Céu escrita por Liminne


Capítulo 67
Capítulo 49 – Resignação




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O sábado amanheceu frio. O calor do verão ia desaparecendo devagar, todos os dias. Logo seria como se ele nunca houvesse existido. Mas mesmo assim... Mesmo assim ainda dava para ver o sol e senti-lo fraquinho na pele. Era uma sensação de esperança. Um quentinho raro e valioso.

Rangiku olhava pela janela do apartamento o céu e a rua lá fora. Se encolhia em seus pijamas cor de rosa. Viu o sol nascer solitária naquele apartamento vazio. Perdeu as contas de quantas vezes caiu no choro, e se recuperou para começar tudo de novo. Roeu todas as unhas. Se sentiu covarde, impotente e culpada.

Tudo que lhe restava era rezar. Sem parar. E torcer para que o amor que sentia por aquele homem fosse mais que apenas um sentimento romântico. Ou melhor, torcer para que as batidas do seu coração estivessem sincronizadas com as dele. E que compartilhassem, além do som e da dor, aquela confiança cega e misteriosa.

Não tinha forças nem para levantar. Nem para ter uma recaída de seu vício. Nem para comer. Só para esperar. E mesmo assim... Mesmo assim parecia que estava morrendo aos poucos só de ficar ali sentada.

 

****

 

Rangiku não foi a única a passar a noite em claro. Lógico que não. Ainda havia alguém sofrendo mais que ela. E era Momo. A culpa pode ser amarga, ácida e parecer corroer todos os seus órgãos. Mas a pessoa que está sentindo o perigo e o desespero na pele... Essa pessoa com certeza está se equilibrando na ponta de um penhasco. A vertigem e a certeza de que vai cair estão a assombrando. E aquela pequeníssima brisa de esperança parece a estar segurando em pé. O coração só chora e espera que ela não se vá subitamente.

Gin apareceu de repente com um laptop na mão e ligou-o. A geminiana só ficou observando muda. Os olhos estavam vidrados. E as bochechas molhadas. Não tinha vontade de falar ou se mexer.

- Vou comunicar ao Aizen que você está aqui. – ele disse a ela, com o mesmo sorriso. Parecia inabalável, mas àquela altura, ela sabia que o rosto dele não passava de uma máscara. – E aí, depois de confirmado, a gente dá um jeito de fugir. Não se preocupe.

Ela não respondeu. Parecia nem ter ouvido.

Ele ignorou e começou a teclar no computador.

Alguns minutos depois, a pequena câmera que repousava em cima do monitor começou a piscar. O objeto estava capturando a imagem de Gin e de Momo ao fundo.

A garota começou a chorar de novo. Bem silenciosamente. Sabia que o virginiano estava falando com seu... Professor. Sabia que estava mostrando a ele sua imagem. E dessa vez, ela não estava sorrindo e usando uma roupa bonita ou uma fantasia. Dessa vez ela estava amarrada, apavorada e cheia de olheiras molhadas. E na verdade, era isso que ele sempre quisera ver. Como era difícil aceitar aquilo. Seu coração estava em pedaços. Mas por um lado, era bom. Só mesmo quebrando-o todo aquele sentimento podia ser libertado. Aquele sentimento unilateral, mentiroso e doloroso. Não tinha nada de bom naquilo. Nada de nobre. Queria conseguir reconstruí-lo todo para dessa vez enchê-lo de ódio daquela pessoa.

Abaixou o rosto e recusou-se a olhar sua própria imagem destruída. Era um choque. Era duro demais. Era a prova do quanto foi burra, teimosa e ingênua. A prova do quanto jogou fora sua sorte e sua confiança.

- Momo-chan. – depois de algum tempo amaldiçoando-se e molhando a roupa com as lágrimas, ela ouviu Gin chamar-lhe. Levantou o rosto para ele. – Agora é minha função levar você para bem longe. – o sorriso se expandiu. – Mas você sabe. Que vou levá-la para casa. E que nosso plano vai entrar em ação.

Ela fez que sim com a cabeça. Mesmo sem energia e apática do jeito que estava... Se pudesse se livrar daquele pesadelo, ficaria mais perto de se recuperar algum dia.

 

****

 

- “Gin, você é esperto... – Aizen pensava consigo mesmo enquanto se dirigia ao aeroporto no banco traseiro de um táxi. – Mas enquanto você está indo... Eu já fui e voltei muitas vezes.” – sorriu para o frio entrando pela janela. Diminuiu os olhos por causa da friagem. Não tinha mais seus óculos para bloquear o vento.

