Change Of Heart escrita por Sak Hokuto-chan


Capítulo 22
Time


Notas iniciais do capítulo

Orphelin, meu carneiro-beta aloka, obrigada pela revisão³³



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Capítulo XXII

Eu não sei explicar, não posso apontar
A diferença que nos torna tão diferentes
Dessa vez eu não tenho nada a perder
Time - Creed

Era só o que faltava! Ser beijado, de novo, sem seu consentimento? Shaka empurrou o atrevido pelos ombros e o encarou. Estava visivelmente chocado. Como a expressão não lhe caía bem, ele rapidamente se recompôs, por mais que continuasse a fuzilar Ikki com os olhos azuis muito claros.

Não precisava perguntar nada, afinal, aquele leonino infeliz sabia – é claro que sabia! – que devia satisfações e, o mais importante, que não poderia escapar como Aiolia, o outro leonino abusado, fizera alguns instantes antes.

Por sua vez, Ikki apenas o encarou em silêncio, um sorrisinho torto pairando em seus lábios. Shaka certamente arrancaria, se pudesse e sem a menor compaixão, cada um de seus cinco sentidos, só para começar.

– Por que – Ikki arriscou, decidido a viver perigosamente – você tá tão aborrecido, já que sai aceitando beijos à força?

Aceitando? – o indiano repetiu lentamente, como se aquela fosse uma palavra que ele não conhecesse, apertando os punhos de um jeito que fez o outro rapaz dar um passo automático para trás. – Como você ousa dizer que...?

– Eu ainda não disse – o leonino cortou, ignorando o jeito como uma das sobrancelhas do loiro estremeceu frente à abrupta interrupção –, mas se quer mesmo saber, loiro enjoado, eu gosto de você.

A boca do virginiano abriu-se involuntariamente. Ele tratou de fechá-la rápido, porém, continuou olhando para Ikki como se este tivesse desenvolvido um par de asas cor de laranja bem ali, na sua frente. Como aquela criatura podia dizer um disparate daquele com tamanha naturalidade, balançando os ombros como se fosse, por exemplo, um comentário aleatório sobre o clima? Está quente hoje, eu gosto de você, acho que vai chover mais tarde...

– De qual realidade paralela você tirou essa ideia? – Shaka inquiriu, a voz fria e controlada com algum esforço.

Ikki deslizou o dedo indicador pela cicatriz que tinha na testa e deu de ombros de novo. Sentou-se sobre a mureta, logo ao lado deles, e disse que não dava para explicar, acrescentando apenas o fato de que simplesmente se viu interessado no loiro e que não era algo muito recente.

Shaka mordiscou o lábio inferior, sem perceber que estava reproduzindo um gesto típico de Aiolia, e respirou fundo ao lembrar-se de sua própria conversa com Mu. Aliás, seria impossível não recordar-se dela. E, por mais que afetasse seu orgulho, a verdade é que também não tinha conseguido se explicar direito, certo? Comparando as duas situações, começou a achar que a resposta de Mu se encaixava perfeitamente bem naquele momento.

– Olha... – começou, fazendo menção de se sentar também, mas desistindo no último instante. Não parecia adequado ficar assim tão perto daquele maluco que podia muito bem tentar assediá-lo de novo. – Sei que ficamos um tanto mais próximos depois daquele lamentável incidente no Meikai...

O sorriso de Ikki ampliou-se um pouco mais.

– Mas não é pra tanto – o indiano prosseguiu, a voz seca permanecendo imperturbável.

– Estou ouvindo – disse o rapaz, após um breve silêncio.

– Ora! – bradou indignado, quase perdendo a concentração. Contudo, respirou fundo e repetiu as palavras de Mu para o outro, convencido de que elas se aplicavam muito mais ao caso daquele insolente, que mal o conhecia direito, do que ao seu próprio.

Assim que acabou de dizer que Ikki simplesmente estava confuso porque o via como uma espécie de irmão mais novo, Shaka percebeu que era a conclusão certa. Óbvio! Era questão de pura observação e análise, uma vez que o oriental era superprotetor com Shun, o irmão caçula. Logo, o mais provável era que depois de ter se dado ao trabalho de cuidar do indiano naquela noite absurda, o rapaz tinha passado a vê-lo como alguém que precisava de proteção também. Sim, confusão esclarecida.

Ikki apoiou a mão sob o queixo, seus cabelos escuros balançando suavemente com a brisa, enquanto ele considerava o argumento por um instante. Alguns segundos mais de reflexão para, só então, replicar:

– Não.

