Shindu Sindorei - as Crianças do Sangue escrita por BRMorgan


Capítulo 51
Capítulo 51


Notas iniciais do capítulo

Um capítulo para colocar as coisas mais calmas aqui.



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Dragonblight, aos arredores de Azjol-Nerub exatos 12 anos atrás.


                Elfos-do-sangue, nunca gostou deles. A cultura inferior que explora os recursos arcanos e nunca devolve nada de bom ao mundo. Bípedes imprestáveis feitos de carne frágil e imunda. Manchar o chão com as vísceras deles é morte para a terra fértil. Sangue ruim e venenoso. Como podem ser tão audaciosos de quererem entrar em seus domínios com seus filhotes barulhentos, seus animais igualmente podres por dentro e impondo sua força mágica? Fazem uma grande festa, há deles de todos os tipos para todos os cantos, a fogueira aquece aqueles mais friorentos, e a bebida intragável à aqueles fracos de coração. Tambores e cantos e música por todo lado, há dança e agitação e tentativas falhas de aproximação, há deles desiludidos, outros desavergonhados, outros apaixonados, há muitos deles aqui esperando por qualquer coisa. Mas não pelas suas presas e sua fúria.

Sempre soubera que mamíferos como eles eram irracionais. Até Worgs da montanha eram mais inteligentes que eles. Até os malditos Vrykulls com suas pernas longas eram mais perspicazes que esses malditos bebedores de cerveja mau-cheirosa e péssimo hálito. Todos se encostam, se esfregam, demonstram o quanto estão felizes com esses gestos absurdos de carinho e afeição, a caçadora disfarçada na neve com seu melhor manto translúcido os desprezava mais que nunca agora. Mais ainda pela dor latejante em uma de suas patas feridas por culpa de um machado dos malditos. “Um monstro!!” gritaram ao vê-la se esgueirando graciosamente entre as árvores. Suas árvores,, sua casa, seu domínio. O nome do desgraçado a infligir o golpe, não saberia recordar, mas observava-os de seu esconderijo protegido no montículo de neve do mesmo tamanho de seu corpanzil. A Rainha tanto prezava pelos seus costumes, suas histórias, quantos por aí gerando famílias de mamíferos imprestáveis ao Plano Infinito. A mesma Rainha estava morta agora pelo traidor Anur’barak e seus comparsas. Seu reino entregue aos infiéis, sua cultura dizimada pelo Flagelo do Maldito Menethil. Algum dia teria a maravilhosa notícia de que ele tombara em combate e sabia muito bem a quem recorrer para que isso fosse o mais rápido arranjado.

Sylvanas Windrunner. Ela seria a chave-mestra de todos os acontecimentos em Azeroth, inclusive a derrota do Grande Mal. Prioridades. “Prioridades!”, ela gritou dentro de sua cabeça cheia de ódio e vingança e mágoa por não ter ficado e lutado como uma verdadeira filha de Vissier faria. “És a feiticeira dos Vissier, Carrie! Ficas de fora de tal conflito! Tua missão está com os Grandes Poderes, longe dos olhos dos Ancestrais, além de nossa compreensão.”, maldito dia em que foi ouvir sua mãe proferir tais palavras. E agora estava ali para sua prioridade maior: Um belo recém-nascido mamífero desprotegido, tão careca e aleijado e torto e incrivelmente esperto. Esse em especial a surpreendia pela aura acobreada que só apenas um dos leviatãs mais poderosos do Plano Infinito poderia ter. Um bebê fedido e chorão era a sua Missão.

Seria esse mamífero a salvação de seu Reino?

Estufou o seu abdômen gelado pela temperatura abaixo de zero em Dragonblight, estava estática ao chão, patas bem grudadas ao chão, seu tronco humanóide arqueado para que sua cabeça pudesse ter uma boa visão do vilarejo dos malditos. O que mais a cansava era sua pata ferida, não poderia curá-la normalmente pelo efeito nocivo do metal fundido e prateado dos malditos mamíferos. Doía e dilacerava e destruía suas esperanças de uma vingança sangrenta, mas observar bem seu inimigo fazia parte de sua missão, seu destino. E nunca se deve escapar do Destino por mais cruel que ele seja.

