O Vale dos Suicidas escrita por Countess Dracula


Capítulo 2
Capítulo 2: A caminho do Vale dos Suicidas


Notas iniciais do capítulo

Agradeço eternamente a ajuda do tio Erci pelos materiais de pesquisa, pela generosa (e paciente) explicação; a paciência e explicação também tanto da Julieta quanto do Luís, ajuda e o apoio da Lyn Hale Bass e da Lady Myh Lee; a opinião da Rayssa Black (aliás, ela tem fics de HP ótimas!), e o incentivo (e a paciência) da Cris, como sempre.

Capítulo escrito ouvindo “Spirit” do Bauhaus.
Inspirado na novela "A Viagem", nos livros "Nosso Lar" pelo espírito André Luiz, psicografado por Francisco Cândido Xavier e "Memórias de um suicída" pelo Espírito Camilo Cândido Botelho, psicografado por Yvonne A. Pereira.



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Com o horror desta constatação, meu Espírito como que desmaiara, senti-me semi - adormecida, como se estivesse perdida no vácuo ao mesmo tempo em que acovardava-me sentir a profundidade do erro que cometi. As sensações eram conflitantes, confusas: eu me matara, mas ainda vivia, e pensar nisso era quase enlouquecedor.

Aos poucos senti-me como que acordando e a dor violenta voltou com tudo, mais forte do que nunca. Junto com ela veio o frio terrível, fazendo-me enregelar. No entanto, creio que o mais enlouquecedor foi quando o ar faltou-me, levanto-me a crer que não estava morta, mas sim que ela estava próxima.

A dor lancinante, localizando-se particularmente em meu estômago, arrancou-me desses pensamentos e presa por convulsões indescritíveis, levei a mãe esquerda ao local. Para minha maior desorientação encontrava-me de algum modo ferida nessa região e não morta, já que a vida continuava em mim.

Cheguei à conclusão de que, de duas, uma: ou estava em um hospital, delirando graças ao láudano, ou tudo não passava de um terrível pesadelo!

O silêncio ao meu redor era enervante e gritei, pedindo a Dante que trouxesse cobertores quentes para amenizar o frio que me entorpecia os membros, visto que nem sequer conseguia mover-me.

Também pedi comida e algo para beber, já fazia muitas horas desde minha última refeição.

Em vez da amada voz de meu marido, para meu pavor, o que respondeu foi um coro de vozes ensurdecedor e sinistro, longínquo a princípio, mas que definitivamente estava aproximando-se.

As vozes chegavam mais perto e nenhuma me era conhecida. Elas gritavam, choravam, umas gemiam, outras estavam enfurecidas, algumas queixavam-se, muitas blasfemavam e a grande maioria suplicava desesperada e raivosamente por compaixão e socorro. O mais espantoso é que essas vozes não conversavam entre si, apenas derramavam seu pranto desolador.

Acovardei-me uma segunda vez e quis fugir para não mais ouvi-las, mas o enregelamento que tolhia-me os membros não o permitia. Desfiz-me em prantos e a multidão trágica de vozes acompanhou-me.

Esforcei-me o máximo que pude e dessa vez consegui levantar-me, mesmo com a dificuldade em mexer meus músculos retesados pelo frio. Assim que o fiz, o cheiro de vísceras putrefatas atingiu-me, nauseando-me. O mais incompreensível era que o cheiro vinha do local onde estava deitada.

Inquieta, comecei a correr, subi as escadas e entrei em meu quarto a fim de esconder-me. Surpreendeu-me o estado em que meus aposentos encontrava-se: Meus objetos pessoais simplesmente não estavam em seus devidos lugares! Entrou Lucy, a arrumadeira, e sua indiferença para comigo enfureceu-me e chocou-me. Mais tarde Dante também me ignorou completamente e isso foi o mais doloroso de tudo até então. Senti magoada, humilhada, triste.

Desci novamente as escadas e o coro nefasto voltou a rugir em meus ouvidos, não importava onde quer que eu fosse. Recomecei a correr e o fiz o mais rápido que pude, saí porta a fora, vagando sem destino.

