Capítulo 11 - Howard Stark

Ainda sinto a mesma dor de cabeça desde que eu acordei. Mayday e Erika disseram que eu tinha ficado quase quatro dias desacordado depois da bofetada que eu havia levado na coluna daquela criatura verde e gigantesca. Disseram que eu estava quase sem batimentos cardíacos e que minha respiração falhava cada vez mais. Entretanto, eu sobrevivi, mesmo que por milagre, e encaro agora a minha recuperação, que inclui no pacote uma dor de cabeça maçante juntamente com alguns hematomas no meu ombro esquerdo e na lombar, com um sorriso.

E devo dizer que estando numa sala clara amarrado numa cadeira não ajuda nada o meu estado.

Olho para o meu lado direito, onde Erika e Mayday estão, e tento ler suas expressões, enquanto a de Erika é serena e um tanto séria, a de Mayday é de puro tédio. Sigo o olhar de ambas e dou de cara com um homem alto e careca com a pele escura e um porte físico respeitável, este possui apenas um olho, o outro está coberto por um tapa olho estilo pirata, algo do qual eu riria se suas feições não fossem tão amedrontadoras.

O homem nos encara com atenção, primeiro Erika, depois Mayday e quando seu olho para em mim, sinto meu estômago embrulhar. Definitivamente, se eu risse do seu tapa olho, poderia me considerar morto no segundo seguinte

– Algum problema, Sr. Stark? – ele me pergunta, como se lesse meus pensamentos. Como sabe meu nome?

Engulo seco antes de negar com a cabeça e desviar meus olhos de volta para o chão.

Foi uma péssima ideia, pois isso não o fez me ignorar, muito pelo contrário, o fez vir até mim e inclinar a minha cadeira para trás, dando-me uma sensação horrorosa de morte. Ele segura a parte traseira da cadeira, equilibrando-a nos dois pés traseiros e me inclina ainda mais para trás para olhar nos meus olhos.

– Qual o problema, Sr. Stark, por que não quer olhar para mim?

Dessa vez eu compro seu desafio e o fuzilo com meus olhos.

– Quem é você?

O homem solta um riso abafado, obviamente rindo de mim.

– Alguém que quer respostas.

Não me intimido com seu sarcasmo.

– E não vai tê-las até que me fale quem é você.

Ele ergue uma sobrancelha em resposta, mostrando-se surpreso com o meu atrevimento.

– Sabe garoto, você se parece com o seu pai. Tem a mesma língua afiada. – ele comenta, fazendo-me perder a respiração por alguns instantes. Meu pai... Esse homem, ou melhor, esse maluco, conheceu meu pai? – E eu não gosto de pessoas com a língua afiada.

– Poxa, Nick, assim você me magoa. – Então eu o vejo, atrás do homem, lá está ele, o garoto que salvou Erika do Camaleão. – Quer dizer então que nunca gostou de mim?

O tal de Nick encara o garoto com raiva e logo solta a minha cadeira, que teria caído para trás se não fosse pelo maluco do arco e flecha que sequestrou Erika anteriormente, que segurou a minha cadeira e a colocou de volta na posição vertical.

– Que desastrado, Nick, ainda bem que não o deixei cair, não é mesmo? – ele imita o amigo, provocando o homem e fazendo-o corar de raiva.

– O que estão fazendo aqui? Essa área é restrita.

– Desculpa, ninguém me falou que aqui era restrito. – uma terceira voz responde sarcasticamente enquanto seu dono entra pela porta da frente, introduzindo um garoto alto e forte com feições duras e bem mais sérias que a dos dois amigos.

– Banner... Deveria estar desacordado. Estaria menos enrascado.

A ameaça do homem não pareceu intimidar o garoto de cabelos negros.

– Acho que não conseguiria ficar desacordado por muito tempo, não com o tanto de adrenalina que você andou injetando em mim. – isso faz o homem recuar. – O que foi, Nick? Não vai me dizer que durante todos esses anos você não injetou doses nocivas de adrenalina em mim enquanto eu dormia. Tudo para me transformar nesse monstro que por anos tento domar.

– Como...? – e olha para o garoto dos cabelos castanhos, este segurava uma papelada nas mãos enquanto sorria maliciosamente para Nick.

– Onde conseguiu isso, Rogers?

