Shindu Sindorei - as Crianças do Sangue escrita por BRMorgan


Capítulo 29
Capítulo 29




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Dalaran, dias atuais.

 - Ele está lá fora... – cantarolava Sorena olha do pela janela do dormitório no andar de cima da Taverna Crisálida.

 - Schiiiu! Deixa eu dormir! – Imladris forçou seu travesseiro contra a cabeça e se cobriu mais com os lençóis.

 - Ele está com um arranjo de flores na mããão...

 - Não, ele não está! – exclamou a clériga debaixo do travesseiro.

 - Ele vai te pedir em casamento. Vai sim. Posso sentir daqui. E vocês terão clérigos em miniatura e paladininhas birrentas...

 - Pára!!

 - Krassus e Immie debaixo de uma árvore... – o travesseiro voou pelo quarto e Sorena se abaixou na hora. – Arrá! Reflexos de tigre! Grrrrrau!! – a mais nova provocou fazendo garras com as mãos. Já o travesseiro foi parar na cabeça de alguém.

 - Mas que raios tá acontecendo aqui?! – Oxkhar recolheu o travesseiro do chão e o colocou na cama de Sorena. Imladris havia levantado em um pulo só e tentava ajeitar os cabelos desgrenhados e o manto de dormir amarrotado.

 - Immie está fugindo de um antigo namorado... – Sorena assoviou apontando para o Paladino Krassus lá embaixo. Oxkhar foi olhar.

 - Nossa, Immie você namorou o Krassus? Ele é bom! – as duas o olharam desconfiadas. – Bom no sentido de ser um ótimo guerreiro e paladino disciplinado. Fez uma escolha bem pensada hein, Immie?

 - E-eu não estou namorando o Krassus! Sua irmã que inventa essas coisas... – correndo para o closet perto do quarto para trocar de roupas. Os irmãos se olharam por um segundo, Sorena deu de ombros.

 - Mulheres... – ela disse.

 - Elfos... – ele disse.

 - Está fazendo o quê aqui? Esse lugar virou ponto turístico?

 - Estou com a Comitiva de Warsong. Estamos prestes a entrar em acordo com Kirin-Tor...

 - Isso parece bom! O Apotecário está aqui? – Imladris passou pelos dois e foi ao banheiro e muito barulho foi feito lá dentro. Sorena estava sentada no batente da janela, uma perna para o lado de fora e assoviando uma canção.

 - Ahn... Não. Não ouço nada sobre Undercity desde que... Sorena...?

 - Sim?

 - Por que você está assoviando “esta” música? – a sobrancelha do irmão mais velho estava erguida e seu olhar checava cada movimento da irmã na janela.

 - Um passarinho verde-alaranjado me disse que alguém iria se apaixonar... – Imladris saiu do banheiro toda arrumada, com seu manto de linho e seda, ajeitando a tiara prateada que prendia os cabelos tão loiros que pareciam brancos no reflexo da luz.

 - E você pára de me provocar! – a clériga pegou seu cajado e apontou para o corpo da mais nova na janela. Sorena ainda estava com roupa de dormir e uma touca de frio de retalhos que imitava orelhinhas de gato.

 - Não estou falando de você... – ela mandou língua para a mais velha e Oxkhar a repreendeu com um olhar.

 - De qualquer modo, vim aqui para convidá-las para as reuniões.

 - Eu vou! – Imladris levantou o braço com firmeza. Sorena fez um bico entediado.

 - Vontade nenhuma.

 - Papai disse que você aprontou ontem...

 - Ela resolveu mergulhar na Fonte ali fora... – Oxkhar localizou a fonte pela janela e tirou a irmã da janela a segurando no colo.

 - Ooooox, você não pode fazer isso!! – ela reclamou esperneando no colo dele.

 - Vamos maninha, você precisa de cafeína para acordar. – descendo as escadas com a irmã no colo. Imladris ia atrás rindo da cena.

 - Me... soltaaa!!

