Fogo e Gelo escrita por Reira


Capítulo 33
Perdas e reencontros


Notas iniciais do capítulo

"Come and take a walk on the wild side
Let me kiss you hard in the pouring rain
You like your girls insane
Choose your last words
This is the last time
'Cause you and I...
We were born to die"
(Born to die, Lana Del Rey)



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Nina POV




Eu não tenho coragem de voltar pra casa. Não tenho nem coragem de sair daqui, de botar a cara pra fora.

Vergonha, culpa, é tudo que eu sinto agora... o que aconteceu comigo ? Desde que Lysandre bateu aquela porta, não paro de chorar enquanto a ficha do tamanho da merda que eu fiz cai.

Por ser uma pessoa horrível, me tornei mais horrível ainda... como consegui fazer isso ? A culpa é capaz de cegar, de escravizar... magoei meus pais... e o Ken.

Ken... como ele deve estar agora ? Ele tentou tanto me trazer de volta, me fazer acordar... fiquei sentada no chão, encostada na porta, olhando para o vazio... pensando em tudo. Como eu pude me entregar á alguém como Lysandre ? Me sinto tão envergonhada... meus olhos doem, minha cabeça dói. Me sinto em um beco sem saída, sem escolha... enquanto eu estava distante, um passarinho entrou pela janela, e começou a andar pela casa, procurando algo para comer. Fiquei olhando para ele, desejando ser livre assim. Desejando não pensar, não sentir nada. Pessoas são complexas demais... como eu consegui me enganar dessa forma ?

Mal tenho forças para erguer meus braços. Minhas mãos tremem, e sinto um peso tão grande no coração, acho que é a maior dor que já senti. Não sei, não consigo pensar direito. Minha visão está embaçando, minha cabeça dói. Me levantei com muita dificuldade, me apoiando na maçaneta da porta, e caminhei até o banheiro com dificuldade, parecendo uma bêbada. Ao chegar lá tirei meus cabelos desgrenhados do rosto e me olhei no espelho. Eu estava horrível, nada da antiga Nina... agora eu tenho olheiras, olhos inchados, uma expressão cansada e vazia... e nada de um sorriso.

Abri o armário com violência, procurando algum cigarro, e nada. Bati a porta, quase quebrando o espelho, e fui para o quarto. Procurei por todo canto, deixando aquele lugar uma verdadeira bagunça, jogando coisas, descontando toda minha raiva. Procurei remédios, bebidas, qualquer coisa que amenizasse minha dor. Liguei a televisão, uma ação desesperada e impensada, apenas tentando encontrar qualquer coisa que fizesse isso passar. Estava passando o clipe de uma garota ruiva, com flores no cabelo. Linda. E mórbida. Ela dizia: “choose your last words, this is the last time, ‘cause you and I, we were born to die”.

Nós nascemos para morrer…

Parece que era a resposta para o que eu buscava… um alívio. Olhei para a janela, a cortina balançava lentamente com a brisa. E de repente aquele apartamento pareceu tão mórbido quanto o clipe que passava na TV. Me aproximei da janela e passei delicadamente as mãos pela madeira que a emoldurava, enquanto olhava para baixo.

Eu não mereço viver...

– ‘cause you and I, we were Born to die – sussurrei junto com a música enquanto me apoiava na janela, vendo a morte mais próxima do que nunca. Pensei em Ken e uma lágrima escorreu. Pensei na antiga Nina, que agora parece mais uma pessoa que conheci, distante... em meus amigos. Meus pais.

Eles ficarão melhores se mim.






Shizuka POV






Nunca estive tão feliz. Apesar de tantas coisas ruins que aconteceram, parece que agora tudo está se encaixando... até que, ao entrar em casa, me lembrei de algo muito importante... preciso ver a Nina.

Ok, que ótima amiga eu sou. Não me esqueci dela nenhum segundo sequer, mas por um breve momento sim. Nem mesmo almocei, peguei minha bolsa e fui até o apartamento do Lysandre. Pensei em chamar o Ken, mas isso fizesse ela se recusar de falar comigo. No caminho, Iris me ligou me contando sobre sua aprovação, e comecei a gritar no meio da rua, dando parabéns. A parte triste é que ela vai ter de ir embora... combinamos até mesmo sua despedida. Conversamos até eu chegar na porta do apartamento. Então disse que tinha ido visitar a Nina e desliguei.

Respirei fundo e por uma ação automática, coloquei a mão na maçaneta. Der, precisa bater primeiro. Mas percebi que ela estava aberta... que estranho !

Abri bem devagar, e o que vi me deixou em choque.

Nina estava pendurada no parapeito da janela. Ela ia fazer isso mesmo ... ? Fiquei um segundo em choque, vendo aquela cena, processando o que estava acontecendo. Então gritei e deixei minha bolsa cair no chão enquanto corria para salvá-la. A puxei com toda a força que conseguimos e ela caiu em cima de mim. Quando nos recuperamos da queda, nos levantamos e ela me encarou com espanto e raiva.