                                             

****

 

- E então, Momo-chan? Pronta? – Gin sorriu para ela.

Ela fez um gesto afirmativo.

Mas antes que pudessem sair correndo dali, o sorriso de Gin se apagou por um momento. Ouviu os carros lá fora. Segurou instintivamente os ombros de Momo.

Os olhos castanhos da menina arregalaram-se. O que ia acontecer agora?

- Momo-chan. – ele sussurrou com força. Mas os lábios já se curvavam para cima de novo. – Acho que terei problemas.

Ela olhava para ele com terror.

- Mas não se preocupe. – ele continuava segurando os ombros dela com os dedos congelados. – Você vai estar segura no fim das contas.

E aconteceu o que no fundo, ele sempre esperou. A polícia invadiu o cativeiro.

- Recebemos uma denúncia anônima. – um dos policiais explicou com a cara fechada. – E parece que encontramos a garota. – ele sinalizou para os colegas que puxaram Momo para longe de Gin. – Você se ferrou, cara. Agora vai ter que nos contar tudo!

Algemaram-no e ele apenas continuou sustentando o sorriso de sua máscara.

 

****

 

- Ai meu Deus. Ai meu Deus. Ai meu Deus! – Renji não conseguia parar de repetir, ofegando como se houvesse ficado horas embaixo d’água ou corrido uma maratona. Estava ali, despencado no sofá com a cara mais passada que se pode imaginar.

- Renji, meu filho, tenha calma! – Jyuushiro entregou a ele um copo d’água. Mas o jovem tremia tanto que acabou derramando mais do que bebendo.

- Rukia-chaaan! Rukia-chaaan! – enquanto o outro tremia e mal respirava, Orihime se debulhava em lágrimas em cima da mãe de Rukia.

- Gente... Por favor... – Rukia estava sem graça, não sabia nem como agir. – Eu queria o apoio de vocês... Não é uma notícia tão ruim assim, é?

- É SIM! – o tatuado encontrou forças pra gritar sonoramente.

- Rukia-chan... – Orihime olhou para o rosto da amiga finalmente. – É a notícia mais linda que recebi esse ano! Mas... É tão de repente... E tão emocionante que... Ahh! É lindo! – começou a soluçar de novo.

- Vocês estão exagerando, pessoal... – a baixinha coçou a bochecha totalmente desconsertada.

- VOCÊ VAI CASAR COM UM RICO ESNOBE E NEM CONTOU QUE ESTAVA NAMORANDO! – Renji continuava gritando.

- Por favor, se acalme. – Jyuushiro pediu mais uma vez.

- Você vai voltar a morar em Kofu, Rukia-chan! – os olhos ensopados da ruivinha estavam brilhantes e não era só pelas lágrimas.

- Vocês estão se precipitando demais! – Rukia arregalou os olhos azuis. – Eu vou noivar ainda! Essas coisas levam tempo. Eu não sei se vou mesmo casar com ele. – Ei, do que estava falando? - Eu quero dizer... Quando se noiva, até casar leva bastante tempo... E eu quero terminar a faculdade antes de ir pro altar, não se preocupem.

- Rukia-chan! – Orihime pegou as mãos dela. – Estou tão empolgada! Quero te ajudar a escolher seu vestido!

- É claro que sim. – a pequena sorriu para ela. – Você sabe que eu não pediria isso pra outra pessoa. Você e mamãe vão me ajudar com tudo!

- Mesmo você tendo duas amigas modelos muito mais fashions? – ela fez beicinho.

- Mesmo assim. – a capricorniana confirmou com um sorrisinho doce.

- Eu te amooo! – agarrou a amiga quase a matando sufocada.

- Eu não vou a essa festa! Isso é um absurdo! – Renji cruzou os braços revoltado.

- Não acredito que você vai perder um boca-livre. – Rukia zombou.

- Como se eu fosse ter apetite vendo um cara desses colocando um anel no seu dedo! – ele se defendeu.

- Ah, para de frescura, Renji. Você não perde o apetite nem em velório de parente. E além do mais, o Byakuya é ótimo. Quando você conhecê-lo, vai mudar de idéia.

Ele só ficou olhando para ela irritado. Quase soltando fumaça pelos ouvidos.

Mas não ia ter jeito... Sabia que sua reação seria explosiva de qualquer maneira, fosse quem fosse o homem com quem ela iria se casar. Não estava acostumado a ver a pessoa mais importante para ele nos braços de outro. Era inadmissível!

Mas afinal, eles eram melhores amigos. De um jeito ou de outro, ia ter que aceitar.

