Yakusoku escrita por teffy-chan, Shiroyuki


Capítulo 31
Capítulo 31 - Kimi no Shiranai Monogatari


Notas iniciais do capítulo

Kimi no Shiranai Monogatari - Supercell
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— A gente já chegou? – Yaya indagou, pulando no mesmo lugar, pela vigésima vez na última meia hora, fazendo com que Kukai, sentado ao seu lado, quase derrubasse o pacote de batatinhas.

— Não, Yaya-chan. Nós não chegamos. Pode confiar em mim, quando chegarmos, eu não deixarei de avisar a você, está bem? – Nikaido respondeu, assim como havia feito cinco minutos atrás. Ele dirigia uma minivan, alugada especialmente para a viagem de férias dos guardiões, e ao seu lado, Yukari lia uma revista de moda, enquanto pensava que não queria em hipótese nenhuma ter filhos se eles fossem ser como aquela pirralha ás do Seiyo. Ao lado de Yukari, no banco da frente, Tsukasa sorria enigmaticamente, enquanto lia um enorme livro de aparência antiga e estrangeira.

Na fileira posterior a do motorista, vinham Utau, com seus fones de ouvido no último volume, Kukai que tentava a todo custo manter Yaya longe do motorista para evitar um acidente, e a própria Yaya que estava nesse momento com a cabeça apoiada no espaço entre os dois bancos da frente, tagarelando sem parar e ignorando os avisos do ex-valete. Logo atrás, estava Kairi, bem no meio, segurando um livro e tentando inutilmente se concentrar. Ele estava em um sério dilema. De um lado, e para a felicidade do pequeno samurai, Amu ressonava tranquilamente, apoiada em seu ombro desde o início da viagem. Mas, por outro, estava Ikuto, praticamente deitando sobre o moreno, roncando audivelmente, o que o incomodava muito, porém ele não podia se mexer, pois isso acordaria a coringa.

Mais atrás, na última fileira, Nagihiko ouvia música, com a cabeça escorada no vidro, e olhando a paisagem. Ao seu lado, Tadase o observava em silêncio, pensando seriamente em fazer como Amu, e encostar sua cabeça no valete, nem que fosse para fingir que dormia. E no canto, Rima lia um mangá, muito concentrada, e tomando cuidado para que ninguém visse a capa ou o conteúdo. Os Shugo charas estavam todos reunidos no espaço logo atrás do último banco, e considerando a falta de barulhos e de confusão, estavam também dormindo.

Fora Yaya quem sugerira a viagem, e depois de apresentar folhetos e programas promocionais, pacotes e planos econômicos, mostrando que havia realmente se empenhado e feito uma pesquisa – embora o fato de um dos tios dela ser dono de uma agência de turismo possa ter contribuído e muito com todo aquele material – ela acabou convencendo a todos a fazerem uma viagem para a praia durante as férias de verão. Tsukasa foi quem mais se empolgou com a ideia,  se ofereceu para acompanha-los, e aceitou de bom grado arcar com parte dos custos, utilizando os recursos destinados ao fundo dos Guardiões. Desse modo, como a viagem seria custeada pela escola, era necessário a supervisão de um professor, e Nikaido encaixou-se perfeitamente nesse papel, trazendo junto sua recém-nomeada noiva, Sanjou Yukari, que veio para acompanhante de Utau, como produtora, e de Kairi, como irmã mais velha.

— Falta muito ainda? – Yaya indagou com voz aguda, e Kukai suspirou, desistindo de fazer a garota ficar quieta. Yukari também suspirou, mas foi de pesar, por ter aceitado vir a essa viagem quando podia muito bem ter ficado em casa, fazendo as unhas dos pés. Porém, considerando que seu irmãozinho Kairi também estava indo, ela provavelmente passaria fome sozinha em casa – Eeei, a gente já chegoooou? – Yaya tornou a perguntar.

— Sim, Yaya! Já chegamos! – Nikaido bradou, e Yukari, Kukai e Tadase suspiraram. Os dois primeiros, de alívio, e o loiro, de arrependimento, por não ter feito aquilo que planejara antes.

Assim que o professor disse aquelas palavras, e Yaya começou a festejar, acordando todos aqueles que ainda estavam dormindo com seus gritos. A imagem do oceano cintilante se estendendo até tocar o céu azul e brilhante de verão se formou diante da janela, saudando os mais novos visitantes. Amu levantou a cabeça, esfregando os olhos, confusa, Ikuto espreguiçou-se longamente, e Kairi mexeu os braços, que ele não sentia desde muitas horas atrás. Utau começou a fazer planos animados com Yaya, após desligar seu Ipod, entrando na mesma frequência da ruivinha quase que imediatamente, e deixando Kukai, que estava sentado entre as duas, desnorteado com tanta animação, Rima guardou seu livro na bolsa, disfarçadamente, e Nagihiko fez o mesmo com seus fones, todos se preparando para enfim chegarem ao hotel.

Logo Nikaido estacionou na frente de um suntuoso hotel à beira-mar, cercado por coqueiros e palmeiras em toda a extensão, assim como por um belíssimo jardim florido e alegre. A arquitetura era exuberante e dava a impressão de ser em algum lugar do Hawaii ou Brasil, mesmo que fosse apenas uma pequena praia no sul do Japão. Yaya foi a primeira a saltar para fora do carro, antes mesmo dele ter parado completamente, e respirando fundo, ela virou-se e abriu os braços.

— Wooow! Olhem só para esse lugar! Não é lindo? A Yaya estava certa, não estava? Podem agradecer a Yaya depois! Eu aceito doces de agradecimento... – ela ponderou, e então respirou fundo novamente, fechando os olhos e erguendo a cabeça - Agora, sintam só esse ar puro!

— Você parece uma velha falando assim – Kukai observou rindo, depois de descer, afagando rapidamente a cabeça da ruiva, que colocou a língua para fora a despeito dessa afirmação.

