Change Of Heart escrita por Sak Hokuto-chan


Capítulo 27
What's On Your Mind?


Notas iniciais do capítulo

Agradecimentos ao Orphelin, o carneiro-beta, que revisou tudo e me impediu de continuar reescrevendo o capítulo eternamente -q



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Capítulo XXVII

Talvez nós pudessémos fazer isso mais uma vez,
Talvez nós devêssemos tentar novamente
O que você tem em mente?
What's On Your Mind? - KISS

Milo inclinou o rosto para o lado, como um cachorrinho confuso, quando Camus meramente arqueou uma sobrancelha ruiva e ficou ali parado, encarando-o com seus olhos de cor estranha.

– Você até pode ter tudo de volta, mas só depois que deixar toda a confusão que sente de lado – o francês explicou com a voz fria e monótona, dispensando o tal déja vù. – Não estou disposto a ficar à mercê dessas suas vontades que vêm e vão o tempo todo.

– O que...? – o grego balbuciou, ainda com as mãos na cintura do aquariano; os braços deste envolta de seu pescoço e a boca tentadoramente próxima.

– Nunca gostei de perder tempo com incertezas, Milo – continuou, soprando as palavras sobre os lábios avermelhados do loiro. – Sei muito bem o que quero e, melhor ainda, o que não quero.

Mudo perante aquelas palavras, o escorpiano ficou olhando para aquele francês ruivo e pálido, lindo mesmo com aquele fundo sem graça de livros velhos e sob a luz esmaecida da biblioteca. Milo achava que sabia o que queria. Era tudo simples, certo e fácil na teoria. Na prática, contudo, ele hesitou, travando frente à segurança sobre si mesmo que Camus demonstrava ter.

E aquele segundo de hesitação lhe custou muito, pois foi o suficiente para que o aquariano o soltasse, afastando-se com uma expressão indecifrável para fora da biblioteca. Milo estapeou a própria testa. Como era estúpido! Teve o impulso de seguir o outro porque, afinal, queria mais do que tudo beijá-lo naquele momento.

Porém, ele não o seguiu. Nem naquela hora e nem depois de refletir sobre as palavras que ouvira. Não seria justo com Camus. Não ainda.

O que fazer? Sozinho não chegaria a lugar nenhum.

Foi quando encontrou a melhor pessoa para ajudá-lo naquela situação: Seu irmão de consideração, é claro! Não Aiolia, que só faria zoá-lo pela eternidade, mas Aiolos que, além de ser compreensivo, teria algo de bom para lhe dizer.

Por sorte, ao chegar à casa dos irmãos Ai-Ai – como diria Kanon –, ele encontrou o leonino ocupado na garagem. Treinava em sua bateria sob as instruções do sempre sombrio Radamanthys. Aiolia assentiu distraído quando foi questionado sobre a presença do sagitariano na casa, voltando a golpear o instrumento em seguida.

A vida inteira de amizade dava a Milo a liberdade para adentrar a casa, subir as escadas e abrir a porta do quarto de Aiolos de supetão, sem pensar muito. O máximo que já tinha acontecido, uma vez ou outra, foi ter encontrado o sagitariano só de toalha.

Agora, Milo não tinha muito certeza se era mais ou menos estranho encontrá-lo seminu ou naquela situação – leia-se: sentado na cama com Shura dormindo com a cabeça apoiada sobre suas pernas.

Aiolos o fitou com uma surpresa que, rapidamente, se desfez em uma expressão aliviada. Tinha se esquecido de trancar a porta. Ainda bem que não era Aiolia.

– E aí? – fez o grego mais velho, exibindo um sorriso despreocupado para Milo, que caiu em si e corou, balbuciando desculpas desconexas ao mesmo tempo em que se retirava. – Hey, volta aqui! Veio falar comigo, não foi?

Milo fez que sim, quase rindo quando Aiolos fez menção de se levantar, mas teve as pernas envolvidas com mais determinação por um Shura ainda adormecido. O sagitariano cruzou os braços, fitando, de forma contrariada, aquele que lhe impedia de levantar-se. Depois, seu sorriso tornou-se gentil e ele, aos poucos, desvencilhou-se com tanto cuidado que o capricorniano nem sequer ameaçou acordar.

– E ainda diz que eu durmo que nem pedra... – Aiolos comentou, revirando os olhos claros ao puxar o garoto a fim de irem para a sala.

– Mudou de ideia, hein? – Milo especulou já recuperado da surpresa e com um tom malicioso.

