Céu escrita por Liminne


Capítulo 56
Capítulo 44 - Na loucura e na doença




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Pouco mais de sete horas da manhã, os bebês choravam de novo. E mais parecia que era a milésima vez naquele dia infernal.

- Vai você, Rukia... – Ichigo resmungava enfiando a cabeça embaixo do travesseiro.

- Por que eu? – a pequena murmurou quase sem forças.

Ichigo argumentou alguma coisa, mas o som saiu abafado pelo travesseiro. Rukia tentou mandá-lo mais uma vez ao trabalho, mas sua boca ficou parada aberta e ela caiu no sono novamente.

Não tinha mais como eles se mexerem! Era de hora em hora que aquelas pestinhas abriam o berreiro! Isso quando no intervalo de uma hora para outra um não resolvia chorar sem o outro. E quinze minutos depois o outro resolvia imitar. E ainda tinham que adivinhar o que queriam! Passeio, mamadeira, fralda, brinquedo... 

O choro ia ficando distante... Começava a fazer parte dos sonhos da dupla. Sim, sonhos... Não dormiram a noite toda, então qualquer cochilada, mesmo com um barulho irritante daqueles, não podia ser chamada de pesadelo.

Até que, algo superior fez os dois pularem do futon. Uma sirene louca, tão alta que pareceu estremecer a casinha.

- QUE PORRA É ESSA?! – Ichigo berrou mais irado do que já se lembrou de ter estado na vida.

Rukia protegia os ouvidos e rangia os dentes. Só podia ser coisa do Capeta-sama.

De repente a sirene parou e tudo voltou ao normal.

Ichigo e Rukia entreolharam-se.

- Será que... – Rukia falava ainda meio tonta.

- Isso é um despertador? – Ichigo arqueou a sobrancelha.

- Não é possível que isso seja um despertador! – Rukia voltou a falar gritando. – Como se a gente [i] precisasse [/i] de algum! – sinalizou com o queixo para os bebês.

- Ahhh! – Ichigo se jogou na cama. – Estou ficando com dor de cabeça! E esse é só o segundo dia!

- Levanta! – a voz de Rukia era dura. Já estava de pé. – Eu desconfio seriamente de que esse alarme foi um aviso do nosso primeiro erro.

- Não acredito! – os olhos de Ichigo se arregalaram e ele levantou-se de cama. – A gente não pode ignorar o choro deles por mais de dez minutos?

- Acho que não. – Rukia tinha o semblante fechado. Pegou Mildred no berço e começou a balançá-la no colo. – É sério... Eu acho que vou enlouquecer aqui. – com a outra mão massageava a têmpora.

- Eu queria te dizer palavras tranqüilizadoras, mas... Acho que vamos pro mesmo hospício. – ele disse enquanto pegava William. A cara estava amassada de sono e a expressão azeda como sempre. Ou talvez ainda mais do que de costume.

- Obrigada tranqüilizador. – ela ironizou com uma careta. – Aii, Mildred! O que eu faço pra você parar de chorar, hein?

- Não pode ser mamadeira. Eles mamaram tem pouco tempo. – Ichigo deduziu.

- Nem fralda. – Rukia ajudou. – Também trocamos as fraldas há pouco.

- Vamos tentar brinquedos. – o ruivo abaixou suspiroso e pegou um dadinho colorido e macio e começou a balançá-lo na frente do bebê.

Rukia ficou olhando com a testa franzida e um ar de riso no rosto. Mas um riso de desprezo.

- É isso que você chama de brincar com um bebê, Ichigo? – ela perguntou com aquela cara irritante.

O ruivo ficou vermelho na mesma hora e fez bico.

Rukia então pegou um coelhinho de pelúcia que estava dentro do berço de Mildred e começou a brincar com a bebê.

- Oi Mildred! Eu sou o Chappy Cosquinha e sabe por que eu tenho esse nome? Por que vou fazer muita cosquinha em você! – esfregou o coelhinho no corpinho da boneca e fazer barulhinhos engraçados. – Até você parar de choraar!

Mas mesmo assim a ruivinha não calou a boca.

- É... Acho que até a mestre das brincadeiras infantis falhou dessa vez. – Ichigo alfinetou se sentindo vitorioso.

- É porque não é um bebê de verdade! – Rukia defendeu-se empinando o nariz. – Mas quem tem [i] mesmo [/i] que saber o que fazer com um bebê chorando aqui não sou eu. – lançou um olhar severo para ele.

Ele abriu a boca com uma vontade imensa de gritar em protesto. Mas só ficou quieto e meneou a cabeça. Estava cansado demais para aquilo. E não era só por causa dos bebês.

- Vamos passear com eles. – ele disse enfim.