– Deixa de ser petulante! – Shaka volveu de imediato, não gostando nada de ter toda sua análise contrariada, principalmente por ele mesmo estar convencido daquela verdade. Malditos leoninos que adoravam perturbá-lo.

O moreno estalou a língua, a paciência já curta por natureza diminuindo ainda mais:

– Eu sei muito bem o que estou falando. Não venha achando que sabe o que eu sinto melhor do que eu mesmo. Seja menos prepotente.

Aí, Shaka começou a ficar ofendido:

– Não é questão de prepotência, seu arrogante, mas de lógica. Sequer nos damos muito bem... – balançou a cabeça, afastando a comprida franja dourada de cima dos olhos.

– Pois, acredite você ou não, é isso o que sinto. Simples assim! Gosto, sinto atração, fico excit-... – Ikki interrompeu-se ao notar o que ia dizer. – Ah, você entendeu!

O indiano apenas ficou quieto, fitando o ser à sua frente. Aquele pobre infeliz estava delirando, só podia ser isso.

– Tudo bem que você é um fresco... Um entojado... – Ikki continuou, fazendo caretas a cada novo adjetivo atribuído ao virginiano. – Mas continua sendo atraente à sua maneira.

Fresco? Entojado? Definitivamente, aquela criatura não estava sã. Shaka virou-se de costas, mastigando um insulto bem depreciativo. Eram tantos os absurdos que andava vivenciando que nem sabia por onde começar a avaliar a situação.

Foi por pouco que Ikki não deu risada diante da insistência do outro em não perder a pose superior. Só que preferiu continuar seu raciocínio de forma decidida, disposto a convencer o virginiano:

– Olha, sei que você é inteligente e coisa e tal, mas sei também que é uma completa desgraça no campo afetivo. Dá pra notar de longe. Além disso, tá na fase da negação...

Ikki levantou-se e deu alguns passos para perto do indiano, parando assim que ficaram cara a cara. Não pôde deixar de admirar-se com aquela cena. O sol atingia o loiro por trás, dando-lhe uma aparência de santo estressadinho e, ao mesmo tempo, fascinante.

– Mas se concluir que não tá a fim, é só dizer. Não vá pensando que serei do tipo que fica no pé, que vence pela insistência. Não sou desse tipo. Tenho amor-próprio, sabia?

– Cale-se! – Shaka ordenou, fechando os olhos e sentindo uma leve dor de cabeça. – Só... fica calado – insistiu, afastando-se rapidamente daquele ser obtuso tão logo ouviu o som estridente do sinal, que indicava o término do intervalo.

Como diria um velho ditado popular: salvo pelo gongo.

***

E, como esperado para aquela época, os dias começaram a ficar mais frenéticos. A data do início do campeonato nacional – que ocorria todo ano e era como uma espécie de olimpíada, contemplando os melhores em cada esporte de todas as universidades –, estava se aproximando.

Os esportistas escolhidos viviam elétricos de um lado para o outro, já que seus treinos eram intensificados naqueles dias que precediam o evento. Quem não fosse participar, por outro lado, estava liberado para assistir aos jogos ou tirar aqueles dias para fazer o que bem quisesse. Até mesmo os estágios cessavam durante aquela data. Era natural, portanto, que todo mundo estivesse animado e ansioso na universidade.

Aldebaran mal via Shura, Aiolos, os gêmeos e Pandora, ocupados como estavam com seus treinamentos. Outra pessoa que havia sumido, embora não participasse das competições, era Mu. Estranho! Pensando melhor, nas poucas vezes que o vira, o ariano parecia um tanto... apático e distante. Parecia preferir manter-se afastado de todo mundo.

Aiolos notara aquilo também, mas a correria em que estava não deixava espaço para grandes especulações. Sem dizer que Mu não facilitava qualquer tentativa de conversa, esquivando-se sempre com alguma desculpa bem educada. Típico dele. Parecia, até mesmo, evitar o sagitariano o máximo que conseguia.

Enquanto isso, toda a preparação dos universitários começou a ter reflexo direto na vida diária dos colegiais – negativos, como alguns diriam. Era o caso tanto de Shina e Marin quanto o de Aiolia e Afrodite, que ficaram sem seus respectivos instrutores ao longo daquele tempo, já que os mesmos andavam ocupados com seus próprios treinos.

Aiolia, por sinal, meio que ficou sem o irmão também pelo mesmo motivo, o que não era muito ruim, visto que Aiolos teria notado que sua agitação e irritação, que começaram desde a última ida ao Meikai, andavam afetando seus amigos. Que gênio difícil!