O sagitariano deu de ombros. Ora! O escorpiano estava na casa do Mu no dia em que voltaram do campeonato. Tinha ouvido bem quando Kanon dissera que ninguém falava não a Shura. Fazer o quê? Era a mais pura verdade! Embora – e essa parte ele não contou ao garoto e a mais ninguém – o caminho para chegarem até a situação atual entre eles tivesse sido meio... Melhor mudar de assunto.

Milo sentiu-se satisfeito pelo mais velho não tentar enrolá-lo com um não é o que você está pensando, eu posso explicar, seguido por alguma desculpa esfarrapada na vã tentativa de disfarçar o óbvio.

– E o Aiolia? Ele já sabe?

– Nem pensar! – Aiolos exclamou, pela primeira vez demonstrando algum constrangimento. – Ainda tenho que falar com ele, ahn, você sabe como ele é...

O escorpiano sabia e não queria estar por perto quando o sagitariano contasse. Podia imaginar muito bem o caos que a novidade desencadearia. Enfim, o grego mais velho mudou de assunto com extrema facilidade e Milo se viu contando todo o seu grande problema, ou seja, aquela coisa mal resolvida com Camus.

Ah! Como Aiolos foi perfeito naquele momento, atencioso e compreensivo, deixando toda a sua veia dramática abandonada enquanto pestanejava por detrás da franja castanha. Nenhuma cena, nenhuma piadinha. E quando, por fim, o sagitariano disse que entendia como o garoto se sentia, toda a confusão e o receio de Milo tornaram-se bem menores. Ele sabia que o outro estava dizendo a verdade, em vez de apenas tentar confortá-lo da boca para fora.

– E como você teve certeza do que queria?

– Sinceramente? – Aiolos suspirou, olhando para cima. – Não sei mesmo. Ele já fazia parte do meu dia a dia, estava sempre lá por mim. Aí, acabei me perguntando bom, por que não? É o Shura! De qualquer jeito, ele não ia desistir e sabe ser muito persuasivo quando quer. Vamos ver no que é que vai dar. Ainda tenho coisas a resolver, tipo contar ao meu irmão. Não vai ser fácil, nem com ele nem com ninguém, mas...

– Pronto! – exclamou Aiolia, entrando na sala como se tivesse sido chamado, todo elétrico e com a regata encharcada de suor.

Aiolos só teve tempo para coçar a cabeça e murmurar um pedido de desculpas para o escorpiano. Achava que não tinha dito nada de muito útil para ajudá-lo. Milo, por sua vez, sorriu, afirmando que o mais velho estava totalmente enganado, visto que tinha lhe ajudado bastante.

– O que estão conspirando aí? – Aiolia reclamou, chegando mais perto da dupla sentada no sofá, a conhecida manchinha vermelha de ciúmes em seu olhar.

– Nada! – Milo exclamou feliz. – Seu irmão é lindo e perfeito e eu o amo, só isso... – dito isto, estalou um beijo no rosto do sagitariano e atravessou a sala, correndo rumo à cozinha antes que o pior melhor amigo lhe acertasse um chute.

Balançando negativamente a cabeça, por causa dos resmungos do irmão, Aiolos voltou para o quarto. Distraído como estava, quase enfartou quando foi puxado pela cintura tão logo fechou a porta. A voz sempre baixa e grave de Shura murmurou uma pergunta ininteligível em seu ouvido, fazendo com que sentisse um arrepio correr pela sua coluna.

– Hey, é melhor descermos. A aula de bateria já acabou, o que quer dizer que logo meu irmão vai aparecer aqui e... Por que você está trancando a porta?

– Ele vai ficar quase uma hora no banho, então, mantenha a calma – Shura replicou, empurrando-o para que se deitasse na cama.

Geralmente era assim mesmo, Aiolos considerou, mas... mas...

Shura não deu a menor atenção, mais interessado em deslizar as mãos por debaixo da camiseta do grego, traçando o caminho dos músculos daquele abdômen bem definido.

Aiolos começou um de seus dramas sem sentido, sabendo que era inútil assim que o espanhol umedeceu o próprio lábio inferior e avançou sobre sua boca, calando-o de uma vez.

***

E foi calado que Mu se sentou frente a um comportado Aiolia na confeitaria, naquele início de noite quente como os lábios macios do garoto. Ainda pareciam queimar sobre sua pele toda vez que olhava as marcas roxas que desapareciam lentamente em seu pescoço.

Sim, estranhou a pontualidade do leonino. Conhecia pouquíssimas pessoas que chegavam no horário marcado aos compromissos e Aiolia, definitivamente, não era uma delas. Assim, ficou bastante surpreso quando chegou ao local e o viu por lá.