- Se você for feliz, eu aceito esse cara aí. – ele disse por fim, ainda emburrado.

E o sorrisinho divertido de Rukia ficou sombrio de repente.

- Rukia-chan? – Orihime percebeu. – Está se sentindo bem?

Ela acordou.

- Estou ótima! – forçou um sorriso grande e luminoso. – Vai me ajudar com o almoço, né?

 

****

 

- Itsugo! Itsugo! Itsugo! – Neliel apareceu no quarto de repente, toda elétrica. Quase derrubou o ruivo da cadeira de tanto susto.

- PORRA! – ele gritou com o coração disparado. – Não me assuste assim, Nell!

- Desculpa... – ela pareceu chateada por um momento. Um momento minúsculo. – É que eu tenho boas novidades! – a empolgação voltou junto com aquele sorriso enorme.

Ele arrancou a folha do caderno em que estava escrevendo – pois com o susto, havia rabiscado o que não devia. – e olhou para ela.

- Fala logo. – o mau humor estampado. – E vê se para de se sacudir, isso faz mal pro bebê.

 - Ahh Itsugo! Ele ligou! Ele ligou! – ela riu.

Ichigo deixou a caneta cair no chão.

- O... O quê? – estava petrificado.

- Ele me ligou, ué! – ela sentou-se na cama dele. – Queria saber onde eu estava. E eu disse que estava em Tóquio, na casa do meu primo querido! – o sorriso não desgrudava dos lábios dela.

- E... – ele engoliu em seco. – Você... Ele disse que vem pra cá?

- Não... – ela deixou cair os ombros. – Maaas... Isso é sinal de que ele está preocupado. E pareceu bem irritado quando eu falei que estava aqui.

- E o que você acha que pode acontecer? – o canceriano estava intrigado e incrédulo.

- Acho que ele pode vir atrás de mim. Ou querer que eu volte. Mas é uma questão de tempo. Pelo menos parece que o primeiro passo foi dado!

Ele mal conseguia fechar a boca.

- Eu disse, Itsugo! Eu disse que meu plano ia dar certo! Eu disse!

- A fé e o otimismo removem montanhas mesmo... – ele ergueu as sobrancelhas e pegou a caneta no chão.

- Logo os seus pais vão voltar a acreditar que você é um menininho puro e inocente, Itsugo! Não está feliz?!

- Como é que é? – ele voltou com uma veia saltando na testa.

Ela caiu na gargalhada, como sempre.

- Bom, é isso aí. – ela levantou-se. – Vamos torcer para que isso aconteça logo! – deu um beijinho na bochecha dele. – Te amo, primo!

E saiu do quarto alegre.

- Eu também, sua louca. – ele murmurou.

 

****

 

- Não! – Momo gritou quando os policiais queriam levá-la embora. – Não é justo! O Gin não é culpado! Não é ele! É uma armação!

Gin surpreendeu-se com o escândalo da menina. Não imaginava que, depois de tudo, ela ainda fosse tentar salvar sua pele.

- Nós vamos investigar isso, mocinha. – o policial que a estava levando garantiu. – Não se preocupe.

- Aizen! Professor Aizen! Foi ele! O Gin só estava tentando me salvar! – ela continuava gritando desesperada, as lágrimas escorrendo e o olhar fixo naquele que arriscou o pescoço por amor.

- Não se preocupe comigo, Momo-chan. – ele disse tranquilamente. – Eu já sabia no que isso ia dar.

- Não é justo! Isso não é justo! – ela continuava gritando e se debatendo.

Um dos policiais pegou o laptop de Gin. E os outros foram empurrando-o para o carro.

- Nós temos o seu endereço. Logo vamos descobrir se tem culpa no cartório ou não.

Ele não respondeu a voz dura do homem. Só continuava sorrindo. E no fundo, agradecendo porque não ia roubar nenhuma parte do coração de Rangiku.

 

****

 

O celular de Rangiku tocou. Seu coração quase saiu do peito. Tremulamente ela conseguiu pegar o aparelho. Era Shunsui. O que ele queria? Era alguma pista? Era uma tragédia?

Demorou quase um minuto para conseguir apertar o botão de aceitar a ligação, de tão desesperada que estava. Não via mais nada à sua frente.

- A-alô. – sua voz saiu sufocada.

- Rangiku-san. – a voz de Shunsui estava raramente séria. – A polícia está aqui. E trouxeram a Momo. Querem te ver urgentemente.

Ela pensou em responder. Chegou a abrir a boca, mas as palavras ficaram entaladas. Jogou o celular no sofá e ganhou repentinamente uma força descomunal que a fez correr para fora do apartamento e descer as escadas, com pressa demais para esperar o elevador.