Todos os outros desceram do carro também, fazendo alguns comentários adicionais. Os Shugo Charas foram primeiro, saindo em alta velocidade do veículo e sobrevoando o lugar. Utau desceu logo depois de Yaya e Kukai, assim como Nikaido, Yukari e Tsukasa, e já colocou no pescoço sua câmera digital, preparando-se para tirar tantas fotos quanto pudesse, e começando com uma da fachada do hotel. Ikuto saiu logo depois, espreguiçou-se como um gato, bocejando longamente e então olhou para frente, com displicência. Kairi também esticou-se, minimante, com ambos os ombros doendo, e Amu o seguiu, sonolenta e ainda tentando se situar. Rima foi a próxima, colocando um pequeno chapéu branco sobre a cabeça, assim como óculos escuros, para se proteger do forte sol da manhã. Tadase a seguiu, admirado com o lugar, então se virou para trás, sorrindo para Nagihiko, que retribuiu com o mesmo entusiasmo. Utau aproveitou e tirou uma foto daquele pequeno momento terno.

— Ei, todos vocês, venham pegar suas malas! – Nikaidou chamou, e todos se apressaram, procurando pelas suas próprias enquanto diziam coisas como “Essa é minha”, “Não vire de cabeça para baixo!”, “Tome cuidado, tem coisas frágeis!” ou “Ei, sua mala amassou a minha!!”. Depois de alguns minutos de confusão, um carregador se aproximou, prestativo, com um carrinho, e se ofereceu para levar a bagagem de todos, e assim, eles adentraram no hotel.

Nikaido e Tsukasa se aproximaram do balcão da recepção, fazendo o check-in de todos, enquanto eles esperavam, sentando-se nos sofás da entrada. Havia dezenas de pessoas diferentes entrando e saindo, algumas até mesmo estrangeiras, e a maioria usando roupas de banho. Depois de alguns minutos, que Utau gastou tirando fotos de todo mundo dos mais variados jeitos, Nikaido retornou, com quatro chaves.

— Prestem atenção! – ele disse, mas não soou autoritário como nas suas aulas. Na verdade, ele parecia muito mais jovial, e talvez isso se devesse ao fato de estar com os cabelos amarrados em um rabo-de-cavalo frouxo e com aquela camisa vermelha com estampa de flores havaianas – Nós vamos nos separar nesses quatro quartos, então vamos eleger líderes para cada grupo, que ficarão responsáveis pela chave, ok? Nossos quartos ficam no terceiro andar, então, no 302, ficam as meninas. – ele entregou a primeira chave à Utau, que era a mais velha – No 305, os meninos – ele hesitou, olhando para Ikuto, e então entregou a chave à Kairi – No 303 fica o Tsukasa-san – Nikaido entregou a chave ao loiro, que sorriu cordialmente – E no 304, ficamos eu e a Yukari – ele sorriu para a noiva.

— Eeeei! Isso não é nem um pouco justo! Você e a Yukari-san vão ficar no mesmo quarto, sozinhos, e o Diretor vai ter um quarto só dele! – Yaya reclamou.

— Eu não vejo por que motivo não seria justo. Eu e o Yuu somos adultos, e estamos noivos.  – Yukari respondeu, com certo orgulho, arrumando o óculos no rosto – Tsukasa-san está pagando a maior parte dessa viagem, então ele tem direito há um pouco de privacidade.

— Sem falar que estamos na praia, e Tsukasa-san é um homem solteiro – Nikaido riu, cutucando o diretor com o cotovelo, enquanto o fitava com cara de “se é que me entende”. Parou imediatamente com a brincadeira assim que notou o olhar com intenções assassinas que Yukari enviava para ele.

 — E, além do mais, Yaya-chan – Tsukasa se pronunciou, ignorando a piada de Nikaido – Você realmente acha que nós colocaríamos uma garota e um garoto juntos no mesmo quarto em uma viagem escolar?

— Bom, vocês estão deixando o Nagi e o Tadase no mesmo quarto, o que dá na mesma já que... pensando bem... deixa pra lá... assim tá ótimo... – ela foi diminuindo a velocidade da fala, a medida que um sorriso alarmante ia tomando conta do seu rosto, como no gato de Chesire. Ninguém prestou muita atenção no comentário da garota, o que certamente a livrou de ser alvo de censura por parte dos mais “céticos”, mas Utau, que estava atenta, sorriu da mesma maneira, causando um arrepio involuntário em Nagihiko, mesmo que ele não tivesse ouvido nada.

— Certo, vamos logo ver os quartos!! – Amu protestou – Estou doida pra ir à praia, e quanto antes arrumarmos tudo, melhor!

Todos seguiram para o elevador, e o carregador de bagagens fez o mesmo. Pararam no terceiro andar, e começaram a se dividir. Amu, Utau, Yaya e Rima pararam no primeiro, pegando suas respectivas malas, que eram a maior parte do que estava no carrinho, e entrando no quarto, dizendo que iam se arrumar para a praia. No segundo, Yukari e Nikaido entraram, depois de pegar suas malas, Tsukasa entrou no quarto do outro lado do corredor, deixando a gorjeta com o carregador, e restou à Ikuto, Nagihiko, Tadase, Kukai e Kairi o último quarto do corredor.

Os quartos, que provavelmente seriam todos semelhantes, tinham uma distribuição bem simples. Aquele que seria dos meninos era todo branco, com a parede dividida horizontalmente no meio, e a metade de baixo em madeira escura. As camas eram todas iguais, três do lado direito e duas do esquerdo, com lençóis verde-claros, e cada uma com um criado-mudo e um abajur pequeno ao lado. Na ponta de cada cama, havia um baú de madeira escura, onde deveriam ser colocados os pertences dos hóspedes. Alguns quadros com pinturas de praias, mar e coqueiros pendurados nas paredes, e no centro um tapete cor-de-areia, redondo e felpudo, com desenhos abstratos, que lembravam folhas e galhos. Na parede oposta, havia uma grande porta de vidro, que se abria para uma sacada, com vista para toda a praia, e na parede esquerda, ao lado das duas camas, uma porta onde provavelmente seria o banheiro.

Ikuto foi o primeiro a adentrar no quarto, pulando na cama mais próxima e se acomodando. Kairi ficou com a cama do centro, e Kukai se ajeitou na cama mais perto da varanda, restando à Nagihiko e Tadase as duas camas do lado direito, lado a lado. Não havia muito a ser arrumado, já que cada um tinha trazido apenas uma bagagem de mão – exceto por Nagihiko, que trouxe duas –, então os garotos apenas sentaram em suas camas, esperando por algo a ser dito.

