Leis da Noite - Mente sobre Materia escrita por Ryuuzaki


Capítulo 12
A Primeira Noite é Inesquecivel - Parte 3




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...

 

Correu o máximo que pôde, o mais rápido que aguentou, apenas para distanciar-se da casa e de sua primeira fonte de alimento.  Não olhava ao redor, não se preocupava com aonde ia, apenas movimentava as pernas o tanto que aguentava. Continuou na louca corrida  até se exaurir, ou achar que estava fatigado, afinal, sentiria ele, um vampiro, cansaço físico?

Com uma de suas mãos, apoiou-se numa parede suja e pichada, que pertencia a uma lanchonete pouco asseada, e começou a respirar pesadamente inspirando grandes quantidades de oxigênio a cada inspiração, mas, até isto era inútil, seu corpo morto já não pedia gás algum para que suas células funcionassem.

 

Michael percebeu que o ar que puxava não lhe aliviava a sensação de vazio que agora sentia em seus pulmões atrofiados e deu um murro na construção à qual se apoiava, novamente esperando que a violência diminuísse sua dor.

Ele se aprumou, percebendo que não estava realmente exausto. Sentia-se perfeitamente bem, talvez, apenas talvez, seu cérebro ainda estivesse acostumado com as limitações mortais, afinal, a mente domina a matéria. Mas, uma parte do pintor sabia que agora ele estava um pouco, talvez muito, acima dos vivos. E tentava transmitir-lhe essa ideia.

- Heh... Morto vivo... Vampiro... Você é agora um, não é mesmo Michael...? – gritava, tendo a noite como sua ouvinte - E por acaso eu pedi por isso?! Pedi por ter essa maldição?!

Recomeçou seu choro sem lágrimas, mas, desta vez, não perdeu muito tempo. Num ato involuntário de seu braço, tentou limpar com as costas da mão o que não existia e pôs-se novamente a andar pela noite.


Caminhava devagar, agora novamente blasfemando contra Claudius, pensando em inúmeras maneiras de torturar o maldito que o transformara, queria despedaçá-lo lenta e dolorosamente, com certeza não sentiria remorsos depois, até riu, na hora, pensando em como seria divertido ver aquele rosto nobre gritar de dor.



 Ficou alguns minutos gargalhando descontroladamente Sua recém adquirida agressividade vampiresca parecia estar começando a mostrar lampejos de sua existência

 

Ficou algum tempo no seu histérico acesso de risos, todavia, começou a se achar estúpido, por não ter prestado atenção em onde estava nem o que fazia. Não sabia quantas pessoas poderiam tê-lo visto sair em disparada de dentro da casa, o que poderia significar que em breve a polícia estaria atrás de seu traseiro sujo de tinta.



Felizmente para ele, já era de madrugada, algo como duas horas da manhã, não sabia como tinha certeza de ser essa a hora exata, mas o fato é que realmente havia acertado. Algum instinto dos vampiros talvez, neste caso o sol era realmente nocivo... “Droga Michael! Já esquecestes destruidora queimadura que recebestes na mão?” Era o que dizia aquela voz amiga, talvez a velha vozinha interior à qual todos recebem ajuda em momentos de tensão.

O jovem vampiro coçou a própria nuca. Estava sendo repreendido por ele mesmo. Achou isto um pouco idiota... Quem sabe não teria perdido alguns miolos na sua transformação?


Todavia, essa paranóia podia ser inata de um ser da noite... Não sabia, nada era certo para ele. Fez então a única coisa que podia fazer no momento: Olhou para frente e tentou identificar em qual parte de Santa Felícia ele se encontrava... Parecia que teria de, ao menos por agora, se preocupar em achar o caminho para casa... Antes que o sol se levantasse.

Olhou em volta, prestando atenção no seu caminho pela primeira vez; Percebeu que estava em uma periferia, algum bairro de baixa renda da cidade, com prédios sombrios, casas mal cuidadas e atmosfera pesada. Já havia ouvido sobre o bairro em que estava, chamavam por ai de “A Bronx feliciana...

 

Devia ter desconfiado antes, afinal, em qualquer outro lugar da “Boemia da Califórnia” teria dúzias de pessoas na rua mesmo a essa hora, mas ali parecia haver alguma espécie de “toque de recolher”, o que aumentava a atmosfera grosseira que o local passava para alguém acostumado com os centros.

 

Continuou por algum tempo procurando por alguma marcação, placa ou o que fosse, qualquer coisa que o ajudasse... Então, de tanto olhar, notou algo diferente... Primeiro pensou que fosse impressão, até que a realidade veio à tona, como um estalo em sua mente e, o que ele viu, era lindo.

 

Como poderia não ter notado antes? Como tamanha beleza havia se escondido, por horas, de sua percepção? Seria um efeito da sua nova condição? Teria aguçado sua visão humana e ignóbil? Era a única resposta. Pois, a cidade era a mesma, o mesmo cenário coberto por luzes dos prédios e anúncios em neon. Via ao longe, uma das vias mais movimentadas de Santa Felícia, mas estava tão... Diferente...

 

Tentou aguçar sua visão, apertou os olhos, tentando ver além do que já conseguia. Não funcionou a princípio, mas, após certa força de vontade aplicada, ou quem sabe, sangue, pode ver muito melhor do que outrora, e, mesmo um letreiro que ele mal enxergava, conseguia até mesmo ler as suas letras que diziam “Jonas’ Bar”.


Estranhou o efeito, afinal ele não enxergava as coisas mais próximas, como achou que aconteceria, mas sim mais nítidas. Era uma visão de tirar o fôlego. Achava que nenhum ser humano conseguiria ver como ele via agora. Cores que ele nunca imaginava existir agora dançavam em frente aos seus olhos, misturando-se com uma iluminação perfeita e desprovida de falhas. O que dizer do neon então, que adquirira uma tonalidade e efeitos indescritíveis, uma luz que ele achava que, se estivesse próxima, poderia tocar-lhe e transmitir sensações táteis de prazer.

 

Michael estava hipnotizado. Pensava em como havia, em toda a sua vida, deixado de ver aquela cena incrível, fenomenal. Achava que agora entendia por que vampiros eram seres urbanos... Por Deus, sabia até que vampiros ERAM seres da cidade. Talvez essa coisa toda fosse muito forte nos mortos, ou apenas muito fraca nos meros mortais.

 

Entretanto, questões filosóficas ou biológicas não eram o que passavam pela sua cabeça agora. Ele queria ir até lá, ver de perto aquela estupenda beleza que havia ignorado por tanto tempo, e que logo se acostumaria. Pois, no fundo, tudo se resumia ao sangue e Michael aprenderia isso logo.

 

Então, ainda maravilhado e esquecendo até mesmo que o sangue que corria dentro de si e aquecia seu corpo era da mulher, a fêmea que matara, o pintor pôs-se a andar em direção às luzes, como um bom vaga-lume faria.

...

 


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