Capítulo 47 - Thomas Banner

– Como está a sua cabeça? – Mayday inquire num tom preocupado. Suas mãos roçam delicadamente minha testa, procurando (de uma maneira bem estranha), fazer com que meu corte pare de expelir sangue.

– Já estive pior. – respondo-lhe num tom fraco. – Mas eu tenho que admitir que essa foi a coisa mais legal que eu já fiz em toda a minha vida!

Ao invés de rir, May apenas franze o cenho.

– Então foi você? Não... “o outro”?

Paro por alguns instantes, refletindo sobre o que me foi perguntado. Mayday me abriu um fator muito importante: fui eu quem controlou meu corpo, ou pelo menos quase isso.

Estranho... Lembro-me perfeitamente de “o outro” estar comigo, querendo esmagar tudo o que via pela frente. E eu estava ao seu lado, dando-lhe as ordens para que seguisse o plano de Howard.

Foi como se tivéssemos trabalhado em equipe. Eu era o pensamento e ele a ação.

Mas, por que depois de tantos anos, ele decidiu me obedecer agora? Não faz o menor sentido...

Bem, se transformar num gigante verde maluco quando se tem um ataque de raiva também não faz sentido, entretanto, isso não vem ao caso agora.

Olho para os lados e vejo que Howard está sentado. Seu pé esquerdo está apoiado no colo de James, que observa algo que se encontra cravado, banhando o membro do Stark em sangue.

– O que aconteceu com ele? – questiono Mayday, que desvia os olhos para observar Howard fazer uma enorme cara de dor quando James esbarra em seu pé machucado acidentalmente com a mão.

– Quando você arrebentou o Gigante, uma enorme tempestade de gelo veio na gente. – ela coça a nuca, desconfortável. – Um dos pedaços atravessou o pé do Howl e... – Mayday para de falar.

– E o quê?! – inquiro alto o suficiente para James olhar para nós dois.

– Ele não está conseguindo mexer nada do tornozelo para baixo. – May morde os lábios quando vê minha cara de tacho. – A culpa não foi sua, Thomas, foi apenas uma falta de sorte.

– Vamos lá, Howl, aguenta só um pouco. – James pede enquanto volta a apoiar o pé de Howard no colo, fazendo o pobre soltar um urro de dor. – Tenho que tirar essa coisa de você antes que inflame ainda mais.

Percebo de imediato a aflição nos olhos de Howard quando olha para o seu pé encoberto pelo próprio sangue. A cena não ajuda a tentar pensar que não foi minha culpa que seu pé ser perfurado por uma lança de gelo.

É mais do que obvio que Howard está sofrendo por minha causa.

– Mayday, me ajuda a levantar? – ela de pronto vem para perto de mim e me ergue com cuidado. Na primeira tentativa de firmar os meus pés, eu acabo caindo, mas na segunda vez já consigo me equilibrar melhor.

Com a ajuda de May eu vou à direção do Howard. Assim que chego perto dele e do James, eu me abaixo para encarar os olhos inchados de Howl.

– Você está melhor. – ele comenta com um sorriso fraco no rosto pálido.

Dou-lhe um sorriso rápido.

– Queria poder dizer o mesmo de você. – desvio meus olhos dos seus, centrando minha visão no seu pé inchado. – Sinto muito, Howard, a culpa é minha.

Ao invés de concordar, que era exatamente o que eu esperava, Howard se limita a retrair os lábios e pousar uma das mãos no meu ombro.

– Nem sempre dá pra salvar o dia.

– Não me importo com o dia e sim com os meus amigos. – eu me levanto e vou para o lado de James. – Deixe que eu faça isso.

– Tem certeza? – James me pergunta com as sobrancelhas arqueadas.

– Apenas mantenha-o parado. – peço, voltando meus olhos para Mayday. Ela me encara com certa aflição no rosto delicado, porém, nada diz. – Muito bem, Howard, vamos ter que tirar isso antes que faça mais danos.

Stark respira fundo enquanto segura firme na mão de Mayday. James se posiciona perto da cintura, segurando ambos os braços fortemente contra o chão.

Respiro fundo, tentando não sentir náusea com o cheiro enjoativo do sangue. Ajeito minhas mãos numa posição que eu não o machuque ainda mais, e como Howard não gritou de dor, percebo que estou fazendo a coisa certa.

Troco um olhar rápido com James e Mayday antes de iniciar o procedimento. Inicialmente, eu pensei em retirar com cuidado e gentilmente, mas aposto que minha delicadeza iria triplicar a dor de Howard. Decido partir então para o “plano B”.

Conto até três antes de puxar o enorme pedaço de gelo. Logo em seguida me arrependo ao ouvir o grito de pura agonia de Howard.

Ele se debate sem parar, mas James o segura na mesma intensidade, impedindo-o, assim, de fazer algum movimento brusco. Mayday começa a chorar ao ver o rosto de Howl se contrair com a dor.

Desvio meus olhos novamente, mas, dessa vez, foi para encarar o enorme pedaço de gelo ensanguentado na minha mão, derretendo aos poucos com o calor da minha palma.