 - Okay crianças... – Hrodi chegou com seu assistente, era um goblin esverdeado com um monóculo dourado. – Sem distúrbios em minha taverna sim? – Oxkhar colocou a irmã no chão, Sorena quase caiu por estar alguns centímetros do chão antes de pousar. Imladris já enchia uma caneca com café forte e bebia de goles em goles. – Sorena, você está de pijamas...

 - Não estaria aqui se esse brutamonte não tivesse me arrancado a força do quarto! – Oxkhar flexionou um dos braços e jogou um olhar malicioso para a irmã.

 - Eu tenho a força...

 - Você tem titica de trobo no lugar de miolos, isso sim! – Imladris quase engasgou com o café ao rir da cara que Oxkhar fez.

 - Isso realmente me insultou...  – e olhando para o pai. – Papai...

 - Sorena você está de castigo...

 - Aaaah, como assim?? – pegando uma maçã e ameaçando jogar na cabeça do irmão. – Seu... seu... – o mais velho chegou perto de Imladris e fez uma reverência gentil.

 - Gostaria de me acompanhar a reunião com os líderes de Warsong, clériga Imladris? – a clériga ficou paralisada no lugar, a caneca a meio caminho dos lábios. Ela largou o copo e acenou um “sim” com a cabeça. – Estaremos no Memorial. – dando o braço para Imladris o segurar, e ela o fez. Sorena desistiu de jogar a maçã e deu uma dentada.

 - E nada de encrencas, viu? – disse a clériga para a mais nova. Hrodi foi até a porta ver o filho e clériga irem pelas ruas de Dalaran. Sorena praguejava contra uma banana na fruteira em cima do balcão. O goblin esverdeado limpava os copos ruminando uma música.

 - Esses jovens...

 - Já vou avisando: Não irei cuidar dos filhos deles! Sou péssima com crianças! – estremeceu de frio a elfa ajeitando sua touca. Hrodi riu alto e apontou as escadas para a filha. – Mas paaaaai!!

 - Nada de mais. Subindo, se arrumando, descendo.

 - Certo, certo... Eu vou...

 - Isso mesmo... Você sabe que isso é bom para você...

 - Odeio visitar a titia... Ela é rabugenta sabia?

 - Ela pediu isso pessoalmente... – a elfa subiu as escadas lentamente e se jogou na cama quando chegou ao quarto. Logo sentiu um cheiro de fragrância exagerada. Fungou o ar diversas vezes e viu que tudo saíra do banheiro.

 - Ela colocou perfume... Só por que o Oxkhar estava aqui? Pelas barbichas de meu Voidwalker... Isso não vai dar certo... Desde quando elfos e humanos procriam?!


                Duas crianças exatamente iguais corriam em círculos, pulando e gritando uma para a outra. Sorena observava o que tinha a pele mais morena, ele tinha os sapatos desamarrados e parecia ser o mais levado. O que vinha atrás pulava sem cessar, fazendo movimentos nos dedos que produziam pequenas fagulhas de luz. Se esgueirou novamente e viu que a placa era mesmo de Cidadela Violeta.

 - Mas que nome é esse...? – ela sussurrou coçando a cabeça.

 - Eu também acho o nome muito bobo... – disse um dos meninos. O outro parou com os olhos arregalados.

 - Você chamou nossa casa de boba?

 - Não! Eu só acho o nome bobo! Cidadela Violeta? Nome mais... elfo-do-sangue... – o outro cutucou o irmão, ele percebeu quem era a visitante. – Ops...

 - Desculpe-me meu irmão. Ele é um bobão.

 - Sem problemas, tou acostumada a ser chamada de coisas piores...

 - Que nem de xisturicefacéfalo? – disse o mais levado, o outro bateu na cabeça dele. – Heeey!

 - Isso nem existe! Como disse antes: Ele é um bobão...

 - Giramar, não fale assim de seu irmão... – disse alguém descendo as escadas do lugar. Era o “prefeito” da cidade, Rhonin. – E Galdarin, trate sua prima com respeito. – os gêmeos de Vereesa Windrunner ficaram encarando Sorena.