Aiolia voltou aquele seu sorriso torto e dúbio para o outro como se este estivesse ali o tempo todo. Aliás, como se, até então, não estivesse usando o bendito sorriso para flertar com uma garçonete loira que Mu achou estranhamente familiar.

Ela devia ser nova por ali e escondia metade do rosto corado atrás da bandeja, que tinha em mãos, conforme conversava sobre qualquer coisa com aquele grego atrevido.

Mu não podia culpá-la por isso.

Era uma mocinha educada e solícita, mas que ele mal percebeu se afastar, porque se pegou analisando Aiolia com mais atenção. Ficou satisfeito ao notar que não era o único que se preocupara em se arrumar com cuidado para aquele encontro. O leonino estava um absurdo de tão lindo e perfumado.

– Ahn... – balbuciou, percebendo que já estava encarando o mais novo por um bom tempo. Se bem que estava sendo encarado também e com muito menos pudor. Acabou comentando a primeira coisa que lhe veio à mente: – A garçonete nova não me é estranha...

– Ah, Esmeralda é o Shun com peitos – Aiolia replicou distraído, começando a olhar o pequeno cardápio. – Exqualquercoisa do Ikki. Não é à toa que não deu em nada. Deve ter sido meio estranho pegar alguém que é a cara do irmão, né?

Mu assentiu em silêncio, por mais que achasse exagerada a comparação feita pelo outro. De qualquer forma, estavam ali por causa de sua ideia de conversar, portanto, deveria começar a falar o que queria de uma vez. Só que eram tantas coisas em sua cabeça que ele só conseguiu expirar com força na medida em que torcia e retorcia a ponta da trança entre os dedos.

Foi como se tivesse emitido algum sinal. Aiolia levantou rapidamente a cabeça – abandonando o menu de doces –, apoiou os cotovelos sobre a mesa, o rosto sobre as mãos e passou a fitar o mais velho com muita atenção.

Seu olhar foi mais do que o suficiente para desconcertar Mu. Àquela altura, tinha certeza de que o grego sabia o efeito que lhe causava e, pior, que gostava disso.

– Eu só queria compreender o que houve dessa vez... – começou em voz baixa, ciente de que havia algumas pessoas sentadas nas outras mesas que, talvez, pudessem ouvir qualquer coisa por descuido seu. – Tudo ia bem até, ehrm, sua festa de aniversário. Depois daquilo, você começou a me evitar e eu achei que estivesse arrependido, mas já deixou claro hoje que não está... – explicou, lembrando-se do beijo que ganhara algumas horas antes.

Aiolia mordiscou o lábio inferior e soltou uma risadinha rápida:

– É claro! Se eu ficasse perto de você, ou te olhando muito, teria te atacado em público mesmo, de um jeito que você estaria morto de vergonha – deu uma piscadela para o outro. – Vê como eu pensei no seu bem?

Mu arregalou os olhos esverdeados. Não tinha pensado naquela possibilidade, obviamente. Agora, no entanto, as coisas faziam sentido. Aquilo se encaixava com o que o grego havia dito mais cedo sobre ter se arrependido apenas por não ter feito determinadas coisas na supracitada festa. Certo, então Aiolia tinha apreciado a experiência e, pelo jeito, estava disposto a repeti-la. Resumindo, tinha, mais uma vez, se preocupado desnecessariamente durante aquela semana.

– Você podia ter me dito isso antes! – reclamou inconformado. Poxa, já estava achando que o garoto voltara aos seus surtos de personalidade de alguns meses antes.

– Foi mal, foi mal! – disse, com um sorrisinho culpado. – Achei que era óbvio, sei lá...

– Aiolia, grave bem o que vou dizer – inclinou-se sobre a mesa também, assumindo uma postura mais séria: – Nada é óbvio quando se trata de você. Nunca! – e finalizou com um peteleco na testa do mais novo, endireitando-se novamente sobre a cadeira.

Aw! – o leonino exclamou, massageando a testa antes de fazer um gesto para que a garçonete se aproximasse. – Já disse, foi mal! – insistiu e se virou para Esmeralda, pedindo uma grande variedade de doces com nomes rebuscados e repletos de calorias.

O ariano franziu levemente o cenho diante do pedido do mais novo. Era tanto açúcar que acabou pedindo um simples café para si mesmo.

– Bleh... – fez o grego quando ficaram a sós de novo. – Só café puro? Sua boca vai ficar toda amarga, assim não dá...

– Espero que venha bem forte e amargo – replicou contrariado, entendendo muito bem o que ficou implícito nas palavras do outro. Francamente, quanta prepotência! – Desse jeito, você faz as coisas parecerem simples... – Mu constatou, retomando a conversa.