– Banner, precisamos estancar o sangramento! – James me chama, e eu demoro a entender o que ele quer dizer. Vendo minha lerdeza, Mayday se adianta para perto de mim e rasga um pedaço do uniforme que... “pegamos emprestado” da SHIELD antes de vir para Asgard para fazer um torniquete no pé de Howard.

Após resolvermos o problema da perda de sangue, James e eu ajudamos Howard a se levantar, cada um cedendo um dos ombros para ele se apoiar.

– É um saco ser o inútil da equipe. – Howard reclama entre alguns gemidos de dor.

Mayday revira os olhos.

– Cala a boca, Howard, sem você nós já estaríamos mortos.

– Só diz isso da boca pra fora.

James e eu nada dissemos, apenas encaramos os dois sem saber ao certo o que fazer. Eu nunca fui bom em resolver conflitos verbais, já que, sempre, tudo se resolve, para mim, na base da porrada. James também está na mesma situação que a minha, mas no caso dele, seus problemas são evaporados com armas.

– Onde estão Erika e Luke? – Howard, para o meu alívio e o de Rogers, muda de assunto, fazendo nossa atenção voltar para o real problema.

– Foram atrás do Eldred. – Mayday responde num tom evidente de preocupação enquanto vira a cabeça para encarar um enorme rombo na parede. – Temos que achá-los.

– Você aguenta? – eu pergunto a Howard.

Ele engole seco e concorda com a cabeça.

Juntos, nós quatro nos dirigimos para a parede quebrada, não parando de pensar em como Erika e Luke estariam nesse momento.

[x]

– Luke! Erika! – todos nós gritamos sem parar, tentando achar algum sinal de vida dos dois.

Durante pelo menos dez minutos nós ficamos gritando silenciosamente (se é que isso é possível) para não atrair a atenção dos guardas. Sinceramente, eu achei que iríamos ficar eternamente procurando devido ao tamanho gigantesco do Castelo de Gelo. Porém, quando começamos a procurar numa parte mais escura e afastada do resto da construção gélida, ouvimos a resposta de Luke.

– Banner? Rogers? May? Howard? Estamos aqui embaixo! – ele grita e nós automaticamente olhamos para o chão. No começo, pensamos estar ouvindo coisas, pois não havia nada além do solo. Contudo, Mayday avança e logo se depara com um buraco. Ela faz um sinal pra nós.

– Eles estão aqui!

James e eu ajudamos Howard com seu passo manco até chegarmos ao buraco, onde Luke Barton nos olha com um enorme sorriso no rosto.

– Você está bem?! – James inquire. – Onde está a Erika?

– Estou bem aqui! – ela responde ao chamado, aparecendo ao lado de Luke. Sua aparência está deplorável com seu visual sangrento e um tanto macabro. – Desçam logo! Vocês precisam ver isso!

Eu, Mayday e James podemos cumprir o pedido de Erika com facilidade... Mas e o Howard?

Aparentemente lendo meus pensamentos, Mayday se aproxima de nós três e tira Howard do nosso apoio. Ela cambaleia e ameaça cair para trás com o peso do Stark, mas no fim consegue firmar seus pés.

– Segure-se bem em mim, ok? – ela o instrui. De imediato Howard entrelaça a cintura de May com seus braços e aproxima seu tronco do dela. Quando os dois estão com os corpos praticamente colados, ela se lança para dentro do buraco e freia sua queda atirando um grosso filamento de teia na borda do rombo, pousando delicadamente juntamente com Howard, que é amparado por Erika e Luke.

James e eu pulamos para dentro da rachadura no chão, juntando-nos aos nossos amigos.

– Como você está, Howl? – escuto Erika questionar Howard enquanto fita o seu pé com imensa preocupação.

– Vou sobreviver. – ele responde apenas.

– Então o maldito está mesmo morto. – comento com uma imensa satisfação. Meus olhos fitam o corpo ensanguentado de Eldred caído no chão com uma flecha enfiada na garganta. – Bom trabalho, Barton.

Luke me lança um sorriso torto.

– Eu não acredito. – escuto Howard murmurar. Viro-me para onde ele está encarando e de pronto entendo a sua admiração.

Lá estão eles. Todos estão presos em enormes casulos de vidro e aço, adormecidos com uma espécie de um gás azul claro se infiltrando em seus corpos por meio de suas respirações pesadas. Eles não envelheceram, continuam do mesmo jeito que o vídeo nos mostrou quando deixaram a Terra.

Viúva Negra, Capitão América, Hulk, Homem de Ferro, Gavião Arqueiro, Thor e Homem Aranha. Os sete Vingadores, nossos pais, estão agora na nossa frente, esperando que os salvemos.

– Nós não encontramos uma maneira de tirá-los disso. – Luke nos informa, cabisbaixo. – Talvez vocês tenham mais sorte do que Erika e eu.

Howard tenta mancar para perto da prisão dos sete, mas cai no meio do processo. Eu vou para perto dele e o ajudo a se levantar. Juntos, nós dois vamos para perto dos casulos para observar os Vingadores mais de perto.

