Os Jogos De Annie Cresta escrita por Annie Azeite


Capítulo 22
XXI — Vitoriosa


Notas iniciais do capítulo

“ — O problema é que não consigo mais dizer o que é real e o que é inventado.
(...) A voz de Finnick se ergue no meio das sombras.
— Então você deve perguntar, Peeta. É o que a Annie faz.”
A esperança, página 291.



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Eu não sou nada além de números e gráficos no monitor. Perfurada por tubos e monitorada por cabos que me alimentam, consolam e restringem minhas obrigações. Tubos para as minhas veias, tubos para meu estômago... Tudo que preciso fazer é existir, o resto já é feito para mim.

Mantenho os olhos fechados, ainda que permaneça acordada. Talvez seja o efeito dos remédios, mas até os menores esforços parecem grandiosos. Desde que recobrei a consciência, sinto os dedos macios de Finnick em meu braço, deslizando ritmicamente de um lado para o outro. O movimento é pendular e delicado, transmitindo certa tranquilidade, contudo, o barulho da porta automática me põe alerta novamente. Ouço, então, uma voz familiar:

— Como ela está?

Finnick suspira.

— O que você acha, Mags? — Não preciso abrir os olhos para identificar a tristeza em sua voz. — Está assustada com tudo que aconteceu.

— Ela vai ficar bem — encoraja a idosa —, nós sempre ficamos.

— Tem razão... Ela é uma lutadora, não é?

— É sim e você também, querido, mas precisa descansar... e se alimentar — orienta sua mentora e velha amiga. — Eu posso ficar um pouco com Annie agora, você está o tempo todo aqui.

Penso em intervir e proibi-lo de me deixar, porém seria egoísta demais. Eu consigo suportar algumas horas sem ele ao meu lado, certo? Eu não posso permitir que ele se prejudique assim por minha causa.

— Estou bem — ele assegura, tranquilizando-me por não se afastar. — Já sabe quando poderemos voltar para casa?

— Sobre isso, tem algo que preciso falar com você...

O silêncio e a tensão tomam o ambiente, como se os dois já tivessem tido essa conversa anteriormente.

— Não! — irrompe Finnick, enraivecido. — Eles não podem obrigá-la a ficar! Não depois de tudo o que passou!

Abro os olhos num átimo e tento me sustentar sentada, porém uma larga tira de tecido envolve minha cintura, restringindo meus movimentos. Os dois continuam sua conversa, parecendo não me notar:

— Desculpe, Finnick, eu não pude ajudá-lo. Sei que parece horrível, mas são apenas alguns dias...

— Ela não vai suportar!

— O que eu não vou suportar? — questiono confusa.

Os dois se viram imediatamente, finalmente percebendo a minha presença.

— Não é nada, Annie — Finnick tenta me tranquilizar sobre algo que ainda não sei. — Vamos dar um jeito nisso.

— Diga-me! — Dirijo-me a Mags, desta vez. — O que está acontecendo?

— Desculpe, Annie. Nós pedimos ao presidente Snow para dispensá-la da entrevista com Caesar. — Ela lança um olhar de receio para Finnick. — E, infelizmente, ele não autorizou.

Entrevista... Da forma como Mags diz, nem parece algo tão terrível. No entanto, precisarei reviver todas as desgraças a que assisti nos jogos numa retrospectiva de horas, como se já não bastasse tê-las vivenciado uma vez. Três horas. É esse o tempo que costuma durar. Serei obrigada a assistir e negar não é uma opção. Droga. Cada vez em que acredito estar perto do fim, sou assombrada por mais decepções. Nunca termina, nunca vai terminar... Não importa o quanto eu me machuque, sempre há uma forma de me machucar mais. Debato-me no colchão, arrancando um a um os cabos em meu peito, o que silencia os bips do monitor. Puxo, para fora, a sonda que adentra minha narina até o estômago, trazendo o gosto amargo de vômito que, sem hesitar, engulo novamente. Perdura apenas o sabor ácido do suco gástrico, quando Mags me chama a atenção:

— Annie, não faça isso! — implora desesperada. — Finnick, me ajude a segurá-la.

Sigo os olhos da senhora de cabelos brancos com os meus, pousando-os em Finnick. Ele partilha da minha aflição, retraído em um dos cantos e congelado nos próprios pensamentos. Eu já o vi desta forma antes — ou talvez pior —, no dia em que meu nome emergiu do globo de vidro. O dia em que tudo começou.