O garoto Rogers dá de ombros.

– Na sua sala... Ou essa também deveria ser restrita?

O ambiente está tenso, os três garotos encaram o homem Nick com um olhar raivoso enquanto Erika, Mayday e eu ficamos no meio, apavorados com o que poderia acontecer em seguida.

Odeio ficar do jeito que estou, preso e vulnerável, diante de uma situação como essa. Discretamente, tento me livrar das cordas que prendem meus pulsos, e fico feliz em descobrir que a pessoa que me amarrou não tinha muita habilidade em dar nós, e rapidamente liberto minhas mãos e aguardo a oportunidade certa para agir. Preciso ainda soltar Erika e Mayday. Tento chamar a atenção das duas, mas somente consigo a de Erika, que observa minhas mãos, eu lhe digo “tenho um plano” com os lábios e ela acena com a cabeça de que havia compreendido.

– O que vocês pensam que estão fazendo? – Nick questiona. – Quem pensam que são?

– Ai está o ponto, Fury, graças a você, não sabemos quem realmente somos. – o garoto do arco e flecha responde. – Não sabemos nem de onde vieram nossos nomes, sabemos apenas que os temos como uma herança das nossas famílias.

– Mas afinal de contas, o que é uma família? – o garoto Rogers indaga. – Nunca tivemos uma, não tivemos nem mesmo a chance de saber o nome dos nossos pais. Tudo o que fizemos ao longo desses dezessete anos foi treinar, treinar e treinar...

– E a pergunta que não quer calar é: estamos treinando para enfrentar o quê? – o garoto dos cabelos negros pergunta. – Por que estamos aqui? Por que não fomos criados como crianças normais como esses três? Afinal, depois de tudo o que aconteceu, é incontestável que eles têm alguma ligação com a SHIELD.

Nick está mais mudo do que nunca, seu rosto perdeu a cor enquanto observa os três garotos não mais com raiva, mas com certo receio.

– Vocês não eram maduros o suficiente para saber a verdade... Ainda não são.

– E pretende guardar por quanto tempo mais a verdade de nós? – o garoto Rogers pergunta. – Todos nós merecemos saber. Solte eles, Barton, não são nossos prisioneiros.

O garoto arqueiro obedece e vai soltando cada um de nós, primeiro Erika, depois Mayday e quando chega em mim, eu me levanto rapidamente e arranco a faca de suas mãos e a jogo para Erika, que a aponta para Nick.

– Vocês todos são loucos. – ela diz. – Especialmente você.

Mayday a olha, confusa e um tanto desesperada.

– Erika, o que está fazendo? – Mayday indaga.

Ela bufa com sua pergunta.

– Será que você não vê? Há algo de errado aqui... Não somos que nem vocês. – ela diz friamente ao garoto Rogers.

– Tem certeza? – o garoto Banner arqueia a sobrancelhas para Erika. – Acho que na verdade, estão tão prejudicados pelas mentiras do Fury quanto nós.

– Banner está certo. – foi a vez do tal de Barton falar. – Pois pelo o que eu escutei, ele conheceu o pai do seu amiguinho e certamente também conheceu os de vocês. – ele se vira para mim e para Mayday. – Não querem saber a verdade?

– Eu não preciso de verdade, conheço os meus pais. – Erika o corta. – E eles são Jane e Donald Blake, uma astrônoma e um médico do Hospital do Queens em Nova York e nunca tiveram contato algum com esse lugar.

Todos nós ficamos em silêncio, não sei exatamente o que estaria passando na cabeça de cada um de nós, mas o que está na minha é simplesmente uma bagunça de pensamentos, dúvidas e incertezas.

Embora Erika quisesse negar, não havia como dizer que não tínhamos nada a ver com eles, quero dizer, muitas pessoas afirmaram conhecer o meu pai, não duvido disso, Tony Stark é um nome famoso pelo globo, já vi várias vezes no Google notícias sobre ele antes do seu desaparecimento misterioso... Escândalos, o romance com a minha mãe, descobertas, invenções, esse tipo de coisa.

Mas não foi só isso.

Vi também alguns artigos que o associavam com uma espécie de armadura metálica e muitas vezes via pessoas se referirem a ele como “Homem de Ferro”, e para a minha decepção, sempre que tentava me aprofundar mais sobre esse assunto, todas as páginas que estavam com as minhas respostas haviam sido bloqueadas por uma agência chamada...