O festejo continuava sem perceberem sua presença, menos mal. Se era para promover o terror para disfarçar seu intento, que fosse com muitas testemunhas da atrocidade, mas não do assassino. O seu alvo se aproximava, ela podia sentir. Como moscas atraídas para um monte de carne decomposta, era isso que eram. O mamífero maior segurava bem o seu alvo. Como uma mão zelosa com sua cria. Malditos mamíferos que só pensavam em se reproduzir e alimentarem o chão com os corpos dos ancestrais vulgarizados. Odiava-os mais esse pedaço de carne nos braços da jovem mãe, Bem-Nascida, as orelhas pontudas que tanto escutam o perigo chegar, mas ela era bem mais esperta que esse humanóide viciado em magia, propagadores de tantas máculas ao Plano Infinito. Subindo silenciosamente em sua teia já posta em uma das árvores acima de seu alvo, a aracnídea fez uma volta em seu próprio corpo e com destreza impressionante fincou seu ferrão bem no centro do tronco do mamífero fêmea. O seu alvo escorregou de seus braços e calculando a queda, a caçadora envolveu a pequena elfa em uma teia de proteção, já a elfa mais velha caiu de joelhos na neve, olhos vidrados no horizonte, saliva amarga e esverdeada escorrendo do canto de seus lábios e a expressão de puro horror.

O horror de ser traída pelo Destino quando se considerava a mulher mais feliz do mundo.

Joannes Lórien não viu sua vida passar pelos seus olhos especiais. Não sentiu o Dom da Profecia anunciar essa emboscada do Destino e muito menos soube como sua única preciosidade havia sido arrancada de sua proteção. Paralisada pelo veneno potente e o enrijecimento dos músculos, ela caiu inerte na neve. Sem testemunhas, sem seu herói vindo dos céus para salvá-la da inevitável Morte.


 - Amaldiçoado seja o dia em que tua vida foi liberta do aconchego do ventre materno... – a assassina praguejou em pensamento para essa criaturinha que agora segurava firmemente em seus braços doloridos da luta anterior contra seja lá o que aquela coisa se tornou. O bebê se divertia com seu balançar característico de quadris, escarnece do peso que ocupa em seus braços, com as feridas que purgam seu abdômen, com a confusão e rasgos em suas vestes de combate. Sempre odiara ser a guerreira de linha de frente em Azjol-Nerub. Seu Destino era ser a Feiticeira dos Visser, trazer a salvação ao seu Povo, livrar todos do Grande Mal. A quentura que esse mamífero em específico exalava era detestável, o cheiro de carne nova e levemente suada a enojava profundamente e os olhos acobreados que tanto a encaram com uma simples pergunta que não ousava responder: "Aonde está ela?" - Que os Titãs engulam seus parentes vivos, vermezinho! Não me importo! – ela responde imediatamente quando encarava o pequeno pacote de ossos e carne que se mexia e fazia sons bobos. A criatura detestável sorriu sem dentes, ela riu de seu sofrimento, de sua perda, ela a odiava por ser quem era. Feiticeira dos Visser. Por que não a matou quando teve oportunidade? Por que não a jogou morro abaixo e esperou que o Destino fizesse seu papel implacável? Por que se acostumava cada vez mais com o peso ínfimo e o cheiro de novo desse saco de ossos ambulante e defeituoso? Por que a aproximou de seu corpo de exoesqueleto e a sentiu arfar vagarosamente, esse tambor primitivo que retumbava dentro dessas películas frágeis chamadas pele e músculos? Por que a sensação que era transmitida pelos seus nervos endurecidos pelo seu corpo e pelo tempo dizia que não em hipótese alguma poderia machucar tão insignificante ser? Como uma reação involuntária perpetuada por algum deus ancestral - e pelo seu Povo, como desejava que não fosse o Grandioso a convencê-la de tais ações - ela mordiscou a mãozinha da criança em um gesto de afeto, mas logo interpretada pelo maldito saco de ossos como violência. Sangue saiu do ferimento que a infligiu. A coisinha chorava agudamente, como todos deles faziam ao serem maltratados. - Pedaço de carne obtuso! Apenas a acariciei como faço em uma cria em nosso povo! Deverias ficar lisonjeada pelo meu afeto! – e a agitando violentamente em suas mãos, exclamou: - Maldita! Maldita! – a criança parou de chorar com tanta agitação. Ria, na verdade. Só poderia ser zombaria! Encaixou-a entre o espaço de seu ombro e seu rosto, colocando a cabecinha nada memorável da criaturinha desprezível encostada em seu pescoço para pelo menos se familiarizar que ali havia alguém viva e com o mesmo ritmo cardíaco. Lágrimas pegajosas sujaram seu colarinho, mãos pequenas buscavam apoio e puxou sua máscara para fora de seus olhos. Carrie-Ahk não a tirou do lugar, mas a sacudiu levemente para que entendesse quem era a superior dali. A criaturinha obedeceu prontamente, agarrando-a insistentemente pelas suas vestes e diminuindo o choro. - Pelas minhas quelíceras venenosas! Como a odeio por esfregar esse focinho úmido em minha pele! – resmungou com asco, ao se pendurar furtivamente em sua teia recém-formada. Tocou seu pescoço lambuzado do líquido nojento que a criaturinha tanto expelia pelas narinas. Como o ser humano era asqueroso!

