Contra Todas As Probabilidades escrita por Mallagueta Pepper


Capítulo 4
Começam as aulas




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Ele checou seu reflexo no espelho mais uma vez. Blusa, confere. Jaqueta, confere. Óculos, ok. Calças, ok. O cabelo estava penteado no estilo rebelde que ele gostava e ele até tinha dado um polimento na corrente que usava ao redor do pescoço. Embora não fosse um encontro, ele procurou caprichar no visual. Afinal, muitas coisas podiam acontecer e era bom estar prevenido.

Por precaução, ele bafejou na palma da mão e cheirou depois. “Hum... é, tá bom. Vou só levar umas balas de menta pra garantir”. A última coisa que ele queria era ver a Mônica desmaiando por causa do seu bafo, apesar de nunca ter tido problemas de mau hálito antes.

- Se você já tá levando balas de menta pro primeiro encontro, nem quero pensar no que vai levar pro segundo! Seu safadinhoooo!!!!

- Você tava me espionando?

- Não, só estava te olhando sem você perceber. Dãaaaa!

- Dá um tempo e pára de pensar besteira! É hoje que eu começo a ensinar a Mônica.

- E precisava passar perfume? Daqui a pouco você vai ficar todo suado e o cheiro some. Isso se não ficar aquela fedentina danada.

- Que fedentina o quê! Eu passei desodorante!

Luísa deu uma risada ao ver o cuidado com que o irmão se preparava para aquelas aulas. Nem a rainha da Inglaterra teria tanta dedicação por parte dele.

- Agora eu vou indo que eu não quero deixar a Mônica esperando.

- Então vai. Só tome cuidado com a mão boba, viu? E chupa uma bala pelo caminho só pra garantir.

Ao invés de responder, ele pegou seu equipamento e saiu dali o mais rápido que pode para evitar as asneiras da irmã e também porque estava ansioso para ver logo a Mônica. Além de ela ser uma tremenda gata, ele tinha adorado aquela tarde que eles passaram juntos. Ela era divertida, engraçada, tinha boa conversa e uma personalidade que ele adorava: vibrante, cheia de energia e muito alegre.

Se ele soubesse que ela era tão legal assim teria dado um jeito de se aproximar antes e Felipe mal podia esperar para conhecê-la melhor.

Quando ele chegou ao parque, ela já estava sentada em um banco ajeitando seus patins.

- Oi. Você esperou muito tempo?

- Não. Tinha chegado agora a pouco.

- Ainda bem. Pronta pra aula? Vou logo avisando que eu sou um professor muito exigente!

- Estou pronta sim e não tenho nenhum medo!

- Então vamos começar. Primeiro tenta patinar um pouco pra eu ver como você está indo.

Mônica não precisou patinar muito para que ele visse o quanto ela tinha dificuldade. Ela mal conseguia se equilibrar!

- Hum... então vamos começar com o básico, tudo bem?

Durante o resto da manhã ele tentou ensiná-la e viu, para sua surpresa, que ela estava com dificuldade para aprender. Estranho... o condicionamento físico dela era muito bom, talvez até melhor que o seu já que ela sempre fora muito forte e atlética. A coordenação motora dela também era excelente e os reflexos bastante ágeis. Ela também conseguia acompanhar e entender muito bem suas instruções. Então por que aquela dificuldade? Ela sempre se mostrava segura no início, mas quando ia tentar colocar em prática, todo seu corpo parecia travar.

Na hora do almoço, eles foram até uma lanchonete e ele viu que ela parecia bem desanimada.

- Olha, Felipe, eu acho que isso não vai dar certo. Que coisa, eu não consigo nem fazer o básico!

- Ainda é seu primeiro dia de aula, Mônica. Não acho que você deveria desistir tão cedo.

- Eu não estou desistindo, acontece que... sei lá, acho que eu não levo jeito para isso mesmo...

Cascuda estava passando ali perto com Marina e ambas viram Mônica sentada a mesa com Felipe. Que cena inusitada! O que eles estavam fazendo juntos? Cascuda acabou não resistindo.

- Oi Mônica, Felipe. O que estão fazendo?

- Oi, meninas. O Felipe está me ensinando a patinar.

As duas fizeram cara de espanto e depois de uma mistura de piedade com preocupação.

- Tem certeza, Mônica? Você nunca levou jeito para isso... – Marina falou, sendo apoiada pela Cascuda.

- É mesmo. Cuidado para não se machucar, viu?

- Claro que não! Vocês me conhecem e sabem que eu não tenho medo de nenhum desafio!

- Você é quem sabe...

As duas saíram dali, deixando Mônica ainda mais desanimada e Felipe bem pensativo. Então era aquilo, não era? Pelo que ele tinha acabado de ver ali, na verdade ela tinha algum tipo de bloqueio que a impedia de aprender. Também, com amigas como aquelas!

- Escuta, por acaso você não está acreditando no que elas disseram, está?

- Eu? Imagina! Não vou deixar ninguém me desanimar.

O rapaz parou o que estava fazendo e fitou o rosto dela diretamente.

- Olha, eu acho que você não precisa se esforçar para parecer forte.

- Mas eu sou forte!

- Claro que sim e eu não duvido disso. Só que você não precisa fingir que é forte o tempo inteiro. Ninguém consegue ser forte 24h por dia. Nem você.

Ela ficou com o rosto vermelho abaixou os olhos para seu refrigerante. Como ele tinha percebido o que se passava em seu íntimo?

- Bem... é que todo mundo me conhece assim...

- E por isso você acha que tem sempre de ser assim para corresponder as expectativas dos seus amigos?

- Não, claro que não. Olha, eu não sou de ficar choramingando pelos cantos, mas sabe... tem hora que isso cansa... – ela parou ao ver que estava falando demais.