Não sei como, mas parei no Cemitério de St. James, o popular “Cemitério de Highgate”. Tropecei numa lápide caída, onde cresciam juncos delgados e diversas flores  dispostas. Não se explicar isso também, mas vi-me a mim mesma,no fundo daquela sepultura em que tropecei, deitada em um caixão, em  adiantado estado de decomposição.

Gritei a plenos pulmões. Berrei o mais de uma forma que jamais pensei que conseguiria. Eu estava louca, louca! Só isso podia explicar meu estado!Sempre acreditei que a morte era o fim, e o eterno o completo esquecimento. Mas eis que, mesmo morta, eu ainda vivia!

Revivi mentalmente meu suicídio, tentando descobrir o que dera errado ou como talvez libertar-me deste horrível pesadelo, pois certamente isso não era real. Recomecei a correr para fugir da pavorosa visão, fugir desesperadamente desse pesadelo infernal em que eu via meu corpo sendo devorado por vermes.

Infelizmente nada apagava-me da mente a sinistra visão.

Por mais que eu fosse, a imagem do que fiz me perseguia e junto com ela a consciência de meus atos. Se existia mesmo a vida após a morte, eu era certamente uma pecadora!

Chocada, aflita e completamente desesperada corri pelas ruas de Londres, mas algo atraía-me de volta à meu túmulo, como se eu andasse em círculos. Não conseguia parar de rondar meus próprios despojos apodrecendo.

Fiquei por tempo indeterminado soluçando em cima de meu túmulo, contorcendo-me me terríveis convulsões de dor , sentindo uma dor inenarrável, grande amrgura e raiva. A compreenção de que me suicidara; estava sepultada, mas que de algum modo, continuei viva e sofrendo despertaram em mim um ódio por meu gesto covarde.

Vaguei desnorteada cerca de quatro anos, tentando compreender o que se passava comigo. A consciência atormentava-me; a fome e a sede torturavam-me, nas poucas vezes em que conseguia dormir nem sequer percebia meu sono, pois tinha plena consciencia das dores e quando raramente aconteciam os poucos minutos de sono em que o alívio podia agir eram bruscamente cortados pelos seres monstruosos que compunham o coro sinistro. Até que certa noite, caminhando angustiada pelas ruas, virei em uma esquina e vi-me perseguida por entidades desencarnadas perversas.Elas eram praticamente uma multidão, cerca de duzentas a trezentas pessoas de ambos os sexos, era essa a multidão a dona das horríveis vozes que eu ouvia durante todo esse tempo. No momento em que praticamente nos esbarramos recomeçaram com as blasfêmias e gritos lamentosos como se tivessem reconhecido-me.

Apavorada tentei fugir o mais rápido que pude, mas por mais que eu tentasse ocultar-me deles andando em sentido contrário mais eu misturava-me à eles! Começaram a empurrar-me gritando:

-Suicída! Infeliz! Para onde vai, criminosa?

Gritei em resposta que não era criminosa coisa alguma, mas eles apenas continuavam a empurrar-me e a bradar loucamente e assim prosseguíamos. Desisiti de tentar fugir da multidão: Isso revelou-se impossível, então entei ver à minha frente, mas lá não se podia enxergar nada além de sombras. Como a noite era fria, senti-me enregelar e juntei-me à sinfonia de choro e lamentações. Pressenti que jamais conseguiria escapar deles e quando dei por mim estávamos todos andando enfileirados dois a dois.

Caminhamos longamente e por fim chegamos a um vale profundo.

 

Continua...

 


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Notas finais do capítulo

Sim, eu sei que falei que o Vale apareceria no segundo capítulo, mas não deu! Estou tentando ao máximo ser fiel à Doutrina Espírita e por isso eu não podia pular essas partes. Mas... Ela chegou ao Vale, não? O próximo capítulo se passa lá. =]
Próxima atualização semana que vem (já estou trabalhando nisso). Caso demore a postar é porque não tive tempo: As aulas na universidade recomeçaram (graças a Deus!).
Obrigada a quem lê e comenta e a quem lê e não comenta também. ^^
Me surpreendi com o número de leitores!Oo'
Por favor, avisem-me dos erros de português? Não tive tempo de revisar. Obrigada. :)