PVD Bella

Charlie olhava-me como se eu não fosse deste planeta e tentava perceber o que havia mudado no meu rosto. Quando entrou na sala deparou-se com a filha prostrada aos gritos em frente à lareira, agarrada a um pedaço de papel onde as palavras já quase não eram legíveis de tantas lágrimas que nele tinham sido derramadas. De súbito levantei-me e uma força inundou o meu ser, sentia me capaz de dominar o mundo, de mover montanhas e alcançar a lua. A minha decisão estava tomada, por isso quando pedi ao Charlie que me levasse, pensando ele que era para a igreja, com um entusiasmo que não demonstrei nos últimos dois meses não posso culpá-lo por achar que eu tinha enlouquecido. Saiu da sala decerto para apressar Eric o nosso motorista. Não havia volta a dar e no fundo do meu ser sabia que tinha chegado o dia da ruptura com o passado e do inicio de um novo futuro.

Alice, Billy, Sue, Jacob… Todos eles pensariam que enlouqueci quando a noticia chegasse à Igreja mas eu não podia perder mais tempo e minutos depois de dar a partida na minha Honda, ainda ouvi Charlie gritar do alpendre da mansão:

– BELLA! NÃO!

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Por ironia do destino a única estrada que unia a antiga mansão dos Swan à pequena igreja de Forks passava ao longo de grande parte da reserva de La Push e pensando nisso o meu coração deu um salto no meu peito. A estrada, ainda ladeada de arvores arrastava-se e as curvas pareciam não ter fim, mas assim que os arbustos mais baixos começaram a aparecer no meu campo de visão eu sabia que não tardaria para que o pôr do sol em First Beach surgisse no horizonte.

Vestidos de noiva não foram feitos para andar de moto e estava grata por ter recusado que Alice me pusesse o véu ainda em casa, o elaborado apanhado em que ela e Angela despenderam parte da manhã estava agora um caos e podia sentir as longas madeixas do meu cabelo balançando no vento atrás de mim. Era uma sensação de liberdade que a adrenalina que corria no meu sangue naquele momento ampliava e reforçava o súbito fluxo de oxigénio preso no meu peito. Era como se o meu coração crescesse e não coubesse mais dentro de mim.

Ao primeiro sinal da praia os meus olhos começaram involuntariamente a perscrutar a linha de costa e assim que dei com a forma familiar do Volvo, a moto deu um solavanco, nada suave, após o reflexo que me fez apertar as minhas mãos sobre o travão de mão. Após a perda súbita de velocidade a moto foi se arrastando em direção à faixa que separava a estrada de alcatrão negro da areia branca da maior praia da reserva. Nessa faixa estava parado, solitário, sombrio, um volvo prateado. O volvo…

Não queria perder-me em todas as memórias que aquele carro me trazia por isso, e impulsionada ainda pela adrenalina que não tinha abandonado o meu sistema e que fazia o meu coração bater mil vezes mais rápido que o seu compasso habitual, forcei-me a dar um passo em frente. Andar tornara se complicado, as minhas pernas não colaboravam na aparentemente fácil tarefa de colocar um pé diante do outro, as minhas pernas tinham desaparecido, pelo menos era isso que a minha mente me dizia. Hesitante e desajeitadamente fui me aproximando do automóvel e cada batida no meu peito fazia soar dentro do meu ser o seu nome, como um cântico, um chamado.

Perdida nas memórias do seu cabelo meticulosamente desalinhado, aquele monte de fios cor de cobre que ele constantemente agraciava com o toque das suas mãos principalmente quando nervoso; dos seus ombros largos e fortes em proporção com o peito musculoso na medida certa, na minha medida certa; esqueci me das palavras inscritas na sua carta… E por me ter esquecido a realidade demorou a atingir-me.