                Mistress Carrie armou sua teia especial e confortou o pequeno bebê ali para que nada o atingisse, nem frio, nem vento, nem chuva. Descansou sua pata ferida em outra teia medicinal fixada em seu abdômen e fechou os olhos. Agora sim teria paz! Mataria a criaturinha quando acordasse. Sim, a mataria por ousar desafiar sua missão.


Dias atuais em Undercity.


Lady Annie andava livremente com sua maçã mordida em diversos lugares, observando bem o cotidiano daquele lugar pitoresco. A garotinha não achava que a cidade subterrânea era um lugar péssimo para viver, até achava seguro e bem estruturado para se esconder e viver por muito tempo sem ser ameaçada de morte ou procurada pela milícia de Valgarde. Mas havia “ela”. Ela sempre estaria ali a espreitando nas escuras, tecendo suas idéias de vingança como fazia com teias que alojava nos tetos desocupados da cidade. Ela só esperava um movimento em falso e zás! Seu corpo estaria estripado em dois ali bem no meio do Trade Quarter e ninguém daria falta. Ninguém choraria pela perda. Outra "humana" despejada nos esgotos escondidos. Apesar dessa preocupação momentânea, comia sua maçã pouco se importando com as ameaças de dentro e de fora. Se o seu estômago estava cheio e calminho, Lady Annie estava feliz. Nada era melhor que uma boa refeição, um aperitivo antes, depois, durante, e sobremesas! Como adorava sobremesas frias! Mas nem em Valgarde conseguia roubar algo do tipo, tinha que comprar em outras áreas para experimentar o gosto dos morangos congelados de K3, a raspadinha de frutas dos Kalu'ak ou aquelas tacinhas de mel quente misturado com chocolate dos Vrykulls.

Mordeu outro pedaço e sentou-se no parapeito da ponte entre o Royal Quarter e o Apotecário, balançando as pernas e ruminando uma musiquinha de sua infância. Abominações vigilantes passavam apressadas, outras estáticas no chão, alguns deles circulando pelas quadras em busca de alguma coisa, estranho ver mortos-vivos que buscam algo além de miolos para se alimentarem. Sorriu para si mesma, era muito sortuda por saber desse lugar e ninguém mais. Teriam inveja dela lá em Valgarde, ficariam roxos de invejas pelas histórias de sua aventura nos continentes ensolarados, de seus duelos com monstros sem nome na língua dos Vrykulls, de suas artimanhas feitas para escapar das garras de Mistress Carrie. Riu um pouquinho mais alto e iria morder vigorosamente a maçã. Uma teia fina se enrolou em seu punho e fez o alimento cair nos esgotos esverdeados.

 - Heeey!! - ela exclamou revoltada, mas logo se encolheu pulando do parapeito para o começo da ponte, era Mistress Carrie subindo as escadas. - Eu estava comendo isso...! - tentou apaziguar seu primeiro tom revoltado. A aracnídea a rodeou por alguns momentos e a espetou com um leve apontar de seu dedo indicador em seu ombro. - O que é?

 - Estou vendo se a sua carne já está macia de se degustar... - a menina deu um sorrisinho sarcástico de volta.

 - Até parece... - cutucando dentro dos bolsos para ver se tinha mais moedas. A regra imposta por Mistress era de não roubar dentro de Undercity e ela obedecia como podia. Mas não queria dizer que poderia roubar os viajantes lá fora.

 - Qual seria sua motivação para comer tanto?

