Carvão Em Pérolas escrita por Milady


Capítulo 14
"Forever trusting who we are..."*


Notas iniciais do capítulo

Olá, pessoas lindas!!!
Deixa eu contar uma coisa pra vocês? No começo dessa semana, comecei a escrever o capítulo e ele já tinha 5 páginas de word... Então de repente, apertei em alguma combinação de teclas do mal e todo o texto se apagou!!!
Detalhe, era um documento que tinha um monte de anotações para capítulos futuros e eu perdi tudo! Primeiro veio o desespero e depois a falta de criatividade... Mas de ontem pra hoje consegui escrever o capítulo de novo. Acontece que como perdi todas as anotações (havia diálogos inteiros escritos, ai que ódio!!!) não sei como será o andamento dos próximos... Tô triste.
=/
Espero que vocês gostem da gambí (apelido carinhoso para 'gambiarra') que escrevi.
Beijos e boa leitura!!!



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Leva algum tempo até que eu consiga me mover novamente. Até perceber que Peeta não voltará essa noite. Arrasto meu corpo escada acima e quando fecho a porta do quarto, sinto a solidão me abraçar.


Só então percebo que ainda choro. Tento inspirar profundamente e não consigo. Fecho os olhos com força... Estou ficando sem ar. Puxo o ar pela boca, mas é como se ele não atingisse meus pulmões... Tem uma força invisível comprimindo minha caixa toráxica, como mãos de ferro. Começo a ficar ofegante e soluços brotam da minha garganta, dificultando ainda mais a respiração...


Me apoio na mesinha em frente ao espelho e encaro a figura ali. Seu estado lamentável me deixa mais nervosa... Não consigo parar de chorar... Não consigo respirar. Só então percebo que estou em um, como diz o Dr. Aurelius, ataque de pânico.


“Meu nome é Katniss Everden, tenho 19 anos, moro no Distrito 12... E estou sozinha...”

Sinto minhas pernas fraquejarem e os soluços ficam cada vez mais altos


“Meu nome é Katniss Everden, tenho 19 anos, moro no Distrito 12, venci os Hunger Games, fui resgatada da Segunda Arena, sou o tordo. Me voluntariei para salvar Prim... Falhei.

Dor. Quero gritar e não consigo... Meus pulmões gritam e eu não consigo respirar. Não consigo parar de chorar. Estou com medo... Preciso de ajuda...

“Meu nome é Katniss Everden, moro no Distrito 12. Tenho 19 anos e sobrevivi a duas arenas. Fui o tordo da rebelião. As pessoas acreditavam em mim. Meu pai morreu. Finck morreu. Madge morreu. Prim morreu. MInha mãe foi embora. Gale foi embora. Matei Coin. Snow morreu. Cinna morreu. Darius morreu. A família de Peeta morreu. Peeta foi embora. Eu não deixo o filho de Peeta viver...

Então tudo ficou preto antes que eu sentisse o chão frio sob mim.

*-*-*-*-*-*-*

Demoro alguns segundos para perceber que estou caída no chão. Não sei por quanto tempo apaguei, mas consigo ver que ainda está escuro. Tento me levantar e sinto alguns músculos doloridos. Tavez eu tenha algum hematoma, mas não ligo para isso. Não choro mais e já consigo respirar. Me encolho na cama, e bastam alguns minutos para me tocar que não conseguirei dormir.

Levanto e vou até a janela do quarto. Reparo que a luz equivalente ao quarto que era de Prim aqui, na casa de Peeta - porque todas as casas da Vila dos Vitoriosos, tem a mesma planta - está acesa. Sua sombra se move atrás das cortinas. Foi ali onde Peeta montou seu pequeno estúdio. Suas telas e tintas. Sinto um misto de alívio e preocupação ao perceber que ele também não conseguiu dormir.