Empurro o vaso de flores da cabeceira contra a parede, distribuindo lírios azuis e cacos de porcelana por todo o chão. Meu mentor não se move para me impedir e utilizo a face afiada de um dos fragmentos para arrebentar a faixa de contenção, enfim, me libertando. O sangue goteja dos orifícios da pele em que os tubos entravam e, quando me ponho de pé, conheço um novo patamar de dor. Experimento uma sensação lancinante e em pontada na lateral de meu tórax que se intensifica toda vez que eu respiro. Ainda assim, existem sofrimentos piores a me consumir e que, infelizmente, não desaparecem com analgésicos.

Alcanço a parede e empurro a cabeça contra a superfície rígida a fim de me machucar mais: somente uma dor pode substituir a outra... No mesmo instante, entram pessoas de branco que me seguram pelos membros e afastam do conforto de minha parede fria. Sou privada do insólito direito de me destruir, chega a ser irônico. Mas não rio.

Os braços que uma vez me pertenceram estão presos por diversas mãos e a única defesa contra os dedos desconhecidos em meu pescoço são meus dentes. Lembro-me de como eles desmanchavam a friável carne de peixe do jantar... Precipitei-me ao pensar que me seriam inúteis agora que não posso comer sozinha ou sorrir. Mordo a mão inimiga com tanta força que sinto a borracha frágil da luva se partir e o familiar gosto de sangue toma minha boca. Escuto o gemido abafado vindo do aglomerado de homens uniformizados e não identifico seu dono. Estão tão entrelaçados entre si e a mim que parecem um só.

Do lado oposto do meu pescoço, uma agulha calibrosa atravessa a pele, provocando um incômodo inquietante. A seringa é tão comprida que me permite enxergar o êmbolo ser pressionado, trazendo o líquido translúcido para minha veia e, posteriormente, a sensação falsa de sonolência. Os homens afrouxam o aperto em meus braços e preciso apoiar as mãos ensanguentadas na parede para me equilibrar de pé. Pontinhos luminosos surgem nos cantos da visão e a última imagem que consigo identificar é o rastro vermelho dos meus dedos no azulejo claro.

Acordo cercada por paredes acolchoadas e claras, a cabeça latejando pela claridade. Engulo a saliva espessa que se acumulou em minha boca no tempo em que estive apagada, fazendo meu estômago se revirar. Ponho-me de joelhos e forço algo para fora, mas nada vêm além de muco e água. Finnick não está mais aqui. Penso em gritar e chamar por ele, porém tenho a impressão de que, onde quer que esteja, não pode mais me ouvir. Certo. Levaram-me Finnick também. A sanidade, a integridade, a felicidade... Por que desejam me privar de tudo?

Meus braços estão atados sobre meu próprio corpo, envolvidos com uma espécie de tecido resistente que impossibilita meus movimentos. Minhas mãos me abraçam, ainda que não haja conforto algum, mas não se trata de uma escolha minha, é uma obrigação. A palavra “camisa de força” me vêm à cabeça. E sim! É isso que estou usando, um colete para loucos. Como podem jogar na minha cara desta forma?

Estou sozinha. Cercada por paredes sem portas ou janelas, presa e impotente... Morta novamente. Os quatro cantos do cômodo se encontram tão próximos que mal posso esticar as pernas no piso almofadado e até o oxigênio parece escasso. A minha cela, no entanto, é mais apertada: se restringe a mim, me aperta e sufoca... A solidão é a minha penitência.

Uma porta se abre atrás de mim — onde antes havia apenas o branco estéril — e um garoto com volumosos cabelos castanhos e olheiras encovadas adentra o aposento. Eu me assusto brevemente com a sua presença, mas reconheceria aqueles olhos em qualquer lugar. Azuis como o céu, pacíficos como o mar... Estão em meus sonhos, em meus pesadelos.

— Noah! — chamo ofegante, sentindo algo entre alívio e desespero.

Ele usa um jaleco — branco como todo o resto — e estende um pequeno copo de plástico na minha direção. Pede que eu abra a boca, ao mesmo tempo que me segura pelo braço. Por que Noah faria isso? Tento desvencilhar-me de seu aperto, ainda que seja impossível fugir.

— Você precisa se acalmar e tomar o remédio — ele aconselha.

— A culpa foi minha — admito —, eu não pude salvá-lo.

— É melhor não se mexer tanto, você fraturou algumas costelas quando se chocou contra as árvores durante o alagamento.

— Por favor, me desculpe, Noah. Eu não queria... — Meus olhos se tornam corredeiras, surpreende-me as lágrimas ainda existirem. Pessoas não secam de tanto chorar?