 - Você é a Myrtae? – perguntou o levado, Sorena não conseguia distinguir um de outro. – Ela é baixinha...

 - Eu não sou baixinha! – a elfa se defendeu. Rhonin a acompanhou pelas escadas. Galdarin estava calado e mastigava os pensamentos.

 - Você tem orelhas grandes... – Rhonin parou e olhou para o filho. O menino ficou irritado. – Mas ela tem!

 - Náááh, são do mesmo tamanho dos de mamãe...

 - É, só que mamãe tem olhos azuis...

 - Seu olho é verde por que prima Myrtae?

 - Meu nome é Sorena... – ela tentou exclamar, mas logo teve que fechar a boca na mesma hora. A tia tinha convidados.

 - Tia Serenath veio? Ebaaa!! – um dos meninos correu em direção da elfa que estava conversando com Vereesa. Ao seu lado, de modo desconfortável, estava Kalindorane, cutucando um pedaço de couro solto de sua braçadeira. Ela estava como Sorena conhecera, arco e flecha nas costas, espada de lâmina alaranjada no cinturão e a armadura dos Farstriders.

 - Pode entrar Myrtae... Estávamos esperando... – quando Sorena foi dizer que esse não era seu nome, um dos meninos a cutucou na cintura.

 - Oh meu dragãozinho azulado de Dragonblight... Aquela é Kalindorane dos Farstriders?

 - E-e-eu quero um autógrafo!! – gritou Giramar correndo para um corredor, o irmão foi junto. Sorena se aproximou das 3 elfas e apontou para o nariz de Kalí.

 - Você está ficando famosa, é isso? – a elfa mais velha tirou o dedo de seu nariz e puxou Sorena para um abraço esmagador. – Gaaaaah, eu quero viver mais um pouco... Tenho a minha mãe pra abraçar ainda... – tossindo secamente e se livrando do abraço. A arqueira pigarreou envergonhada e ajeitou a mecha de cabelos vermelhos de Sorena.

 - Você cresceu... – ela comentou observando os lugares onde Sorena havia se machucado quando se conheceram. – E menos detonada...

 - Eu tenho uma clériga agora pra me auxiliar... Se bem que ela bate mais do que eu... – Serenath e Vereesa estavam prestando atenção nas duas.

 - Quando precisar de uma Vigia para o grupo, você pode me chamar...

 - Nhaaaaa!! Vigia Kalindorane!! – Giramar chegou afobado com um livro aberto e uma pena na mão. Galdarin vinha com o tinteiro.

 - Me dá um autógrafo?! – pediram os dois ao mesmo tempo. O olhar mortífero de Vereesa lembrou muito ao de Sylvanas.

 - Bem, ahn... sim... Mas por quê isso? – ela perguntou para os dois garotos de aproximadamente 10 anos que sorriam de orelha a orelha.

 - Quando você tem fãs, não questione... – murmurou Sorena para ela.

 - Ela tem orelhas grandes! – pontuou Galdarin. – E como são bonitas... – babava o menininho.

 - Há dois minutos atrás ele estava implicando com as minhas! – Kalí assinava o livro para os dois.

 - Quando se tem fãs, não questione...

 - Meninos, que livro é esse? – Vereesa foi ver e logo o rosto sério ficou irritado, Sorena deu dois passos para trás, assim como Serenath, as duas trombaram. – Mas quem mandou vocês pegarem o MEU Arcanus & Tinttilus da MINHA estante?! Rhonin!! – a elfa gritou e os meninos encolheram.

 - Querida? – ela apenas mostrou o livro assinado pela arqueira. Kalí se sentia um vermezinho de tanta vergonha. – Oh... problemas à vista... – ele suspirou e apontando para um corredor. – Vocês dois. Castigo.

 - Mas paaaaai!! – os dois falaram ao mesmo tempo.