Tentava não pensar. A cabeça latejando. Os olhos doendo, querendo vê-la mais que tudo.

- Momo! – chegou lá embaixo ofegante. Já começava a cair no choro. – Momo! – repetiu com a voz tremendo. – Você está bem! – correu até a menina e abraçou-a como nunca fizera na vida.

Shunsui e Nanao entreolharam-se de sobrancelhas franzidas. Estavam preocupados.

- O que aconteceu? Priminha, o que aconteceu?! – a loira segurava o rosto de Momo e olhava avidamente naqueles olhos infantis.

- Nós temos uma longa história para explicar, senhorita... – o policial falou com ar entediado.

 

****

 

Depois de explicar por alto o que aconteceu e marcar o depoimento de Momo para o dia seguinte, os policiais foram embora. O coração de Rangiku estava louco, pilhado, tonto. Ela nem acreditava que aquilo tudo estivesse acontecendo. E que Gin fora o culpado!

Esperou que Momo tomasse um banho para conversarem melhor no apartamento.

- Foi tudo culpa do professor Aizen. – a menina dizia aos prantos. – Ele me enganou, prima! O Gin fez um plano maluco pra me salvar... E tudo isso porque ele te ama!

A libriana segurava a mão da prima com força. Olhava para o rosto abatido e choroso dela. Mas ela também estava abalada. Quase em choque.

Agora tudo fazia sentido, afinal.

Era por isso que Gin não podia ficar perto dela. Era por isso que era perigoso demais. E quando ele disse naquela carta que arriscaria o pescoço... Era por Momo! Ele a salvaria! Era por amor. Era por ela!

Seus olhos voltaram a escorrer incontrolavelmente.

- Fique calma, prima. – ela conseguiu dizer, bem suavemente. – Agora você está a salvo. Está tudo bem.

- Não, não está! – Momo gritou. – O Gin me salvou e foi preso! Ele provavelmente vai levar toda a culpa por tudo que aconteceu! E quem me enganou foi o professor Aizen! E onde ele está? Onde?! Ele não vai ser punido?!

- Shhh! – Rangiku abraçou de novo a prima e afagou protetoramente seus cabelos. – Momo... Fique calma. O Gin pode ter te salvado. Mas não foi por você. Foi por mim. E as outras meninas que não tinham nada a ver comigo? Elas foram levadas. Foram vendidas. E sabe Deus como elas estão agora. Ele também mereceu. – soltou o ar pesadamente. – E quanto ao Aizen... Você vai depor amanhã e esclarecer tudo para a polícia. A justiça será feita. Fique feliz, amor. Você está bem e está em casa.

Momo ficou em silêncio por um momento. Sentindo o calor da mulher que cuidara dela praticamente a vida toda. Bem ou mal. Elas se amavam e sabiam que eram o tudo uma da outra.

- Mas você está mal, prima... – ela disse baixinho, porém, bem audível para os ouvidos da peituda. – O Gin... O Gin voltou para a prisão e dessa vez vai ser pior.

Ela mordeu o lábio inferior. Queria impedir os olhos de continuar jorrando, mas era quase impossível. Estava fragilizada demais. Quase perdera a prima. Estava quase afogada num mar de alívio. E ao mesmo tempo... Ao mesmo tempo profundamente melancólica. Ele a amava de verdade. Ela o amava mais que nunca. E estavam separados mais uma vez por isso.

- Eu sei... – ela sussurrou dolorosamente. – Eu sei... – repetiu franzindo o rosto.

Momo sentiu pena da prima. Ainda que estivesse com o coração em farelos. O amor que aquele homem sentia por ela era especial. Era verdadeiro. Era lindo.

E impossível pelo visto.

- Vamos descansar Momo. Tenho certeza que eu e você precisamos de longas horas de sono.

Rangiku tratou de secar o rosto e levar a prima para o quarto pela mão. Não soltaria aquela mão de jeito nenhum.

E o teria em seus sonhos...

 

****

 

- Você está certa de que quer fazer isso? – Rangiku perguntou segurando os ombros da prima na frente do espelho. – A gente pode pedir pra adiar se você não estiver se sentindo bem. Eles não podem te obrigar, foi um trauma pra você!

Momo ficou apenas encarando-se por um tempo. Suas sobrancelhas estavam apertadas. Seu olhar estava divididamente triste e indignado. Todos os seus músculos estavam retesados, como que em postura de combate. Ela estava sendo o mais forte que conseguia. Mesmo morrendo de vontade apenas de desabar.