Rukia concordou e os dois começaram a fazer o famoso tour pela mini casa. Passaram-se cinco minutos e nada das crianças pararem o choro.

- Aii, não aguento mais! – Ichigo resmungou. – Meu estômago já está roncando e essas crianças não se acalmam!

- Eu, sei, eu sei... – Rukia suspirava irritada. – Elas não nos deram nem tempo de escovar os dentes! Precisamos mudar de tática.

Rukia começou então a cantarolar uma canção de ninar. Como o choro de Mildred foi ficando menos histérico, ela começou a cantar mais alto.

Ichigo ficou abobalhado. Não sabia que a voz dela podia ser tão doce assim cantando para bebês. Ela seria uma mãe muito carinhosa... Ei! No que estava pensando?! Quando deu por si, ela o estava olhando indignada, como quem o ordena a fazer alguma coisa com aqueles enormes olhos recém-acordados.

Tomou um susto por ter sido pego a fitando daquele jeito e demorou a perceber o que ela realmente queria que ele fizesse. É. Ela queria que ele cantasse também!

- Não, Rukia... Eu não...

- Você quer ouvir o choro do William o dia inteiro?

- Não.

- Você quer comer alguma coisa?

- Quero.

- Você quer que a gente tenha mais um erro no nosso placar por culpa sua!?

- Nunca!

- ENTÃO CANTA!

As bochechas do jovem voltaram a ficar coradas. Ele não ousava encarar a capricorniana autoritária. Mas não tinha mesmo escolha. Ia ter que pagar mais esse mico.

Começou então a cantar bem baixinho. Quase não podia se ouvir. Ainda mais debaixo do choro e da voz suave de Rukia.

A essa altura, Mildred já estava quietinha, com os olhos semicerrados. E para o infortúnio do ruivo, o olhar de Rukia queimava sobre ele pressionando-o.

Ficando quase roxo de vergonha, aumentou um pouco o tom de voz. Lembrou-se no fundo de suas memórias de uma música que a mãe sempre cantava para ele e para as irmãs. Mergulhado naquele clima, acabou esquecendo que aquela baixinha o observava e fez direitinho seu papel para que William dormisse calmamente.

- Muito bem, Ichigo. – Rukia sorriu. – Conseguimos fazê-los ficarem quietos pela próxima hora! – passou por ele para levar Mildred ao berço. – Nunca ia imaginar que você conhecia uma canção de ninar. – riu.

E ele voltou a ficar envergonhado enquanto a seguia para os berços.

- É eu... Talvez eu leve jeito para esse negócio todo de ser pai.

Ela ficou olhando-o admirada. Lembrou que naquela primeira ficha que viu dele, antes mesmo de conhecê-lo, mencionava algo sobre querer muito ser pai. E agora... Agora o seu maior sonho estava prestes a se realizar...

Engoliu em seco. Pôs as mãos nos quadris.

- É bom que leve jeito mesmo. – foi andando para a cozinha, evitando captá-lo. – Mas não fique convencido.

- Vai preparar o café da manhã? – ele perguntou chegando à cozinha e mudando de assunto.

- Vou. Ontem você preparou o jantar. É uma troca justa.

 

****

 

- E então? Estou aprovada? – Mai perguntou depois que os dois terminaram de almoçar.

Estavam na casa de Ashido e a loira cismara de fazer o almoço. Uma receita que havia aprendido com Rukia. Queria mostrar para o namorado que ela podia surpreender ainda mais.

E como ele fizera suspense durante toda a refeição, ela foi obrigada a perguntar, senão morreria de curiosidade e expectativa.

Diante da pergunta dela, ele sorriu enigmático.

- Ahhh! Você vai me responder! Você tem que me responder! – ela começou a fazer manha, mas ao mesmo tempo ria.

- Certo. – ele concordou segurando o riso. – Eu não queria dizer, mas... – torceu o nariz e diminuiu os olhos pra ela. – Mas ficou ótimo! – resolveu encerrar o suspense frente ao rosto quase decepcionado dela.

- Ah! Eu sabia! – ela colocou a louça na pia toda vitoriosa.

- Sabia nada! – ele riu e abraçou-a por trás, dando-lhe um beijinho no pescoço. – Eu vi sua carinha de insegurança. Estava achando que eu não tinha gostado!

- Há, bobo... – ela fez uma careta. – Você me pegou, ta? Eu fiquei insegura mesmo.

- Que bom que agora você está admitindo. – ele provocou-a.

Ela empurrou-o com o corpo e desvencilhou-se dele, fazendo cara de ofendida. Mas o sorrisinho não enganava.

- Você destrói meu orgulho, Sr. Advogado. – ela fez bico e dirigiu-se para o sofá da sala.

