Para Jamie, que tomou vergonha na cara. (juroqueparei-q)

Consultas

...and if you left I would be two-foot small

Raiva.

Aquele era um sentimento ao qual Sasuke estava completamente habituado, mas a situação agora era inegavelmente diferente de todas pelas quais ele já havia passado. A raiva nunca antes fora voltada contra ele mesmo. Contra os outros sim, contra Naruto sempre, mas jamais contra si próprio... E no entanto ali estava ele, sentado na cadeira de seu escritório e com tantas coisas passando em sua mente ao mesmo tempo que mal sabia por qual delas começar.

Provavelmente foi por estar tão perdido que chamara Naruto ali, e agora se arrependia amargamente de ter agido pelo mais simples impulso – outro tipo de ação que simplesmente não cabia ao seu ser.

"-Porque não tenta flores? Sempre que eu faço algo idiota eu levo flores para a Hinata." – ergueu os olhos vagarosamente para o loiro à sua frente e pensou em respirar fundo, mas nem aquilo estava adiantando naquela tarde.

Havia saído da casa de Sakura tão rápido quando acordara e com tanta vergonha que nem se quer passara na sua própria para tomar um banho ou trocar de roupa. Sua cabeça doía ao mesmo tempo que funcionava a cinco mil rotações por minuto e agora Naruto lhe mandava dar flores à garota que ele disse na noite anterior que queria comprar...?

Ridículo. Ela provavelmente pensaria que as flores eram parte da negociação ou do pagamento e ele não tinha muita certeza se saíra ileso uma segunda vez.

Aliás, parando para pensar um pouco se Naruto realmente levasse uma flor para a pobre Hinata cada vez que fizesse algo idiota os dois já deveriam estar vivendo em um jardim botânico. E também ele não era o tipo de homem que levava flores à uma mulher... Odiava flores por mais de um motivo e já havia se esforçado para deixar todos eles claros mais de uma vez. Tudo bem que fora obrigado a levar flores para Temari quando a pobre cruza da bipolaridade dela e da calma de Shikamaru nasceu, mas aquele havia sido um caso à parte que jamais voltaria a se repetir e...

"-Também pode levar ela pra jantar! Tem um restaurante que serve um ramen delicioso na quadra debaixo da minha casa e..."

Levou uma mão às têmporas e as massageou levemente. Primeiro que Sakura nunca aceitaria sair para jantar com ele, daria sorte se ela quisesse se quer vê-lo... Segundo que jantar de reconciliação – se é que podia dar esse nome àquilo – e ramen simplesmente não cabiam juntos na mesma sentença. Terceiro que Naruto estava o fazendo desviar o foco de seu pensamento de como resolver aquele problema para como matá-lo de maneira rápida, silenciosa e efetiva.

É... As coisas estavam ficando realmente difíceis e muito longe de chegarem à uma solução.

Tudo tendia só a piorar uma vez que estava começando a se questionar do motivo pelo qual chamara Naruto para ser seu conselheiro naquela situação. Quer dizer, ele só era casado porque Hinata inevitavelmente teve que esfregar na cara dele que era apaixonada e ter praticamente o pedido tanto em namoro quanto em casamento; logo, o conhecimento daquele dobe naquele campo ficava entre a casa do zero e do menos um.

Não que ele próprio também tivesse muita experiência na área... Nunca fora paciente com mulheres e todas as namoradas – ou pseudo-namoradas – que tivera o irritaram o suficiente para ele desejar comprar um foguete e passar férias na Lua. O que não era má idéia, uma vez que até onde se tinha notícia era um local não habitado e inóspito para a proliferação da praga chamada raça humana.

"-...Veio pedaços pequenos de frango e eu realmente tive que reclamar, e depois que arrumaram eu passei mal e dei sorte que a Sakura estava de plantão e..." – arqueou uma sobrancelha, fitando o loiro como se ele tivesse acabado de dizer algo que finalmente fazia algum sentido.

...E realmente fazia. A primeira vez que a vira fora devido ao afilhado doente. Depois Naruto e seu braço quebrado devido à mais uma peripécia mal sucedida. Na seqüência teve o nascimento da pirralha e depois a imbecilidade de Kakashi... Os filhotes de hiena da caridade e seus livros nada infantis, o apêndice de seu irmão e finalmente a festa. Listando os primeiros encontros que tivera com ela ficava fácil perceber uma semelhança... Consultas.

Talvez tudo que tivesse que fazer era passar mal e dar a sorte dela ser a médica de plantão. Aquela parecia a maneira mais fácil, simples e indolor de chegar até ela.

Agora só havia mais alguns poucos problemas: que tipo de criatura imbecil se auto infligiria dor e mal-estar? E, mais do que isso, como fazer uma idiotice daquelas parecer completamente acidental e cotidiana?

Não era como se ele ficasse doente o tempo inteiro. Aliás, muito pelo contrário, era raro encontrar pessoas com a saúde e resistência que ele tinha. Logo...

Ergueu os olhos para Naruto mais uma vez, levando uma mão ao queixo enquanto ignorava completamente o rumo que o monólogo dele havia tomado. Se o observasse em uma base diária talvez pudesse aprender um pouco... Não deveria ser assim tão difícil ser um completo idiota. Quer dizer, haviam tantos que aquilo só poderia significar que o grau de facilidade para se tornar um era grande... Ou isso ou Deus deveria realmente gostar de criar gente estúpida e espalhar pelo mundo.