- Sim, prima. – sua voz lutava para não vacilar. – Eu estou certa de que quero fazer isso. – apertou o punho. – Não por mim. Mas pelas outras meninas que tiveram um destino ainda pior. E pelo... – achou que não ia conseguir. – Pelo Aizen... – falou baixinho. E agora não conseguia mais se encarar no espelho.

Rangiku olhou o reflexo da prima à sua frente. Os olhos baixos e o punho cerrado. Ela estava tentando ser mais do que podia. Não pôde evitar um esboço de sorriso orgulhoso. Ela havia aprendido uma lição e estava agindo não como uma garotinha, mas como uma mulher. Mas ainda assim, podia compartilhar com ela aquela dor no peito. Já sentia os olhos pinicarem de novo.

Escorregou a mão pelo braço dela e agarrou-lhe a mão mais uma vez.

- Eu vou estar com você o tempo todo. – disse tentando não chorar. – Vamos passar por isso juntas, prima!

Os olhos castanhos de Momo encontraram-se com os olhos tão claros de Rangiku. As duas conseguiram sorrir uma para a outra. Naquele momento estavam envolvidas por um amor e uma cumplicidade que jamais pensariam ter. Não tão forte. Não tão grande. Não com aquele gosto e aquele calor.

- Vamos. – Momo decidiu.

 E as duas foram caminhando até a porta do apartamento de mãos dadas.

 

****

 

- Eu adorei conhecer seus pais. De verdade. Você tinha toda razão. Eles são muito gentis.

Rukia sorriu diante daquelas palavras. Sentiu-as tão verdadeiras. E ele estava quase sorrindo com a fraquinha luz do sol incidindo em seu rosto.

Caminhavam de mãos dadas por Kofu naquela manhã fria de outono. Ele pretendia levá-la a um lugar nostálgico.

- Eu sabia. – ela até riu um pouquinho de satisfação. – Eles também gostaram muito de você. –olhava para o rosto lindo dele.

Ele olhou de volta e ela sentiu aquela onda incontrolável de timidez. Não era de seu feitio agir assim. Mas... Por algum motivo, simplesmente acontecia.

Suas bochechas coraram e ela deixou os olhos focarem suas mãos entrelaçadas. Aquele sentimento... Ela se sentia bem perto dele. Tão quente... Tão segura...

- Mas ainda assim me sinto um pouco mal por tudo o que aconteceu. – ele disse com a voz profunda parecendo atingi-la mais diretamente. – Eles não devem estar totalmente à vontade de entregar você a mim tão de repente.

Ela continuava apenas sorrindo para suas mãos. Tentava se concentrar no que as batidas de seu coração diziam sobre aquilo. Ela com certeza não estava se sentindo desconfortável. Ela com certeza estava feliz, parecia tudo perfeito na verdade. 

Perfeito.

- Eles vão ter tempo para se acostumar. – ela disse com a voz mais doce que o normal. – E... Não há como eles terem medo de me entregar a alguém como você... – sentiu sua pele quase pegar fogo, mesmo que o outono em Kofu fosse bem frio.

- Alguém como eu? – ele parecia interessado.

- É... – ela não conseguiria olhar nos olhos dele nem se tentasse muito. – Alguém assim... Perfeito.

O olhar dele para ela, junto com os raios mornos de sol, aqueceram-na com uma ternura gostosa.

Ela só pôde sentir aquela doçura, sem saber de onde vinha.

Caminharam por mais um tempo até chegarem ao destino. A casa dele.

- Ah! – ela ofegou e seus olhos encheram-se de brilho. – Byakuya... A cerejeira... – sorria com as lembranças doendo em seu peito.

- Fazia tempo... – ele conduziu-a até mais perto da linda árvore. Não estava tão florida como estaria na primavera, mas ainda assim era admirável e cheia de seus significados. – Eu não conseguia chegar tão perto dela.

Os olhos dela, como se houvesse um ímã, encontraram os dele sem querer.

- Eu senti sua falta. – ele completou. Seus olhos pareciam poder ver a alma dela.

Ela sentiu o coração bater mais forte. Mais forte. Não podia piscar. E nem se afastar.

Sentia o frio. O calor. A nostalgia. E uma dor... Uma estranha dor... Seria a culpa? Seria aquele outro olhar que não saía de sua cabeça em momentos como aquele? Seria sua mente obrigando-a a amar aquele momento mais do que a si mesma?