Não dei pela falta do seu cheiro, a única e inconfundível mistura de gel de banho, tabaco e hortelã pimenta, não dei pela falta da aura que irradiava dele sempre que ele estava presente, aquela força que emanava do seu interior e que atraia todos para ele, a mim especialmente, fazia me sentir como uma borboleta que voa em direção à luz e que quando perto da mesma mistura no seu ser o conforto e o perigo que aquela proximidade lhe traz. Os meus olhos começaram uma busca pelas redondezas, perscrutando o parque de estacionamento, o areal e junto ao mar onde a espuma das ondas traçava uma linha de bolhas brancas sobre a areia molhada, nem sinal da sua imponente figura.

Foi então que a ficha caiu e a adrenalina que corria junto ao sangue nas minhas veias deu lugar à bílis que subia pela minha garganta e me trazia um gosto amargo à boca. A minha cabeça girava, sentia me tonta, prestes a desmaiar, os meus joelhos mais fracos do que nunca. Dentro da minha mente um frenesim de vozes gritava sem parar, como se estivesse numa sala rodeada por uma multidão não conseguia distinguir claramente o que dizia cada uma das vozes por si mesma, apenas fragmentos…

...

Isabella Swan e Jacob Black tem o prazer de os convidar para se juntarem a eles na celebração do seu amor numa cerimónia que terá lugar na igreja da cidade de Forks pelas 15 horas do dia 18 de Junho.

–Alice que cara é essa? Que aconteceu?

– Ele viu o convite Bella. O Edward.

– Alice também não precisamos agir como se o meu casamento fosse segredo, ele sabe que me vou casar e com quem, só muda que agora também sabe o dia e a hora em que vai acontecer.

– Você não percebe Bella? Muda tudo. Ele sempre esperou que você mudasses de ideia, no seu interior enquanto não houvesse uma data definida ainda havia esperança de te ver de novo correr para os braços dele. Isto muda tudo, não imagina como...

– Alice, eu tomei a minha decisão ele sabe disso. Não é como se nunca tivéssemos discutido isso. Ele está bem melhor agora.

– Ele chorou Bella. Eu nunca, nunca tinha visto o grande Edward Cullen chorar. No entanto assim que os seus olhos deixaram as palavras escritas no convite e a seu olhar subiu duas lágrimas rolavam pela sua face. Ele esperava ouvir me negar, dizer que tudo não passava de uma brincadeira e quando eu não disse nada ele saiu porta fora.

...

O fluxo de lembranças atingia-me com a violência de um tornado que com força arrasadora não deixa nada de pé à sua passagem. Eram como peças de um puzzle surgindo.

...

–Bella amor, a minha irmã Rachel não conseguiu um vôo que lhe permitisse estar aqui antes das três da tarde. Era pedir te muito que adiássemos a cerimónia por duas horas?

–Claro que não Jake. Só temos que conseguir avisar toda a gente. Não quero ninguém a reclamar que fui a única noive que se atrasou duas horas no grande dia.

...

Do meu peito brotou um soluço, ao mesmo tempo que senti o gosto salgado nos meus lábios e com a mente em branco só sentia a dor que parecia grande demais para caber dentro do meu coração. Eu não ia aguentar, não depois de as suas palavras me fazerem admitir aquilo que no fundo o meu coração há muito sabia. Edward tinha esperado por mim, tal como prometera na carta que a Alice me entregou, conseguia olhar o mar à minha frente e ver o horizonte que os seus olhos tinham percorrido enquanto secretamente esperava ouvir os sons de alguém que chegava para se reunir a ele. Tinha esperado, pensava ele, até à hora em que eu já não mais era solteira, em que a minha vida estaria definitivamente unida à de Jacob, para então partir desolado em busca da cura para um coração em pedaços.

Mas o destino cruel não deixou Edward saber que tínhamos adiado o casamento por causa da Rachel e por isso a sua carta só me chegou às mãos meia hora depois das quatro da tarde, uma hora e meia depois de ele ter partido julgando-me uma mulher casada.