 - Sem mais. Castigo. – os dois saíram de ombros caídos e tristonhos.

 - Acabo de constatar que todos os pais são os mesmos. Só mudam de endereço. – Serenath olhou para Sorena e sorriu para o chão.

 - Você parece estar melhor... – disse apenas. Vereesa sentou-se na poltrona finamente decorada e pediu para todas fazerem o mesmo. Kalí ficou em pé.

 - Olha, entre todas aqui, eu sou a pior. – explicou Sorena. – E estou sentando. – puxando a saia longa de Kalí para ela se sentar.

 - Myrtae, te chamei para anunciar que...

 - Sorena, Sorena... O nome é Sorena... – resmungou ela para a braçadeira de Kalí.

 - Como a Ofensiva de Warsong está em nossa cidade, é de extrema importância que todos que estiveram envolvidos no conflito em Lordaeron estejam cientes sobre a atual situação.

 - Mas você não era contra nós?

 - Nós quem, cara de concha? – brincou Kalí, Sorena riu junto.

 - Undercity está um caos, querida... Muitos dos refugiados já se estabeleceram nos locais de fuga e... ahn... As negociações com Silvermoon estão fragilizadas.

 - Sylvanas sempre manteve a sua convicção de proteger Silvermoon e assim ela faz mesmo que indiretamente... – Sorena girou os olhos e voltou sua atenção para a braçadeira danificada de Kalí.

 - É um modo bem estranho de se defender o lugar onde nasceu... Esfolar o próprio irmão, colocar fogo em outro... Transformar alguns de sua espécie em Ghouls... É bem louvável...

 - Não questione as razões de Sylvanas. – disse Vereesa encarando ferozmente Sorena. Ela devolveu o olhar cutucando a orelha esquerda.

 - É, você fala isso porque não foi o seu pai ali no meio carbonizado porque tentou informar a irmã quem era o traidor que estava fazendo planos de dominação mundial há muito tempo... – Serenath deu uma olhada mortífera para ela. – Me desculpa se isso te magoa, mas ela fez intencionalmente! Eu estava lá! Pergunte ao Ox e a Immie! Eles vão dizer... Oh espera, a Immie vai negar até a morte...

 - Imladris está aqui? – a clériga perguntou ansiosa.

 - Está... Veio comigo já que a “outra” expulsou ela de casa.

 - Myrtae, será que você pode fechar essa sua boca por um momento? – disse Vereesa gentilmente.

 - Não. – respondeu a mais nova se levantando. – E se quer saber minha opinião, não vou voltar nunca mais para Undercity, nem que me dopem, me amarrem e me levem a força!

 - Não estamos pedindo isso!

 - Então não vem com essa de “os envolvidos no conflito”! Que aquela cidade se exploda! Que todo mundo lá vá virar farinha, não me importo! Que a Rainha evasiva de prepotência absolutista deles morra! Morra mesmo! – Kalí se levantou também e tentou conter os ânimos da mais nova. – Vocês acham que eu faço parte da família agora? Justamente agora? Alguém chegou a me perguntar se eu quero ser parte da família?

 - Acho que só de abandonar a sua família adotiva e viajar sozinha para Undercity responde a questão... – disse Serenath.

 - O que posso fazer? Certa feiticeira morta-viva me fez fazer isso. – e dando passos largos para a escadaria, saiu sem dar satisfações. Kalí suspirou e virou-se para Serenath.

 - Eu ainda posso acertá-la daqui. Posso?

 - Eu deveria ter conversado com ela, Vee... A menina não conseguiu superar algumas coisas...

 - Ninguém conseguiu. – disse Vereesa. – Mas somos maduros o suficiente para entender.


Undercity anos atrás.


 - O que foi Imladris...? – disse Aelthalyste impaciente em sua andança pela biblioteca do Culto das Sombras Esquecidas. A menininha de quase 5 anos fungava e tinha lágrimas nos olhos. – Vai me dizer que ficou assustada de novo com as Abominações? – a mini-clériga concordou ajeitando as roupas costuradas para caberem em seu corpinho. Um dos mantos azulados pertencera a sua Mestra quando viva e era a peça favorita do vestuário da menina. – Eu já te disse mil vezes que essas Abominações daqui não fazem mal...

