Fogo e Gelo escrita por Reira


Capítulo 32
Segundas chances


Notas iniciais do capítulo

"Shed a tear 'cause I'm missing you
I'm still alright to smile
Girl, I think about you every day now
Was a time when I wasn't sure
But you set my mind at ease
There is no doubt you're in my heart now..."
(Patience, Guns'n'Roses



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Ah não, isso não...

Pensei que fosse obra da Ambre, mas ela não estava por aqui. Quem estava era Charlotte, me olhando com um sorriso malicioso. Estava demorando pra ela mostrar as garras de novo. Respirei fundo, me segurando para não acabar com ela ali mesmo. Onde ela tinha conseguido aquilo ? Ah é, a Ambre guardou o vídeo no notebook e a Charlotte deve ter pego uma cópia. O pior foi ver o olhar de desaprovação de Castiel... senti as lágrimas vindo, mas segurei. Meu primeiro impulso foi sair correndo dali, como teria feito á um tempo atrás; mas agora eu sinto que devo enfrentar isso. Mostrar que essas pessoas não me afetam. Apesar dos risos, dos olhares, e principalmente de Castiel, me mantive forte.

–- Cast – Comecei a explicar – Eu fiz a besteira de ir em uma festa da Ambre, e ela colocou algo na minha bebida. O resultado foi esse... mas pode ter certeza, eu me arrependo até hoje. – O olhar dele se suavizou, mas ainda havia uma repreensão. Não devia ser fácil mesmo me ver daquele jeito... ainda mais na frente de quase toda a escola. Mas ele confia em mim como eu nele, então sei que vai acreditar e mim. E sabe que a Ambre é capaz disso.

– Eu vou resolver isso. – Fui caminhando em direção ao telão, firme, ignorando a vergonha. Evitava de olhar em volta para não encarar as pessoas. E quando cheguei, respirei fundo e então encarei todo mundo. Não foi fácil... a pior coisa do mundo é ser zombada dessa forma. – Me julguem – comecei. – Eu acabei... passando dos limites nessa festa, ok. Mas me arrependo, e muito. Agora vocês... vejo meninas se gabando por ter ficado com noventa por cento dessa escola. Se gabando por ser capacho, se gabando por ser usada por qualquer um. E vocês vão me julgar porque cometi um erro ? E mesmo que eu tivesse feito de propósito, quem são vocês pra dizer qualquer coisa ? – Todos se calaram. Eu tinha razão, afinal, é a maior hipocrisia julgar alguém se você faz pior. Charlotte tinha o olhar cheio de raiva. Eu sorri pra ela e ia sair, quando Castiel chegou. Ele segurou na minha cintura e sorriu pro refeitório inteiro.

– É isso aí, e ela é uma das melhores pessoa desta escola, isso eu posso afirmar. E é minha namorada, e eu sei que muitas aqui queriam estar no lugar dela – Nisso ele olhou para a Charlotte – E precisam fazer esse tipo de coisa pra disfarçar a inveja. – E então ele me puxou pela mão. Comecei a rir e de longe vi Mel e Hoshi rindo também, e fazendo gestos de aprovação. Os olhos de Charlotte ardiam de raiva. Eu ainda sentia vergonha por ter sido exposta assim, mas eu sabia que tinha amigos com quem contar, e isso bastava, mesmo que a escola inteira risse de mim.




Charlotte POV




Garota estúpida...

Ainda bem que ninguém sabe que fui eu quem fiz isso. Saí correndo do refeitório, chorando de nervosismo. Eu não me conformo que o Castiel quis mesmo aquela loira sem sal... argh ! Porque sempre eu ? Porque eu nunca consigo o que eu quero ?

Fui até o jardim, onde me escondo quando quero ficar sozinha. Me encolhi perto de um canteiro de rosas e desabei. Deixei todas as lágrimas de todas as mágoas escorrerem. Sou mesmo uma invejosa, uma garota sem personalidade. Que vive para ser aceita e para conquistar atenção.

Todos os garotos que eu gostei, todos zombaram de mim. Porque quando eu era criança, eu tinha o nariz grande e era gordinha. Garotas como Ambre me humilhando. E então, resolvi fazer uma plástica para reduzir o nariz, parei de comer e quase fiquei doente para emagrecer. E pra quê ? Continuo sendo a mesma fracassada...