— Bem, as garotas disseram que querem ir à praia, então nós deveríamos nos arrumar, nee? – Nagihiko foi o primeiro a se pronunciar.

— Certo... – Ikuto murmurou contra o travesseiro, e então sentou-se subitamente na cama, e em um movimento único e brusco, arrancou a camiseta preta que usava, ficando com apenas a bermuda azul-escuro e deixando à mostra o peitoral bem desenvolvido de um garoto de 18 anos – Estou pronto.

— Ah! – Kukai pareceu perceber algo, e fez o mesmo que o mais velho, arrancando sua camiseta e ficando apenas com a bermuda cinza e verde – Eu também!

Nagihiko, Tadase e Kairi se entreolharam, visivelmente perturbados. Tadase e Kairi eram tímidos, e não se achavam confortáveis para despir-se na frente dos amigos. Mesmo que fizessem isso no vestiário da escola, era diferente quando estavam sozinhos em um quarto, ainda mais com alguém como Ikuto, de quem nunca sabiam o que esperar. Já Nagihiko, depois de tantos anos como Nadeshiko, desenvolveu certa reserva quanto a se trocar na frente dos outros, algo inconsciente. E somado a isso, havia aquele estranho e inexplicável interesse de Tadase por suas pernas, e de forma alguma ele queria criar uma cena na frente dos outros, daquela forma. Os três não tiveram tempo de se decidir, pois logo ouviram uma pequena batidinha no vidro da porta da varanda.

Do outro lado, estavam Kiseki, Rythm, Yoru, Daichi e Musashi. Kukai, que estava mais perto, levantou-se e abriu, deixando os Shugo Chara entrarem.

— Yey! Vamos logo para praia, o que vocês estão esperando? – Rythm indagou assim que entrou, voando até seu dono.

— Eu quero surfar! – Daichi bradou, e o Chara de Nagihiko assentiu com o mesmo ânimo.

— E eu quero conhecer aquela graaaaaaaaaande caixa de areia lá embaixo! – Yoru cantarolou, muito animado.

— Andem logo plebeus! Um rei como eu não pode esperar!

— Certo, nós vamos esperar lá embaixo, tá legal? – Kukai anunciou, e Ikuto levantou-se preguiçosamente seguindo-o. Yoru e Daichi os acompanharam.

— Eu vou me trocar ali, está bem? – Kairi disse, assim que os dois mais velhos fecharam a porta, e com algumas peças de roupa em mãos, ele adentrou o banheiro. Musashi sentou na cama dele, fazendo pequenos treinos com a sua espada.

— Ano... Fujisaki-kun... – Tadase chamou hesitante, sentando-se na cama bem a frente de Nagihiko. Kiseki observou seu dono atentamente, em silêncio, com muitas coisas passando em sua pequenina cabeça real. Rythm também analisava os dois, mas com um sorriso no rosto – Eu estava observando... – ele corou com a afirmação, e fitou as próprias mãos, que ele esfregava nervosamente uma na outra – E percebi que você está... um pouquinho... mais alegre, desde que começamos a viajar...

Nagihiko se surpreendeu. Ele estava realmente sentindo-se bem naquele lugar, mas achava que estava agindo exatamente da mesma forma que sempre fizera. Como Tadase conseguira perceber essa pequena variação de estado, sendo que o próprio Nagihiko não havia levado isso em conta, ele não saberia. Mas era fato que aquele garoto sempre sabia como deixa-lo desconcertado.

— Bem... acho que isso é por que é a primeira vez que eu venho à praia... como eu mesmo. – ele baixou a voz, inclinando-se na direção, e Musashi, sentado do outro lado, não pareceu ouvir nada – Sem precisar me esconder debaixo do guarda-sol, usando maiôs ou vestidos... Eu vou poder me divertir com todos, pular na água, correr, nadar, jogar bola... vou poder competir com o Souma-kun, da maneira que sempre quis, apostar para ver quem come mais, e então reclamar da dor de estômago, jogar água nas garotas enquanto elas tomam sol, e depois sair correndo, fugindo delas... e vou poder brincar com você, Hotori-kun, de verdade, sem precisar fingir nem me esconder... isso... me deixa feliz. – ele sussurrou, sorrindo minimamente, e Tadase sentiu seu coração dar um salto incômodo no peito, vendo aquele sorriso.

— Então me deixa feliz também – Tadase sussurrou de volta, sorrindo com o rosto ruborizado, e Nagihiko abriu ainda mais o seu sorriso.

A porta do banheiro se abriu, e Kairi apareceu, usando uma bermuda branca e preta,  uma camiseta regata verde-escuro, com kanjis em preto na parte inferior e chinelos. Tadase e Nagihiko se afastaram bruscamente, sendo que nem haviam reparado que estavam tão próximos um do outro. Kairi saiu do quarto, acompanhado de Musashi, e os dois ficaram sozinhos novamente.

— E-eu vou me trocar então – Tadase levantou-se, remexendo em sua mala ansiosamente, retirando algumas peças aleatórias, e entrando rapidamente no banheiro. Kiseki, depois de dar uma breve olhada na direção de Nagihiko, voou e entrou junto com ele.

Logo que Tadase fechou a porta, Kiseki avançou até diante dos olhos dele, com um semblante muito sério.

— Tadase... eu estou muito preocupado com você. Tem algo que eu preciso realmente dizer, e penso que não há mais como adiar essa conversa.

— Kiseki... você tem certeza de que é um assunto assim tão importante? Fujisaki-kun está ali fora me esperando, e, bem, nós estamos em um banheiro, não é exatamente o lugar para conversas sérias... – Tadase disse, um pouco confuso.

— Eu não posso mais deixar esse assunto de lado, se não falar com você agora, não conseguirei mais nenhuma chance de pegá-lo sozinho. – Kiseki disse, e Tadase assentiu, em silêncio, prestando atenção no seu Chara. Se ele estava assim tão apreensivo, então o assunto era mesmo relevante – Tadase... eu fui alertado há algum tempo sobre algo que estaria acontecendo com você... e desde então eu tenho prestado atenção, querendo perceber se por acaso aquilo que me disseram era verdade... Sinceramente, eu passei muito tempo sem saber dizer. Seu coração estava confuso e eu não conseguia entende-lo. Mas... ultimamente, eu tenho notado mudanças no seu coração, e elas são extraordinárias, algo que eu nunca imaginei que pudesse ser possível, o que me fez supor que talvez aquelas afirmações estivessem, mesmo que parcialmente, corretas. Porém, apesar de eu poder tirar minhas próprias conclusões, eu quero confirmar com você o que está ocorrendo antes de qualquer coisa.