- Tudo o que a gente falar aqui, vai ficar aqui mesmo. Eu não sou a Denise que gosta de espalhar os segredos dos outros pra todo mundo. Pode confiar em mim.

- Desculpe, é que... bem... a gente não está acostumado a conversar... – era difícil para ela entender por que se sentia tão a vontade perto dele e por que estavam tendo aquele tipo de conversa sendo que até poucos dias atrás, eles só se cumprimentavam ocasionalmente.

- E por que não podemos começar? Acho que nós dois podemos ficar muito surpresos.

Aquilo a fez sorrir um pouco. Ela já estava ficando surpresa.

- Você estava falando que se sente cansada de ser forte o tempo inteiro....

- Na maior parte do tempo eu até que levo numa boa e nem penso nisso. Às vezes é que eu me sinto cansada. Além do mais, todo mundo sempre acha que só existe esse meu lado. Toda vez que tento ser meiga e delicada, eles acham que estou sendo fresca.

- Ah, sim. Quer dizer, seus amigos se acostumaram tanto com a Mônica durona que agora não conseguem te ver de outro jeito.

A moça o olhou, espantada ao ver como ele tinha entendido aquilo tão bem.

- É isso mesmo. Sempre que tento fazer algo mais... delicado, sei lá, as meninas acham que eu não vou conseguir. E acabo não conseguindo. Pra dançar, por exemplo, sempre tive dificuldade. Elas falavam que eu não ia conseguir, mas eu não acreditava. Só que no fim, eu não conseguia mesmo. Só depois de muito tempo e olhe lá.

- Então deve ser por isso que você em dificuldade para patinar, não é? Porque suas amigas acham que você não tem condições de fazer algo que não envolva unicamente força bruta.

- Olha, elas não fazem por mal e nem querem me puxar pra baixo...

- Eu não disse isso. Vai ver elas nem sabem o que estão fazendo. Acontece que o problema nem é tanto elas falarem e sim você acreditar no que elas estão te falando.

-... – novamente ela ficou sem fala. Aquele era o mesmo Felipe que ela conhecia? Não. Ela acabou de descobrir que não o conhecia de verdade.

- Sabe como minha irmã e eu conseguimos ser tão bons?

- Não...

- É porque nós não deixamos que ninguém defina nossos limites. Quando nos falam que não somos capazes de algo, que não vamos conseguir, a gente não acredita e sempre segue em frente. Se não conseguimos, foi porque não fomos bons o bastante e não porque outras pessoas disseram que não seríamos capazes.

- Nossa... e você acha que eu deveria parar de ouvir o que minhas amigas falam?

- Acho. Pelo menos na parte que fala das suas limitações. Olha, é você quem deve experimentar pra saber se pode ou não fazer alguma coisa. Elas não vivem sua vida e não sabem o que se passa dentro de você, então não podem dizer do que você é ou não capaz.

Eles ficaram em silêncio por um tempo, para que ela pudesse digerir tudo o que ele tinha falado. Ela não precisou pensar muito para chegar à conclusão de que ele estava certo. Não fazia sentido deixar de confiar em si mesma só por causa das opiniões dos outros, mesmo sendo suas amigas.

Como ela podia se dizer forte e destemida se sempre deixava as opiniões negativas dos outros lhe atrapalhar quando tentava algo novo? Não, aquilo não tinha nada a ver com a pessoa forte que ela era.

- Você tem razão. Nossa, parece até que acendeu uma luz!

Ele sorriu ao ver que a empolgação dela tinha voltado. Aquilo significava que as aulas iam continuar, para sua alegria. E Felipe se surpreendeu ao ver como ela aprendia rapidamente.

Ela não tinha mais dificuldades de equilibrar e quando terminou o dia, ela já patinava razoavelmente bem, mostrando que ela estava quase dominando o básico. Uma pessoa comum teria demorado mais tempo para aprender.

- Eu nem acredito que estou conseguindo patinar sem cair!

- Pois pode acreditar. Você aprendeu bem rápido, heim?

- É... acho que só precisava acreditar mais em mim. Que coisa, você deve achar estranho eu falar isso, né?

- Não. Como eu disse antes, você não precisa ser 100% forte e infalível o tempo inteiro. É normal a gente ter dúvidas sobre nós mesmos.

Eles foram patinando juntos até a casa da Mônica, em ritmo lento. Ele queria ficar com ela o máximo de tempo possível. Aquele dia tinha sido tão agradável que ele queria que não terminasse mais. Perto dela tudo parecia ficar mais leve.

- Chegamos...

- Pois é. Escuta, você vai querer continuar tendo aulas de patinação? Ainda há muita coisa pra aprender.

- Querer eu quero, mas você deve ser muito ocupado com seus treinamentos e ainda tem aquele concurso de patinação no gelo...

- Não precisa ser todo dia. E estamos de férias, então tem mais tempo livre de sobra.

- Então eu quero. Foi muito legal aprender e estou adorando!

- Que bom! Infelizmente amanhã não vai dar, eu tenho que treinar com a Luísa e a tarde um encontro com nosso patrocinador. Podemos treinar depois de amanhã, na parte da tarde. Combinado?

- Combinado!

Eles se despediram e Felipe voltou para casa feliz da vida. Aquele podia ser o começo de algo muito especial.


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Notas finais do capítulo

Pois é, né... vocês devem estar estranhado ver um Felipe tão cabeça, mostrando maturidade e lucidez. Bem, as pessoas são mesmo uma caixinha de surpresas. E essas conversas serão muito importantes para ajudar a Mônica entender melhor seu relacionamento com o Cebola e assim ter forças para se libertar e esquecê-lo de vez.



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