Duas semanas já tinham se passado e o leonino não dava mostras de que ia sossegar. Melhorava quando ele se distraía o bastante com os próprios pensamentos, mas se alguém cometia o erro de mencionar o nome Mu, a coisa toda voltava a ficar crítica. Só que ninguém conseguiu relacionar uma coisa com a outra, ocupados como estavam com seus próprios, pequenos ou grandes, problemas pessoais.

Entretanto, sempre havia alguém contente no meio de um bando de gente confusa e problemática, sendo a sortuda da vez: Shina. Tudo bem que Milo tinha desaparecido por alguns dias, atrapalhando seu divertimento pessoal, que era pentelhá-lo, mas desde que ele voltara... Ah! Sua vida tinha ficado bem mais colorida com os momentos yaoi que ele acabava proporcionando mesmo sem saber. Ou talvez soubesse, quem sabe?

– Você tá todo bravinho por ter sentido minha falta esses dias, é? – o escorpiano perguntou ao seu pior melhor amigo.

Eles estavam na sala de aula vazia, ou era o que Milo imaginava, enquanto os demais alunos curtiam o intervalo bem longe dali.

Shina, que estava sentadinha em uma carteira aos fundos e tão silenciosa quanto uma cobra, apenas observava a cena. Torcia para que o mau humor do leonino não atrapalhasse as brincadeiras e piadinhas yaois que ela adorava quando ele fazia.

Aiolia não a decepcionou:

– Talvez, minha Maçã-do-Amor... – disse, piscando um olho de forma sugestiva ao estalar uma palmadinha no traseiro do outro.

A italiana vibrou de emoção, já antevendo Milo corar daquele jeitinho fofo, como costumava fazer, antes de começar a xingar o pior melhor amigo e sair amaldiçoando tudo.

Só que, contrariando as expectativas, o loiro apenas sorriu de lado. Ou melhor, sorriu e deu um tapinha sob o queixo do leonino, dizendo a este que já podia se animar então, pois estava de volta e para ficar.

Aiolia e Shina se entreolharam e encararam o escorpiano com estranheza.

Desde então, Milo vinha rebatendo todas as provocações sem se aborrecer mais, isto é, como faria pouco tempo antes. E, por mais suspeito que fosse, Shina estava se divertindo demais para se importar com aquela drástica mudança.

***

Era Mu quem andava exageradamente se importando com tudo, de modo a não conseguir se divertir. Ele adorava aquela época do campeonato, pois assistia aos jogos e torcia pelos amigos, mas, daquela vez, só conseguia se retrair pensando em seu terrível comportamento.

Certo, tinha exagerado ao chamar o leonino de criança – Nossa, ele ficou furioso! –, mas... o que podia dizer? Aiolia era bem mais novo mesmo. Podia até ter passado da infância e ser alto e ter um corpo bem definido, mas não era muito mais do que uma criança ainda.

Sem contar que era irmão do seu melhor amigo. O que Aiolos diria sobre aquilo?

Mu não conseguia olhar para o sagitariano sem se sentir mal. Então, ele o evitava sempre que possível. Não era difícil, já que o grego andava tão ocupado com seus treinos, mas era chato e embaraçoso ter que inventar mil desculpas para não ir até a casa dele.

Concluiu que precisava de um tempo fora. Aproveitaria os dias do campeonato para visitar seu lar no Tibete. Sabia que os amigos ficariam bem chateados se não fosse acompanhar os jogos, porém, era a melhor coisa a ser feita àquela altura. Distância e paz o ajudariam, era o que pensava.

E a justificativa para sua ideia de partir fazia mais sentido a cada vez que topava com o leonino pelas ruas, o que não era incomum devido à proximidade de suas casas. Nesses ligeiros encontros, eles não se falavam e mal se olhavam, mas a situação se agravava. Era perceptível.

Naturalmente, Mu já tinha se arrependido de não ter falado com Aiolos – sobre Aiolia – antes. Era tarde demais para qualquer tentativa de conversa. A confusão já estava instalada.

– Você não vai? – o sagitariano indagou, só para confirmar se tinha entendido direito aquela novidade que o amigo resolveu contar às vésperas da olimpíada, na saída da universidade.

– Sinto muito! Eu queria ir – Mu explicou com sinceridade, meio apressado. – Mas esses dias livres de aula e estágio cairão como a oportunidade perfeita pra eu visitar minha família, entende? – e era verdade, por mais que estivesse omitindo alguns detalhes.