 - Elas cheiram mal...

 - Elas estão mortas, queria o quê? – a banshee passou pela estante e elevou seu corpo translúcido até uma parte alta pegando um livro de capa cinzenta e cheio de marcas. Colocou o livro em cima da mesinha de estudos e acendeu a luz da lamparina dali com um simples estalar de dedos. Imladris piscou os olhos sonolentos várias vezes e se impressionou como a luz fazia a Mestra ter um leve espectro esverdeado. – Sente-se. – ela obedeceu e sentou na cadeira alta com dificuldade. Aelthalyste bufou impaciente e içou o corpo da menininha com um puxão a colocando na cadeira rapidamente. Abriu o livro em certa página e indicou uma parte. – Leia para si. Diga-me o que achou depois. – Imladris encarou o livro e engoliu em seco. Raspou os pés descalços nas pernas da cadeira, olhou para os lados sem saber como falar. Aelthalyste lia um outro livro atentamente.

 - Tia Aelthalyste...

 - Não me chame de tia. Sou sua Mestra. – a menininha encolheu mais no lugar e mordeu o lábio inferior com certa incerteza. – Já terminou de ler?

 - Eu não sei ler direito... – a banshee ficou mirando o nada a sua frente, tombou a cabeça lentamente e fechou o livro que lia com rudeza. Jogou o seu livro na mesa onde estava a menina e olhou para o teto.

 - Não sabe ler direito... – comentou apenas. Imladris tinha lágrimas de novo nos olhos. – Se eu estivesse viva agora eu gritaria com você por desperdiçar o meu tempo. – e vendo a carinha chorosa da menininha desamparada, ela tirou os grilhões que carregava nos pulsos e alinhou seu corpo para ficar na mesma altura que a cabeça da menina. – Mas como estou morta e tenho todo o tempo do mundo para fazer o que quero, vou te ensinar a ler “direito”...

 - O-obrigada tia Aelthalyste... – a banshee a olhou furiosa. – D-desculpe Mestra Aelthalyste. – corrigiu a menina rapidamente.

 - Vamos pelo começo sim? – conjurando um livro grande e pesado da estante. Era uma compilação de contos de terror. Tinha letras grandes e garrafais, figuras fantasiosas desenhadas nas páginas e em algumas grandes figuras com temas sobre as histórias. Um cavaleiro com cabeça de abóbora decorava a página em que Imladris lia. – Leia comigo sim?

 - S-sim... – e começaram o processo de aprendizagem com a história do notório cavaleiro da Ordem da Luz que perdera a sanidade e agora assombrava as cidades de Azeroth com sua presença fantasmagórica.


Goldshire tempos depois.


 - Sorenaaaaaaaaaaa!! – gritava Oxkhar empunhando uma espada curta. Atrás dele dois cães de caça e seus amigos de Missão com tochas. – Sorenaaaaaaa!! – Hrodi corria pela extensão da Floresta Elwynn com seu cozinheiro Primm e seu filho mais velho Daltorn.

 - Oxkhar, aqui!! – gritou o pai acima dos latidos dos cães e dos golpes rudes de espada que os cavaleiros da Ordem da Luz davam em aranhas gigantes que desciam das árvores para emboscar aventureiros noturnos.

 - Mas que maldição! – praguejou o paladino de 17 anos. – Aonde?! – chutando um réptil hostil que enganchou em sua perna.

 - Aqui!! – Hrodi balançou sua tocha, Oxkhar visualizou onde estavam. Caverna de Cristal.

 - Vai lá Ox. Cuidamos dessas pernudas aqui. – disse o seu amigo de Missão. O recém condecorado paladino correu para o pai pulando diversas armadilhas de kobolds.