Ele foi atrás dela e sentou-se ao seu lado.

- Está falando de ter feito comida pra mim ou de ter admitido a insegurança? – ele abraçou-a e olhou-a bem de perto.

- De ter admitido a insegurança. – ela respondeu olhando para o alto, evitando o azul dos olhos dele. – Eu só fiz comida pra você em agradecimento ao seu jantar.

- Há! – ele deitou-a no sofá e conseguiu pegar o olhar dela. – Está mentindo de novo!

Ela franziu o nariz para ele e não disse mais nada.

Ele ficou fitando-a por alguns minutos. Ela era tão linda e misteriosa... Aqueles olhos tão negros adoravam dizer tão pouco... Quase nada. Só para deixá-lo daquele jeito. Só para ter que implorar para que ela demonstrasse.

Acariciou o rosto macio dela e afastou uma mecha daquele cabelo loiro perfeito.

- Me conte, Mai... – a voz dele pareceu mais rouca e séria, mas com um tom amável e protetor. – O que anda te preocupando, hein?

Ela franziu as sobrancelhas clarinhas.

- Acha que tem alguma coisa me preocupando?

- Não. – ele olhou bem fundo naqueles olhinhos mudos. – Eu tenho certeza.

- Ohh... Você está ficando especialista em me desvendar. Isso é um mérito realmente grande, Sr. Advogado.

- Vai ficar me chamando assim? É irritante. – ele sorria.

- Vou. – ela mostrou a língua.

- Humm... Certo. Mas vai ter que me dizer o nome da sua ruguinha na testa. – tocou a ruga imaginária de brincadeira.

- Só se você adivinhar! – ela disse baixinho, com aquela expressão sedutora de quem lança um desafio.

- Okay. Deixe-me pensar... – ele diminuiu os olhos pensativos. – É o seu romance.

- Não. – ela riu. – O romance está indo maravilhosamente bem. Na verdade, só precisa ser revisado para procurar uma editora. – ergueu um pouco o rosto orgulhosíssima.

- É, eu sabia que não era o romance. – ele disse e ela riu. – Então... São suas colegas de quarto. É. Só pode ser isso. Porque você veio correndo ontem à noite pra cá.

- Nããão! – ela negou. – Elas são ótimas!

- Chiharu? – ele franziu o canto do rosto.

- Nunca teria problemas com a Chi!

- Então já sei. – ele comprimiu os lábios com cara de sabe tudo. – Está deprimida porque eu não te levo pra sair e nossos programas são caseiros.

- Não seu palhaço! – ela deu um tapinha no peito dele. – Retiro o que eu disse. Você está péssimo em me desvendar.

Ele olhou fundo no rosto dela e acariciou-a mais uma vez.

- Não se preocupe, Mai. Quando seu livro for o mais vendido do Japão, isso só pra começar, seus pais vão aparecer rapidinho, cheios de orgulho.

Ela arregalou os olhos. Mas logo voltou a diminuí-los. Não sabia se estava surpresa de ele realmente saber ou se no fundo já esperava por isso. Por algum motivo o coração estava mais quente.

- Talvez... – ela suspirou.

- Eles só estão tentando trazer você de volta pra eles. Não querem que você se machuque. – ele explicou pacientemente. – Mas quando eles se derem conta do que a filhinha deles é capaz... Vão mudar de idéia e colocar mais confiança em você.

Os olhos sempre opacos dela relampejaram.

- E você acha que eu sou capaz de tanto assim? – perguntou numa vozinha fraca e doce.

- E você não tem certeza? – ele sorriu confiante. – É claro que você é, Mai. Você me mostrou ser capaz de tudo. – ela sorriu tão sinceramente... – Até de fazer comida.

- Ahhh! – ela fingiu-se de indignada e bateu nele de novo. – Você é tão petulante Sr. Advogado! – riu.

- Você também, Srta. Escritora.

Sorriram um para o outro e se beijaram.

 

****

 

- Ichigo, termina logo! – Rukia sacudia Mildred no colo andando de um lado para o outro enquanto ela chorava. – Senão essa criança não vai parar de chorar!

- Calma, Rukia! – Ichigo estava irritado. – Você mandou eu ir primeiro, agora espera, droga. Que casa infeliz. Só tem uma banheira pra dois bebês!

É. Agora os bebês choravam pedindo banho. Rukia pediu que Ichigo fosse o primeiro a aliviar o sufoco do bebê que segurava, mas se arrependeu amargamente. Mildred não parava de berrar em seu ouvido e a espera a estava deixando louca. Isso sem falar em surda.

O grito da ruivinha atingiu o auge e o fundo do ouvido da baixinha de olhos azuis.