Aiolos olhou para o amigo, ponderando suas palavras. Ele sabia – e Mu sabia que ele sabia – que tinha mais coisa, estava claro. Todavia, resolveu deixar sua curiosidade de lado. Em outro momento, tiraria aquela história a limpo.

– Boa sorte, Aiolos! – desejou, antes de se virar para ir embora, aliviado porque o outro não o acompanharia devido à agenda apertada com os treinos. – Com os jogos e com o Shura, principalmente.

O sagitariano quase engasgou com a própria saliva. Andara tão concentrado que havia esquecido que o prazo final para dar uma resposta ao espanhol estava próximo.

E agora?

***

Finalmente chegou o dia da viagem para o campeonato, pois ele aconteceria em outra universidade que ficava bem longe. Aiolia era quem mais estava se sentindo pressionado com esse fato... Literalmente, pois Aiolos o apertava com força entre os braços, espremendo-lhe o rosto contra o tórax enquanto fazia inúmeras recomendações. Estava preocupado. Era a primeira vez que o caçula ficaria completamente sozinho em casa por vários dias.

– Tem certeza de que não quer que eu fique? – o sagitariano perguntou, como se aquilo fosse realmente possível, afrouxando um pouco o abraço para que o irmão pudesse levantar o rosto e olhá-lo. – Eu não imaginei que nossos pais estariam viajando justo nessa época dos jogos.

– Claro que não! – Aiolia revirou os olhos, sendo tomado pela indignação. – Não sou mais uma criança... – disse num tom de voz subitamente baixo, semicerrando os olhos. Parecia falar consigo mesmo. – Por que ainda acham que sou uma?

Aiolos surpreendeu-se com aquela mudança de comportamento. Aiolia estava reclamando agitadíssimo há um instante e, de repente, parecia confuso e aborrecido. O mais velho desfez o ar dramático e ergueu suavemente o queixo do menor, fitando-o com atenção.

– Eu sei que não é mais uma criança, mas continuo me preocupando com você. Só que, agora mesmo, estou apenas azucrinando, porque sei que você não gosta.

Encolhendo os ombros, o leonino apenas lançou um olhar vago através da franja. E Aiolos percebeu que tinha muito mais coisa por trás daquelas atitudes.

– O que há com você? – inquiriu com seriedade, deslizando os dedos pela raiz dos cabelos do irmão e penteando-os para o lado, de forma que pudesse ver melhor o rosto dele. – Tem estado estranho de uns dias pra cá.

Aiolia encarou o irmão com toda a atenção que podia. Como se o visse pela primeira vez em muito tempo. Sentiu-se, de modo repentino, esquisito e deslocado. Eram parecidíssimos fisicamente. Por que, então, não se pareciam mais em outros aspectos também? Seria muito mais fácil se pudesse ser tranquilo como o mais velho, se não fosse tão impulsivo e não se comportasse de uma forma tão estranha que, às vezes, ele mesmo mal se reconhecia.

O sagitariano ficou dez vezes mais preocupado diante da expressão atormentada do caçula. Porém, antes que pudesse falar mais alguma coisa, Aiolia balançou levemente a cabeça, como se voltando a si, e sorriu. Depois, disse que não era nada, que só andava cansado pelos treinos e estudos. E que Aiolos parasse de se preocupar tanto e fosse logo! A julgar pelo tempo daquela despedida, o irmão ia acabar se atrasando demais.

Aiolos estreitou os olhos, sem se dar por satisfeito com aquele movimento evasivo. Estava disposto a investigar melhor as coisas quando voltasse – Hmm, Aiolia e Mu andavam estranhos, teria alguma relação? Enfim, Aiolia não queria falar e nem havia mais tempo para conversas. Ou seja, apenas sorriu e abraçou o mais novo outra vez.

– Bem, desencana dessa coisa de criança pra cima de mim!– exclamou, alheio aos protestos abafados. – Saiba que mesmo quando você tiver sessenta anos e eu quase setenta, vou continuar tratando você como meu irmãozinho... Não importa quanto tempo passe. O irmãozinho fofo que vivia agarrado em mim, que se escondia em minha cama no meio da noite como um gatinho assustado e...

Fala sério, Aiolos! – o leonino interrompeu, erguendo a cabeça com esforço, todo avermelhado pelas lembranças constrangedoras da sua infância. – Você tá me envergonhando na frente do meu futuro cunhado... – provocou e olhou de viés para Shura, que esperava o término da despedida entre os irmãos parado em frente ao carro, assistindo-os com um cigarro entre os lábios.

