Contra Todas As Probabilidades escrita por Mallagueta Pepper


Capítulo 29
Repondo as energias


Notas iniciais do capítulo

Hoje eu resolvi fazer uma dobradinha, postando dois capítulos de uma vez. Não dá pra fazer todo dia, tá? Divirtam-se e não se esqueçam dos reviews!
.
E um agradecimento especial a EmilyJobs que me deu algumas frases legais para colocar na história. Valeu!



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Depois do jantar, com direito a um delicioso lombo de porco assado no forno a lenha pela D. Ju, Mônica resolveu ir para o seu quarto mais cedo. Na frente dos tios, ela tinha conseguido disfarçar bem e aparentar uma alegria e disposição que não sentia. Apesar de todo seu esforço, ela sentiu que ainda tinha muita coisa para colocar para fora e não queria fazer isso na frente de ninguém. Ela então correu para seu quarto, deitou-se na cama e chorou mais uma vez a saudade de pessoas amadas que não iam voltar mais.

O presente que Felipe tinha lhe dado no natal ainda estava pendurado em seu pescoço, já que ela não teve coragem de tirar. Será que ele ainda estava usando o dele?

“Não... aposto que ele deve ter jogado na privada... ai, que droga! Por que ele fez aquilo? Claro, culpa do Cebola. Mas ainda assim ele acreditou!”

Sua mente dava milhares de voltas, tentando entender o que tinha acontecido e não chegava a lugar nenhum. De tanto pensar, ela acabou ficando cansada e adormecendo ali mesmo. Minutos depois, Mônica acordou assustada com um barulho em seu quarto e abriu os olhos rapidamente procurando por um possível invasor. Era só o Malhado, cachorro do seu tio, que estava ao lado da sua cama abanando o rabo e olhando para ela com uma cara alegre de cachorro manso e brincalhão que ele era. 

- Oi, Malhado, você me deu um susto, viu? – ela falou afagando a cabeça do cão, que curvou as orelhas para trás e olhou para ela com o olhar meigo. – Oin, eu sei que você não fez de propósito, fofinho! É que eu... hã?

Alguma coisa lhe chamou a atenção. A porta do quarto estava fechada? Como? Foi quando ela se lembrou de que tinha trancado a porta para ter mais privacidade. Então como o cachorro tinha entrado ali? Pela janela nem pensar porque o seu quarto ficava no segundo andar e pelo que ela sabia, cães não voavam.

- Mas como você entrou aqui? – a moça levantou da cama e foi até a porta, verificando que ela estava mesmo trancada. Não tinha como ele ter entrado. Uma cutucada na perna lhe chamou a atenção. Era Malhado lhe cutucando com o focinho. – O que foi?

O cão lhe cutucou com o focinho de novo e depois foi até a porta, arranhando com a pata indicando que era para ela abrir.

- Ah, tá... você quer sair, né? – ao abrir a porta, o cachorro saiu e ficou parado no corredor como que esperando por ela, fazendo-a entender que ele queria que o seguisse.

Ainda intrigada com tudo aquilo, Mônica foi atrás do cão pela casa até os dois saírem no quintal dos fundos. Mais uma vez, ela levou um susto ao ver que era dia. Dia não, tarde, talvez por volta das três horas.

- Vixe! Será que eu dormi tanto assim? Por que ninguém me acordou? Ai, que vergonha!

Um suave latido não deixou que ela continuasse se auto recriminando por ter dormido além da conta e ela continuou a segui-lo até os dois chegarem até o lago. Mônica notou que havia alguma coisa muito diferente ali, como se o local não fosse o mesmo. Os patos ainda nadavam no meio do lago, as arvores estavam nos seus devidos lugares... mas ainda assim o local parecia diferente, como se fosse apenas uma cópia do original.

O cachorro foi entrando no lago até a água alcançar mais ou menos a metade das suas pernas e parou ali, esperando por ela. Sem pensar na estranheza da situação, ela o seguiu entrando na água também, não se importando em sujar um pouco os pés com a lama do lago.

- Ô Malhado, por que você me trouxe aqui? Aff! Eu estou falando com um cachorro? Claro que ele não pode me responder!

- Mas eu posso.

Um grito ecoou no ar.

- Quê? Quem disse isso?

- Olhe para baixo que você vai ficar sabendo.

Levou pelo menos trinta segundos até ela criar coragem para olhar e ver de onde aquela voz estava vindo. Nada, era apenas seu reflexo na superfície do lago, que estava pouco nítido porque o local era muito raso.

- Entre mais um pouco no lago. Onde você está é raso demais e você não vai poder me ver.

Ainda desconfiada, ela andou mais um pouco até a água atingir sua cintura. Dali ela não pretendia passar.

- Agora você pode me ver.

Mônica teve que apertar os lábios com muita força para não gritar histericamente ao ver que seu reflexo estava falando com ela.