 - Aonde ela está? – Hrodi apontou a tocha trêmula para dentro da Caverna. – Oh bolotas... – o pai tinha a respiração ofegante e o cenho tenso. – Calma pai, vamos tirá-la de lá. – e virando para Primms e o filho. – Primms, chame as arqueiras de Karin. Elas conhecem o terreno melhor que nós da Ordem. Vamos esperar aqui.

 - Entraremos agora! – exclamou Hrodi prestes a chorar de nervoso.

 - Papai, isso não vai ajudar em nada. Não conhecemos nada daí de dentro! Podemos nos perder e algo pior acontecer, escutou?

 - S-sim... Esperaremos... – limpando o rosto com rapidez e respirando fundo.


Undercity anos atrás no mesmo instante:


                Aelthalyste supervisionava os estudos da recém nomeada clériga e mensageira oficial do Culto das Sombras Esquecidas em outros distritos dos Abandonados, Imladris. A jovem passeava para lá e para cá nas estantes pegando livros e procurando verbetes sobre um assunto que a incomodava um bom tempinho: Abominações. A Mestra estava orgulhosa pela menina se dedicar totalmente a causa dos Abandonados e ainda mais por saber como balancear seus poderes mágicos. Infelizmente Imladris não desenvolvera as Trevas tanto como Aelthalyste queria, mas sua maestria com a Luz e magias divinas eram impressionantes.

 - Os Apotecários precisariam de necromantes para manter uma forma tão instável como as Abominações sob controle... Como é possível? – a Mestra passou por duas estantes e a encarou com curiosidade.

 - Há outros modos de se controlar mortos-vivos além de recorrer a Necromancia, aprendiz.

 - Sim, sim... – concordou Imladris indicando um parágrafo em um livro escrito especialmente para ser consultado pelos Apotecários. – Objetos encantados com Magias de Domínio dos Mortos-vivos, encantamentos... Mas mesmo assim não compreendo a natureza de se remendar dezenas de corpos em uma criatura imensa apenas para serem guardas secundários. Por que não os usam como guerreiros de linha de frente?

 - Então observo que tem as boas estratégias de combate assim como nossa Rainha, menina elfa... – Imladris ruborizou tanto que foi obrigada a deixar escapar o sorrisinho satisfeito de ser elogiada. – Isso mesmo menina... A Dama Sombria procura de todas as formas reestabelecer as nossas tropas... Tivemos sérios problemas na batalha dos Moinhos de Agamand... Nossos melhores guerreiros estavam na frente e logo sucumbiram aos necromantes... A sua inteligência pode nos ajudar bastante...

 - E-eu não gosto de guerrear, Mestre... Eu prefiro manter a paz.

 - Mas você sabe que onde há paz... Há guerra...

 - S-sim... – a jovem olhou para a mão direita com alguns dedos inutilizados após ser encontrada na Cicatriz Letal quando novinha. A guerra matara seus pais, sua família e de certa forma ela própria. Imladris se considerava tão morta quanto qualquer um ali. Mas não no sentido negativo de morrer, mas sim de abraçar a nova vida entre os Abandonados e ser parte deles como pudesse.

 - Quero que se concentre em táticas de cura a distância. Vamos ter uma campanha para final do ano em Gilneas e a Dama Sombria espera que todos estejam preparados.

 - M-mas como eu poderia ajudar em batalha se...

 - Os Orcs de Frostwolf e Warsong estarão no front... – o coração de Imladris pulou em sua garganta. – Ficou empolgada só porque o respeitável Warchief Thrall se envolverá na batalha?

 - Como não poderia ficar empolgada! Warchief Thrall é lendário guerreiro! O grande líder da Horda! O único que pode salvar o dia!

 - Menina, guarde sua empolgação sim? Táticas para...?

 - Sim, sim!! – a jovem elfa correu de volta para a estante e tirou todos que estavam ao alcance. – Irei ajudar o clã Warsong! E Frostwolf! Que honra! – disse ela abraçando um livro com carinho e pegando outros.