– Aff, elas são simples, você que complica! – revirou os olhos, empertigando-se na cadeira. – Eu queria, você queria, simples assim. Desencana, Mu! Não é como se eu tivesse te pedido em casamento ou algo assim.

Na verdade, Aiolia não tinha pedido nada mesmo, Mu pensou amuado. O mais novo já chegara fazendo o que queria... Certo, o que ambos queriam, mas... Bem! Podia ter sido qualquer outro e, no entanto, havia sido ele a vítima.

– Por que eu? – indagou num murmúrio quase inaudível.

Aiolia arqueou uma sobrancelha, como se aquela fosse a pergunta mais descabida do mundo, e respondeu dando de ombros:

– E por que não você?

Abrindo e fechando a boca num instante, Mu balançou a cabeça. Daquele jeito, acabariam em algum joguinho sinistro e duvidoso composto por meias palavras, se não por meias verdades. E muita coisa subentendida também. Não, não podia ser assim. Não lhe restavam energias para isso. Longos anos tentando entender, em vão, as mudanças de atitude de Aiolia tinham lhe esgotado. Mecanicamente, começou pelo óbvio:

– Você sabe-...

– Ah, sim – o leonino interrompeu impaciente –, minha idade, mimimi, o Aiolos, blábláblá... Não acredito que você ainda tá nessa. Seus argumentos são inválidos, sabe? Eu já te falei isso. Eu não sei por que você. Caramba, você me irrita e me atrai, sei lá!

Aiolia continuou repetindo seu sei lá para si mesmo e Mu não ousou interromper aquela exasperação. Nunca conseguira entender direito o motivo da irritação, mas... A atração era recíproca. E, ao que tudo indicava, bem evidente.

Quando a mocinha voltou com os pedidos, Mu tornou a ignorá-la, mesmo que sem intenção. Retorcia a ponta da trança sobre a perna pensativamente. Contudo, foi impossível não sorrir quando o leonino lançou um olhar extasiado sobre os doces e passou a comê-los com entusiasmo.

– Bem... – o tibetano tentou recomeçar, provando seu café forte, mas quase engasgou quando sentiu um joelho do grego se encostar ao seu. Tudo bem que havia uma toalha sobre a mesa circular, mas, ainda assim, o ariano lançou um olhar preocupado ao redor. Por precaução, afastou a perna um pouco para o lado, fugindo do contato. – Não faça-...

– O quê? – o grego interrompeu com aparente inocência, afastando uma mecha cor de mel que lhe cobria um dos olhos. – Isso? – deslizou um pouco para frente na cadeira e prendeu um joelho do tibetano entre os seus, soltando aquela risadinha característica.

Mu levantou os olhos para aquele adolescente inconsequente. E lá estava Aiolia, com seu sorriso petulante, olhando-o com curiosidade.

Aiolia...

– Hey – interrompeu de súbito, soltando-o antes que viesse algum protesto –, como as marcas sumiram tão rápido? – quis saber, movendo a cadeira para o lado do ariano a fim de observá-lo melhor. Seus dedos afastaram algumas mechas de cabelo do pescoço do outro, esbarrando na pele pálida de leve.

Quando o perfume do leonino invadiu o ar ao seu redor com mais intensidade, abalando seus nervos e convicções, Mu sentiu o rosto arder. Achou que fosse passar mal de tanto constrangimento ali mesmo. Aiolia era louco? Havia outras pessoas ao redor! Rapidamente, cobriu o pescoço com uma das mãos, esquivando-se, e contou, num murmúrio apressado, sobre o creme que Shion lhe arrumara para dar um jeito naqueles hematomas indiscretos.

– Hmm... – fez o mais novo, deslizando a mão ao longo da trança comprida.

– Olha, vamos continu-... Ah! – exclamou, quando o grego alcançou o fim de sua trança e apertou sua coxa, deslizando a mão até seu joelho com firmeza, mas bem devagar. – Ahn... – balbuciou perdido, indignado quando seu corpo resolveu responder ao contato com arrepios por todo ele. Pelos céus! Podia sentir tão bem o calor daquela mão atrevida através do tecido da calça que, sem perceber, fechou os olhos e prendeu a respiração por um instante.

Aiolia observava as reações alheia com interesse. Ver o ariano corado e desconexo daquele jeito, com o fôlego alterado por causa de seus toques, era incrível. Não havia tido tempo para apreciá-lo daquele jeito na festa, pois a correria para não serem vistos juntos atrapalhara muitas coisas.