Puxo uma cadeira e coloco diante da janela. Fico ali, encarando a sombra de Peeta, pensando em tudo e em nada... Sem conseguir descansar, deixando o tempo passar, até que senti os primeiros raios do sol em meus olhos. Só então me dei conta que a luz do estudio de Peeta estava apagada. Ele já não estava ali.

Me levanto devagar. Sinto dor nas costas. Olho ao redor e sei que não conseguirei ficar mais nenhum segundo naquela casa. Vou até minha gaveta e pego o molho de chaves. Meus pés seguem sem que eu consiga pará-los e em poucos segundos já estou diante da porta vizinha. Tento usar a chave, mas ela está destrancada.


Subo as escadas, dou um olhar à porta entreaberta do quarto, mas passo direto por ela, chegando ao lugar que seria o quarto de Prim, se estivessemos em minha casa. É só atravessar o umbral e o cheiro de tinta fresca invade minhas narinas. Olho ao redor e vejo muitas telas coloridas. Eu não costumo ver as obras de Peeta, mas naquele momento eu precisava estar ali.

Vejo imagens da segunda arena: Finick dentro do mar, com água até a cintura; Johanna correndo; um relógio formado de areia e água do mar; Beete riscando algo na arena; eu e Finick cobertos daquela pomada marrom e mal cheirosa, fazendo caretas; um recorte dos olhos azuis de Peeta. Tem algumas pinturas que misturam imagens das duas arenas, fogo, o D12... Tem o pai de Peeta fazendo a massa do pão e seus irmãos rindo. Um recorte de olhos cinzentos que reconheço como sendo os meus, há chamas dentro deles. Tem uma imagem meio borrada de Gale e Beete manipulando armamentos. Algumas telas estão manchadas de tinta negra que cobre a pintura por baixo... E também vejo meu rosto em várias telas: escrevendo, sorrindo... dormindo.

Num canto da sala vejo uma tela quase toda em preto em branco. Um cheiro forte de tinta fresca emana dali. Ao me aproximar percebo que se trata do jardim da mansão de Snow, na Capital. Há crianças ali e elas parecem estar chorando e gritando. As únicas coisas coloridas, em amarelo e vermelho, são labaredas de fogo no gramado. Em primeiro plano está uma garota que reconheço como sendo Prim. Ela segura Buttercup em seu colo... Mas o gato está diferente, parece ter uma juba e olhos claros... Ao fundo, meio escondida entre sombras, uma figura... Sou eu! Vestida com as roupas do tordo, uma trança descendo pelo meu ombro direito e empunhando meu arco. Uma flecha com a ponta em chamas... Apontando para Prim!

Me afasto com um pulo e sinto meu corpo inteiro tremer. Quero rasgar essa tela... Quero chorar... Quero morrer!

Tento respirar. Preciso respirar. Seguro as lágrimas novamente, mas elas são teimosas e insistem em correr pelo meu rosto. Sufoco um soluço. Se eu me permitir entrar em pânico novamente sinto que não conseguirei mais voltar.

“Estou tendo uma manhã ruim... só isso. Peeta não pensa isso de mim. Não mais...”

Não percebi o momento em que me encolhi no chão junto a parede. Fiquei ali mais um tempo, fixando a tela onde os olhos azuis de Peeta me encaravam. A todo custo tentando evitar que o medo e o desespero se apoderassem de mim novamente. Comecei a recitar baixinho.

“Meu nome é Katniss Everden. Tenho 19 anos e o Distrito 12 é meu lar. Peeta e eu somos tributos vencedores. Fingimos ser os amantes desafortunados do D12... Protegemos um ao outro na segunda arena. Fomos separados. Ele foi torturado, envenenado. Teve suas memórias alteradas... Quis me matar... Mas ele não queria me matar. A culpa foi de Snow. Snow fez ele me odiar, mas ele voltou. Peeta me conquistou. Eu sou dele, ele é meu. Protegemos um ao outro, é isso que nós fazemos...”