 - Fome? Estômago ronca, essas coisas? - e dando-lhe as costas foi descendo os degraus e indo novamente para o Trade Quarter. – Você é a doutora-morte daqui. Deveria entender como funciona... - Mistress atravessou a ponte rapidamente e a acompanhou bem de perto.

 - Não entendo é esse seu apetite voraz...

 - Ahn... Fome? Já disse isso.

 - Você já comeu o bastante para uma família inteira hoje.

 - Vai ficar regulando minha ração?! Oh peraê! Você tá é me mimando?! Vigiando como que nem uma mãe zelosa né? Hahahahaha!

 - Calada! - um cutucão afiado em suas costelas a fez parar de rir. - Você criaturinha desprezível tem um modo peculiar de se alimentar... Isso sim me interessa...

 - Por que aí a minha carne estará fácil de degustar? - repetiu ela esperando uma resposta sarcástica.

 - Sua carne é letal para meu paladar.

 - Bom saber! - e chegando ao imenso complexo do Trade Quarter ela suspirou alto e disse em uma voz inocente. - Olha... Um kodo voador... - apontando para um lugar vazio perto das escadas.

 - Um o quê?! - Mistress olhou mesmo assim e depois fechou os olhos para se conter por ter caído na brincadeira. Novamente os poderes da menina estavam aflorando depressa demais. Lady Annie desaparecera de sua frente sem deixar pistas.

Floresta Eversong décadas atrás.


 - Vereesa Windrunner sempre tão concentrada nos estudos, Alleria o exemplo de toda garota élfica em Silvermoon, Lirath o garotinho mais levado dos arcanistas-mirins, o esguio e rápido Andrus e os gêmeos Windrunner. Estou te dizendo, muitos ouvirão dessa família. Os Windrunner. – dizia um taurino afiando um graveto para fazê-lo de espeto. Seu nome era Cairne Bloodhoof e ele era conhecido pelas suas andanças em Azeroth. Quem o escutava era um ávido seguidor em sua forma de imensa águia. – Não sou muito chegado a elfos. Eles são estranhos demais para eu poder entender a complexidade. Deve ser isso o problema deles? Às vezes a simplicidade é tudo na vida... – o fogo estava preparado e o leitão separado e salgado ali perto. A águia crocitou alto. – Sim, minha amiga... Aqueles que regem as leis da natureza trazem os segredos bem escondidos! – apontando para o Windrunner Spire no final do horizonte. – Eventos acontecerão e jamais poderão ser revertidos, mas dentro das cinzas... – tirando um pouquinho de pó xamânico de seu bolso externo do cinturão e jogando em cima da fogueira. As labaredas crepitaram em uma mistura de cores ao mesmo tempo. – Nasce a esperança de um novo mundo...

 - Cheguei atrasada pro jantar? – disse alguém aparecendo furtivamente nas sombras.

 - Não, você sempre chega na hora da comida, não mocinha?

 - Foi mal tio Cairne... – a jovenzinha de cabelos longos e acobreados sentou perto do fogo e estapeou um montinho de neve que estava em seu ombro direito. – Notícias do front.

 - Diga.

 - Já aconteceu.

 - Bem... E então?

 - As coisas vão piorar. Assim, muito. Não podemos...?

 - O que será que o Grande Leviatã acharia disso?

 - Vovô é moleza na conversa, o ruim é convencer meu pai.

 - Então creio que deixar como está é mais seguro que mudar o curso de uma nação inteira.

 - Senhor sabe que isso não vai acabar bem não é? – Cairne bufou impaciente e fincou pedaços de carne de porco no graveto. – Que vai causar um estrago enorme na vida de quem participar disso? E acredite, lá na frente isso vai dar um bafafá...

 - Apenas se concentre em sua missão, sim? – disse o taurino sabiamente e apoiando o graveto com as carnes em um pedestal de gravetos maiores. – Achou o arco?

 - Arram. Papai mandou lembranças.

 - Ele é um cavalheiro admirável... – os dois ficaram ali observando o fogo crepitar e a carne assar. A águia empoleirada em uma pedra a frente deles piou baixinho, a mocinha meio-elfa concordou. – Me entristece saber que tudo será premeditado. Pobres Crianças do Massacre, não saberão quem começou a Guerra sem Fim...

 - Me entristece é que não vou poder nem comer metade desse leitão...



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Notas finais do capítulo

R.I.P. Sylvos/Derris.Todo mundo gostou de você (Creio eu.).



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