– Nem acredito que estou vendo o meu pai. – Howard comenta enquanto toca no casulo de Tony Stark. – Achei que eu nunca o conheceria.

Mais ao lado, eu vejo o meu próprio pai. Ele está com uma expressão serena, como se estivesse dormindo tranquilamente na sua cama ao invés de estar aprisionado num casulo que está a quase vinte anos roubando sua alma para transformá-la em energia para Loki, o deus otário.

– Temos que tirá-los dessas coisas. – eu digo, determinado. – Luke, vocês tentaram quebrar isso?

– Erika esmurrou umas cinquenta vezes e eu já atirei diversas flechas... Esse troço é indestrutível.

Howard e eu nos entreolhamos e, imediatamente, elaboramos um plano em silêncio.

– Coloque-me perto daquele painel. – Howard me instrui e eu imediatamente o deixo ao lado de uma espécie de computador asgardiano... Ou seja já o que for. – Eu passei uma noite inteira na biblioteca...

– Típico. – disseram Luke e May ao mesmo tempo.

– ... E acabei aprendendo algumas coisinhas depois de muita persistência mesclada com muita paciência.

Meu queixo e o de Erika caem.

– Você aprendeu a língua dos deuses em apenas doze horas?!

Stark dá de ombros.

– Basicamente.

– Não tem como você ficar mais nerd que isso. – Luke comenta com um falso desdém.

Mas Howard não está muito preocupado com o que Barton tem a dizer, apenas se concentra no seu trabalho de tradução enquanto eu espero pacientemente por novas ordens. Os olhos do Stark percorrem rapidamente pelo painel, sua testa está vincada, mostrando sua determinação.

– O que está acontecendo? – posso ouvir James murmurar para Mayday, Luke e Erika, que estão parados ao seu lado, apenas observando os meus movimentos e os de Howard. – Temos que fazer alguma coisa?

– Achei! – Howl grita, empolgado. – Thomas, arranque os canos que interligam os sete casulos.

De pronto eu obedeço. Corro e vou arrancando um a um dos tubos metálicos, tendo em menos de cinco minutos uma pilha em meus braços.

– E agora?

– Agora espere eu fazer a mágica. – ele diz com um sorriso torto estampado no rosto.

Enquanto seus dedos batem fervorosamente contra o estranho painel, eu me junto à plateia, esperando ansiosamente (sem demonstrar) para que ele acabe o serviço.

Uma vida inteira se passou quando Howard finalmente se afasta do painel para observar o seu trabalho. Um segundo se passa antes de os casulos liberarem nos nossos pais, expelindo-os para fora. Os sete caem no chão, suas tosses devido a grande quantidade de ar nos faz sair do lugar e ir auxiliá-los.

Sinto um enorme arrepio na coluna quando toco a pele do meu pai, Bruce Banner, pela primeira vez. Ela está tão fria quanto a própria neve de Jotunheim. Seus músculos estão atrofiados e moles, e seus olhos cansados e vazios. Quando me olha, ele franze a testa e me questiona com uma voz fraca.

– Q-quem é você?

Eu tento responder, mas as palavras simplesmente não saem da minha boca. Jamais na minha vida inteira pensei em estar aqui, ao lado do meu pai. Olho para os lados e vejo meus amigos ajudarem seus próprios pais. Luke observa Clint Barton com um olhar preocupado, já Mayday fita Peter Parker boquiaberta, provavelmente por perceber que o seu pai é apenas alguns anos mais velho que ela própria. Erika tenta manter Thor consciente enquanto Howard sacode de leve Tony Stark, que ainda está desmaiado. James observa Natasha Romanoff e Steve Rogers com aflição, não sabendo ao certo o que fazer.

Quando me dou conta, meu pai já está em pé, pendendo um pouco para os lados e me observando com seu olhar desconfiado.

– Eu não vou perguntar de novo. Quem é você? – e se posiciona para me combater com seu corpo ainda meio mole.

Percebo que os outros Vingadores começam a recuar de uma maneira capenga, tentando tomar uma distância segura de nós. Contudo, nós continuamos a nos aproximar, calmamente, tentando não assustá-los ainda mais.

– Por favor... – Erika começa, mas logo é interrompida com um grito abafado vindo de Howard.

Todos nós nos viramos para encará-lo sendo refém de Tony. O pai de Howard segura fortemente sua garganta, dando-nos um claro sinal para nos afastarmos.

Pelo jeito, Tony Stark estava apenas fingindo estar inconsciente.

– Vocês ainda não responderam a pergunta do Dr. Banner. – Tony Stark se afasta um pouco mais de nós ao mesmo tempo em que traz o corpo do filho para mais perto de si. – Quem são vocês e para quem trabalham?

Todos nós estamos confusos e chocados de mais para responder. Porém, James respira fundo e dá um passo a frente.

– Eu sou James Romanoff Rogers. – fala num tom sério. – E estes são os meus amigos: May Parker, Thomas Banner, Luke Barton, Erika Foster e Howard Stark. – James respira fundo. – Nós somos seus filhos.