Me levanto devagar e me apoio nas paredes para chegar até seu quarto. Empurro a porta, que desliza sem fazer barulho algum. Peeta está jogado sobre os lençóis, sem camisa e com a mesma calça de ontem. Posso ver alguns respingos de tinta em sua pele branca. Ele dorme. Vou até a cama e engatinho até ele. Seus olhos azuis se abrem devagar, ainda sonolentos. Por um momento tenho medo de sua reação, mas ele apenas me olha. Ainda sinto meus olhos molhados e o sabor salgado em meus lábios. Me deito encolhida, de costas pra ele em um convite mudo. Peeta apenas rola para o lado e aproxima seu corpo do meu, envolvendo seu braço em minha cintura. Fecho os olhos e a última coisa que sinto antes de ser envolvida pelo sono, é a respiração de Peeta em meu pescoço.

*-*-*-*-*-*-*-*



Sinto calor. Os dias no D12 estão ficando cada vez mais quentes. Me mexo um pouco na cama e percebo que estou sozinha ali. Abro os olhos rapidamente e observo o ambiente. Me levanto, meus pés descalços tocam o chão, eu saio do quarto e caminho pelo corredor, seguindo um barulho que vem do estúdio de Peeta. Chego na porta e o vejo de costas: ele molha um pincel grosso em tinta preta e depois espalha pinceladas aleatórias sobre o quadro que vi essa manhã, manchando e cobrfindo o campo em chamas, minha imagem apontando uma flecha para Prim...

Me mexo inquieta e ele se vira para mim, olhando fixamente em meus olhos, e depois para a tela... Depois para mim novamente.

“Não real.” - Ele diz.


Eu avanço até ele, mais uma vez a torneira em meus olhos aberta. Envolvo meus braços ao redor do seu pescoço e o abraço com força. Eu não vou sair dali, não vou deixar que ele me tire dali. Um soluço escapa quando seus braços fortes me envolvem. Sinto quando ele afunda o nariz em meu pescoço e eu me permito parar de chorar, o bolo em minha garganta finalmente se dissolvendo e consigo respirar com mais facildade

Ficamos um tempo imóveis. Segurando um ao ontro, como sempre fizemos, no meio de todas aquelas telas. Fecho os olhos. Não quero o passado me encarando naquele momento. Sinto Peeta se mexer, tentando se afastar, e antes que eu consiga raciocinar, estou avançando para beijá-lo.

Não sei porquê fiz isso. Eu só não quero essa terrível sensação de solidão novamente ao meu redor. Peeta corresponde ao beijo, com força e intensidade. Ele ainda me quer! Permito que algo, que acho parecido com felicidade, tome conta de mim naquele instante. As mãos dele apertam minha cintura e eu seguro seus ombros com força. Com um susto, percebo que Peeta me ergue e num impulso envolvo minhas pernas em sua cintura. Entre beijos, ele me leva até seu quarto e me solta em sua cama.

Eu não dou espaço para que ele se afaste e o puxo de volta para meus lábios. Estou ofegante mais uma vez, mas agora não é por uma sensação ruim. Rastejo para o meio da cama com Peeta debruçado sobre mim, me beijando, depositando mordidinhas em meu pescoço, seus olhos escuros. Eu o quero tanto...

Estou tão envolvida em seus toques e beijos que sou pega de surpresa quando ele se afasta. Tento segurá-lo, mas ele já está sentado, do outro lado da cama, me encarando, ofegante.

“Não” - minha voz sai manhosa e eu não a reconheço como minha - “O que você está fazendo?”

Fico de joelhos indo até ele, mas ele se levanta e coloca as mãos na cintura, encarando o chão.

“Não podemos.”

“Por quê?” - Desde quando tenho esse tom de voz?

Então ele me olha.

“Você não tomou o chá ontem à noite.”

Sinto como se ele tivesse me empurrado debaixo de uma ducha fria.

“E eu não confio muito em mim, nesse momento... Digo, para parar... Para não ir até o fim.”