— T-tem algo de errado com o meu ovo do coração? – Tadase indagou, sobressaltado, levando a mão ao peito como se com isso pudesse verificar.

— Não é com o seu ovo do coração, mas com o seu coração em si. Algo a ver com sentimentos, eu.... não saberia explicar com exatidão. E também não é nada de errado, embora eu não possa dizer que me parece certo... enfim, tem algo que eu preciso perguntar a você, não há outro modo de saber.

— Diga logo, Kiseki, já está me deixando preocupado! – Tadase pressionou, exasperado.

— Tadase, você… você se apaixonou pela ex-rainha, Fujisaki Nadeshiko? – Kiseki disse de uma só vez, depois de respirar fundo.

Tadase ficou vários segundos encarando a sua versão miniatura, com os olhos parados e sem expressão. Aos poucos, as palavras ditas por ele iam fazendo sentido, e seu rosto se coloriu imediatamente, de um vermelho puro e brilhante.

— K-k-k-k-ki-ki-kis-s-se-k-ki… p-p-por q-que está dizendo... e-e-eu.. q-q-quem disse i-is-so...? V-você não disse isso para ninguém n-não é? – Tadase exaltou-se, agarrando Kiseki entre os dedos.

— Então é verdade, Tadase? Você se apaixonou? – Kiseki repetiu, incrédulo, e Tadase ofegou, corando ainda mais.

— N-não fale alto! – ele sibilou, olhando alarmado para a porta, como se esperasse que a qualquer momento Nagihiko pudesse aparecer diante dele – Eu... é verdade... eu gosto do Fujisaki-kun. Mais do que isso... eu acho que eu o amo... Eu o amo... amo muito, muito mesmo, Kiseki.  – Tadase admitiu por fim, sentindo-se como se um peso fosse retirado das suas costas, ao dizer em voz alta. Kiseki encarou Tadase por alguns segundos, talvez supondo que ele dissesse que era brincadeira, mas o loiro sustentou seu olhar com seriedade, determinado e convicto.

— Tadase... você tem certeza disso? – tornou a perguntar, suplicante.

— Tenho, Kiseki. Mais certeza do que em qualquer outra coisa na minha vida. Eu amo o Fujisaki-kun – ele disse novamente, dessa vez com mais certeza. Após admitir pela segunda vez, dizer isso se tornou mais fácil. Essa afirmação era tão simples e natural quanto respirar para Tadase, e parecia apenas correto que fosse assim, sem nenhuma dúvida ou incerteza. Mas Kiseki não parecia pensar assim.

— Tadase... Eu estou apenas supondo, mas... não seria o caso de você ter se apaixonado apenas pela metade feminina do garoto Fujisaki? Digo, a Nadeshiko tinha um porte e elegância notáveis, nada que se encontre em garotas como a Hinamori Amu, e também boa educação, diplomacia, discrição, reserva... enfim, ela era uma Rainha perfeita e legítima, não tenho como negar, e cheguei a pensar que seria uma companheira a sua altura antes de saber sobre o seu segredo. Mas... você, melhor do que ninguém, sabe tudo sobre o Fujisaki Nagihiko, então... você não está encantado pela dama perfeita e fechou os olhos para os fatos, não é mesmo? Um rei não pode se dar ao luxo de ignorar certos detalhes apenas por que lhe convém, Tadase, e eu não admito que você se permita ficar cego de amor!

— Eu estou perfeitamente ciente dos meus sentimentos – Tadase replicou, finalmente soltando Kiseki e suspirando inconscientemente – Eu... bem, me apaixonei também pela metade masculina, ou devo dizer, principalmente por ela. Não sei o que isso significa, mas eu amo Fujisaki Nagihiko, e para mim, não importa qual o seu gênero. Eu apenas... amo ele. – Tadase disse com a voz mal passando de um sopro, e então sorriu discretamente para Kiseki.

— Está bem, Tadase. Um rei sempre sabe o que faz, e eu irei respeitar a sua decisão, já que você me parece tão convicto nela. Eu estarei aqui, ao seu lado, para quando precisar, tenha em mente.

— Obrigado, Kiseki – Tadase afagou a pequena cabeça lilás do Rei, quase derrubando sua coroa – Eu agradeço a sua compreensão. Eu não sou assim tão tolo, sei que nem tudo são como nos contos de fadas, e também sei que não é provável que eu seja correspondido, mas eu desejo poder me declarar a ele o quanto antes, nem que seja para ser rejeitado. E nessa hora, eu sei que você estará comigo, Kiseki.

— Rejeitado? Como assim? – Kiseki ficou confuso, relembrando a conversa que teve com Rythm e Eru há tanto tempo, em que eles informaram sobre o amor unilateral que o valete nutria por Tadase, que, ao que tudo indicava, já não era mais tão unilateral assim. Até mesmo Kiseki, depois de alertado, pode perceber o quanto esse sentimento era óbvio, e o próprio Tadase não havia se dado conta disso!

— Não fale assim, Kiseki – Tadase repreendeu – Eu sei que você quer dizer que “Ser tão pessimista não é uma atitude digna de um soberano!” ou “Ele não pode rejeitar um Rei, pois ele é seu valete e deve servidão eterna”, mas todos nós sabemos que não é assim que as coisas funcionam!

— Não é isso Tadase...

— Ah! E mais uma coisa! Por favor, eu imploro, não conte isso a ninguém! Ninguém, ouviu bem?

— Um rei não devia implorar Tadase! E pode confiar, que não direi nada. Acho que não devo interferir nos seus assuntos amorosos, não foi para isso que você me desejou. Apenas... não se demore muito, está certo?