 - E haverá taurinos...

 - Haverá o quê?!


Goldshire semanas depois.


                A mesa estava posta com sopa rala de legumes e rodelas de pão. Hrodi tossia insistentemente e estava enrolado em mantos grossos. Ele soprava sua colher o tempo todo e seu nariz estava tão vermelho que contrastava demais na pele. Sorena observava o pai comer com uma carinha triste. Chorara muito de tarde, escondida entre as arvores. Oxkhar fora para a Missão e ela não tivera coragem de dizer adeus ao irmão. O pai estava assim doente desde que o episódio da Caverna de Cristal acontecera. Já perdera noites inteiras tentando lembrar porque havia ido sozinha de noite a aquele reduto de aranhas peçonhentas e monstros de todos os tipos. Acordara com os gritos de Oxkhar a sacudindo enquanto corriam de perigosas criaturas aracnídeas de aspecto mofado e pernas longas. O pai estava a frente, ferido no braço e no rosto, tochas bruxuleavam até a saída do túnel. O corpo de uma arqueira de Karin cortado ao meio no meio do caminho. O espírito da mesma a olhando com confusão. Não era o primeiro que ela via. E nem seria o último. Pelo menos ali sentada na Taverna do Sol, comendo sopa e vendo o pai tossindo era mais seguro que ficar lá fora.

                Subitamente em menos de 2 semanas após conversar diretamente com a cabeça flutuante debaixo de sua cama e ter resposta em seus sonhos havia tornado um tormento diário para ela. Tudo mudara e ela não conseguia contar para ninguém que agora via coisas estranhas por todos os lados, almas penadas vagando pelo vilarejo, borrões anuviando seus olhos quando se concentrava demais, até auras contornando as pessoas. A de Karin era azulada e bem brilhante. Uma águia sempre se formava quando Karin caminhava e deixava uma trilha azulada para trás. A do pai estava enfraquecida esses dias e parecia com um punho fechado em um dourado opaco. A de Oxkhar era indefinida, mas o seu irmão sempre iluminava qualquer lugar que tocasse ou pisasse. A única aura que ela não pressentia era a própria. E isso era frustante! Passava horas da noite, dormindo escondida nos estábulos (Descobrira que ficar na companhia de animais fazia os espíritos desaparecerem), olhando para as próprias mãos tentando captar qualquer coisa. Qualquer detalhe que a acusasse de ter uma aura também e principalmente de não estar vendo coisas. De não estar ficando maluca.

 - Passe o sal ali para mim, filhota... – pediu seu pai com a voz rouca. Ela obedeceu e entregou a caixinha com sal refinado. O já velho Hrodi jogou uma pitada no prato de sopa e provou uma colherada. – Está bem melhor... – e depois olhando para ela. – Não vai comer?

 - Sem fome.

 - Não pode. Anda, come logo senão esfria.

 - Sem fome, pai!

 - Não discute e me obedece. Colher no prato e depois comida na barriga. – Sorena resmungou um pouquinho fazendo o que ele mandara com má vontade. – Você está pálida. Andou se aventurando longe de casa?

 - Não. – ela disse com a boca cheia e mastigando o legume da sopa.

 - Andou fazendo coisa que não devia?

 - Por que eu faria?

 - Oxkhar disse que você estava apaixonada...

 - Não é isso...

 - Então...? – a menina elfa abriu a boca para falar, mas preferiu soltar um suspiro alto e voltar a comer aborrecida. – E então...?!

 - Acho que o senhor pegou a gripe de kobold que o Monsenhor Turion falou certa vez... Temos que tratar dela...

 - Você sabe que eu sou de ferro! É só uma gripezinha de nada!

 - Até ferro enferruja algum dia... – ela disse colocando mais sopa no prato.

 - Hmm parece que o apetite de alguém finalmente resolveu aparecer... – comentou o pai, mas Sorena pensou seriamente que não era disso que estava com fome.



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