–- Charlotte ? – Ouvi uma voz masculina me chamar. Dei um pulo de susto e ao ver quem era, me surpreendi com o garoto de cabelos verdes, o jardineiro da escola. Eu o conhecia, estudamos na mesma sala da primeira á terceira série, e depois na oitava, a época em que eu mais sofri. Jade, ou o garoto do Brooklyn, como eu costumava chamá-lo. Afinal, ele é um dos únicos alunos bolsistas daqui, e não sei porque motivo, trabalha como jardineiro e cuida do clube de jardinagem de manhã, e estuda á noite. E apesar de vê-lo quase sempre, nunca conversamos. A Ambre não vai com a cara dele e ele é bolsista, o que, de acordo com ela, poderia estragar nossa imagem.

–- Oi garoto do Brooklyn. – Eu disse, enxugando as lágrimas, tentando ser discreta. Mas nada escapa dos olhos dele.

–- O que aconteceu com você ? Sempre te vejo por aí, tão alegre... e é tão popular. – Eu ri com cinismo.

-- Popular ? É, eu sou bem conhecida. Mas não tem nenhum amigo, absolutamente nenhum.

–- Mas você se esforçou em ser uma boa amiga ? – Não, pensei. Na hora me veio Ambre me repreendendo, indignada, por eu ter armado com Castiel, pra ficar com ele. A vida nunca fui gentil e verdadeira comigo e eu nunca pensei em ser o que eu não conheço. Mas agora eu entendo que eu nunca vou receber o que desejo, se eu mesma não pratico. – É, Charlotte, parece que você não aprendeu nada ainda. – Suspirei. Ele tem razão. Mas acho que agora não tem mais jeito. Minha imagem é péssima, meu caráter pior ainda. Não é uma coisa tão fácil de consertar... – Você consertou sua imagem por fora, mas e por dentro ? Você prestava atenção á zombaria e ignorava minhas flores. – Isso foi como uma facada. Me lembrei de todas as vezes que, ao me ver chorando, ele me abraçava e me dava uma flor, coisa que ele sempre gostou. Eu sabia que ele gostava de mim. Mas eu era cega demais pra perceber e com certeza ele já devia ter outra pessoa. Prestei mais atenção nos espinhos do que nas rosas. Olhei para o chão, envergonhada. Ele se ajoelhou do meu lado e ergueu meu rosto pelo queixo. – A beleza vai muito além de dotes físicos, Charlotte. Muita coisa mudou desde aquela época, mas eu ainda vejo potencial em você, garota. Acho que você reprimiu a verdadeira Charlotte, aquela que gostava de colocar band-aids nos meu ralados e arranhões quando estávamos no primário. – Ele ainda se lembra disso ? Não consegui segurar o riso. É verdade, nem sempre eu fui assim. Eu amava cuidar de pessoas, e sonhava em ser médica, mas acabei perdendo meu sonho pelo caminho... muitos diziam que eu não iria conseguir...

–- Acho que não tem mais volta... – Eu disse.

–- Claro que tem. – Ele pegou uma rosa e tirou o cabo, em seguida colocou no meu cabelo, como já fez tantas vezes... – Todo mundo pode mudar, Chal. Todo mundo. – Ele se levantou e me estendeu a mão. Apoiei nele e me levantei, limpando as folhas da calça e sorrindo. Agradeci e ele sorriu. – Agora, vê se dá valor pras coisas certas.

–- Pode deixar, garoto do... Jade. – Era um nome excêntrico, mas eu gostava. Eu ia me despedir e parar de atrapalhar o serviço dele, mas a curiosidade foi maior.

–- E como está a vida ? Está namorando ? – Ele riu.

–- Pra você ver como reparou em mim no Ensino Médio. Eu namoro a Peggy. – Arregalei os olhos.

–- A garota do jornal da escola ? Mas ela terminou ano passado...

–- Namoramos á distância... começamos a namorar no meio do ano passado. Agora as coisas funcionam via cartas e skype. Estou juntando pra ir estudar com ela em Harvard. Já passei na prova, vou cursar direito. Ela está fazendo jornalismo lá. – Fiquei impressionada. Nunca pensei que fosse possível namorar assim... mas ele sempre foi determinado... eu também poderia estar indo para Harvard ou outra universidade cursar o que eu queria, mas acabei me perdendo, e perdendo tempo também. Mas eu vou recuperá-lo.