— Está bem, Kiseki – Tadase sorriu ternamente. Falar sobre esse assunto com seu Shugo Chara realmente foi de um conforto sem igual, e Tadase sentia-se inacreditavelmente mais leve e tranquilo depois de desabafar dessa forma.

— Está tudo bem aí dentro, Hotori-kun? – Tadase ouviu a voz preocupada de Nagihiko ecoar no pequeno espaço, logo depois de pequenas batidinhas na porta.

— Está sim, Fujisaki-kun, já estou indo – ele se apressou em dizer, correndo para se vestir. Colocou rapidamente a bermuda azul e o colete laranja, e então retornou ao quarto. Estava tão nervoso que chegava a tremer levemente, tentando a todo custo agir normalmente. Kiseki, sobrevoando ao seu lado, também estava alterado. Nagihiko, que o esperava, já estava inteiramente vestido, com uma bermuda lilás e uma camiseta cinza-claro.

— Você está bem, Hotori-kun? Está todo vermelho... – Nagihiko observou, levantando-se e se aproximando do garoto. Tadase corou, sentindo o valete medir sua febre com as mãos gentis e macias.

— E-estou… - Tadase perdeu-se no toque cálido de Nagihiko, tentando recobrar a linha de raciocínio – É m-melhor irmos logo, estão nos esperando… - ele se esforçou em dizer, afastando-se alguns passos, contrariado. Nagihiko fez o mesmo, e juntos, eles desceram pelo elevador, e chegaram até o hall de entrada, onde não encontraram ninguém.

Foram então para o lado de fora, e andaram juntos até o início da praia. Tadase e Nagihiko tiraram os chinelos, e afundaram os pés na areia fofa enquanto procuravam pelos amigos. Ao longe, conseguiram identificar Nikaido, tentando arrumar o guarda-sol, que se fechou ao redor dele algumas vezes antes de se firmar. Os dois correram até lá. Rima estava deitada e uma cadeira inclinável, embaixo de outro guarda-sol, encoberta pelo enorme chapéu branco e pelos óculos-escuros, e tomava chá gelado, em uma taça com guarda-chuvinha e tudo. Yaya estava mais a frente, e construía um castelo de areia, com ajuda de Kukai e dos Shugo Charas. Utau tomava sol, deitada em uma toalha, ao lado de Yukari. Kairi, sentando-se embaixo do guarda-sol que Nikaido finalmente conseguiu armar o guarda-sol, abriu seu livro e se concentrou nele quase que imediatamente, enquanto Amu brigava com Ikuto para ver quem ficaria com a última cadeira. Tsukasa estava na beira do mar, molhando os pés nas ondas que se desfaziam.

— Ah, finalmente apareceram! – Yaya exclamou, vendo Tadase e Nagi chegarem juntos.

— Ho ho ho ho hoh! o que estavam fazendo sozinhos até agora hein? – Utau riu, erguendo os óculos escuros para deixar aparecer os olhos maliciosos.

— Esse sol deve estar fervendo sua cabeça, Tsukiyomi-san – Nagihiko disse, ceticamente, e a cantora sorriu de canto, satisfeita ao ver Tadase corar com apenas aquela afirmação.

— Vamos para a água, Fujisaki-kun! – Tadase exclamou, lembrando a conversa que havia tido com o garoto minutos antes, no quarto, e então segurou sua mão, levando-o na direção do mar.

— Espere um pouco – Nagihiko arrancou a camiseta, voltando para o lugar e a deixando junto com as coisas dos outros – Pronto – Ele sorriu, voltando na direção de Tadase, mas ele parecia apenas sem palavras, com os olhos parados e fixos, lembrando uma criança que tinha um X em seu ovo do coração, exceto pelo semblante tolo. Depois de muito analisar o abdômen surpreendentemente bem-definido do valete, ele pareceu retornar a si, e fez o mesmo, voltando a correr na direção do mar e sendo seguido pelo amigo.

 Yaya teve um ataque, ao ver aquela cena, e quase destruiu o castelo em inicio de construção com sua empolgação, e Rima corou furiosamente, trocando olhares cúmplices e sugestivos com Utau, que estava deitada logo ao seu lado.

Todos passaram o dia inteiro na beira do mar. Aos poucos, a praia foi enchendo, e logo estava repleta de pessoas. Os guardiões e seus amigos fizeram de tudo um pouco, aproveitando o dia. Jogaram bola na água, racharam uma melancia, terminaram o castelo de areia e depois, almoçaram ali mesmo. Nagihiko e Kukai alugaram pranchas de surf, e fizeram uma competição. Amu se juntou a eles, depois de fazer Chara Change com Ran, e os outros ficaram na areia, torcendo. Tadase entrou também no Chara Change, e acabou empolgando-se mais do que devia, gritando ameaças e palavras de incentivo para o seu súdito mais que favorito.

Depois da competição de surf, em que Tadase gritou tanto que desconcentrou Nagihiko e Kukai acabou vencendo, o rei quase entrou da depressão-pós-chara change, mas logo foi recuperado e depois de bradar desculpas a todos, eles pularam ondas, jogando água um no outro, com Rima ao fundo, deitada em uma enorme boia. Ikuto não conseguiu se segurar, e a derrubou na água, rindo escandalosamente ao ver a loira, parecendo com um poodle ensopado, furiosa e querendo bater nele. Depois disso, jogaram vôlei, e Amu, que ainda estava o Chara Change com Ran, quase afogou Rima com um saque forte demais, mas ela se recuperou quase que imediatamente depois da ameaça de Ikuto de fazer um boca-a-boca nela. Por fim, Ikuto foi enterrado na areia, em uma tentativa de fazê-lo parar de incomodar a Rainha.

Quando enfim se cansaram, e o fim da tarde já ia chegando, deixando o clima frio demais para banhos de mar e obrigando todos a vestirem suas roupas, Tsukasa surgiu enfim, trazendo uma nova atividade para a noite.

—Aqui – ele mostrou um pequeno folheto promocional – Neste lugar são feitos testes de coragem. Vocês não gostariam de participar?

— Teste de coragem? – Utau e Yaya exclamaram ao mesmo tempo, empolgadas.

— T-t-tes-t-te de c-coragem... – Tadase repetiu, incrédulo, e sendo acompanhado em sua reação negativa por Amu, que tremeu contidamente.