Não podia evitar. Estava correspondendo os olhos dele. Mesmo que a confusão transparecesse em seu azul, ela apenas o estava encarando. Estava deixando que o olhar dele chegasse mais perto. Tão perto a ponto de devorar o dela. Estava dando a permissão que ele precisava para inclinar-se. Para chegar mais perto. Para fazer sua respiração colidir com a dela...

Estava dando a permissão a ele com aqueles olhos paralisados e os dedos agarrados aos dele. Não estava dando permissão. Não estava dando permissão.

E então, ele tocou os lábios nos dela. Beijou-a. E os olhos azuis ainda abertos, ignorando o que gritava a mente, se recusava a aceitar o que ele estava lhe dando.

 

****

 

- Naquele dia eu fui mandada para a casa do Ichimaru Gin achando que eu ia me encontrar com o produtor das fotos... Eu achava que era uma aspirante a modelo, já tinha tirado várias fotos... Mas quem as tirava não era o Gin! Era o meu professor! O Aizen! – Momo tentava explicar ao delegado.

A libriana continuava ali ao seu lado.

- Ele me dizia que queria ser fotógrafo e que isso era um segredo nosso... Tirava as minhas fotos e me fazia acreditar que eu me tornaria uma modelo. – apertou a mão da prima. – Foi ele que me mandou para a casa do Gin. Foi ele que armou tudo. E o Gin... Ele estava planejando me salvar! A culpa é toda do Aizen! É toda dele! Ele que deve ser castigado! – seus olhos começaram a arder de novo.

O delegado suspirou e encarou Rangiku. Logo depois passou os olhos cansados para a geminiana que tanto sofria.

- Hinamori-san. – ele parecia tentar escolher as palavras com calma. – Você está dizendo que Ichimaru Gin é inocente e só queria salvá-la, fugir com você do cativeiro?

- É! – ela afirmou. – No meu caso ele foi totalmente inocente! Quem deve levar a culpa de tudo é o Aizen! Foi ele! E ele armou tudo para que o Gin levasse a culpa! Ele deve ter descoberto sobre o nosso plano de fuga! – sua voz já estava se alterando.

- Eu sinto muito... – ele continuava cauteloso ao falar. Mas não como se fosse com sentimento. E sim como se estivesse tentando ser mais preciso do que qualquer outra coisa. – Mas não tem como Aizen levar a culpa de tudo. Ele está morto.

Os olhos de Rangiku quase pularam. E o coração de Momo quase parou no mesmo instante.

- O QUÊ?! – a morena gritou mais estupefata do que se lembrava de ter estado na vida.

Depois da quase parada cardíaca, agora parecia que seu coração decidira surtar. Estava batendo tão loucamente que ela temeu não conseguir mais respirar.

- Isso mesmo. Aizen Sousuke foi encontrado morto no apartamento de Ichimaru Gin. Parece que eram mesmo parceiros, mas... Sobrou para o Gin levar a culpa dupla. – levantou as sobrancelhas e comprimiu os lábios desaprovando.

As lágrimas presas dos olhos de Momo escorreram.

- Não pode ser... – murmurou perturbada. Não conseguia nem piscar. – O Aizen... Ele estava falando com o Gin no computador! Eu vi! Eu estava lá! Ele estava me mostrando para ele na câmera!

Mais uma vez o delegado trocou uma tentativa de olhar cúmplice com Rangiku. Claramente não estava levando a menina a sério.

- O computador de Gin foi investigado. Não havia nenhuma conversa com Aizen registrada naquele dia. Só encontramos conversas com possíveis interessados, se é que vocês me entendem.

- Não... Não... Não acredito... Não é verdade... – Momo murmurava pálida, com os olhos vidrados e ao mesmo tempo perdidos.

- E junto com o corpo de Aizen encontramos diversas provas incriminadoras no apartamento de Gin sobre o caso do tráfico. Parece que ele vai passar um bom tempo pensando em cada uma dessas provas no lugar merecido em que ele se encontra.

- Não! – Momo gritou. – Não foi isso! Está tudo errado! Eu estou dizendo! Acredite em mim, eles estavam conversando no computador na minha frente! O Gin não pode tê-lo matado! – ela já estava gritando.

- Momo! – Rangiku quase esmagou a mão da prima. – Acalme-se! – tentou usar uma voz firme e autoritária. Sabia o que ela estava sentindo. Entendia, compreendia. Também não queria deixar que Gin pagasse por tudo aquilo. Também acreditava nas palavras que vieram do coração dele. Mas... Sabia que não ia ser fácil provar. – Respira! Respira!