- A louca (como diria a Denise)! Desde quando você deu para ser medrosa, criatura?

- Fala sério! Meu próprio reflexo está falando comigo e você não quer que eu fique com medo?

- Não, não quero! Você já enfrentou coisa muito pior na sua vida e não teve medo nenhum, por que vai amolecer agora?

Aquilo fez com que ela se acalmasse.

- Bem, de certa forma eu entendo. Olhar para dentro de si mesmo costuma assustar as vezes.

- Você sou... eu?

- Sou sua alma, sua essência e a pessoa que você é de verdade. Parece que não temos nos visto muito ultimamente, não é? Também, você se distanciou de mim!

- Claro que não! Se você é minha alma, como vou me distanciar de alguém que está sempre comigo?

- Estar perto fisicamente não significa estar perto de coração e alma. Você se distanciou de mim, se distanciou de quem você é de verdade e mergulhou em um pântano de auto piedade e lamentações.

- Ai, também não é pra tanto, né?

- Claro que é criatura! Onde está sua força? Por que desistiu tão cedo? Por que você se deixou derrotar por um planinho tão besta quanto o do Cebola?

- Eu nem sei que plano é esse, pra começo de conversa. O Felipe não quis me falar!

- Então que você encostasse o rapaz na parede e arrancasse a verdade dele, ora essa! Você simplesmente deixou que ele fosse embora sem te dar nenhuma explicação!

- Se ele não quis falar, o que eu poderia ter feito? Dado um pescoção nele até ele falar?

- Não, mas deveria ter sido mais enérgica, batido o pé e insistido. No entanto, você apenas o deixou ir embora e depois foi chorar feito uma criancinha!

- Eu também tenho sentimentos, viu?

- Sei disso até melhor do que você mesma, só que sentimentos não são para serem usados em lamurias!

- Ai!

- Ai nada! E por que abandonou seus amigos?

- Eles me abandonaram!

- Você nunca tentou conversar com eles para saber a verdade.

- Tentei sim, só que quando eu chegava perto, eles iam embora.

- Deveria ter insistido. E quando lhe provocaram, deveria ter brigado como sempre fez. Por que fugiu da luta?

- Porque eu não brigo mais com as pessoas!

- Brigar não quer dizer bater ou usar de violência e sim colocar tudo em pratos limpos, exigir que te dessem uma explicação decente para o que estavam fazendo. Eles te provocaram, fizeram tantas coisas e você não reagiu? Você apenas recuou, ficou chorando feito uma criancinha medrosa e ainda achou que eles iam ter piedade das suas lágrimas?

- Eu não preciso da piedade de ninguém!

- Você não pode me enganar, esqueceu?

Ela engoliu em seco. De certa forma, sua alma estava certa. Várias vezes Mônica chegou a pensar que seus amigos acabariam tendo pena ao vê-la triste e magoada, o que não aconteceu. Ela também pensou que sua doença fosse despertar a compaixão deles também e algo lhe dizia que aquilo também não ia acontecer. Algumas lágrimas começaram a cair dos seus olhos embora ela tentasse se segurar.

Um pouco de água foi espirrada em seu rosto e ela olhou novamente para seu reflexo, que lhe sorria.

- Por que chora? Perdeu em alguma esquina seu encanto? Ninguém pode tirar de você seu mais belo sorriso, motivo de idas e vindas saltitantes.

- Hã?

- O que eu quero dizer é que ninguém pode te fazer feliz ou infeliz sem seu consentimento. Até agora você deixou que outras pessoas determinassem como você se sentia, como agia e está na hora de isso acabar. Se outras pessoas te magoaram, foi porque você permitiu que eles se aproveitassem das suas fraquezas.

- Mas eu sou forte...

- Ser forte não é ser turrona, mandona e cabeça dura. É tomar as rédeas da própria vida e não deixar que as ações de outras pessoas lhe façam infeliz. Você não pode mudar os outros, mas pode mudar a si mesma.

- Faz sentido...

- Claro que faz. Eu sou sua alma, não sou? Sei o que é bom para você e apesar do seu distanciamento, sempre estarei no seu coração.

- Então eu prometo que vou te ouvir mais. Pelo menos vou tentar, né?

- Claro que vai tentar. Sei que vai.

- E agora, o que eu faço?

- Primeiro, não deixe que as outras pessoas te magoem. Segundo, lute por quem você ama. Se essas pessoas não quiserem mais nada com você, paciência. Pelo menos você tentou.

- Eu tenho medo é de ninguém mais querer falar comigo, nem o Felipe e nem meus amigos. Tenho medo de ficar sozinha, muito medo!

- Acorde, garota! Você é linda, inteligente, tem um ótimo perfume e seus olhos brilham mais que um punhado de purpurina. Você não vai ficar sozinha. Se eles não te querem, tem quem queira, basta apenas você aprender a cultivar o que você tem de melhor!

- O que eu tenho de melhor... – ela repetiu pensativa.