— Está tudo bem, Tadase! – Yaya contornou o braço no ombro do loiro, amigavelmente – Não precisa ter medo! O Nagi vai estar lá para proteger você dos fantasmas, vai sim, não vai, Nagi?

— Nós aceitamos! – Utau bradou, sem dar à Nagihiko a chance de responder.

— Certo, ainda bem, por que eu já fiz nossas inscrições. Aqui está – ele distribuiu seis papeizinhos entre os jovens – Vocês vão em duplas, e atravessam aquele bosque ali – ele mostrou um morro logo a frente, que era circundado por uma floresta. Na luz lúgubre do por do sol, parecia apenas uma enorme mancha negra, um tanto ameaçadora até. Tadase tremeu, escondendo-se parcialmente atrás dos ombros do valete.

— Anh? Os nossos nomes já estão escritos aqui... – Amu surpreendeu-se ao ler o seu papel.

— Ah, sim, eu tomei a liberdade de dividi-los de acordo com o que observei nesse breve período de tempo, espero que não se importem – Tsukasa riu quase inocentemente. Depois dessas palavras, todos olharam alarmados para os seus papéis, temerosos. As duplas, segundo o que Tsukasa tinha determinado, eram Kukai e Yaya, Rima e Ikuto, Amu e Kairi, Yukari e Nikaido, Utau e Tsukasa, e, obviamente, Nagihiko e Tadase.

Ambos os garotos coraram, ao ver seus nomes escritos juntos, e Utau soltou um pequeno gritinho de empolgação, animada com a ideia de Tsukasa. Outros ainda resmungaram, contidos, da escolha das duplas, mas nenhum deles ousou ir contra o diretor, que tinha um sorriso indecifrável no rosto inexplicavelmente idêntico ao garoto que tremia e se retorcia atrás de Nagihiko.

— Waaa~ A Yaya vai com o Kukai! E nós somos a primeira dupla! Vamos logo!! – Yaya segurou Kukai pelo braço, e antes que ele pudesse se opor, arrastou-o na direção da entrada da floresta. Os outros, sem ter a oportunidade de discutir, os seguiram mais calmamente e alguns, como Rima, visivelmente desmotivados. Chegaram enfim no início do bosque, onde algumas pessoas, que pareciam alunos do ensino médio, organizavam o teste de coragem. Yaya chegou com Kukai, primeiro, entregou o ingresso, e arrastou ele para dentro da floresta.

A garota que recepcionou Yaya e Kukai, que já haviam sumido da vista de todos, aproximou-se para ajudar os restantes. Pegou os ingressos e explicou que a próxima dupla poderia ir assim que soasse um sinal que indicaria que a primeira dupla já havia passado da metade. Passaram-se vários minutos de incômodo e constrangedor silêncio, até que enfim algo parecido com o som de uma corneta rasgou o ar, sobressaltando os guardiões.

— Os próximos... – a moça indicou a entrada, prestativamente.

— Aqui, eles dois! – Utau empurrou Nagi e Tadase para frente, descaradamente, eles não tiveram opção a não ser seguir o caminho.

A trilha seguia para cima, cortando a densa floresta, e não demorou até que eles perdessem de vista o local onde os outros ficaram para trás. Nesse momento, a noite já havia caído, e apenas a luz da lua iluminava a sombria paisagem, deixando-a ainda mais desolada e assustadora do que já pareceria durante o dia. Nagihiko avançava lentamente, sentindo a figura trêmula de Tadase o acompanhando de perto. Ele não sabia disso, mas dessa vez, o loiro não estava fingindo apenas para a aproveitar a oportunidade e agarrá-lo. Ele estava realmente com medo, e justamente por isso, ainda não havia sequer tentado tocá-lo, se limitando a andar próximo enquanto fitava os arredores com apreensão notável.

Subitamente, uma risada maquiavélica e assustadora se fez ouvir, vinda de lugar algum, e ecoou por todo o espaço fechado. Tadase não conteve a tempo o grito de pavor que escapou de sua garganta, e sem pensar nas suas ações, envolveu as costas de Nagihiko em um forte abraço, escondendo a face entre a camiseta dele.

— Hotori-kun... – Nagihiko sussurrou, surpreso, sentindo as mãos de Tadase apertarem-se contra o seu tórax, enquanto ele choramingava baixinho – Está tudo bem, eu estou aqui – ele murmurou, com a voz gentil, virando-se e aconchegando Tadase em seu abraço.

— T-temos que c-continuar – Tadase disse, afastando-se de Nagihiko contra a vontade.

— Tem razão – Nagihiko concordou, também contrariado, e então segurou a mão de Tadase firmemente entre a sua, recomeçando a andar – Não olhe para os lados – ele disse, coma voz cálida – Olhe para cima, para as estrelas, e assim não vai sentir tanto medo...

— Sim... as estrelas estão lindas – Tadase disse distraidamente, seguindo o conselho do maior – Eu acho... que nós poderíamos apreciar elas melhor se não estivéssemos... nesse lugar... – ele resmungou para si mesmo, tremendo com a sensação incômoda de insegurança que o desconhecido causava.

— Vamos ver elas quando sairmos daqui, então – Nagihiko sorriu, e Tadase sentiu algo quente e macio preencher seu peito, expandindo-se e inflando, até que chegasse à sua garganta, pronto para transbordar. As palavras estavam ali, prontas para serem ditas, mas Tadase não encontrou sua voz, no meio de tantos sentimentos misturados.

Nesse instante, novos sons assustadores como uivos e choros de criança ecoaram pelo espaço, e Tadase tremeu, agarrando o braço de Nagihiko com a mão livre, sem soltar a outra que ele tinha entrelaçado a ele. Ao longe, uma figura de branco podia ser notada. Era difícil dizer, naquela escuridão, se era mesmo uma pessoa ou apenas um produto da imaginação, estimulado pela situação, mas o fato era que eles tinham que passar por aquele local para continuar. Tadase encolheu-se ainda mais, enlaçado à Nagihiko, e os dois apressaram o passo ao cruzar aquela parte.