–- O que está fazendo aqui ?

–- Vim te ver... o que você pensa que está fazendo ?

–- Acabando com esse pesadelo – Ela respondeu, indo em direção á janela novamente. Eu a segurei pelo braço e ela me fuzilou com o olhar.

–- Me deixe, Shizuka.

–- Não, jamais vou te deixar fazer uma besteira dessa !

–- Prefere que eu continue vivendo desse jeito ? – Fiquei em silêncio. Ela estava horrível, por dentro e por fora. É claro que quero que ela viva, mas o que dizer com respeito á sua condição ? Respirei fundo.

–- Você vai se tratar, você tem a gente que se importa. Volta Nina... – Supliquei. Ela deu uma risada irônica e ficou em silêncio, olhando para o chão. Achei que tudo tinha se acalmado, e afrouxei minha mão. Quando ia dizer algo, ela se soltou e correu até a janela, subindo no parapeito. Eu gritei de novo e consegui puxá-la a tempo, mas ela se debatia e dizia para eu deixá-la, enquanto chorava desesperadamente. Eu não sabia o que fazer, então a empurrei até a parede e dei o tapa mais forte que consegui em seu rosto. Ela me olhou com os olhos arregalados.

–- ACORDA ! – Gritei, cheia de raiva. – Não sabe que fazendo isso vai causar muito mais dor do que já causou ? – Ela se encolheu e voltou a chorar. Eu também comecei a chorar e a abracei com força. – Nós estamos aqui, Nina... tudo vai ficar bem... – Ela retribuiu meu abraço e ficamos um bom tempo assim, num silêncio pesado e gritante, interrompido apenas por seus soluços. Quando ela se acalmou, a ajudei a arrumar suas coisas e fomos embora. Ela estava tão magra e fraca que suas mãos tremiam. Enquanto andávamos pelo prédio, até chegar á rua e chamar um táxi, muitos olhavam com estranheza para ela, alguns até cochichavam e davam risinhos. Minha vontade era apagar todo mundo com um soco ! Sociedade hipócrita e fútil. Eu encarava todos com um olhar fulminante, desejando o pior naquele momento para todo mundo. Eu não sou assim, mas a raiva tinha tomado conta.

Fomos o caminho até em casa em silêncio, com ela deitada em meu ombro, quase dormindo. Eu queria perguntar várias coisas, mas não tinha coragem, ela estava frágil demais.

Quando chegamos em casa, preparei um banho de banheira, separei roupas limpas e fui até a cozinha almoçar, a deixando sozinha lá em cima. Assim ela poderia relaxar e pensar um pouco.

Não consigo entender o que aconteceu com ela. Como ela pode chegar a esse ponto... e nem perguntei porque. Falando nisso, o apartamento parecia meio vazio... será que Lysandre foi embora ?






Violette POV





Tudo parecia tão igual e tão diferente... não sei explicar !

Meus amigos não mudaram muito, mas não consegui ver todos em um só dia, nem Hoshi eu vi. Nem a Mel... mas eu vi ele.

E continua lindo, com aquela cara de criança inocente, do que ele não tem nada.

Será que ele continua tocando violoncello ?

No final da aula, o procurei discretamente por todos os lugares. Mas, ao invés de encontrá-lo, me deparei com Ambre. Antes que ela me visse, me escondi atrás de uma árvore. Ela parecia nervosa e preocupada, enquanto falava com um garoto moreno. Ela parecia tão diferente... não tinha mais aquele ar arrogante. Tanta coisa mudou... até a cor das paredes. Mas eu continuo invisível como sempre fui, e isso é bom. Me sentei na grama e me encostei na árvore, enquanto abria minha pasta de desenhos, revendo os desenhos que eu fazia da escola. Hoshi, Alexy, Mel, Ambre, pessoas desconhecidas... era minha paixão passar os intervalos desenhando gente, e coisas. Pelos desenhos eu vou vendo os detalhes que mudaram... numa manhã não dá pra ver tudo. Será que todo mundo continua igual ? Será que eles sentiram minha falta ?

De repente, veio uma sombra acima de mim. Ergui os olhos e ali estava ele, me encarando, me fazendo corar e arrepiar dos pés á cabeça. Fiquei sem reação enquanto o ouvia falar.

–- Hey, Violette.

–- Hey – Respondi, com a voz entrecortada, sem conseguir dizer mais nada.






Ambre POV





–- Você não pode estar falando sério, Leigh...

–- É sério Ambre – Ele olhou no relógio – O vôo dele está marcado pra daqui 20 minutos. – Ele não pode ir embora assim... e a criança ? Ele não vai ao menos dar alguma assistência ? Nem, sei lá, esperar ela nascer ? Ah, isso demora nove meses, é verdade... mas mesmo assim, ao menos falar comigo ! Eu tenho o direito de saber !

Nervosa, deixei Leigh falando sozinho e fui direto para o carro. Minhas mãos tremiam no volante e eu estava acima do limite de velocidade mas já fiz coisas muito piores, então não estou ligando. Preciso pegar ele a tempo.