–- Que ótimo... tomara que tudo dê certo entre vocês. – Ele sorriu e eu sorri de volta. Ia me despedir, mas tinha mais uma curiosidade. – E... porquê você sempre dá flores pra Ambre, mesmo sabendo que ela vai jogá-las fora ? – Ele deu de ombros.

–- Sabe aquele ditado “água mole em pedra dura, tanto bate até que fura ?” – Assenti, rindo. – Então, algumas pessoas se concentram tanto nas coisas erradas, e precisam ver beleza e cor de vem em quando. O tipo de pessoa que olha para o chão ao invés de olhar para o céu... e eu gosto de fazer isso, levar cor á vida preta e branca de algumas pessoas... apesar de saber que ela rejeita, mas no fundo eu sei que ela gosta. Algum dia ela vai perceber isso. – Jade, sempre admirável. Peggy é muito, muito sortuda mesmo.

–- Queria ter enxergado as coisas dessa maneira antes. Enfim, não vou te incomodar mais. Foi bom te ver. Até mais, garoto do Brooklyn.

–- Até mais, Chal.




Alexy POV





Garoto idiota ! Devia ter falado com ela !

Quando vi Violette bem na minha frente, meu primeiro impulso foi correr. Vim até a sala e sentei na minha carteira, tentando entender tudo aquilo. Como assim ela some e de repente aparece, sem mais nem menos ? Como ela pôde fazer isso ?

Violette sempre foi a pessoa mais especial do mundo pra mim. A única pessoa que me entendia do início ao fim, que me ouvia sem julgamentos. Mas eu era um idiota ! Nunca dei o valor que ela merecia. E até hoje continuo igual. Sempre procurando garotas para preencher esse vazio, mas nenhuma delas se compara á Violette. E quando eu a tinha perto de mim, a tratava como uma mera amiga. Quanto tempo é necessário para perceber que o que você precisa esteve sempre do teu lado e você não viu ?

Minha vida já é horrível. Eu tinha de conviver com meus pais, que não se amavam e viviam brigando. Aquilo me abalava tanto, e eu procura refúgio nas coisas erradas. E nela. Mesmo não querendo, era só ela que tinha a cura pra minha raiva, pra minha revolta. E eu não via.

Eu me lembro claramente de uma dessas noites em que meus pais brigavam, a pior briga eu acho... eu estava tão cansando dos gritos, que saí de casa, e fui para um barzinho com alguns amigos e descontei toda minha tristeza e raiva na bebida. Liguei pra ela, era uma da manhã se não me engano. Ela percebeu que eu estava bêbado e preocupada, perguntou onde eu estava e foi me buscar de táxi. Vim o caminho inteiro dormindo, e quando chegamos na casa dela, ela me levou para o quarto de hóspedes e me ajudou a deitar na cama. Me lembro de acordar, de ver seu rosto daquele jeito meio embaçado, e dizer: “Eu te amo, Violette!” Ela só riu e disse: “Tudo bem, agora vá dormir”. Agora entendo quando dizem que quando bebemos, dizemos a verdade, mesmo que nós mesmos não tenhamos consciência disso.

No dia seguinte, contei pra ela tudo que tinha acontecido. E ela me ouvia, me transmitia toda aquela serenidade que ela tem no olhar, me fazia sucos, me dava remédio pra dor de cabeça. Ouvia meus pensamentos malucos, me ajudava nas composições, apoiava meus sonhos. Como eu fui burro, burro em não ver nada disso ! Um dia ela me ligou, pra conversar. Estava um pouco desanimada, e eu estava saindo com uma garota, que nem lembro mais o nome. E eu disse que estava ocupado, e depois me senti culpado por não ter dado atenção.

Comecei a lembrar das nossas brigas, das vezes em que a afastei de mim por dizer que eu poderia me virar sozinho, mas sempre acabava ligando pra ela tarde da noite, querendo ouvir sua voz de sono pra me acalmar, pra não fazer besteira de novo.