– Não é simples... – Mu se ouviu repetindo chateado, esforçando-se para soar firme ao interceptar a mão de Aiolia com a sua, quando este resolveu subi-la pela parte interna de sua coxa. Estava ali, sofrendo com o contato, e o leonino naquela aparente indiferença? Injustiça! – Você está sendo insensível para com as minhas preocupações.

Um muxoxo impaciente foi toda a resposta que Aiolia proferiu por um momento. Mu pensava demais. Preocupava-se sem razão. As coisas eram tão simples! Ambos queriam a mesma coisa e o resto era perda de tempo.

– Saca só, Mu... – explicou, incerto e inquieto, movendo o polegar contra a palma da mão que prendia a sua debaixo da mesa. – Assim parece que estamos tendo uma discussão de relacionamento. E isso não faz sentido. Não por essas coisas que você diz. Muito menos agora, quando não existe um relacionamento.

Aquele comentário fez com que Mu soltasse a mão do mais novo, afastando-a de si, e o fitasse com o máximo de seriedade que pôde, para não dizer chateação. Pelo jeito, era inútil conversarem. O leonino era genioso e muito novo para se preocupar com a situação complexa que estavam enfrentando.

Mal sabia ele que sentiria falta daquele Aiolia mais tarde.

– Certo – começou, com a voz perfeitamente controlada, voltando a ser capaz de dominar as próprias emoções. – O que você quer?

– Agora? – replicou, desatento ao tom do mais velho. – Desfazer essa sua trança... – arriscou, mas se arrependeu depois do olhar estreito, digno de Shion, que recebeu. Acrescentou ligeiro: – Não sei, já disse. Foi tão agitado na festa que... – parou e bufou, como se estivesse muito cansado. – Seu problema, Mu, é que você olha pra mim e ainda vê o garotinho de oito anos. Mesmo que eu já seja mais alto do que você...

– Bem...

– Deixa eu te mostrar – o grego mordiscou o lábio inferior, piscando com uma malícia que devia ser proibida em menores de idade: – o quanto eu cresci...

Como se tivesse levado um choque, Mu estremeceu na cadeira ao sentir Aiolia apertar novamente sua coxa, com o dobro de pressão e vontade. Entreabriu os lábios, sentindo uma estranha ansiedade deslizar por seu corpo, um forte rubor espalhando-se em sua pele. Lançou um olhar atordoado ao redor, constatando que a confeitaria já estava quase vazia. Há quanto tempo estavam ali mesmo?

– Hey, que tal você fazer aquilo de novo? – Aiolia sugeriu baixinho, soltando-o sem pressa, bem tranquilo. – Deixar de pensar um pouco, como fez aquela noite? Aí, talvez eu descubra a resposta que você procura... – ao dizer isso ele não sorriu malicioso, apenas empurrou na direção do mais velho o pratinho com o único doce que restara. Levantou-se e foi acertar a conta com Esmeralda.

Mu ficou ali, sentado, encarando a sobremesa. Não queria pensar mais em nada daquilo. Aliás, não havia o que pensar, só havia uma alternativa lógica e racional: acabar com aquela situação problemática de uma vez.

No entanto, havia o doce de aparência tão caprichada e saborosa parado ali e lhe oferecendo aquela oportunidade tentadora. Era como um convite. Um desafio. A xícara de café, aquele tão forte e amargo, logo ao lado como uma última tábua de salvação. O tibetano sabia que tinha uma escolha segura. Coloque um ponto final. Ainda assim... Qual seria a descoberta de Aiolia? E como viveria naquela incerteza eterna do e se...? Era tarde demais e Mu fez sua escolha. Reticências... Sentiu o estômago gelado e a pulsação acelerar. Mas o desafio era mesmo saboroso.

Nunca soube precisar como chegaram até a sua casa tão depressa. Graças aos céus, Shion e Dohko ainda não haviam voltado. Os olhos do leonino faiscavam com tanta determinação que Mu se sentiu a caça da noite. Principalmente quando, assim que entraram, Aiolia o encurralou ali mesmo, contra a porta, daquele jeito felino tão provocante.

Também não saberia dizer exatamente em qual momento o grego desfizera sua trança; os dedos ágeis libertando suas mechas compridas enquanto deslizava a outra mão pela lateral de seu abdômen. Nesse momento, Mu já tinha fechado os olhos, concentrado no calor que os lábios de Aiolia espalhavam por sua pele – em especial, no trajeto que ele fez da sua mandíbula até o lóbulo da sua orelha, mordiscando-o e fazendo com que sua respiração falhasse.