- Tudo indica que era mesmo o corpo de Aizen Sousuke no apartamento do Gin, Hinamori-san. E a senhorita não devia estar tão chateada com isso. Afinal, o Gin foi o homem que a seqüestrou. E não só a você. Várias meninas. Devia estar feliz por estar bem e por ele estar no seu devido lugar depois de causar tanto sofrimento.

- Não! Ele ia me ajudar a fugir! Não é justo! O Aizen tramou tudo para a culpa toda cair sobre o Gin! – ela continuava gritando. Não podia mais segurar.

- E que motivos ele teria para ajudá-la a fugir, Hinamori-san? – o delegado cruzou as mãos em cima da mesa e inclinou-se para encará-la mais de perto. – Posso garantir que ele estava lucrando muito com essa história toda. E lucraria ainda mais com a morte do seu parceiro, não é mesmo?

Ela franziu o cenho. As lágrimas continuavam correndo pelo seu rosto silenciosas.

Engoliu aquela pergunta.

Amor. Essa era a resposta.

Mas... Era digna de crédito? Diante de toda aquela bagunça?

Olhou para a prima. Ela sorria pequenamente. Aquele tipo de sorriso que conforta. Aquele sorriso que significa algumas palavras.

- “Está tudo bem.” – ela estava dizendo com o sorriso. – “A atitude dele te protegeu. O amor dele nos salvou.”

Sabia que era isso que ela queria dizer. Os cantinhos de seus olhos também estavam molhados. E sua mão apertando-a traduzia a dor, a gratidão e a resignação que trazia no peito.

- Recomendo que faça um acompanhamento psicológico com ela. – o delegado dirigiu a palavra a Rangiku. – Ela com certeza passou por um grande trauma. Qualquer um ficaria nesse estado.

- Muito obrigada, senhor delegado. – a loira levantou-se. – Podemos ir?

Ele afirmou com um gesto.

As duas se despediram então e retiraram-se dali. Não havia mais nada que pudesse ser dito ou provado. Era o destino. E seria justo de alguma forma.

 

****

 

- Shiro-chan! Shiro-chan! – Momo afundou a cabeça no peito do amigo e chorou. Derramou toda a sua dor, toda a sua revolta, todas as suas mágoas.

Mesmo que estivessem ali no terraço... Sentindo aquela brisa fria... Mesmo que estivessem tão expostos, ela ainda sentia um calor. Aquele calor que, não importava o que acontecesse, estaria sempre ali para ela.

Tentava não pensar no quanto foi injusta com ele. Não naquele momento. Ela só conseguia se odiar mais a cada segundo.

- Hinamori... – ele não estava sem jeito com aquele abraço. Não daquela vez. Estava tão despedaçado quanto ela.

O amor leva as pessoas para o mais perto possível do altruísmo. E quando seu coração é roubado por alguém, não há escapatória. As mesmas dores e alegrias serão compartilhadas. Sentidas pelas duas almas.

- Me desculpa por tudo! Me desculpa, eu... Me desculpa! Eu sou tão idiota... Tão burra! Eu acabei com tudo! E não aguento mais, Shiro-chan! Eu não sei se vou agüentar! – ela encharcava a camisa dele com seu choro e todos aqueles sentimentos tristes, sombrios e desesperados.

Ele afagou-lhe carinhosamente os cabelos e as costas. Naquele momento não existia mais mágoas. Só existia o desejo de drenar aquelas lágrimas.

- Não pense nisso agora, Hinamori. – ele dizia suavemente para ela. – Você vai superar tudo isso. Eu sei que vai. Por você. Pela sua prima, pelas suas amigas... E também por mim. Todos nós estaremos ao seu lado. Sempre.

- Shiro-chan... – ela soluçava e soluçava.

Nunca a tinha visto chorar daquele jeito. Ele mesmo estava quase sendo contagiado.

Mas só continuou ali, abraçando-a. Amparando-a. Sentindo seu cheirinho doce e a frieza que seu corpo emanava.

Olhou para o céu. O sol da tarde, encoberto pelas nuvens, estava logo ali. Mas não importava. Ele podia se pôr. Podia dar lugar à Lua e às estrelas. E voltar. Nascer de novo. Caminhar eternamente por entre as nuvens. Ele não a deixaria. Nunca. E não a soltaria até que se sentisse segura mais uma vez.

 

****

 

- Eu gostei do branco! – Unohana levantou o vestido no ar. Era de mangas três quartos e adornado com delicadas rendas nas barras e nos cotovelos.

- Eu também gostei desse. – Orihime opinou. – Mas branco é tão casamento! Acho que gostei mais desse aqui! – estendeu um vestido rosa de mangas compridas e gola alta, com detalhes pretos.