O sagitariano arregalou os olhos, soltando o caçula, e já ia protestar quando o garoto se adiantou:

– Agora é sério! – murmurou, puxando a gola da camisa do mais velho. – Não vá bancar o uke dominado, hein? Seja o seme e manda ver! Aw! – choramingou ao ser atingido por um tabefe na cabeça.

– Vou indo então – desconversou, apoiando as mãos nos ombros do irmão ao dizer com solenidade: – Não destrua a casa, me liga quando quiser e pode dormir com um dos meus travesseiros quando a saudade apertar, ok?

– Vá de uma vez!

Aiolos riu, estalou um beijo na testa do mais novo e partiu na companhia de Shura.

Respirando fundo, Aiolia encostou as costas na porta e deixou-se escorregar até o chão. A cena toda, bem ali no jardim, o deixara exausto como se tivesse treinado o dia inteiro. Só que ele não sabia que ainda tinha mais:

– Ah! Que decepção... – fez Shina, aparentemente brotando do nada, caminhando em direção ao leonino enquanto arrastava Marin por um braço.

Parecia evidente que a garota estava à espreita apenas esperando o momento certo – ou errado, dependendo da perspectiva – para entrar em cena.

– Eu aqui crente de que ia rolar um incesto yaoi...

– Fica pra próxima... – Aiolia replicou distraído, mas superinteressado no uniforme de líder de torcida que Marin estava usando.

Não era dia de treino, nem de jogo. Então, não havia razão para ela usar aquilo, se não Shina também estaria usando. Não que ele achasse ruim, lógico!

Marin parecia estar pensando a mesma coisa, fitando o grego com um olhar que parecia dizer não pergunte, por favor!.

Aí, Shina simplesmente empurrou a ruiva para cima do rapaz, como se ela fosse uma encomenda qualquer. Graças aos bons reflexos, Aiolia levantou-se agilmente a tempo de segurá-la.

Assim como surgiu, a italiana desapareceu de repente, mas não sem antes dizer que aquilo era tudo, deixando Aiolia e Marin sem qualquer explicação plausível para aquela loucura.

Dividida entre a exasperação e o constrangimento, Marin permaneceu calada naquela posição meio abraçada com o leonino.

– Ela surtou de vez? – ele perguntou, ainda olhando para a direção em que a ariana seguira.

A única reação da ruiva foi apertar a frente da camiseta dele com nervosismo, fazendo com que ele a fitasse com uma atenção renovada.

No entanto, Marin não o olhou de volta, preferindo manter a cabeça abaixada como se o chão pudesse ser mais interessante.

– Ahn, tudo bem? Você parece meio... espantada comigo, ou algo assim...

Ela levantou a cabeça com hesitação, a expressão confusa de Aiolia a fazendo sorrir finalmente. Suas mãos pararam de tremer, ao se sentir mais confiante, e deslizaram suavemente pelo tórax do grego; passaram pelos ombros até alcançarem o pescoço dele, e pararam bem na nuca para um carinho inesperado.

Aiolia pestanejou surpreso. Seu orgulho leonino inflando na medida em que vislumbrava, dentro dos olhos da garota, o tamanho da admiração que ela tinha por ele. Tão linda e, whoa!, gostosa naquele uniforme azul, que ele não pensou em mais nada. Sequer conseguiu se sentir culpado. Afinal, era ela quem o contemplava com expectativa, enrolando seus cabelos entre os dedos, toda corada e perfumada. Linda, de verdade.

O movimento seguinte, natural e esperado, foi inclinar-se para beijá-la. E Aiolia até tentou, mas não sabia mesmo ser suave.

Eles nem tinham conversado direito, mas ela gostava tanto dele que, num instante, já tinha sido arrastada para dentro da casa. Os beijos intensos e as mãos na cintura, deslizando para cima e para baixo com impaciência... Até que, como se tivesse tomado um choque, Aiolia se afastou bruscamente.

Mas eram tantos hormônios, a adolescência toda, ela dizendo com veemência que estava tudo bem, tudo bem!, que era sua escolha, que não se arrependeria, que ficaria feliz...

Que diabos, ele não era de ferro! Ela estava simplesmente tentadora e conivente com a situação. Aiolia encostou as mãos nas pernas dela, subindo bem devagar pelas coxas firmes, dando tempo para que ela o impedisse, se quisesse, ou ele mesmo se impedisse, se pudesse. Mas Marin só estremeceu e corou ainda mais, um incentivo para que ele deixasse toda a sanidade de lado e... Dane-se!