Até que um dia ela veio me dizer que ia sair com um tal de Viktor, que tinha convidado ela pro baile da escola. Eu achei aquilo tudo estranho, eu já tinha ouvido falar desse Viktor, pra mim ele estava saindo com a Hoshine, mas deixei pra lá, porque estava com ciúmes demais pra pensar em outra coisa além de torcer o pescoço desse garoto.

Nem sequer fui ao baile. Inventei mil desculpas, mas na verdade eu só não queria ver ela com outro.

E fiquei em casa, tendo de aguentar mais uma das brigas da minha mãe e do meu pai. E dessa vez a coisa ficou tão grave, que eles decidiram se divorciar. Aquilo foi um choque enorme, e eu percisava dela mais do que nunca.

Já era meia noite e meia quando meu pai pegou sua mala e foi embora. Minha mãe se trancou no quarto e eu fiz a mesma coisa. Peguei o celular e disquei o número dela umas três vezes e nada. Dei uma pausa, fiquei olhando para o celular me perguntando porque raios ela não atendia, e imaginei ela com aquele garoto. Imaginei ele dançando com ela... beijando ela. A raiva foi tanta que joguei o celular na parece e não sabia mais o que fazer. Saí de casa sem rumo, e acabei indo pra casa do Dake, pra não ficar na rua. Ele tentou me ajudar, mas eu não conseguia tirar a imagem dela e do Viktor da minha cabeça. Mal consegui dormir.

Estava com tanta raiva que não liguei mais pra ela, nem a procurei. A ignorei quando ela me chamou no msn e nem reparei que não a via mais na escola. Até que, quando fui fazer um trabalho na casa da Hoshine, ela me contou tudo que aconteceu.

Viktor e ela estavam mesmo saindo. Ela gostava demais dele, mas ele era um mau caráter que, mentindo pra Violette, a convenceu de que não estava saindo com Hoshine e a pedidos de algumas garotas idiotas na nossa escola, a chamou pra sair. Violette estava linda naquela noite, Kim, uma das ex-alunas que era amiga dela, a ajudou a se arrumar. Mas tudo isso era um plano para humilhá-la. Quando ela chegou no baile, logo descobriu a armação quando viu Hoshine vir abraçar Viktor. Aí descobriu que era tudo mentira, mas antes que fosse embora, as garotas que armaram tudo vieram para cima dela. Jogaram ovos, farinha, tinta; a humilharam com palavras horríveis. Tudo porque ela era tímida, porque não saía com garotos, porque era a estranha da escola, que “vivia com o nariz colado nas telas de pintura”, era a antissocial... a santinha, a certinha, como se isso fosse ruim ! Sempre admirei a personalidade dela.

Foi horrível. Violette saiu correndo de lá chorando, com os risos de todos nas suas costas. Hoshine, que não conseguiu impedir a cena, saiu correndo atrás dela, mas Violette queria ficar sozinha. E desde então nunca mais apareceu na escola. Hoshine disse que ela tinha se mudado sem avisar ninguém. Nem terminei o trabalho, ao ouvir isso fui correndo para a casa dela. E ver aquela casa toda fechada, aquela placa de “aluga-se” na frente, me cortou o coração que comecei a chorar ali mesmo.

Me sentia culpado por não estar lá, pra bater naquele garoto estúpido até quebrar osso por osso. Por não estar lá pra abraçá-la e defendê-la daquelas víboras com unhas e dentes; por tê-la ignorado... procurei por ela, mas nada. Ninguém sabia onde ela estava. E, completamente sozinho, me entreguei aos meus vícios antigos, tentando superar o vazio que ela deixou. Deixei até de tocar violoncello, que eu tanto gostava, porque eu me lembrava dela.

E agora ela está aqui novamente, e estou me perguntando o que fazer, ela me afeta tanto que simplesmente não sei como agir. Mas não pude evitar um sorriso. Eu tive um pouco de raiva por ela ter me deixado, consegui disfarçar tão bem... queria ser orgulhoso e conseguir me manter em pé, dizer um oi ou qualquer coisa, mas saí correndo feito uma criança medrosa. Mas agora, recuperado da surpresa, vou procurá-la e fazer de tudo pra recuperar todo esse tempo que perdemos.





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Notas finais do capítulo

AEEEEE finalmente ! Deixem reviews pessoas lindas *----*



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