Me sento no colchão. Meu corpo ainda espera que continuemos, praticamente implora por isso... Mas minha consciência está bem atenta à razão de Peeta... E ao tom magoado em sua voz.

Estendo a mão para ele. Pedindo com o olhar que ele venha para a cama comigo.

“Ok. Não faremos nada então.”

“Na verdade. Eu preciso de um banho... Estou sujo de tinta.” - Ele pega uma calça e uma cueca em uma gaveta e caminha para o banheiro - “Eu já volto.”

E eu sei que essa é sua maneria de pedir para que eu o espere. Volto a me deitar na cama e aguardo, os olhos vidrados.

“Você não tomou o chá ontem à noite.”

Fico em dúvida se havia realmente ironia ou mágoa na sua voz... Ou se ele estava cuidando de mim.

Ergo o meu olhar quando ouço a porta do banheiro se abrindo e o perfume do shampoo de Peeta ivande meu olfato. Ele vem ainda secando os cabelos e me olha. Joga a toalha sobre uma cadeira e vem até a cama, deitando-se ao meu lado. Eu me aproximo e repouso a cabeça sobre seu peito. Ficamos assim, calados por um tempo que eu não consigo precisar.

“Por que você não falou comigo sobre isso?” - a voz calma dele me assustou e eu me agarrei mais à sua cintura.

“Eu não sei... Acho que tive medo...”

Ele se mexe sob mim e respira profundamente.

“Me assusta você pensar que eu poderia te obrigar a uma coisa que não se sinta preparada...”

Eu me ergo e me apoio no braço, olhando para ele. Sua placidez me causa uma sensação ruim.

“Me assusta pensar que você não confia em mim para compartilhar esse tipo de coisa que deveria ser decidido em conjunto...”

“Não é verdade... eu confio em você. Eu confio minha vida à você...”

“Mas confia nossa vida á uma terceira pessoa... Foi a Grease quem te deu as folhas né?”

‘Não foi culpa dela...”

“Eu sei que não.” - ele suspirou e se sentou, eu fiz o mesmo - “Eu só queria que você tivesse falado disso comigo... Kat... Nós somos um casal de verdade há poucos dias... Somos pessoas com sérios problemas e eu tenhno consciência disso...”

“Mas, eu sei que você quer...” - eu sou tão fraca por não dizer exatamente o que penso nesse momento.

“Sim, eu quero uma família. Eu quero muito.” - ele ergueu o olhar e me encarou - “E eu quero essa família com você. Mas não quero que ela seja quebrada como a minha foi... Eu quero ser um casal primeiro, sabe? Eu quero descobrir o que é realmente ser um casal com você, e depois... Depois nós vemos o que fazer... Mas eu preciso saber que você confia em mim, que vamos tomar decisões juntos, construir uma vida juntos...”

Então minha memória me leva à primeira arena e sinto o gosto das amoras cadeado em minha língua.

Juntos? -ele perguntou.

Juntos. -eu respondi

“... Eu só fiquei magoado por perceber que algúem sabia mais de nós dois do que eu sabe? Se você tivesse falado comigo... Eu sei formas de evitar, mesmo sem o chá...”

Então algo estalou em mim.

“Como você sabe que se pode adoçar o chá?”

Então eu vi uma coisa que jamais pensei ver me toda a minha vida: Peeta corando. Ele respirou fundo, e me olhou, mantendo a calma.

“Eu comprava as folhas no Hobb.”

Um pensamento louco passou pela minha cabeça. Ele comprava as folhas para a mãe dele? Mas ela não parecia uma mulher que confiasse esse tipo de tarefa para os filhos...

“Para quem você comprava?”

Ele me olhou, um bilho de nostalgia no olhar.

Oh!

“Você tinha uma namorada?” - senti um gosto amargo no fundo da garganta.

“Mais ou menos.”