Enquanto isso, suas próprias mãos continuavam comportadas na nuca do leonino, fazendo carícias tímidas entre aqueles cabelos bagunçados. Bom! Foi assim até Aiolia atacar seus lábios com beijos impacientes e exigentes, aqueles que lhe eram característicos. A boca tão adocicada e voraz que Mu ousou estender os toques para as costas do rapaz, arranhando-lhe a pele macia de leve – do jeitinho que descobrira, durante a festa, que fazia o outro se arrepiar inteiro.

Aiolia apertou os quadris estreitos do ariano com tanta vontade que deixou marcas. Seu corpo pressionando o dele cada vez mais, sem parar com os beijos e mordidas naqueles lábios rosados – exceto para sugerir que Mu tirasse aquele creme do pescoço, coisa que o tibetano se recusou a fazer, alegando que já não havia espaço em sua garganta para novos hematomas.

Mu começou a rir e a contorcer-se quando o leonino moveu os dedos sobre seu abdômen, fazendo-lhe cócegas como forma de vingança por sua resolução. Aiolia definitivamente fazia as coisas parecerem simples, pensou, abraçando-o pela cintura e apoiando a cabeça no ombro dele. Incrível como era reconfortante ficar daquele jeito com o mais novo, apenas abraçados, algo que queria ter feito desde a festa, mas que havia sido impossível em meio à correria em que ficaram.

O momento não durou muito – graças à impaciência de Aiolia, que logo começou a deslizar as mãos por debaixo da camisa do ariano, subindo e descendo pela coluna deste com bastante entusiasmo –, mas a sensação de que tudo estava certo e nada mais importava perdurou. Sim, a mesma sensação que tivera na festa e que julgava ser impossível de ser experimentada novamente. Aquela idealização estranha e preocupante.

Dessa vez, porém, a sensação continuou mesmo depois que Shion e Dohko chegaram, o que fez com que Aiolia lhe roubasse os últimos beijos com pressa antes de partir sorrindo para a dupla recém-chegada, dizendo a eles que Mu era um ótimo jogador de Pokémon.

E a sensação continuou lá enquanto Dohko piscava divertido para Mu e Shion apenas o olhava como se estivesse captando alguma coisa diferente no ar.

Assim, foi contagiado por aquele sentimento que transbordava de dentro de si, que tudo começou de uma vez por todas... Que Mu resolveu ceder aos apelos de Aiolia e, o mais importante, aos seus próprios.

***

Shina bem que queria que qualquer coisa interessante começasse. Os dias andavam amenos demais para seu gosto. Onde estava seu precioso yaoi diário? Milo e Aiolia não andavam se provocando ultimamente. O primeiro parecia estar tramando algo, concentrado em só os deuses sabiam o quê. O segundo parecia atordoado, uma bomba de energia prestes a explodir, incapaz de parar quieto mesmo durante as aulas.

Seiya era um que não queria nem ouvir falar daquela safadeza. Afrodite, então, era uma estátua fria e inacessível no que dizia respeito às intimidades que compartilhava com Máscara da Morte. Camus era outro que não deixava brechas para uma aproximação. Suas esperanças se voltavam para Ikki e Shaka – pois, sim, ela já estava sabendo do beijo que o oriental roubara do virginiano –, mas se estava rolando algo a mais entre aqueles dois, bem, era difícil de dizer. Eles eram muito discretos, ou não tinha nada acontecendo mesmo e o tal beijo não passava de especulação.

– Vocês estão perdendo um tempo precioso! – Shina exclamou para Milo e Aiolia no meio do intervalo, os três sozinhos em um canto qualquer da quadra enquanto os demais amigos não apareciam. – Yaoi é vida, gente!

O leonino sorriu largamente para ela:

– E yuri? Por que você nunca fala de yuri?

– Fala sério! De peitos, na minha vida, já bastam os meus, okay? – Shina replicou, beliscando o escorpiano quando este comentou que, por sinal, eram belos peitos. – Não mudem de assunto. Pensem bem, tá cheio de casais yaoi à nossa volta...

– Cheio onde? – Milo quis saber, brincando, distraído, com um de seus longos cachos dourados. – Só tem o Shion e o Dohko. O Máscara da Morte e o Afrodite não contam, são uma bizarrice à parte... – naturalmente, sabia que havia mais um, embora ainda não pudesse mencioná-lo diante do leonino.

– Ok, ok – Shina continuou, imperturbável: – Tem vários caras que demonstraram inclinações ao yaoi. Sabem o que isso significa?

– Que estamos na gaylândia? – Aiolia arriscou, fingindo interesse, o que causou risos em Milo.

– Não, sua besta! – Shina deu um tabefe no topo da cabeça dele. – Significa que yaoi é muito bom! É que vocês não provaram tudo ainda, por isso não concordam comigo...