Parece que quando se está com pressa, todos os faróis ficam no vermelho. Quando eu podia, ultrapassava, mas nem sempre conseguia. E nem parei pra pensar nas multas que vou ter que pagar. Ao menos isso o dinheiro pode pagar...

Se não fosse essa criança, eu não precisaria estar fazendo isso. Mas deve ser horrível crescer sendo renegado pelo pai... quem mandou fazer tudo errado, Ambre. As pessoas se tornaram tão tolerantes. Não é legal julgar, mas elas acham lindo eu estar grávida. “Mãe é mãe em qualquer idade”, eles dizem. Mas admito que meu psicológico nunca esteve tão abalado. Minhas emoções. Eu não estou preparada. Não me arrependo da criança, mas sim de tê-la tão cedo. Minha vida irá girar em torno dela agora, então muitos dos meus planos vão ficar para trás. Queria poder dizer á todas aquelas meninas cheias de sonhos para não se iludirem. As pessoas dizem que a gravidez é linda em qualquer idade, mas não são elas que vão ter que cuidar de uma criança sem estrutura emocional e financeira, ter que abrir mão de inúmeras coisas, acordar no meio da noite por conta de choro, cuidar de uma vida sendo que mal começou a sua.

Com esses devaneios, quase bati o carro. Fiz uma manobra violenta para evitar a batida e acordei desses pensamentos, me concentrando novamente no que estava fazendo, ignorando sirenes de polícia e gritos de homens machistas dizendo que mulher no volante só dá merda. Meu celular começou a tocar, era o Nathaniel. Sei só pelo toque. Parei o carro na frente do aeroporto e atendi enquanto corria para dentro.

–- Cadê você, Ambre ?

–- Vim resolver uma coisas, Nathaniel. Porquê ?

–- Volta pra casa agora.

–- Não tenho mais cinco anos, Nath. Não manda mais em mim.

–- Você foi falar com aquele filho da... – Desliguei na hora. Nath com certeza estava nervoso e até perdeu a noção, porque ele nunca fala desse jeito. Leigh deve ter contado pra ele da nossa conversa... mas e daí. Preciso encontrá-lo. Aquele lugar estava cheio, e faltavam seis minutos para o embarque de Lysandre. Eu corria desesperada, olhando de um lado para o outro, até que o vi segurando a mala e olhando para o relógio. Corri na direção dele, fazendo-o levar um susto quando me viu.

–- O que pensa que está fazendo, Lysandre ?

–- Indo embora. – Ri com cinismo e cruzei os braços, me segurando para não bater nele ali mesmo.

–- E me abandonar assim ? Sem nem mesmo conversar como vai ser ?

–- Porque veio até aqui, Ambre ?

–- É ÓBVIO ! Pela criança, é claro ! – Nesse ponto, eu já estava gritando e algumas pessoas olhavam assustadas. Nem me importei. Malditos curiosos...

–- Tem certeza que é só pela criança ? Você não quer que eu vá embora, quer ? – Eu ia responder, mas as palavras desapareceram da minha boca. Fiquei sem fala e deixei meus ombros caírem, derrotada. Olhei para todos os lados, sem coragem de encará-lo. Ele tem razão, no fundo, é por mim também. Eu quero que ele fique. Mas ele é uma pessoa horrível... como posso querer alguém assim do meu lado. – Me desculpe por isso Ambre. – O encarei com raiva. Suas desculpas soavam como hipocrisia pra mim. – Um filho... agora sentimentos. Mas eu não quero mais causar problemas. Eu vou embora.

–- Você nunca sentiu nada por mim, não é ? – Ele ficou em silêncio.

–- Nunca sinto nada por ninguém, Ambre. – Eu sempre fui péssima pra saber se as pessoas estão mentindo ou não. Eu queria acreditar que ele estava, porque Lysandre nunca dizia o que sentia aos outros. Nunca. Olhei para o chão, tentando esconder uma lágrima que escorreu. Ele secou com o uma das mãos, e em seguida suspirou fundo. – Nenhum de nós merece essa utopia chamado de amor. Adeus, Ambre. – Ele virou as costas e foi. Indignada, comecei a gritar:

–- Isso ! Volte para o seu dinheiro, a única coisa que você ama ! Seu idiota, egoísta, cretino ! – Eu disse coisas piores, mas prefiro não lembrar. Quando percebi as pessoas me encarando, saí correndo de lá e fiquei durante meia hora dentro do carro, chorando. A ficha caiu, eu estou sozinha nessa. Me apaixonei por um homem sem escrúpulos. Eu devo ser doente, não sei.

“Nós não merecemos essa utopia chamada amor”.






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Notas finais do capítulo

GENTE ME DESCULPEEEM ! T-T terminei a escola e comecei a trabalhar... muita correria ! Falta de criatividade também... mas prometo não demorar mais desse jeito ! Não me abandonem... T-T ♥



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