— Se não puder tomar o remédio, terei de furá-la novamente. Abra a boca, por favor.

Ele comprime os côndilos de minha mandíbula — forçando-me a abri-la — e entorna os comprimidos do copo para minha boca. Engulo-os em seco, recusando a água que me oferece e aguardando a protuberância descer por minha garganta. Em seguida, levanto a língua a mando do rapaz para provar que não escondi as pílulas embaixo dela.

— Finnick! — eu indago. — Onde está Finnick?

— Seu mentor está bem, mas você não pode ver ninguém enquanto não se tranquilizar. — Ele acende uma luz em meu olho direito. — Sabe onde estamos?

— Na capital?

— Isso mesmo. — confere, examinando o outro olho. — E por que estamos aqui?

Por que estamos aqui? Por que eu estou aqui? Reviro a informação em minha cabeça, a fim de encontrar uma resposta: porque eu sobrevivi e os outros morreram... Porque Noah morreu e eu não pude salvá-lo. Então outra pergunta se formula em minha cabeça. Por que Noah está aqui?

— Eu não sei — respondo ao meu examinador —, mas me diga você. — Olho para as paredes apertadas que me aprisionam. — Por que eu estou aqui?

— Porque é uma vitoriosa — explica sem demora e pede para que eu observe seu dedo estendido.

— Este não parece um lugar para vitoriosos — eu pondero. Lembra-me o manicômio em que morava a Senhora Hortênsia, uma velha louca do distrito quatro. — E você não é o Noah — acrescento, ao fitá-lo mais uma vez e perceber que os olhos, na verdade, são negros. Destoantes do azul plácido de meu falecido aliado.

— Não, eu não sou — confirma impaciente —, agora acompanhe meu dedo. Sem mover a cabeça, por favor.

Ele movimenta o indicador de um lado para o outro, formando um “H” no ar e, depois de alguns minutos e várias anotações, vai embora pela mesma porta invisível por onde entrou, deixando-me novamente com o silêncio.

O confinamento me perturba, os minutos se tornam horas e as horas se tornam dias. É como se eu estivesse novamente perdida, escondida no tronco apodrecido que chamei de abrigo na arena. Arena... Um arrepio percorre minha espinha, eriçando os pelos de minha nuca. Como uma única palavra pode causar tanta aflição?

Sem os braços livres, preciso apoiar as costas na parede para me levantar. Tomo cuidado com o lado dolorido, mesmo não havendo formas eficientes de me machucar: é tudo irritantemente macio e estou tão entorpecida de remédios que me sinto um pouco tonta. Tenho saudades da dor física, capaz de abafar os pensamentos mais lúgubres enquanto me atenho à injúria real, mas a Capital precisa do meu rosto intacto para as câmeras e, é claro, não pode permitir mais marcas.

A porta de sempre se abre na parede e, desta vez, não sou pega de surpresa. Costumam fornecer comida pela mesma entrada e tenho um estômago barulhento para avisar. Infelizmente, não é a gentil avox trazendo o meu jantar, mas quatro pacificadores enormes e em fila, esperando para me levar. Qual a necessidade de quatro deles? Apenas um poderia me carregar sem esforço algum, mas exagero é algo rotineiro aqui.

— Aonde estamos indo? — pergunto assustada, enquanto me conduzem para fora.

Nenhum dos homens me cede atenção. Atravesso o corredor estreito e avisto alguém me esperando no final. Fico aliviada em identificar de quem se trata, mas, mesmo sendo um rosto familiar, não é o que eu mais desejava ver.

— Olá, Annie — Ocella me cumprimenta de forma calma e contida, o que destoa da mulher histérica que conheci. — Deixem-na comigo agora, rapazes — diz aos pacificadores. — Já podem ir, obrigada.

Ela me conduz para dentro de uma enorme sala revestida de espelhos e madrepérola e não sei se o lugar é realmente extenso ou se minha estadia anterior faz o resto parecer maior. Para todo lado que olho, há diversas Annies refletidas, todas de cabelos selvagens e olhos apavorados. A camisa de força me faz parecer ainda mais louca.

— Você se lembra da sua equipe de preparação, certo? — pergunta Ocella, apresentando um a um meus preparadores. Não me recordava de nenhum dos nomes, mas acredito que seja pela irrelevância da informação e não por um déficit de memória.

Circe, Aulus e Helga — então, reapresentados — desamarram as tiras detrás da camisa, libertando meus braços dormentes. Não é uma sensação inédita, algumas vezes por dia, a avox loira que me trazia o almoço deixava meus braços livres para comer, mas finalmente a assistente careca — Circe ou Helga? — abre o zíper do colete e o retira completamente. Aprecio a leveza de vestir apenas a bata de tecido fino e não mais aquele couro espesso e desconfortável.

