A partir daquele dia, Ichigo passou a ir para a praia todos os dias, naquele mesmo horário, na esperança de encontrar a bela morena que não saía de seu pensamento. No primeiro dia, não a encontrou lá. Um tanto decepcionado, sentou-se no lugar onde os dois tiveram a sua conversa e começou a pensar naquele dia. A face, o som da voz, o sorriso, os olhos. Ele tinha captado cada detalhe daquela mulher, entretanto, seu coração não cansava de repetir que precisava encontrá-la ao menos uma vez mais, para confirmar se ela realmente era real.

Pensou na tola conversa que tiveram, e lembrou-se que não lhe contara quem realmente era. O fato era que uma parte dele desejava que a morena gostasse dele por quem ele era, e não pelo que ele era. Sempre, no momento em que revelava que era o herdeiro do trono do reino dos Kurosaki, Ichigo simplesmente deixava de existir para as pessoas. Tornava-se o príncipe. A partir daí, as pessoas não mais se importavam com sua personalidade, com sua aparência, com sua índole. Tudo o que importava era o titulo que lhe pesava os ombros, e não o ser humano que ele era. E achara aquela morena tão encantadora sem mesmo saber de nada sobre ela, amara como a sua voz era doce e forte e como ela parecia franca e honesta, e sentira dentro de si uma imensa vontade de ser, talvez pela primeira vez, apreciado por ser Ichigo, e teve medo de que ela mudasse sua postura se ele revelasse que era o príncipe Kurosaki Ichigo.

Percebeu que o fim da tarde se aproximava. Pelo jeito, ela não viria hoje. Levantou-se e foi embora para o castelo. Ao chegar, pediu a um dos servos que lhe preparasse um banho. Banhou-se e então foi para o seu quarto, recusando quando sua mãe o chamou para o jantar. Após confirmar diversas vezes a ela que tudo estava bem, só que estava sem fome, sua mãe deu-lhe um terno beijo e desejou-lhe boa noite. Então, Ichigo deitou-se para sonhar com a sua morena.

Nos dois dias seguintes Rukia também não apareceu, e Ichigo já começava a se perguntar se ela o estaria evitando. Mas, no quarto dia, ao chegar já desanimado à praia, teve uma bela surpresa: encontrou a sua morena andando na beira do mar, tendo as pernas atingidas pelas ondas, os cabelos graciosamente agitados pela brisa. Estava de costas para ele, entretanto, assim que Ichigo pôs seus pés na areia da praia, a morena virou-se bruscamente, como se ele a houvesse chamado. Olhou diretamente para ele que, ao vê-la sorrir, não se conteve e correu em sua direção. Ela ficou parada no mesmo lugar onde virara, aguardando por ele, o sorriso ainda em seu rosto.

– Yo, Rukia! – disse, um tanto sem fôlego.

– Yo, Ichigo! Tudo bem com você?

– Sim. E você, como tem passado?

– Ah, bem. Só meu pai que esteve resfriado, e tive que ficar cuidando dele. E sabe como são os homens quando ficam doentes...

– Ahn, até onde sei, somos iguais às mulheres doentes... – disse, levantando uma sobrancelha. Não que nunca tivesse ouvido este comentário de sua mãe, mas não resistiu a implicar com ela. Sentiu-se recompensado ao ver um leve rubor surgir em sua face.

– Oh, desculpe, não quis parecer preconceituosa – riu constrangida – talvez só meu pai e meu irmão que agem como bebês chorões e eu e minha mãe que sejamos fortes demais...

– Bem, o que mais tem feito? Suponho que não tenha ficado só cuidando de seu pai nesses três dias em que não nos vimos...

Ela lhe lançou um olhar penetrante... Então ele também havia contado quantos dias fazia desde seu primeiro e ultimo encontro? Desde que conhecera aquele ruivo, foi quase impossível parar de pensar nele... Até sua mãe e seu irmão acharam que estava um tanto estranha, afinal, nos últimos três dias, enquanto não estava cuidando de seu pai, ficava com o olhar vago, e sempre que voltava à realidade, algo desastroso havia acontecido: queimou o arroz quando fazia o jantar no dia em que o conheceu, salgou demais o peixe no dia seguinte, adoçou demais o chá no dia posterior e encerrou com chave de ouro quebrando um copo ao assustar-se quando seu irmão gritou com ela, após cansar de perguntar, desconfiado, onde ela estava com a cabeça ultimamente. Seu irmão parecia totalmente avesso à idéia de que ela conhecesse algum rapaz.

– Ah, nada demais... Você não estaria interessado... – disse com um meio sorriso, que deixou o ruivo intrigado. “Ou não acreditaria que passei os dias treinando técnicas de kobudo*, e as lutas que a minha mãe ensina ao esquadrão Shinigami” pensou Rukia.

– Me interesso por tantas coisas. Você poderia se surpreender... Conte-me, vamos... – Ichigo praticamente implorava para a morena.

– Bem, Ichigo, a verdade é que eu não me interesso muito por, digamos, “coisas de mulheres” – tinham abandonado a beira do mar e sentado à sombra se “sua” arvore – É claro que minha mãe me ensinou a cozinhar, costurar, cantar, dançar, ler, escrever, contar e outras coisas que tutores ensinam...

– Uau, sua mãe sabe muita coisa, hein? – interrompeu, divertido, olhando par a morena. Conversar com ela era tão fácil...

– Sim, realmente minha mãe sabe tudo... E um pouco mais. – riu do próprio comentário e virou-se para Ichigo, olhando em seus olhos, o que fez o rapaz prender a respiração – Bem, queria saber o que andei fazendo durante estes dias além de cuidar de meu pai... Andei treinando. Kenjutsu e Laijutsu **, além de lutas corporais e técnicas próprias de samurais e ninjas***

Ichigo a olhava incrédulo, pensando que aquilo era algum tipo de brincadeira. Mas, se fosse brincadeira, ela não saberia o nome de todas aquelas artes e técnicas, certo? Ainda embasbacado diante da singularidade daquela mulher ao seu lado, tudo o que Ichigo conseguiu dizer foi:

– Ah, então tá...

Rukia olhou para o ruivo e riu.

Ficaram conversando ainda por um bom tempo, quando Rukia percebeu o adiantado da hora e avisou que tinha que ir embora. Levantou-se e desta vez foi imitada por Ichigo, que disse:

– Sabe Rukia, me interesso muito por técnicas de luta. Você se incomodaria de encontrar-se comigo para treinarmos, aqui mesmo, na praia? - antes que ela lhe respondesse, acrescentou – sei todas as técnicas também, mas a pessoa que me ensinou foi embora e não tenho com quem treinar ultimamente. Então, o que me diz? – Olhou para a morena com seu melhor olhar “pidão”.

– Sim, seria ótimo. – Rukia respondeu, sorrindo – Meu irmão não tem tido muito tempo para treinar comigo ultimamente... E não quero enferrujar.

– Então, está combinado? Amanhã, logo após o almoço, talvez por volta das 2 horas? Afinal, assim teremos bastante tempo de luz para treinar.

– Combinado. Até amanhã, Ichigo. – disse, enquanto se virava e ia saia na direção que sua casa ficava.

– Até amanhã, Rukia. – disse o Ruivo, ainda admirando a morena que se afastava.

A noite correu tranquilamente, exceto para duas pessoas no reino, que não conseguiam dormir direito, ansiosas que estavam pelo dia seguinte.

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