Aquele tipo de pensamento o servia apenas para lembrar em como ele gostaria de ter poderes divinos algum dia... Acabaria com a humanidade antes mesmo que alguém pudesse gritar 'Sasuke'. Talvez salvasse algumas pessoas. Poucas.

Sakura definitivamente seria uma delas.

Ou não.

Porque daí teria que ver rosa todos os dias e com certeza haveriam estetoscópios verde-limão envolvidos no cenário.

Mexeu-se incomodado quando percebeu que no fundo não se importava com aquilo, até mesmo achava adorável – se é que aquela era uma palavra que ele sabia como usar.

"-...E foi assim que resolvi mais esse problema! O que achou, Sasuke?" – piscou por pelo menos duas vezes antes de compreender que Naruto aparentemente havia terminado sua narração.

"-Não achei nada." – suspirou, olhando para o telefone por instantes enquanto sua mente trabalhava rápido para voltar à sua idéia anterior. Então ela brilhou como um letreiro de cabaré desregulado. – "Naruto, o que acha de vermos um filme e comermos pipoca com aquele seu molho especial?"

...A julgar pelo silêncio e pela falta de resposta aquele pedido havia mesmo causado surpresa. Ele mesmo estava surpreso. E com um pouco de medo também... Quem poderia garantir que com aquela experiência seus órgãos seriam capazes de resistir? Quer dizer, se Naruto ainda estava vivo a coisa toda não podia ser assim tão letal... Kakashi mesmo havia sobrevivido sem seqüelas se ele levasse em consideração que o mesmo já era seqüelado antes daquilo.

"-...Teme, ta falando sério?" – o loiro levantou-se, analisando os cantos da sala de maneira minuciosa e certificando-se de olhar debaixo da cadeira. – "Isso é pegadinha, né?"

Girou os olhos. Aquilo realmente seria mais difícil que o esperado... Um teste à sua paciência, sanidade mental e saúde ao mesmo tempo.

"-Esquece."

"-...Não, não!" – Naruto se levantou, gesticulando de maneira rápida demais. – "É claro que eu tenho pipoca e molho. Posso escolher o filme também?"

Sasuke sabia que se arrependeria amargamente da resposta que estava prestes a dar, mas...

"-Pode, dobe. Mas se não for pedir demais tente-"

"-Eu sei o filme perfeito! Tenho uma seleção de filmes que você vai adorar, teme, já viu Beethoven? Eu tenho do um ao quatro, pode escolher se quiser!"

...tente escolher algo não tão estúpido era o que ele ia dizer.

"-...Que seja. Só se certifique de realmente levar o molho da pipoca." – apontou, levantando-se de sua cadeira e afrouxando um pouco o nó da gravata. Aquela seria uma longa tarde... E se tudo corresse perfeitamente bem também seria uma longa noite.

"-Hm..." – parou na porta quando Naruto o cutucou no ombro, fitando-o por um instante. – "Sasuke?"

"-Qual o problema agora, Naruto?"

"-Ainda estamos em horário comercial." – apontou para o relógio que havia em cima da porta e Sasuke quase riu.

Desde quando Naruto preocupava-se com horário comercial...?

Talvez depois das mais de mil conversas que tivera com ele sobre chegar no horário, sair no horário e respeitar o ambiente de trabalho. Parece que todas aquelas manhãs perdidas com ele em seu escritório haviam finalmente surtido algum efeito e...

"-...Não que eu realmente me importe com isso, mas você é meu chefe e isso é... Estranho. Normalmente tenho que fazer as coisas escondido de você pra não ter que ouvir aquele papo chato de chefe insuportável, e não estou querendo dizer que você é um, mas é que-"

...Não. Porque mesmo cogitou a possibilidade da mente de Naruto ter assimilado alguma coisa em todos esses anos? Estava realmente começando a ter fé demais nas pessoas, o que poderia vir a ser um problema mais tarde. E agora.

"-...e tem mais toda aquela coisa de protocolos e eu tenho alguns pra ler ainda hoje e mais uns quatro atrasados da semana passada, e isso você não precisava ficar sabendo mas eu acho pelo menos justo que nossas mentes estejam limpas e sem remorso algum enquanto assistimos a um filme cheio de mensagens poéticas e lições de vida, mas..."

Se havia alguém com uma capacidade melhor de estabelecer monólogos e falar asneiras do que Naruto no mundo, ele agradecia aos céus por ainda não terem sido apresentados. Se continuasse sem interrompê-lo aquilo provavelmente tomaria a tarde toda – tempo que ele não tinha disponível para perder... Pelo menos não com aquilo.

"-Está bem, está bem. Podemos ir, sou seu chefe e estou te dispensando." – quase mudou de idéia quando um sorriso surreal surgiu na face do loiro e ele adiantou-se para abrir a porta e sair. – "...E que fique claro que isso não vai se repetir nunca mais."

"-Claríssimo!"

"-...E, Naruto? Mais uma coisa."

"-Seja breve teme, tenho que passar em casa pegar os DVDs e o molho especial à lá Naruto." – torceu o nariz só de imaginar a tortura visual, auditiva e estomacal à qual estava se voluntariando a participar...

"-Se comentar com alguém sobre isso, é um homem morto." – passou rapidamente por ele quando o mesmo parou de andar, e voltou-se para trás apenas quando a porta do elevador se abriu e ele entrou, deixando Naruto para o lado de fora. – "E não duvide disso." – acrescentou antes que se fechasse, dando uma bela olhada no relógio de pulso enquanto descia para a garagem.

Tinha que se preparar. Se é que aquilo realmente seria possível.