“Como assim, mais ou menos?” - respirei para acalmar minha voz - “Ou se namora, ou não se namora!”

Ele deu uma risadinha e eu quis deixá-lo sozinho ali.

“Não é assim. Você e Gale, por exemplo...”

“Gale e eu não éramos namorados. Nunca fomos!”

Mas fomos quase... não fomos?

“Helissa Cartwright.” - ele falou.

Demorou um tempo para eu lembrar. Mas eu só conhecia uma Helissa no Distrito 12...

“A costureira... Mas ela era bem mais velha que você...”

Ele deu de ombros. Lembro dela. Era bonita. Longos cabelos negros e olhos azuis, devia ter por volta dos seus 30 anos quando a vi pela última vez. Não era natural do D12, tinha vindo com o marido que era supervisor nas minas. Ele havia morrido de pneumonia uns 4 anos atrás. Ela costurava para as pessoas mais favorecidas do Distrito.

“Ela era viúva. Ia muito à padaria e adorava meus bolos... Ela sempre me elogiava pro meu pai... Fazia piadinhas.” - ele parou e encarou o teto - “Engraçado, como as lembranças de antes dos jogos não foram afetadas...” - então continuou - "Um dia ela pediu ajuda para levar as compras e meu pai disse para eu ir com ela. Ela me chamou para entrar, conversamos e ficamos amigos... Passei a ir sempre em sua casa então...”

Eu queria saber, mas eu queria que ele parasse.

“Você disse que sempre tinha gostado de mim.” - minha voz saiu mais magoada do que eu pretendia.

“Sim. Mas eu tinha 15 anos, Kat... Jamais imaginaria que você olharia para mim... E sempre havia Gale.” - eu quis falar mas ele me impediu com um gesto - “Ok. Hoje eu sei que vocês não tinham nada. Mas na época, todo mundo achava que sim... Bom, eu falei de você para Helissa e ela riu com piedade, mas dizendo que eu era um garoto muito bonito, gentil e engraçado, e devia ter algumas garotas que se interessavam por mim. Ela disse que ia me ensinar a lidar com as garotas, então me beijou. Ela era viúva, sem filhos e se sentia muito só. Não me pedia amor, apenas que ficasse ali com ela... E eu fiquei, porque era bom. Éramos mais companheiros que amantes, sei lá... Era bom." - e ele riu novamente, nervoso - "Helissa me pedia para comprar as folhas e algumas vezes eu até fiz o chá para ela, que odiava o gosto amargo, então adoçava... Bom, ela nunca engravidou.”

Eu abracei meus joelhos e apoiei a cabeça ali.

“Ela foi importante para você...”

“Muito. Depois da Colheita, ela veio se despedir. Minha mãe não quis deixar, mas ela insistiu. Ninguém sabia de nós, então minha mãe não entendeu direito o que ela estava fazendo ali, mas meu pai deixou. Ela veio e me abraçou chorando, porque sabia que eu não ia voltar, não quando você estava na arena também. ‘Faça ela te notar. É a sua chance, mesmo que breve’. Foi a última coisa que ela me disse...”

Eu ergui meus olhos para ele

“E vocês voltaram a se ver, depois dos Jogos?”

“Sim. O sorriso dela ao me ver...” - ele riu saudoso - “Pensando que eu tinha conquistado você... Foi com ela que eu me abri, sobre a farsa dos amantes desafortunados... E ela me consolou quando eu precisei...”

“Claro que consolou.” - minha voz estava raivosa e ele me olhou.

“Não dessa forma, Katniss. Ela foi realmente minha amiga naquele momento. Depois da primeira arena, nunca mais ficamos juntos novamente.”

“E ela foi sua única...?” - a pergunta saiu dos meus lábios antes que eu pudesse engolí-la.

“Não. Ela não foi a única mulher com quem fiquei.” - ele me olhou em desafio, quase fiquei magoada, mas eu pedi por aquilo não foi? - “Marion, da nossa série, na escola...”