— O que está acontecendo? — Aulus, que está mais próximo da saída, nos alerta sobre o rebuliço do lado de fora.

Ao me concentrar, escuto passos frenéticos e ruidosos no corredor, como se alguém estivesse fugindo. Então, a porta se abre de forma abrupta, batendo contra a parede num estrondo alto. Finnick se apoia no batente de mármore, ainda aflito e ofegante.

— Ei! Você não pode ficar aqui — repreende meu preparador.

— Me impeça! — retruca Finnick de forma ríspida e, então, corre até mim. — Annie!

Os braços me envolvem com avidez enquanto seu peito ampara meu rosto, permitindo-me sentir as batidas aceleradas de seu coração contra minha bochecha. Felicidade não seria o ideal para descrever este momento, é algo mais puro e genuíno. Eu sou um pequeno barco nas ondas de um mar revolto e Finnick é meu porto-seguro.

— Nós temos apenas algumas horas para aprontá-la. — Ocella observa o relógio de pulso luminoso. — Você pode ficar aqui com ela, docinho, mas por favor não nos atrapalhe.

Ela dispensa os pacificadores que apareceram por causa do barulho.

— Certo — Finnick concorda resmungando. — Estou logo ali, Annie.

Meu contrariado mentor se desloca para um dos cantos, enquanto os preparadores trabalham em mim. Eles retiram o resto das roupas, deixando-me inteiramente nua. Posso enxergar o reflexo de Finnick, por trás de meus ombros franzinos e descarnados, infeliz por me ver desta forma. Desvio a atenção para o meu abdome, onde há um quadrado de pele rosada com as margens retilíneas e bem delimitadas. Não parece uma ferida acidental.

— Eles pegaram um pouco de pele daí para consertar seu rosto — explica minha estilista ao ver minha confusão —, tecidos verdadeiros são melhores do que os sintéticos.

De certo, minha face está perfeita. Não há mais aquela cicatriz da queimadura de água-viva ou os diversos machucados que obtive na arena. A equipe não terá muito trabalho comigo desta vez. Minha pele é integra, reluzente, ainda que existam profundas olheiras arroxeadas embaixo dos olhos necessitando de correção. Eles cobrem minuciosamente as manchas escuras com base e pó no tom da pele, mas os horrores que as causaram também são visíveis nos olhos transtornados... e, obviamente, não há maquiagem para isso.

Ocella me põe dentro de um vestido branco que me faz torcer o nariz — depois desses últimos dias, passei a detestar essa cor antes inofensiva. Ela empurra meus cabelos para trás e, no geral, minha apresentação é bem simples. Não há coroas, não há joias, não há pinturas pelo corpo. Se não fosse a fina camada de maquiagem, eu juraria estar com a mesma roupa do hospital. As mangas são compridas e se alargam nas extremidades, cobrindo parcialmente minhas mãos. Existem discos de um metal gelado onde o tecido toca os cotovelos que, curiosamente, não são visíveis externamente. Pergunto-me a sua necessidade.

— Apenas fique sabendo que eu não tive culpa. — alerta minha estilista, um tanto pesarosa. Do que ela está falando? — Vai acabar rápido, ok?

Circe e Helga prendem grossos braceletes prateados em meus punhos, que também ficam recobertos pelo tecido das mangas. Elas se despendem de mim com um abraço e descem junto a Ocella e Aulus para a entrevista.

Finnick e eu temos alguns minutos a sós antes de nos unirmos aos demais. Como não há muita conversa a ser botada em dia — passei os últimos dias sozinha e trancada —, aproveitamos o momento para ficar abraçados em silêncio. Às vezes, palavras não são conforto o suficiente e o calor de seus braços é meu único consolo. Entretanto, o tempo caçoa novamente de nós dois e, depois do que pareceram frações de segundo, precisamos ir também.

Tomamos o elevador de cristal e me dou conta de onde estou. O centro de treinamento... Como não percebi antes? O tempo todo, eu estive aqui. Não é novidade haver um hospital para os vencedores no prédio dos tributos, mas o que era aquele quarto claro e acolchoado? Parte de um hospício? A ideia não me parece tão absurda agora que sobrevivi à arena. As sequelas físicas e mutilações são as menores consequências dos Jogos.