- Ahh! – ela gritou afastando um pouco o bebê de seu ouvido. – Ichigo, deixa de ser lerdo, pelo amor de Deus! Ou os meus tímpanos vão inexistir!

- Porra, você não acha que eu também to ficando surdo não? – ele gritou e virou o rosto vermelho de raiva pra ela. – Eu ainda não terminei, o William ainda não parou totalmente de chorar! Ah! – quando voltou o rosto para a banheira, percebeu que o bebê havia caído embaixo d’água e fazia bolhinhas. – Merda! – puxou o boneco pelo braço de qualquer jeito.

E mais uma vez, subitamente, aquela sirene maldita estremeceu o casebre e os corpos das vítimas do destino.

- Ahhhhhhhh! – Ichigo gritou protegendo os ouvidos.

- Para com issoooo! – Rukia fez o mesmo, mas com Mildred gritando não conseguiu muito progresso.

O alarme parou depois de uns quinze segundos.

- Viu só?! – Rukia gritou mais alto que nunca. – Eu estava certa! Esse alarme indica nossos erros! Já é o segundo, Ichigo! Segundo! E a culpa é sua porque você estava afogando seu próprio filho!

- A culpa é MINHA? Tem certeza que a culpa é MINHA?! – ele tirou o bebê da banheira e enrolou-o na toalha. Agora ele parecia estar se acalmando, apesar do susto de quase ser afogado. – VOCÊ ficou gritando no meu ouvido, me apressando! VOCÊ me distraiu! – ele também tinha perdido o controle do tom de sua voz.

- Pai que é pai não se distrai a ponto de AFOGAR o seu próprio filho! – ela continuava acusando-o a plenos pulmões.

- Não fale assim! Eu não afoguei o meu próprio filho, que inferno! É só um boneco de merda!

Alarme ensurdecedor novamente. Por um segundo Ichigo teve certeza que alguém já havia corrido naquela missão, achando que era incêndio.

- Puta que pariu! – xingou irado. – O que foi que eu fiz agora, porra?!

- Deve ser porque você chamou o seu próprio filho de merda! – Rukia deduziu ouvindo zumbidos assim que o alarme calou-se. Tirou a roupinha da ruiva e trocou a água da banheira.

- Ah, será que foi isso? Agora o Infernal-sama pode nos ouvir também?

- Eu sei lá, só consigo achar essa explicação! – ela evitava olhar para ele, para não ter vontade de agredi-lo.

- Será que não foi porque alguém fica se esgoelando não? Olha só! Tá assustando os bebês! O moleque mal calou a boca e já está chorando de novo! – emburrou com William chorando em seus braços.

- Ahh, ta bom. Só eu que estava gritando, né? Só eu!

- Argh, quer saber? Vou vestir o garoto antes que essa porcaria dessa buzina, ou seja lá o que for isso toque de novo. – saiu batendo pé.

- Isso, fica bem longe! Assim eu não lembro que a gente só precisa de mais QUATRO erros idiotas para ter que carregar essas pestes pro resto da semana!

É... O clima não estava nada estrelado para o casalzinho de signos opostos e seus adoráveis filhinhos...

 

****

- Três horas da tarde e a gente só almoçando agora... – Ichigo dizia com a voz mole, levando os hashis à boca.

- Você não me parece com tanta fome assim. – Rukia observava o jovem enquanto comia mais rápido que o normal.

- Acho que... – ele reprimiu um bocejo. – Acho que meu sono ta falando mais alto do que a fome... – os olhos estavam quase fechando.

- Ichigo! Cuidado! – Rukia gritou. – Você vai dormir no prato desse jeito!

O ruivo sacudiu a cabeça e forçou os olhos arregalados. Começou então a comer bem mais rápido.

- Assim você vai se engasgar, criatura. – Rukia ralhou de novo, mas agora com uma voz entediada.

Ele engoliu a comida.

- Assim eu posso dormir um pouco antes do próximo choro! – ele continuava a devorar tudo como se o seu tempo fosse acabar.

Rukia sentiu pena daquela cena. Ela também estava louca por uma cama, louca para fechar os olhos sem compromisso com horários. Mas pelo visto era mais resistente que ele em dormir.

- A gente podia fazer um rodízio... – ela pegou-se dizendo. Mas agora os olhos castanhos pregaram-se nela e ela teria que continuar. – Sabe... Se aquela porcaria de alarme não cismar de tocar dizendo que é um erro... – revirou os olhos. – A gente podia fazer turnos. Já que estamos sem dormir, cada um podia ficar pelo menos umas três horas dormindo enquanto o outro cuida dos bebês.

Os olhos de Ichigo brilharam feito os de uma criança ao ver um sorvete gigante e colorido.