Eu lembrava de Marion. Baixinha, olhos verdes e cabelos ruivos e lisos. Ela era linda e muito popular. Não era uma santa, todas sabiam.

“Você era o filho do padeiro?” - eu falei mais para mim do que para ele.

“Claro que eu era o filho do padeiro, Katniss...”

“Não. Uma vez, cheguei mais cedo na sala e ela estava falando com duas amigas, sobre o filho do padeiro... Mas eu pensei que era algum dos seus irmãos...”

Oh, sim... Ela falava do filho do padeiro. Tâo gentil com seus olhos azuis e seus cabelos dourados... Tão atencioso e carinhoso. Com seu sorriso tranquilizador e gestos intensos...

“Vocês ficaram juntos muito tempo?”

“Não. Ficamos juntos uma vez na noite do seu aniversário. Depois ficamos amigos... Eu não fui o primeiro dela.”

“Mais alguém?”

“Delly.”

Eu arregalei meus olhos para ele.

“Delly?!”

Delly que ficou do lado dele o tempo todo no D13? Delly que me consolou quando eu estava quase enlouquecendo por ele estar distante? Delly que pediu para eu lutar por ele?

“Delly e eu trocamos beijos algumas vezes... Parecia justo, já que eu gostava de você e ela tinha uma queda por Gale...”

“No 13?”

“Não, Katniss... Na escola.”


Eu me levantei. De repente ficar na mesma cama que ele me pareceu bem difícil.

“Você disse que gostava de mim desde os 5 anos...” - eu não devia acusá-lo.

“Sim. Desde os 5 anos que esse sentimento por você vem crescendo.”

“Gostava de mim e ficava com outras garotas...”

Vi um quê de indgnação em seu olhar.

“Sim. Porque eu precisava viver. Eu era apaixonado por você, mas não tinha a menor perspectiva de te fazer me notar... Eu precisava tentar sentir algo por outra pessoa...”

“Ah, claro...”

“Katniss, pelo amor de Deus. Na minha cabeça você e Gale trocavam beijos e sabe-se lá mais o quê todas as vezes que iam para aquela bendita floresta...”

“Não. Não trocávamos... Nunca...”

“Você é uma péssima mentirosa...”

“Só fizemos algumas vezes... Poucas vezes...”

“Você mesma ficou em dúvida, Katniss...” - ele fez um gesto nervoso com as mãos.

“Sim, fiquei... Mais pelo hábito do que por qualquer outra coisa. Porque ele sempre foi muito próximo... Porque ele era o único rapaz com quem eu realmente tinha contato e em quem eu confiava... Porque eu sentia sua falta antes da turnê dos vitoriosos. Você se afastou de mim e eu precisava de alguém...”

“Eu me afastei porque você admitiu fingir gostar de mim. Fui um idiota, a culpa não foi sua, mas eu precisava aprender a conviver com aquilo, a calar minha raiva... E se você precisava de alguém, então sabe perfeitamente como me senti antes da colheita.”

“Mas eu não fui pra cama com Gale!”

Vi as feições de Peeta mudarem e ele se forçar a ficar calmo.

“Seria um direito seu, se o tivesse feito. Não tínhamos nada um com o outro antes.” - ele respirou - “Katniss... você está com ciúmes?”

Sentei novamente na cama, fitando o chão e confessei, minha voz raivosa.

“Sim. Estou.”

Senti o colchão afundar do meu lado e Peeta puxou meu rosto para encará-lo.

“Katniss... Olha pra mim.” - eu o fiz - “Helissa e Marion estão mortas... São apenas lembranças de um passado que não vai voltar” - a voz dele estava carregada de tristeza - “E Delly está na Capital, refazendo sua vida, do mesmo jeito que nós, aqui... juntos. E eu te amo. Sempre foi você, independente delas.”