SHIELD. Exatamente onde me encontro agora.

Eu não poderia sair daqui sem obter as minhas respostas.

– Erika, eles estão com a razão. – eu digo de repente, fazendo-a me olhar com indignação. – Nós estamos sim ligados a esse lugar, todos nós.

– M-mas, Howard, não... Eu sei quem são meus pais!

– Será mesmo, Erika? – foi a vez de Mayday falar. – Quero dizer, todos nós não temos pelo menos um dos nossos pais, eles aparentemente sumiram do planeta sem deixar nada para trás e nunca mais apareceram. Não acha isso estranho?

– Talvez pra vocês, mas não pra mim.

O garoto Rogers chega perto de Nick e empurra contra a parede.

– O que você tem a dizer sobre isso, Fury?

Nick o encara com raiva.

– Só porque acha que, por enquanto, está com vantagem perante a minha posição, não quer dizer que vai me fazer falar, Rogers, vocês não estão prontos.

– Tudo bem então. – o garoto Barton dá de ombros e senta no chão enquanto o amigo Banner entorta a maçaneta da porta, bloqueando a única passagem para fora da sala. – Vamos ficar sentadinho aqui e esperar até que você diga quando estaremos prontos.

– E esse é um dos motivos de achá-los imaturos demais para a verdade. Será que não veem que estou tentando protegê-los de algo além de tudo o que já presenciaram?

– Já treinamos o bastante para enfrentar a verdade, Fury. – Banner o contradiz.

– Isso está além do treinamento, Banner, uma vez que a verdade for revelada, não há outro caminho. – ele olha para Mayday, Erika e pra mim. – Não há mais volta para uma vida normal. É isso o que vocês querem? Pois eu já lhes digo, o Camaleão foi só o começo, há coisas piores que um simples assaltante soltas por ai.

Nós três nos encaramos, até que Mayday morde os lábios e dá um passo a frente.

– Minha vida nunca foi normal mesmo. Acho que qualquer coisa é melhor do que voltar para a minha escola e enfrentar mais um dia naquele lugar inútil.

Logo depois dela, foi a minha vez.

– Também estou cansado de mentiras e de todos me esconderem quem realmente sou e quais são os segredos por trás da minha família.

E quando a vez de Erika chegou, ela nada disse, apenas ficou parada atrás de nós dois, nos encarando com lágrima nos olhos.

– O que pensam que estão fazendo? Acham que vão descobrir o quê com tudo isso?

– Erika... Por favor, largue isso. – o garoto Barton pede e tenta se aproximar. – Ninguém aqui vai machucá-la. Tudo o que queremos é a verdade.

– A verdade... – ela sussurra. – A verdade que vocês buscam não tem sentido para mim.

– Diga a ela, Fury. – escuto Rogers o ameaçar. – Conte!

Nick Fury inicialmente nada diz, mas conforme James forçava sua mão contra seu pescoço, sua língua começou a se soltar um pouco.

– Donald Blake não é seu pai, Srta. Foster.

Quando ele o diz, Erika abre sua boca e logo deixa cair a faca no chão, recuando para perto da parede enquanto cobre os ouvidos com a mão.

– Não! Está mentindo!

– Bem que eu gostaria, Srta. Foster, e lamento que esteja contando dessa maneira. – Nick diz com uma voz abafada, obviamente o aperto de James Rogers o está sufocando. – Mas pelo jeito, acho que não terei outra oportunidade.

– Solte-o, James, precisamos dele vivo, lembra-se? – Banner ordena e Rogers demora a obedecer, largando Nick de uma forma tão brutal que este cai no chão como um saco pesado de farinha. Banner se aproxima dele. – Está pronto para abrir a boca, Fury? Ou ainda precisamos convencê-lo?

Nick Fury cospe em seus pés e rapidamente se levanta, encarando Banner de igual pra igual.

– Vocês não me assustam, muito menos me intimidam, mas acho que já estou farto de tentar manter vocês em segurança e em troca receber isso. É a verdade que querem? Muito bem, mas não venham chorar para mim depois que as consequências aparecerem. A escolha foi de vocês.