- Está falando sério? – ele perguntou ainda com a boca cheia.

- Estou. – ela disse tentando não olhar no rosto dele. – Pode começar a dormir se quiser. Sua cara fica muito pior quando você ta com sono, não to agüentando mais olhar.

Ele nem se sentiu ofendido. Naquele momento teve vontade de abraçar a pequena à sua frente. Mas sabia que ela apenas estava sendo legal com ele porque... Porque estava sob o novo título de sua amiga.

- Tomara que o Infernal-sama não classifique DORMIR como um erro. – ele levantou-se emburrado da mesa e quase correu até o futon. Em menos que um piscar de olhos já estava estirado na cama e apagado.

- Enquanto as três crianças dormem, vou tomar um banho rápido. – Rukia falava consigo mesma terminando de lavar a louça.

Foi até sua mala, pegou uma roupa e levou para o banheiro.

Foi questão de cinco minutos para as crianças começarem a chorar de novo.

- Ah não. – Rukia teve vontade de chorar junto.

Com Ichigo dormindo, ela teria que correr, ou então o Capeta-mestre que se fazia de guru dos relacionamentos ia tocar a sirene... E aí sim, ela estaria perdida.

- Eu já vou! – ela gritou como se assim pudesse ganhar tempo e se enrolou numa toalha. Em seguida saiu correndo pela casa minúscula até chegar ao berço. Mas não antes de levar um tombo daqueles no meio da maratona.

- Ahhh! – espatifou-se sentindo o gelado do chão - Inferno! – ela praguejou sentindo dor nas coxas. – AI, A TOALHA! – gritou apavorada quando percebeu a toalha se desenrolando de seu corpo.

Levantou-se com dificuldades, mancando e gemendo de dor no quadril e arrastou-se nesse estado deplorável até o quarto. Mais uma vez é preciso destacar o que o desespero não faz com uma pessoa.

Ichigo chegou a resmungar por causa do barulho, mas estava condicionado às suas maravilhosas três horas de sono e não ousou se mexer.

- Ai meu Deus! – Rukia agora tinha uma criança em cada braço, uma toalha que teimava em escorregar do seu corpo ainda cheio de bolhinhas de sabão e uma dor infernal no quadril. – Por favor crianças, colaborem! – ela sacudia do melhor jeito que podia as pestinhas.

Saiu do quarto para não incomodar o ruivo e sentou-se numa cadeira.

- Que idéia maldita a minha. – soltava o ar com força. – Como vou cuidar de dois ao mesmo tempo?

Resolveu então deixar os bebês no berço chorando e pegou as mamadeiras. Levou-as até a sala e deixou-as sobre a mesa. Depois correu para o quarto quase escorregando de novo, pegou os bebês chorões e sentou-se na cadeira com eles. Com um em cada braço, fez a maior ginástica para alternar as mamadeiras até que eles estivessem satisfeitos e devidamente calados.

- Ichigo... – ela já estava queimando de raiva. – Acho bom você sofrer o tanto quanto estou sofrendo quando for a minha vez de dormir.

Terminadas as mamadeiras, colocou as crianças de volta no berço e voltou para o banho.

Será que depois dessa ainda ia querer ser mãe?

 

****

 

Estava vigiando o relógio enquanto trocava as fraldas de Mildred e William. Eram cinco horas da tarde. Só faltava mais um choro para entregar todo o serviço na mão de Ichigo. E depois de suas três horas de sono, ia definitivamente cancelar aquele acordo. Não tinha como cuidar de dois bebês que só choravam ao mesmo tempo! E ainda com a pressão de saber que se demorasse um pouquinho a sirene ia marcar mais um erro.

Por isso aquele desgraçado desumano tinha colocado dois bebês ao invés de um só.

- Po, fica quieto aí... Eu quero dormir... – Ichigo resmungou virando pro outro lado na cama.

Rukia teve uma vontade enorme de começar a bater panelas no ouvido dele. Ela lhe dava três horas de folga e ele já ficava abusado assim?

Conteve-se apenas com um olhar fulminante e terminou com as fraldas dos bebês.

- E pensar que acabei de tomar banho... – ela suspirou.

A casa ficou tão silenciosa que ela teve vontade de mergulhar naquele futon para sempre. Mas sabia que muito trabalho viria pela frente. E sabia também como Ichigo era enrolado e a possibilidade de a sirene tocar no turno dele era muito maior que tocar no seu. Então foi andando até a cozinha para preparar as mamadeiras dos bebês e facilitar um pouco a vida dele. Tudo para não ter que viver aquela tormenta por mais uma semana!