Ele tinha razão. Gale mesmo tinha me dito que havia beijado outras garotas antes de mim... talvez tenha até ido para cama com algumas delas. Peeta tinha o direito de ter um passado. Ele era popular, tinha vários amigos na escola. E eu? Que tipo de garota eu fui? Nenhum romance, uma ou duas amizades no máximo, se contar com Madge... Tão envolvida com a dor da perda e responsabilidade de cuidar da minha família. Gale também tinha isso nas costas, mas tinha tido tempo e vontade de viver além disso. Eu não. Então veio tudo de novo, a mágoa da minha mãe por ter jogado tudo nos meus ombros. Mais uma vez eu chorei. Peeta me abraçou.

“Katniss?”

“É tão triste, finalmente perceber que eu nunca pude ser uma garota normal, com preocupações normais... Cuidar da minha mãe e de Prim fizeram de mim uma velha amarga, num corpo de adolescente...”


Então eu percebo o motivo de ter aguentado toda aquela conversa com Peeta. Eu precisava saber que ele tinha sido um garoto normal antes de tudo... Que antes de toda a desgraça, ele tinha sido feliz ao seu modo... Tinha conseguido viver como um adolescente qualquer do 12. E eu estava com raiva. Raiva e ciúmes da vida que ele teve antes de tudo, porque no fim, era como se, de alguma forma, eu fosse culpada por tudo aquilo ter sido tirado dele. Raiva, porque eu não pude ser assim.

E eu chorei, enquanto Peeta me segurava e suas mãos em meus cabelos me dizendo que tudo estava bem, que eu poderia ser uma garota normal, em uma vida normal...


Mas eu nunca seria uma garota normal, numa vida normal. Não depois de tudo. Nem ele seria...

E nós tínhamos plena consciência disso.


*-*-*-*-*-*-*



*Nothing Else Matters - Mettalica

o�S8on�S �M lly que me consolou quando eu estava quase enlouquecendo por ele estar distante? Delly que pediu para eu lutar por ele?




“Delly e eu trocamos beijos algumas vezes... Parecia justo, já que eu gostava de você e ela tinha uma queda por Gale...”


“No 13?”


“Não, Katniss... Na escola.”


Eu me levantei. De repente ficar na mesma cama que ele me pareceu bem difícil.


“Você disse que gostava de mim desde os 5 anos...” - eu não devia acusá-lo.


“Sim. Desde os 5 anos que esse sentimento por você vem crescendo.”


“Gostava de mim e ficava com outras garotas...”



Vi um quê de indgnação em seu olhar.


“Sim. Porque eu precisava viver. Eu era apaixonado por você, mas não tinha a menor perspectiva de te fazer me notar... Eu precisava tentar sentir algo por outra pessoa...”


“Ah, claro...”


“Katniss, pelo amor de Deus. Na minha cabeça você e Gale trocavam beijos e sabe-se lá mais o quê todas as vezes que iam para aquela bendita floresta...”

“Não. Não trocávamos... Nunca...”

“Você é uma péssima mentirosa...”


“Só fizemos algumas vezes... Poucas vezes...”

“Você mesma ficou em dúvida, Katniss...” - ele fez um gesto nervoso com as mãos.



“Sim, fiquei... Mais pelo hábito do que por qualquer outra coisa. Porque ele sempre foi muito próximo... Porque ele era o único rapaz com quem eu realmente tinha contato... Porque eu sentia sua falta antes da turnê dos vitoriosos. Você se afastou de mim e eu precisava de alguém...”


“Eu me afastei porque você admitiu fingir gostar de mim. Fui um idiota, a culpa não foi sua, mas eu precisava aprender a conviver com aquilo, a calar minha raiva... E se você precisava de alguém, então sabe perfeitamente como me senti antes da colheita.”


“Mas eu não fui pra cama com Gale!”


Vi as feições de Peeta mudarem e ele se forçar a ficar calmo.