Andaram mais alguns minutos, em silêncio completo, e então ouviram a corneta que indicava que haviam passado da metade da prova. Agora, o terreno começava a se inclinar novamente para baixo, e, inexplicavelmente, tornava-se mais escuro e fechado também. Era complicado distinguir a trilha em meio à mata fechada, que barrava a luz da lua, e também das estrelas, e estava tão escuro que não fazia diferença estar de olhos abertos ou fechados, sendo que Tadase optou por fechá-los e deixou-se conduzir pelo maior, apenas seguindo o passo cauteloso dele, e ouvindo sua respiração cadenciada encher seus ouvidos, eliminando qualquer outro ruído.

Andaram assim por mais vários minutos, perdendo a conta de quanto tempo fazia desde que saíram da beira da praia. Podia ter sido há horas, dias, ou apenas há alguns minutos. Não importava muito, pois a impressão que tinham, era a de que haviam passado toda a vida andando pela floresta escura, e as lembranças do sol fossem apenas um sonho remoto. Nagihiko, mesmo que por um breve momento, desejou que assim fosse. Daquele modo, com Tadase tão perto que podia sentir as batidas frenéticas do coração dele em sua pele, nenhuma das preocupações que sempre o perturbavam, dia e noite, se faziam presentes. Era apenas o escuro, o som dos passos, e o leve arquejar de Tadase, logo atrás de si.

Estava seguindo essa linha de pensamento, quando repentinamente, o toque de Tadase se esvaiu, seguido de um estrondo e uma interjeição de dor. Nagihiko voltou-se para trás, alarmado, e tateou no escuro à procura do menor.

— Hotori-kun? Hotori-kun! Onde você está??? – indagou ao nada, com uma nota de pânico na voz.

— Aqui! – ele ouviu a voz assustada de Tadase, e então conseguiu identificar o vulto dele se levantando do chão – Eu tropecei, me desculpe – ele disse em voz baixa, e então, ergueu as mãos no ar, querendo alcançar o valete novamente. Sentiu a superfície quente, coberta por um tecido, que deveriam ser as costas dele, e percorreu com a mão toda a extensão, sentido o leve arrepiar da pele por baixo da camiseta. Ouviu o arfar contido de Nagihiko, e então percebeu que na verdade, aquele era o seu abdômen. Ao constatar isso, a mente de Tadase girou, e ele não conseguiu se afastar. Aproximou-se mais um passo, sentindo o calor de Nagihiko se espalhar por todo o seu corpo, como fogo em brasas, e então continuou a explorar com as mãos ingênuas o tórax do maior, até que estivesse próximo o suficiente para abraça-lo, e também, sentir seu perfume.

Nagihiko perdeu a linha de raciocínio com aquele toque irresistível e provocante de Tadase, e mordeu os lábios, contendo-se, ao sentir o menor se aproximar ainda mais, circundando sua cintura e afundando o rosto em seu peito, para então aspirar profundamente o ar. Era como se quisesse sentir seu cheiro, e gravá-lo na memória. Sua mente ficou completamente em branco. Ali, no escuro completo, com apenas aquelas sensações como referência, ele se esqueceu de quem era, e do que era certo ou errado. Não saberia nem mesmo responder o seu nome completo, caso fosse perguntado. Tudo o que tinha em mente era o fato de ter Tadase tão perto, e ao mesmo tempo, longe demais. Ele queria mais. Queria Tadase.

— Hotori-kun... – ele sussurrou, e foi quase como um lamento. Logo depois, perdendo totalmente qualquer resquício de algo que pudesse ser nomeado como “razão”, ele pressionou o corpo diminuto de Tadase contra a árvore mais próxima. Ouviu-o arquejar, surpreso, e isso soou quase como um convite para que prosseguisse.

Afundou o rosto entre o ombro e o pescoço de Tadase, com o nariz formigando ao sentir o aroma de morango, misturado ao cheiro de areia, mar e protetor solar. Provou aquela pele macia com a ponta da língua, sentindo um gosto salgado mesclada ao sabor doce que já era natural de Tadase, ao mesmo tempo em que o abraçava pela cintura e com a outra mão, buscava o zíper do colete, baixando-o até abri-lo. Tadase segurou-se ao máximo para não fazer nenhum barulho estranho, mas ao sentir a língua de Nagihiko percorrer seu pescoço, depositando beijos e pequenas mordidas, com cada vez mais intensidade, deixou escapar um gemido. A mão ágil de Nagihiko invadiu o tecido já aberto do colete, percorrendo o abdômen até chegar ás costas, acariciando cada centímetro da pele quente, que se arrepiava com o toque dele.

Tadase sabia que aquilo, de alguma forma, estava errado. Nagihiko jamais agiria dessa forma, por impulso. Talvez fosse por causa do escuro, ou ele tivesse entrado no Chara Change, por descuido. Não seria a primeira vez. Ainda que uma parte dele, a que estava sendo tomada por aquela enxurrada de sentimentos e sensações que Nagihiko provocava, desejasse ardentemente que suas preces tivessem sido atendidas e ele enfim pudesse ser correspondido, a parte racional e insegura insistia que o que estava acontecendo não devia ser nada mais do que um sonho. Provavelmente, por que havia batido a cabeça ou algo assim ao tropeçar e cair segundos antes.

Nagihiko havia intensificado seus toques, e à medida que ia subindo com os lábios até o lóbulo da orelha, arrancando mais gemidos desmedidos do loiro, sua mão foi baixando, chegando até o cós da bermuda. Tadase circundou os braços ao redor do pescoço de Nagihiko, ficando na ponta dos pés para alcançá-lo, e enrolando os dedos nas mechas macias do cabelo dele, da maneira que mais gostava. Nagihiko interpretou, inconscientemente, o gesto como um aval para continuar, e afastou os lábios da bochecha de Tadase, visando agora tocar finalmente aqueles lábios cheios, que pareciam ávidos pelo seu toque.

— KYAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAA! – um grito feminino e estridente repercutiu, fazendo Nagihiko voltar a si.