 

****

 

- Ichigo! Ichigo, acorda! – Rukia cutucava o ruivo sonolento.

- Ah não... Só mais cinco minutos... – ele agarrou-se no travesseiro e respirou confortavelmente.

- Cinco minutos é o suficiente para eu ENLOUQUECER! – ela não foi nada boazinha e começou a bater nele. – Anda levanta! Minha vez de dormir! Não suporto mais isso!

Ele resmungou umas palavras ininteligíveis e levantou-se contrariado, esfregando os olhos.

- Já dei mamadeira, já troquei fralda e já brinquei com eles... Agora é sua vez de se virar.

Quando ele terminou de esfregar os olhos percebeu que ela estava com roupa de dormir.

- E saiba que depois das minhas três horas, acabou esse acordo. Não dá não.

- Cala a boca. – ele murmurou ainda lento. – Eu ainda to acordando e você ta gritando demais. – franziu o cenho irritado.

Ela apertou bem os punhos segurando a vontade de enchê-lo de socos na cara.

- Okay. – ela subiu na cama. – Então veja por você mesmo as maravilhas de ser um pai solteiro. – puxou o cobertor para si. – Boa noite. – fechou os olhos esperando que o sono não demorasse a chegar. Não podia perder nenhum segundo daquele incrível tempo no paraíso.

Sentiu-se um pouco amedrontado pelas atitudes e as palavras dela. Mas não se deixou abalar muito. Afinal, ela estava com muito sono.

Levantando e caminhando para ir tomar um banho, o ruivo percebeu que três horas de sono não são nada quando você não dorme o dia inteiro. Sua cabeça estava latejando e olha que a casa estava silenciosa!

Depois que saiu vestido do banheiro e ficou algum tempo sentado à mesa de jantar vazia pensando, os bebês finalmente começaram a chorar.

Foi até eles e se assustou ao perceber que teria que carregar dois ao mesmo tempo.

- Por favor, não gritem desse jeito... – ele disse e depois se reprovou. Tinha chegado ao ponto de pedir POR FAVOR a dois bonecos! Já estava mesmo à beira de um surto. – Minha cabeça ta doendo, porra! – ele irritou-se com um grito de cada lado do ouvido.

Encostou Mildred em seu ombro e ficou balançando William desajeitadamente com o outro braço.

Quando estava quase se acostumando a acalentar os dois ao mesmo tempo, ouviu um barulhinho familiar. Mas o pior não era o barulhinho. E sim o que ele trazia consigo: um líquido quente escorrendo pelas suas costas e um cheiro azedo nada agradável.

- PUTA QUE PARIU! – ele gritou tirando Mildred de seu ombro. – EU ACABEI DE TOMAR BANHO SEU BEBÊ DO DEMÔNIO! – foi tentar olhar sua camisa atrás e confirmou as suspeitas: aquela boneca nojenta tinha vomitado! – E agora, merda? Como que eu vou limpar isso?! – acabou se preocupando demais com a sujeira e relaxou o braço fazendo uma tragédia pior ainda. Sim. Deixou Mildred escorregar para o chão. – Ahhh! – ele alarmou-se ao ver aquela cena. - NÃO! NÃÃÃÃOOOO! – ele já sabia o que estava por vir.

Feito. O único som que abafou os gritos da ruivinha foi o daquela sirene assassina.

- Não! Não, por favor! – ele abaixou pra pegar a bebê. – Pare de tocar, pare de tocar! – ele choramingava de medo. Não sabia se era mais por causa do novo erro no placar ou por causa de uma ira muito pior que ia ter que enfrentar...

Exatamente naquele momento.

- KUROSAKI ICHIGO! – Rukia apareceu gritando assim que o alarme cessou. – EU NÃO POSSO FICAR UM SEGUNDO LONGE QUE VOCÊ ESTRAGA TUDO?!

Ele tremeu dos pés à cabeça. Ela parecia naquele momento mais infernal do que o Infernal-sama.

- Ru-Rukia... – ele gaguejou. – Volte a dormir! Tá na sua hora de descanso!

E os bebês não calavam as malditas bocas.

- Tá na hora é de você tomar vergonha na cara! O que você fez agora?! – ela estava vermelha de raiva.

- E-eu... – ele engoliu em seco. – Ela vomitou em mim! – mostrou a blusa atrás toda suja.

- E por causa disso você jogou ela longe?!

- Não! – ele gritou em defesa própria. – Eu deixei ela cair!

- Há! – ela virou os olhos com escárnio. – Grande diferença!

Aquilo fez o sangue dele ferver ainda mais. Como se não estivesse sendo tudo tão difícil pra ele. Como se ela não fosse enlouquecer com um bebê lhe vomitando as costas. Como se ele pudesse pensar com aquela dor de cabeça e aquelas crianças gritando sem parar!