“Seria um direito seu, se o tivesse feito. Não tínhamos nada um com o outro antes.” - ele respirou - “Katniss... você está com ciúmes?”

Sentei novamente na cama, fitando o chão e confessei, minha voz raivosa.

“Sim. Estou.”

Senti o colchão afundar do meu lado e Peeta puxou meu rosto para encará-lo.

“Katniss... Olha pra mim.” - eu o fiz - “Helissa e Marion estão mortas... São apenas lembranças de um passado que não vai voltar” - a voz dele estava carregada de tristeza - “E Delly está na Capital, refazendo sua vida, do mesmo jeito que nós, aqui... juntos. E eu te amo. Sempre foi você, independente delas.”


Ele tinha razão. Gale mesmo tinha me dito que havia beijado outras garotas antes de mim... talvez tenha até ido para cama com algumas delas. Peeta tinha o direito de ter um passado. E eu? Que tipo de garota eu fui? Nenhum romance... Tão envolvida com a dor da perda e responsabilidade de cuidar da minha família. Gale também tinha isso nas costas, mas tinha tido tempo e vontade de viver além disso. Eu não. Então veio tudo de novo, a mágoa da minha mãe por ter jogado tudo nos meus ombros. Mais uma vez eu chorei. Peeta me abraçou.


“Katniss?”


“É tão triste, finalmente perceber que eu nunca pude ser uma garota normal, com preocupações normais... Cuidar da minha mãe e de Prim fizeram de mim uma velha amarga, num corpo de adolescente...”


Então eu percebo o motivo de ter aguentado toda aquela conversa com Peeta. Eu precisava saber que ele tinha sido um garoto normal antes de tudo... Que antes de toda a desgraça, ele tinha sido feliz ao seu modo... Tinha conseguido viver como um adolescente qualquer do 12. E eu estava com raiva. Raiva e ciúmes da vida que ele teve antes de tudo, porque no fim, era como se, de alguma forma, eu fosse culpada por tudo aquilo ter sido tirado dele. Raiva, porque eu não pude ser assim.


E eu chorei, enquanto Peeta me segurava e suas mãos em meus cabelos me dizendo que tudo estava bem, que eu poderia ser uma garota normal, em uma vida normal...


Mas eu nunca seria uma garota normal, numa vida normal. Não depois de tudo. Nem ele seria...


E nós tínhamos plena consciência disso.



*-*-*-*-*-*-*



*Nothing Else Matters - Mettalica


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Notas finais do capítulo

Antes de qualquer coisa, desde ontem que venho editando o capítulo, mas ele insiste me ficar desconfigurado (parágrafos e uma parte repetida no fim) e não sei mais o que fazer para consertar, por favor, me desculpem...
Quem nunca teve uma D.R. com o namorado, interrogando-o sobre as ex, que atire a primeira pedra! rsrs
Bom, gente, com esse capítulo eu queria mostrar um pouco mais da vida de Peeta antes de tudo, pq eu sempre imaginei que ele fosse um garoto popular (até pelo jeito e carisma dele), que tenha tentando viver além do sentimento dele pela Katniss, porque no fim de tudo, ele tinha medo de chegar junto dela. E também quis mostrar uma autodescoberta da Katniss... É legal quando os personagens/pessoas tomam consciência das suas realidades.
Tentei manter a mesma linha do capítulo anterior, sem muito romantismo por parte dela, mas a sensibilidade ao tocar nos pontos fracos e na dor e nos medos que ela carrega, por tudo que aconteceu. Reparem bem na postura do Peeta também, há muito a se resolver ainda.
Ah, a história do 'juntos?' 'juntos.' Eu retirei do filme, porque acho muito mais bonitinho do que o 'no três?' do livro (mas não lembro realmente quem diz primeiro, se tiver errado, me avisa, ok?).
Muito obrigada pelos reviews. Aguardo muitos, muitos mais! =D
Um beijo e até a próxima!
P.S.: Recomendações? Reviews? Mereço? ^^