Ele piscou atônito, recobrando a consciência. A voz que o interrompera pertencia à Amu, e ele chegou a censurá-la em pensamento, antes de perceber de fato a situação em que se encontrava. Soltou Tadase no mesmo segundo, e no escuro, nenhum dos dois podia ver a face igualmente enrubescida do outro, e nem mesmo ousaram dizer nada. O que havia acabado de ocorrer parecia apenas uma alucinação momentânea, e eles tinham certa dúvida sobre o que aconteceu ou não. Apesar da incerteza, Nagihiko não pode deixar de sentir uma enorme e densa culpa alojar-se desagradavelmente dentro de si. Ele havia feito de novo, e ficar perto de Tadase só estava ficando cada vez mais difícil – e perigoso. E dessa vez... ainda havia aquela percepção, que poderia muito bem ser algo criado pela sua mente, de que que Tadase havia permitido o seu toque. Mais do que isso, que ele havia desejado continuar. Apenas essa hipótese já causava em Nagihiko uma dor terrível, que ele mal podia aguentar. A dor da ilusão de alcançar aquilo que desejava há tanto tempo conseguia ser ainda maior do que a privação de nunca tê-lo tido, e ainda havia, somando-se à isso, o receio de machucar, assustar, coagir ou prejudicar, de qualquer forma que fosse, aquilo que ele tinha de mais precioso, que era o próprio Tadase.

O rei, por outro lado, sentia-se inquieto. Depois do que – ele supunha – acontecera, o seu medo infundado de fantasmas havia desaparecido, dando lugar a um medo real, que seria melhor nomeado como incerteza. Ele queria, mais do que tudo, verbalizar seus sentimentos. E sentia que essa era a hora perfeita, sem nada que pudesse atrapalhá-los. Mas... seu corpo ainda sofria das consequência daquele episódio, ou seria devaneio? Suas pernas estavam tão bambas que era uma surpresa ele continuar de pé, e seu corpo estava inacreditavelmente quente, como se tivesse passado o dia inteiro debaixo do Sol, além de outras reações que ele preferia nem mesmo colocar em palavras. Sua mente o puxava para direções distintas, completamente desfocada e perturbada. Ele mal conseguia controlar os comandos de respiração, e seu coração batia tão rápido que poderia levantar voo.

Perdidos em seus próprios receios, os dois garotos enfim chegaram até a saída da floresta, do outro lado, onde Kukai e Yaya já os esperavam, animados.

— Waa! Olha lá, o Nagi e o Tadase! Eeeei, por que demoraram tanto? A Yaya e o Kukai nem precisaram de tanto tempo assim! Ou será que vocês acabaram se perdendo e... Woooow!!!! O que é isso! Vocês andaram se divertindo por aí!! Tadase, sua roupa está toda aberta e desalinhada, e seus cabelos, olha só, estão... – ela interrompeu a frase no meio, ao perceber que nenhum dos dois ouvia o que ela dizia. Confusa, ela olhou para Kukai, que apenas balançou a cabeça, preocupado.

Tadase e Nagihiko tinham os semblantes vazios, cada um mirando um lado. Os dois suspiraram ao mesmo tempo, sem nem perceber, e então baixaram os rostos, com expressões indecifráveis.

— Eu vou voltar para o Hotel – Nagihiko anunciou, depois de alguns segundos, e sem dizer mais nada, se afastou na direção da rua.

Tadase levantou os olhos, vendo as costas de Nagihiko ao longe. Pelo tom de voz, ele pode perceber que aquela melancolia e tristeza haviam retornado para o seu amigo, com ainda mais intensidade, e sentiu seu coração se despedaçar ao constatar isso. Sentou na calçada, sem conseguir ouvir as palavras de Yaya ou qualquer outra coisa. Tudo o que ele queria agora era achar respostas, e entender o que raios acontecia entre ele e Nagihiko, de uma vez por todas.

Enquanto caminhava, Nagihiko manteve-se impassível. Fez um esforço descomunal para não esboçar qualquer reação, e continuou andando pela rua. Quando já estava afastado o suficiente para não ser visto, deixou que as lágrimas quentes lavassem seu rosto, lentamente. Esperou que talvez, com elas, aquele sentimento imoral se esvaísse, também, e o deixasse, mas sabia que não seria assim tão simples. Sem conseguir enxergar nada, com os olhos marejados, ele pegou a chave na recepção, tomando o cuidado de esconder o rosto com os longos cabelos, e subiu para seu quarto. A primeira coisa que fez foi entrar no banheiro, e fechar a porta. Desejou que todos demorassem a chegar, por que assim, ele poderia sair do banho e fingir que estava dormindo, ninguém o perturbaria com perguntas, e ele não teria que ver o rosto ingênuo e confuso de Tadase certamente exigindo respostas para aquele ato de loucura que ele esteve prestes a cometer – de novo.

Quantas vezes mais ele teria que atacar Tadase para aprender o quanto era perigoso chegar assim tão perto dele? Ele havia feito novamente, e não podia mais confiar em si mesmo. Foi um deslize, um erro imperdoável... e que jamais voltaria a acontecer. E essa era a pior parte, era o que mais machucava.

Doía ficar longe de Tadase, ah sim, doía muito. Era insuportável, lancinante... Nagihiko tinha a impressão que seu corpo não aguentaria ter que sentir novamente essa dor, que certamente seria muito maior agora, que ele já havia provado da sensação de ter Tadase em seus braços. Mas... não haveria outro jeito para ele. A dor da insegurança, de estar tão perto e não poder tocá-lo, e acima disso, do medo de afastá-lo por causa dos seus descontroles, era muito mais agonizante.

Ele não disse o que queria à ele. E como poderia? Isso só estragaria a vida de Tadase, que tinha tudo para ser perfeitamente feliz. Bem longe dele. E agora Nagihiko, jamais teria uma chance de dizer. Era esse o seu castigo por ser tão imoral, a forma de se redimir pelo seu pecado.

Enquanto deixava a água fria lavar os últimos resquícios do dia na praia, Nagihiko tomou uma decisão. Assim que retornassem para a cidade, ele renunciaria ao posto de valete, e voltaria à Europa.


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Notas finais do capítulo

Koko wa Shiroyuki desu!
Aqui estou eu, postando a fic finalmente, depois de uma árdua jornada~ Aaah~ eu odeio sair na rua -.- E quase fui atropelada por estar distraída com os fones de ouvido *pensando em yaoi cof cof cof*
Enfim, espero que aproveitem esse capítulo, pois foram muitas horas fantasiando ele~
Ja nee~ Não esqueçam dos reviews, onegai *u*