Os dois tiveram receio em perguntar o que, precisamente, aquilo queria dizer, mas não foi necessário. A garota fez questão de explicar em tom conspiratório:

Lemon, é isso que falta!

Milo engasgou com a própria saliva, tossindo tanto que Aiolia precisou dar uns tapas em suas costas. Passado o susto inicial, os dois começaram a protestar, reclamando que a garota estava tão louca que precisava ser internada. Sem contar que já tinham dito que nunca seriam ukes de ninguém.

Shina distribuiu novos tabefes. Ora, que fossem semes então!

– Eu ajudo vocês a encontrarem ukes bem bonitinhos... – prontificou-se empolgada. – Tipo, sei lá! O que acham do Alberich da classe do Ikki?

– Aquele ruivo chatíssimo e todo metido? – Aiolia franziu o cenho em desgosto. – Nem ferrando!

– Concordo! Fresco por fresco, seria melhor o Misty então... – Milo opinou, sem saber por que diabos estava entrando naquela onda da italiana. – Não, esquece! É outro que deve ser cheio dos nhenhenhéns na cama...

– Hmm... Tem o Shun, que é bem fofo – Shina tentou, ganhando olhares descrentes em troca. – Tá, entendi, o Ikki arrancaria os couros de vocês... Hmm... Shaka?

Aiolia e Milo se entreolharam. Nunca! Shaka e seus não-me-toques eram o cúmulo do azedume e Ikki também os esfolaria vivos.

– Verdade, sem falar que... – Shina pôs-se a pensar alto, um tanto incerta: – Acho que o Shaka é seme...

Silêncio. Um perturbador momento de puro silêncio.

Os dois rapazes a encaravam com um espanto palpável. Em qual universo paralelo Shaka era seme? Shina encolheu os ombros. A aparência do indiano podia não ser exatamente a mais varonil, mas considerando o porte e a personalidade...

– Nem assim – Milo a interrompeu. – Me arranja aí um desses que você andou fumando, Shina, porque só isso pra explicar o que acabou de dizer – e riu mais um pouco, parando no exato momento em que a garota iria acertá-lo novamente. – Ok! Mas falando sério agora, eu sempre achei que o Shaka era assexuado ou algum tipo de uke que se faz de santinho, mas que conhece todo o Kama Sutra de cor...

– Até porque – Aiolia complementou, rindo também – se o Shaka for seme, o Ikki automaticamente vira o uke, né? Imagina o Ikki sentado no colo dele, rebolando e gemendo me possua, Shaka, bem forte! Hahaha, não dá!

Eles só não continuaram rindo e dizendo mais bobagens porque Shina tratou de voltar ao assunto que realmente importava:

– Esqueçam o Shaka! Vamos lá, que tal o Myu, da turma do Ikki também?

– Nah, muito... colorido – Milo contestou, sem se dar ao trabalho de explicar que crítica mais sem sentido era aquela. – Mas, caramba, hein? Ikki vive rodeado de ukes em potencial e foi querer logo o Shaka...

Para pentelhar mais Shina, Aiolia replicou que era porque Shaka era seme, o que fez com que ela distribuísse uma nova rodada de tabefes, em vez de voltar nessa questão. Depois, mesmo sob os protestos dos outros dois, continuou citando outros possíveis ukes que conheciam.

Não que tenha dado certo. Mime, por exemplo, apesar de parecer uma boa opção, era cheio dos problemas. Orpheu, que ela achava ser mais um uke a sair em breve do armário, revelara há pouco tempo seu namoro com uma tal Euridice, o que parecia ser bem sério. E Afrodite, por melhor que pudesse ser, não estava exatamente disponível e tinha um temperamento terrível, sem falar que era amigo deles. Nesse meio tempo, vários outros foram citados – até alguns nem um pouco bonitinhos –, por mais que todos fossem rechaçados.

– Vocês são muito seletivos, não acham? E olha que nem estão com essa bola toda, ok?! – Shina protestou aborrecida, concentrada demais para notar que eles nunca escolheriam ninguém porque simplesmente não estavam interessados em experimentar lemon com quem quer que fosse.

– Oh, quase que a gente esqueceu... – disse o escorpiano, olhando de viés para o outro grego. – Tem o Mu também... – sugeriu com um sorrisinho bem suspeito.

– Nada de Mu – Aiolia respondeu automaticamente, a voz ríspida fazendo a italiana fitá-lo com desconfiança.

– Mas você já até beijou ele uma vez... – disse Milo ao acaso, referindo-se ao acontecimento do Meikai que o leonino lhe contara, sabendo que Shina pensaria que estava falando sobre o episódio da aposta de três anos atrás.