- Rukia, vai dormir! – ele gritou. – Isso aqui é problema meu e eu vou resolver!

- Não é problema só seu! – ela nem ligou pro estado alterado dele. – Agora só sobraram três erros! Três erros!!!

- Tudo bem. – ele olhou-a desafiadoramente. – Eu vou deixá-los pra você.

Ela ficou quieta o olhando seriamente. Alguma coisa no tom dele estava diferente, ela percebeu.

- Eu preciso saber cuidar de um bebê, não é o que você sempre diz?! Então eu vou cuidar melhor que você. Não se meta nas minhas três horas de trabalho!

Ficaram se encarando por um tempo. Os dois com os semblantes duros e fechados.

Ele tinha razão... Precisava aprender mais do que ela.

- Então é bom que saiba mesmo o que está fazendo. – ela disse ainda com uma cara séria, mas sem força na voz. – A vida da sua futura filha depende de você não errar mais. – deu as costas e voltou para a cama.

Ele suspirou com força. Naquele momento nem ouvia as vozes chatas das crianças. Só ouvia seu coração martelando no ouvido. Por que é que tinha dito aquelas coisas? Mágoas? Vingança? Uma explosão do que estava guardando? Foi a dor de cabeça o atormentando? Ou estava mesmo ficando maluco e perdendo o juízo?

Não importava. Ia dar o seu melhor naquela missão e provar a ela que seria um ótimo pai. Não importava para qual filho ela achasse que ele seria.

 

****

 

Pouco depois das nove da noite, assim que Ichigo havia satisfeito a última necessidade dos bebês para o seu turno, foi direto acordar Rukia.

- Rukia, acorda. – ele chamou calmamente.

Ela abriu devagar os olhos.

- Qual o problema, Ichigo? Tá apanhando pras fraldas de novo? – ela perguntou bem baixinho, com aquela voz de quem acaba de acordar.

- Não idiota. – ele ficou com raiva. Mas ao mesmo tempo orgulhoso de dizer a próxima frase. – Eu terminei o meu turno.

Ela franziu as sobrancelhas. Então era verdade? Ele havia terminado o turno sem mais nenhum alarme ou gritaria?

- Que ótimo. – ela bocejou e olhou bem para ele. – Agora voltamos a cuidar dos dois juntos.

- Sim. – ele assentiu. – Mas antes você precisa comer alguma coisa.

Ela levantou, calçou suas pantufas de coelhinhos e foi esfregando os olhos até a cozinha.

- É... Tem razão, estou com fome... Vou preparar o jantar pra... – mas quando chegou lá, perdeu a fala. A mesa já estava posta e o jantar estava pronto à sua espera como num passe de mágica.

- Ué... Mas... – ela ficou confusa pensando. Será que tinham ganhado uma cortesia do Infernal-sama? Há! Até parece! Pelo visto não tinha acordado por inteiro ainda.

- Que fique claro que eu não fiz esse jantar para te agradar. – ele fez uma careta azeda e sentou-se à frente dela. – Só fiz para te provar que eu posso cuidar de duas crianças sem arrumar confusão e ainda fazer o jantar!

Ela absorveu as palavras dele e sentou-se diante do prato. Quase sorriu. Ele era muito determinado. Quando cismava com uma coisa, conseguia fazê-la perfeitamente. Ele acreditava e fazia. Tirava forças de não se sabe onde e fazia.

- Muito bem Ichigo. – ela deixou-se sorrir, mas com várias pitadas de ironia nos lábios. – Já pode ser uma excelente dona de casa.

- Argh, sua... – ele cerrou os dentes irado e ela riu.

- Ah... E você? Não vai comer? – percebeu que não havia prato para ele.

- Eu só fiz esse jantar de pirraça. – ele admitiu olhando pro outro lado. – Eu já comi antes. Tudo que eu preciso agora é de uma cartela inteira de analgésicos...

- Tem na minha mala. – ela disse depois de engolir a prova da comida. – Pode pegar.

Ele levantou-se.

- Valeu.

Ela olhou para ele num sorrisinho pequeno.

- Eu que agradeço. A comida está ótima!

 

****

 

No meio da madrugada, os choros recomeçam.

- Ah, não... – Rukia resmungou. – Eu já to levantando... – mas o seu corpo não obedecia. Precisava de sono. Precisava de descanso.

Ela acabou sonhando que estava levantando da cama e indo até William... O menino só queria que ela o pegasse no colo e...

- AHHHH! – ela levantou assustada com o barulho da sirene estremecendo a cama. – Ichigo! – gritou, mas quando deu por si, percebeu que o ruivo trocava a fralda de Mildred no fraldário, todo enrolado.