- Isso mesmo. você sabe que pode fazer muitas coisas diferentes, sabe que pode inovar, fugir do lugar comum e fazer coisas que nem imaginava ser possíveis. Então, o que está esperando?

- Agora? Nada! A turma não perde por esperar, eles vão ver só uma coisa! E se o Felipe não quiser mais, azar o dele! O Cebola perdeu, o DC perdeu e ele vai perder também!

Seu reflexo deu uma risada, fazendo-a rir também. Aquela sim era a Mônica forte e durona que ela conhecia.

- O que foi isso? Eu estou me sentindo estranha...

- Calma, vai ficar tudo bem. Não tenha medo.

- Eu não estou com medo...

Suas pálpebras foram ficando pesadas e apesar de saber que adormecer no meio do lago podia ser perigoso, ela não teve medo. Tudo foi ficando escuro e silencioso até um apito insistente que parecia vir de outro mundo fizesse com que ela abrisse os olhos novamente. Era o alarme do seu celular que estava sobre o criado ao lado da cama.

Ela levantou-se num pulo só, olhando ao seu redor sentindo-se confusa e desorientada. Pelo relógio, eram seis horas da manhã e os raios do sol começavam a entrar pela sua janela. Seu pijama estava seco e seus pés limpos, sem a lama do lago. A roupa de cama também estava limpa e seca, para seu alivio. A porta continuava trancada e o Malhado não estava dentro do quarto.

- Que coisa... foi um sonho então! Hahaha!

Mônica acabou rindo de si mesma sentindo todas as tensões abandonarem seu corpo, dando lugar a um imenso alívio. Sonho ou não, seu reflexo estava certo. O tempo de lamentações tinha passado e estava na hora de começar uma nova vida.

- Eu vou dar um jeito nisso tudo, vou sim... - primeiro ela pretendia falar com seus amigos, começando pela Magali. Na segunda feira, depois da aula, ela planejava ir até a casa da amiga para elas terem uma conversa muito séria. Sozinhas, sem ninguém mais da turma por perto, elas iam poder conversar sossegadas e Mônica queria colocar tudo em pratos limpos.

Depois que se entendesse com os amigos, ela ia atrás do Felipe pedir, não, exigir explicações para o fim do namoro deles. Ela ia fazê-lo falar de qualquer jeito e assim teria uma chance de esclarecer as coisas. Se mesmo assim ele não quisesse lhe dar uma chance de defesa, paciência. Ele seria apenas mais um a ser riscado da sua vida.

Mônica não queria mais chorar, lamentar e nem sofrer a falta de quem não queria mais nada com ela. Agora ela só queria viver sua vida numa boa e ser feliz. Se algum dia surgisse alguém especial, ótimo. Senão, tudo bem. Ela não ia morrer infeliz por causa disso.

E ela também não queria arrumar mais ninguém por um bom tempo. Dali por diante, seu coração estava fechado para balanço. Era tempo de curar as feridas, definir novos rumos para sua vida e seguir em frente. E também não havia mais ninguém em vista. O Toni? Não. Narcisista demais. O DC era muito complicado e depois de ele ter lhe dado o fora, ela não o via mais como opção. Ela estava mais do que farta de correr atrás de quem não lhe queria. O Tikara? Eles não tinham nada a ver um com o outro. Então o jeito era ficar sozinha por um tempo. Quem sabe fazer como a Aninha?

Ela sim tinha sido esperta ao descobrir vários novos interesses e era aquilo que Mônica pretendia fazer.

Ao sair para o terreiro, o ar frio da manhã invadiu seus pulmões, lhe dando energia nova.

- Oi, tio? Pescou bastante peixe? – ela perguntou ao ver o tio voltando da pescaria junto com seu cachorro, o Malhado.

- Oi, Moniquinha. Olha só que beleza! – ele falou lhe mostrando o balaio cheio com belos peixes do rio. De vez em quando, ele saia de madrugada para pescar e sempre voltava com muitos peixes. – hoje vamos ter um banquetão que só vendo. E você, como domiu?

- Dormi muito bem e estou com as baterias recarregadas. Agora ninguém me segura!

Ele sorriu satisfeito ao ver que ela parecia mesmo estar bem melhor. Quando chegou ali, sua sobrinha estava um fiapinho de dar pena. Depois de respirar ar puro, comer comida feita no fogão de lenha, passear no sítio e trabalhar um pouco, ela tinha ficado bonita e corada de novo.

Malhado tinha chegado perto dela para ganhar afagos na cabeça e ficou olhando para ela com cara de quem sabia de alguma coisa.

Seu tio entrou na casa levando os peixes para D. Ju limpar e ela ficou no quintal pensando na vida, com o cachorro sentado do seu lado.

- Fala a verdade, aquilo não foi só um sonho, foi?

Ele deu um sonoro latido como resposta e deitou-se ali mesmo para descansar. Ela entendeu aquilo como um sim.


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