– É mesmo! – ela exclamou esperançosa, ficando pensativa em seguida: – Falando nisso, o Milo aqui ainda deu uns pegas em outro rapaz, mas você, Aiolia, só ficou nos selinhos, né? Você tá muito atrasado!

Aiolia ficou quieto até demais. Sabia que Shina estava pensando naquela aposta do passado e nos selinhos que Milo costumava lhe dar na infância. Não parecia uma boa ideia atualizá-la e, por isso, o leonino quase fulminou Milo com o olhar quando este murmurou um insinuante será? para o ar.

– Não tem problema! – Shina prosseguiu, fazendo uma anotação mental sobre investigar aquela insinuação direito mais tarde. – Você faz tudo de uma vez e economiza tempo. Ah, o Mu! Ele é gentil, educado e muito bonito... E deve ser dos bons, depois de ter namorado o Shura e tudo, né?

Aiolia mordeu o lábio inferior com força, apertando os punhos até as juntas ficarem pálidas:

– Nada a ver... – murmurou desgostoso.

– Por quê? Vocês precisam experimentar pra verem o que estão perdendo... – a garota afirmou convicta. – E você, Milo, se tivesse feito desde aquela primeira noite no Meikai, não estaria nesse chove e não molha com o Camus...

O escorpiano fechou a cara, aborrecido por causa da menção ao nome do francês.

– Tá aí – Aiolia resolveu revidar, sorrindo de lado para o pior melhor amigo. – Camus seria um bom uke, eu acho...

Pode esquecer! – Milo esbravejou indignado, ficando vermelho em seguida.

– Oh, parece que o Milo-chan já escolheu seu u-kee! – Shina cantarolou alegre, fingindo que não ouviu o vá se danar que o escorpiano resmungou.

– Ótimo! Depois você me conta como é, tá, Flor do Campo? – Aiolia perguntou, dando corda para que Shina se esquecesse dele um pouco.

Mas é claro que Milo não podia deixar passar em branco aquela provocação. Seu espírito vingativo decidido a mirar bem no orgulho do leonino, mesmo sabendo que tinha sido o culpado por começar aquela discussão, depois de mencionar o nome do tibetano:

– Okay, Estrela da Manhã, é o único jeito de você saber, já que nunca conseguiria arrastar um uke pra cama, né?

O que foi que você disse?

Shina rapidamente pegou a ideia no ar e não perdeu tempo:

– Não deixa ele falar assim, não! Você consegue, Aiolia!

– Cara, é mais fácil eu conseguir levar todos esses ukes pra cama ao mesmo tempo – o leonino afirmou, fervendo de indignação – do que você conseguir um lemon com o Camus...

Milo teve o impulso de perguntar quer apostar?, mas lembrou-se, a tempo, de que não seria nada legal fazer uma aposta daquelas. Se o respectivo uke descobrisse depois, nossa!

– Olha, não importa com quem seja, Ai-chan, só te digo que posso fazer. Não tenho medo ou sei lá...

– Eu também não, oras!

Shina sorria como se o Natal já tivesse chegado, trazendo-lhe os melhores presentes do mundo. Ela tinha a plena certeza de que aquela história ainda iria render bastante, animando aqueles seus dias repletos de mesmices.

E ela tinha razão, por mais que não soubesse o quanto.

Continua...


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Notas finais do capítulo

É, bem, eu devo dizer que apesar dessa história aloka de lemon que a Shina começou, a fic continua sendo apenas +16, então nada de lemons por aqui... '-'

Enfim, estou numa "deprê pré-fim de fic". Por um lado, a fic está terminando e isso é incrível, nunca levei uma longfic tão longe e estou feliz ^^ Por outro lado, depois de dois anos me dedicando a ela, vem uma sensação de, sei lá, ter criado um filho e ele sair de casa, meu bebê solto pelo mundo, haha -qqq E não posso acabar de qualquer jeito, né? Por isso eu demoro mais, reescrevendo várias vezes e tal (esse cap aqui eu reescrevi cinco vezes antes de mandar pro carneiro-beta oo e ele querendo me matar... -q). Porque, né, quem leu todos capítulos até agora merece todo o meu capricho e dedicação até o final S2

Logo, os comentários de vocês são ainda mais importantes nesse momento, pra eu saber se as coisas estão se desenvolvendo bem e tudo S2 Assim, meus agradecimentos aos queridos que mandaram reviews e mensagens: Orphelin, Bruna Uzumaki, Kina-Ino,Taia, serena, Suzuki_Yoi, Suh, sam chan, CaioAzly, Svanhild e katsu S2

Desculpa a demora e que tal esse capítulo? =3



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