Na entrevista final, o vitorioso costuma subir para o palco junto de toda a equipe e entram em ordem: os preparadores, a escolta, o estilista, o mentor e, finalmente, o vencedor. É sempre assim e não será diferente este ano. Quando alcanço o subsolo, todos já estão me esperando, inclusive Éolo, o mestre de cerimônia mais inútil e ausente da história.

Posiciono-me hesitante no centro da plataforma circular semelhante a da abertura dos Jogos. O hino começa a tocar e imediatamente me pego olhando para cima, à procura de um rosto no céu. É claro, não há rosto algum para ser visto, tampouco céu. Há apenas as vigas e armações que suspendem o palanque e algumas poucas teias de aranha isoladas. Lá em cima, a multidão irrompe em aplausos e assobios, produzindo um som estridente como os gritos desesperados que estou acostumada a ouvir. Fico inquieta em meu circulo de metal, considerando formas de fugir sem ser notada. Finnick percebe minha agitação e se estica para segurar minha mão.

— Está tudo bem, peixinho. Estou bem aqui.

Os minutos parecem menos longos no tempo em que ele mantém nossos dedos unidos e, logo, o time inteiro já está no palco, chegando a vez do meu mentor.

— Estarei lá em cima — anuncia, enquanto sua plataforma se eleva. — Você cumpriu suas promessas, Annie, agora cumprirei as minhas. — Ele precisa se abaixar para terminar o discurso: — Todo o tempo, lembra?

Agarro-me à lembrança à medida em que ele se afasta. “Só fique comigo até chegar a hora” foi o que eu pedi no trem a caminho da Capital. Ainda me lembro do abraço que recebi naquele dia, quando sequer sabia que o amava. Eu realmente não fazia ideia, podia desconhecer meus sentimentos e o que eles significavam, porém de uma coisa eu tinha certeza: apenas Finnick me fazia sentir daquela forma.

Os aplausos para meu mentor são os mais empolgados de todos e, embora me resgatar da arena seja um feito imensurável, sei que a atenção recebida é por sua fama já estabelecida. Tridentes, charme e abdomens... O alvoroço ainda nem chegou perto do fim, quando a placa de metal começa a me erguer. Sou recebida por luzes coloridas e ofuscantes, gritos agudos e ensurdecedores... Todos os sentidos sendo prejudicados de alguma forma, mas Finnick está ao meu lado novamente. Como prometeu.

— Annie, doce Annie — cumprimenta Caesar, entusiasmado —, então nos vemos outra vez!

Ele faz uma pequena pausa, aguardando minha resposta, ainda que não a receba. O que eu devo fazer? Cumprimentá-lo? Sorrir? Interação social parece algo complicado.

— Apresento-lhes a vitoriosa do septuagésimo Jogos Vorazes — ele preenche meu silêncio. — E que edição dos Jogos! Uau! Um final espetacular, não acham? Por alguns segundos, eu pensei que não teríamos um vencedor!

Eu também pensei, admito, embora decida não responder. Para que cooperar se já está tudo acabado? Eu sobrevivi aos Jogos e, mesmo com meu melhor comportamento, serei obrigada a assisti-los aqui no palco.

Claramente incomodado com a minha participação reduzida na entrevista, o apresentador endireita a gravata borboleta lilás e pigarreia impaciente.

— Não seja tímida, senhorita Cresta... — ele completa, gesticulando para que eu me sente. — Agora queira se acomodar.

Caminho lentamente até o centro do palco, atravessando os membros da equipe em fileira. Todos distribuem acenos encorajadores e eu preciso respirar fundo antes de prosseguir. Olho para frente determinada a terminar isto de uma vez e, por mais que minhas pernas estejam fracas e eu necessite sentar, a poltrona que me aguarda não é nem um pouco convidativa. Tem a cor vermelha, intimidante e assustadora. Como o sangue que estou prestes a assistir...


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Notas finais do capítulo

Esse capitulo foi realmente divertido de escrever, as partes da Annie no hospital ou tudo que envolvia medicina são as minhas preferidas ( pra quem nao sabe, eu estudo e respiro medicina). Como de costume, vou colocar algumas informações inúteis e interessantes aqui:
Os exames que o médico "Noah" faz realmente existem. Ele faz o teste de motricidade ocular e reflexo pupilar. O "tubo" que a Annie retira do nariz chama-se sonda* nasogástrica ou nasoenteral e é um tubo que vai até o estomago mesmo, levando uma dieta liquida. E sim! dá pra tirar isso puxando, existem muitas Annie Crestas no hospital que eu estagio HAHAH.

Beijos gente! Espero que gostem do capitulo e não me matem pela demora!
— Azeite.