Sem dúvidas ficariam marcas nas coxas dela, visto a empolgação com que as apertou, adentrando aquela saia de pregas azul sem o menor remorso ou pensamento coerente. Simplesmente, Aiolia estava colocando em prática o que já teria feito da outra vez, no Meikai, quando certo indiano intrometido os atrapalhara.

Mas, agora, ninguém os interromperia.

***

O campeonato durou duas longas e exaustivas semanas. Kanon teria muita coisa para contar quando voltassem. Aiolos, então, nem se fala.

Porque durante os dias eram os jogos. Eram as torcidas vibrando por seus esportistas favoritos. Eram as garotas suspirando quando Aiolos amarrava sua inseparável bandana vermelha na testa, totalmente alheio ao mundo. Era a postura imperturbável de Shura ao duelar contra o oponente da vez, seu florete cortando o ar em movimentos precisos. Eram os cabelos sempre presos dos gêmeos, balançando de um lado para o outro enquanto eles corriam pela quadra. Era Pandora saltando e girando agilmente dentro daquele collant preto, desprezando os admiradores que não paravam de aparecer porque, sim, ela já tinha alguém interessante em vista.

Era a mira perfeita de Aiolos ao atirar uma flecha, mantendo-se imóvel até que o alvo fosse atingido. Era Saga ralhando com Kanon porque este não parava de mandar beijos para suas fãs, exibindo-se sem camisa toda vez que ganhavam. Era o rosto inexpressivo de Shura ao ganhar mais um duelo, nunca parando para comemorar, pois só valeria a pena quando saísse vitorioso em tudo – nunca se saísse vitorioso, porque com Shura eram sempre, sempre, sempre certezas.

Resumindo, era esforço, suor, cansaço, fome, e mais esforço naquele calor todo. Eram os troféus e as medalhas. Gritaria, muita gritaria para todos os lados.

Mas eram as noites que realmente se destacavam.

Porque durante as noites era pura diversão. Eram as comemorações em cada quarto, todas regadas a muito álcool. Era Kanon comandando as jogatinas e as apostas, blefando por detrás das cartas de baralho. Era Saga revirando os olhos e fingindo que não conhecia o irmão, preferindo jogar xadrez com qualquer outro esportista mais careta que estivesse à toa. Era, até mesmo, Shura sendo expulso do banheiro porque Aiolos já estava lá tomando banho, dizendo que a situação entre eles não permitia mais aquele tipo de intimidade – afinal, o espanhol estava interessado de outra forma nele e queria pegá-lo de jeito. Era Pandora se preparando para invadir o quarto do sagitariano, altas horas da madrugada, usando apenas um vestido decotado que a valorizava muito bem. Era Saga com a personalidade alterada, após finalmente ser convencido a beber, interceptando o caminho da moça e acabando com os planos dela.

Era Aiolos conversando pelo telefone com o irmão, aborrecido porque não tinha como contatar o melhor amigo, Mu, mas levando um baita susto ao ouvir alguém dizer bem próximo do seu ouvido: O prazo acabou..., constatando que não estava mais sozinho naquele quarto do alojamento em que as pessoas da sua universidade tinham se instalado. Era Shura que, mesmo ganhando um não mal articulado como resposta, sorria perigosamente porque dizia que já não se importava mais. Era Pandora desesperada porque acabou encontrando-se com a pessoa errada. Era Saga carregando a moça porque ela se debatia desvairadamente entre seus braços. E era Kanon gargalhando porque... Ah! As noites iriam dar o que falar quando voltassem.

Continua...


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Notas finais do capítulo

Ahn, eu espero que ninguém fique (muito) na bad (como o meu carneiro-beta, haha) pelo momento Aiolia x Marin... oo Era um "mal necessário"... *suspira*

No próximo vamos avançar mais um pouco, acertar umas pendências e ver um pouco mais do Afrodite, que anda tão... sumido, tadinho...

Obrigada pelas reviews: HoneyShi, Kiko Sama, Kiba-Ino, Orphelin, Bruna Uzumaki, Hanajima, Tenkisei Minos de Griffon, Ana Rodrigues, Ethernal Saint 23, Svanhild e Lord Art (que comentaram via Facebook 8D) S2

Agradecimento especial pra Ana Rodrigues, que recomendou a fic lindamente S2

Que tal esse capítulo? '-'