- Esse também é bem bonito! – a ariana observou nas mãos da ruiva. – Já estou vendo que vai ser difícil decidir! – sorriu.

- É mesmo. Ainda bem que o pessoal das lojas foi tão legal de nos deixar trazer os vestidos para casa para escolher com calma, né? – a virginiana riu empolgada. – Eu duvido que em Tóquio eles deixariam fazer uma coisa assim!

- Tem toda a razão, Hime-chan!

- Mamãe. Orihime. – Rukia, sentada na cama do quarto de sua mãe com uns cinco vestidos empilhados no colo, chamou-as com a voz dolorida. – Eu não o amo. – os olhos estavam baixos.

Orihime deixou o queixo cair junto com o vestido cor-de-rosa. Unohana só continuou encarando a filha, como se esperasse algo.

- Ru-Rukia-chan... – os olhos castanhos da ruivinha estavam enormes. – O... O que você está dizendo? Por acaso... Não está falando do vestido? – tinha uma pontinha de esperança.

- Eu estou falando sério. – encarou as duas com dificuldade e uma melancolia confusa brilhando nos olhos. – Eu não o amo. Eu... – comprimiu os lábios. – Eu preciso amá-lo!

As duas entreolharam-se. E resolveram que era hora de entendê-la.

- Rukia-chan... – Orihime foi até ela. – Por que você aceitou esse noivado então? Por que você precisa amá-lo?

- Minha pudinzinha... – a mãe pegou a mão da filha com amor. – Conte, o que está atormentando esse coraçãozinho? Está escrito nos seus olhos desde tanto tempo... – sua voz era puro carinho e compreensão.

Ela quase teve vontade de chorar por isso.

- Eu amo outro, mamãe. – ela desabafou num jorro. Estava no seu limite. – Eu o conheci em Tóquio, num programa idiota que diz encontrar almas gêmeas. Participei de um monte de provas para que nosso relacionamento fosse testado. Eu neguei por tanto tempo que aquilo podia ser verdade... Mas o programa tinha razão. O destino nos uniu. Somos tão diferentes e tão... – sentiu um gosto amargo na garganta. – Eu realmente o amo. E não consigo parar de pensar nele. Mas eu não posso! Eu não posso! – fechou os olhos e balançou a cabeça. Parecia estar carregando mesmo um peso gigantesco.

As duas sentaram-se na cama, uma de cada lado de Rukia.

Orihime esfregou o ombro dela amigavelmente.

- Ele vai ter um bebê... Com a prima dele... E acabamos nos afastando. E eu decidi que a gente terminasse o programa separados. Não há mais espaço para mim, entendem? É a família dele! Eu não quero estragar tudo... Ao mesmo tempo em que queria tanto acreditar no nosso destino e continuar do seu lado... Mas... – riu sem humor. – Eu sou uma idiota mesmo. Por que estou assim? Porque meu coração dói tanto de dizer essas coisas? De lembrar?

- O amor é assim mesmo, meu anjo. – a mulher acariciou a mão da filha. – Ele nos muda por inteiro. E acredite... É sempre para melhor.

Ficou encarando os olhos da mãe. Não entendia como aquilo podia ser melhor. Não podia!

- Bem. Eu já desabafei com vocês. – inspirou fundo. – Agora... Vamos continuar escolhendo o vestido. – levantou-se da cama.

- Ei! – Orihime protestou. – Mas você não ama o Kuchiki-sama. Você ama esse garoto do destino!  Não pode continuar escolhendo o vestido!

- Você está certa, Orihime. Eu amo o Ichigo, mas... Mas eu já tomei minha decisão. Eu preciso seguir em frente com esse noivado. Eu vou ter que esquecê-lo. Porque ele tem algo mais importante para cuidar agora. E eu não vou me meter nisso. Eu vou procurar a minha segurança para que ele possa dar a maior segurança possível para a filha dele que está por vir.

- Mas... – Orihime abriu a boca mais uma vez.

Unohana, porém, cobriu-a com os dedos.

- Hime-chan... – sussurrou. – Não. – balançou a cabeça. – Vamos confiar na Rukia. Sempre fizemos isso, não foi?

A ruivinha olhou para a melhor amiga na frente do espelho com o vestido cor-de-rosa na frente do corpo e suspirou.

- É. Você tem razão. – estava entristecida. Mas sabia que sempre podia confiar nas escolhas de Rukia. Ela sempre foi a pessoa que mais admirou por toda a vida. Não iria decepcioná-la.

 

 

Continua...


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