- Me desculpe! – ele virou-se perdido com talco no rosto. Tossiu um pouco com todo aquele pó. – Mas eu não consegui terminar de trocá-la a tempo de...

A culpa não era dele! Era dela! Ela que não tinha levantado!

Levantou-se o mais rápido que pôde então e foi ao encontro de William. Mas agora já era... Faltavam apenas mais dois erros.

- Eu fui a culpada Ichigo. – ela admitiu sonolenta e brava consigo mesma.

 

****

 

Estava na hora do almoço do dia seguinte. Tudo havia corrido bem... Quer dizer... Bem no sentido de mais nenhum erro. Porque aqueles dois não tinham forças nem para brigar um com o outro.

- Eu... Vou... Matar... O Infernal-sama... Com estrelinhas afiadas... – Rukia tentava falar, com a voz mole e arrastada. Estava sentada na cadeira segurando William no colo e lhe dando mamadeira. Parecia que havia perdido o controle sobre o que pensava e transformava em fala.

- Não só você, Rukia... – Ichigo dizia de olhos quase fechados, balançando suavemente a ruivinha nos braços enquanto andava. – Não só você...

A pequena não agüentou. Fechou os olhos com a desculpa de descansá-los e acabou cochilando.

Pena que o ruivo também sonolento só percebeu quando a criança de cabelos pretos estava se afogando em leite.

- RUKIA! – ele tentou alertar.

Mas o alarme veio um milésimo de segundo depois quase fazendo Rukia cair da cadeira.

- AI MEU DEUS! O QUE HOUVE? – ela olhou pros lados assustada e então percebeu o boneco banhado em leite. – Droga! – ela praguejou e levantou para pegar um pano e secá-lo. – O destino é irônico mesmo. Falta só um erro e eu estou gastando tudo!

Ichigo tentou reprimir o seu lado que se sentia vingado. Mas nem foi tão difícil. Afinal, eram apenas mais dois erros para que tivesse que pagar o maior mico da sua vida!

Os bebês pararam de chorar satisfeitos com o almoço. Rukia foi na frente levar William para o berço e quase morreu do coração quando a sirene gritou DE NOVO!

- NÃÃÃO! – os olhos dela encheram d’água na hora. – O que foi que eu fiz dessa vez?! Eu não fiz nada! Não fiz nada pelo amor de Deus! Isso é calúnia! – começou a gritar descontrolada para o invisível. Sua intenção era atingir Celeste-sama.

- Calma Rukia! – depois que a sirene parou, Ichigo segurou os braços dela. – Fica calma! Acho que você só errou de berço! – ele tirou o menino do berço rosa e colocou-o no azul.

- Ahhhhhhhhhhhh!!!!!!!!!!!!! – Rukia gritou desesperada como nunca tinha gritado em toda vida. – ELE VAI ME PAGAAAAR!

- O travesseiro, Rukia! O travesseiro! – Ichigo entendia de alguma forma o chilique dela.

Ela então correu até a cama e começou a socar o travesseiro até se sentir mais calma.

 

****

 

Sete e meia da noite e eles passeavam com os bebês de um lado para o outro. Nem havia mais analgésicos para tomar. E a dor de cabeça parecia que não passava nunca. Pior: parecia que aumentava.

Faltava apenas uma hora e eles não podiam mais escorregar em nenhum erro. Nenhum! Talvez fosse esse o motivo da dor. A preocupação os estava levando à loucura.

- Oh meu Deus! – Rukia não tirava os olhos do relógio de parede. – Eu prometo que se não errarmos mais nada até as oito horas, o Ichigo vai passar uma semana sem reclamar de nada!

- Ei! – Ichigo gritou.

- E ele vai sorrir e dar bom dia para as pessoas.

- Rukia... – ele chamou entre dentes.

- E vai pentear o cabelo direitinho!

- Rukia, prometa alguma coisa que você possa fazer! Não eu! – ele ralhou no seu limite de raiva.

- Como? Eu já prometi tudo que eu tinha pra prometer! Agora só me restou você!

Ele ficou quieto. Pensando bem, estava fazendo qualquer negócio para aquele pesadelo acabar logo.

Dez segundos para as oito. Nunca secaram tanto um relógio em toda a vida.

- Dez, nove, oito, sete, seis... – ele foi contando.

- Cinco, quatro, três, dois... – ela continuou.

- UM! – os dois gritaram juntos.

E a porta se abriu.

- E então meus queridos jovens? – Celeste-sama apareceu com aquela cara-de-pau e o sorriso mais odioso do mundo. – Tiveram uma maternidade e paternidade estreladas?

 

 

Continua... 

 


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