Era mais um dia de sol que os estudantes de Seiyo tinham que enfrentar. Estava um calor de rachar os ossos, e os alunos mal podiam esperar pelas férias de verão que estavam chegando, embora tivessem que enfrentar as temidas provas bimestrais primeiro. Estava um lindo dia de sol lá fora, o sol brilhava, os passarinhos cantavam, as flores desabrochavam, um dia realmente maravilhoso, mas ainda assim, parecia haver alguém que não ligava a mínima se estava fazendo sol ou chovendo, porque há tempos que seus pensamentos e seu coração andavam tão nublados por uma nuvem densa chamada Hotori Tadase, que não ligava a mínima para o clima do lado de fora da escola.

Nagihiko andava mais preocupado do que de costume, e um tantinho mais depressivo também. Sabia que precisava superar esse amor que ele acreditava ser unilateral por Tadase, tinha certeza de que isso não daria em nada... mas simplesmente não conseguia. Às vezes se pegava pensando se não seria melhor fazer outra viagem para espairecer a mente, mas sabia que isso não daria certo, e apenas aumentaria o desconforto em seu peito. Afinal, não tinha dado certo da primeira vez, por que daria certo na segunda?

Ninguém parecia ter percebido que o Valete possuía preocupações demais para um garoto que ainda nem atingira o ginásio, exceto por Tadase, é claro. O loiro adquirira o hábito de observar o amigo com o canto dos olhos sempre que podia, isso quando não fixava seu olhar descaradamente nele, à ponto de se desligar completamente do mundo à sua volta, e percebera que Nagi andava mais desanimado do que o normal. Queria muito poder ajudá-lo, consolar o garoto, lhe dar conselhos, qualquer coisa que o fizesse se sentir melhor... mas era realmente difícil fazê-lo, considerando que Nagihiko raramente se abria com ele.

Agora, os dois estavam sentados em um canto da quadra, em plena aula de Educação Física, junto com o resto da turma, e também com os alunos do quinto ano, que estavam fazendo aula conjunta com eles. Os mais novos estavam sendo chamados primeiro, e quando o sensei chamou o nome de Yaya para fazer os exercícios na barra, e o Rei viu a amiga correndo até o meio da quadra com mais agitação do que o necessário, achou que era seguro iniciar uma conversa sem o perigo de serem espionados. Respirou fundo, desviou os olhos por um instante do garoto mais alto sentado ao lado dele para que não percebesse que Tadase o estava observando até agora, e falou:

– Ano... Fujisaki-kun? P-Por acaso você está com algum problema, ou... se sentindo mal, ou coisa assim?
– O que?! Não, eu não estou doente, nem nada assim... daonde foi que tirou isso?
– É que... você não parece muito bem ultimamente - Tadase baixou ainda mais os olhos, torcendo as mãos nervosamente - Quero dizer, já faz muito tempo que você não parece estar completamente bem, mas... ultimamente você parece estar pior do que de costume. Você está com algum problema? Se quiser, eu... e-eu posso ajudar...
– Não se preocupe, não é nada, Hotori-kun. Eu só... tenho pensado em várias coisas, sabe - ele baixou um pouco a voz - Como por exemplo em Temari, e nas provas que estão chegando... e... v-várias outras coisas. Mas não é nada que um Rei como você deva se preocupar - ele encarou Tadase com o canto dos olhos e, antes que pudesse se conter, afagou o topo da cabeça dele, como se o loiro fosse um fofíssimo filhote de cachorro. Tadase arregalou os olhos em choque, mas logo os fechou para apreciar melhor aquela pequena demonstração de afeto, corando até as orelhas. No entanto, Nagi logo interrompeu o toque, visto que estavam em um local público em plena luz do dia, e com várias pessoas em volta - Nee... como vai o Hotosaki? - Nagi perguntou a primeira coisa que lhe veio à mente, tentando mudar de assunto para livrar o Rei de preocupações desnecessárias - Logo será época de vacinação, sabia? Você precisa se lembrar de levá-lo
– Ahh, é verdade! - o loiro exclamou - Agora é... etto... vacina contra raiva, certo?
– Sim, mas eu acho que também tinha a contra cinomose - o Valete respondeu pensativo - Não me lembro agora... mas podemos verificar isso depois. Só não se esqueça de levá-lo, é nesse sábado, se não me engano
– Hai! Etto, Fujisaki-kun... você se importaria de levá-lo junto comigo dessa vez? - Tadase pediu timidamente
– J-Jutos?! Ah... o q-que foi, Hotori-kun, ele já está tão grande que você não aguenta mais levá-lo sozinho, é? - Nagihiko brincou, para disfarçar o embaraço. No entanto, uma imagem de Tadase sendo arrastado por um cachorro com duas vezes o seu tamanho formou-se na cabeça do Valete, causando-lhe uma súbita vontade de dar risada
– Não é isso, é claro que aguento! - o Rei exclamou um tanto desconcertado - É só que... bem, toda vez sou eu que levo ele, e... d-de certa forma ele também é seu, não é? Ele compartilha nossos nomes afinal. Daí podemos aproveitar pra passear um pouco depois, e... c-comprar uma coleira nova pra ele talvez, a que ele tem já está pequena, Hotosaki está crescendo tão rápido...
– Hai, hai... se é o que meu Rei deseja, então eu irei com o senhor, Majestade - Nagihiko brincou, fingindo uma reverência
– Nyaaaaaa kawaiiiiiiii!!!!!

Os dois garotos viraram-se assustados e deram de cara com Yaya atrás deles, observando-os aparentemente há bastante tempo.

– Ain, como vocês pode ser tão fofos, hein Tadase, Nagi?! - ela exclamou com empolgação excessiva, e um tanto alto demais - Falando assim sobre o Hotosaki... parecem até um casal recém-casado com seu primeiro bebê! Kawaiiii!!!!
– Y-Yaya-chan, quantas vezes preciso te dizer pra não dizer essas coisas constrangedoras em público?! - Nagihiko adiantou-se, alarmado, tampando a boca da amiga, e impedindo-a de dizer mais besteiras
– Não se preocupe, Nagi, a Yaya guarda segredo! - a Às desvencilhou-se do garoto rapidamente, ainda gritando mais alto do que devia - Vocês deviam resolver isso logo, hein?! Já que chegaram à esse ponto, o Nagi aqui por exemplo podia muito bem aproveitar pra levar Sua Majestade pra algum cantinho escuro e...
– Nem mais uma palavra sua pirralha precoce de mente suja!!! - Nagihiko tornou a tampar a boca da amiga, dessa vez com as duas mãos. No entanto, já era tarde demais, as alunas mais perto tinham ouvido o grito da Às e agora recomeçavam com as fofofcas
– Vocês ouviram?! Até a Yaya-chama percebeu!
– E ela é uma Guardiã também... se até a Yaya-chama está dizendo isso, então quer dizer que os boatos são verdadeiros, não é?!
– Só pode ser verdade! Tadase-sama e Nagihiko-sama estão mesmo tendo um caso!
– Ehhh?! Mas eu podia jurar que o Hotori-sama gostava da Nadeshiko-sama!
– Aposto que ele está indeciso! E o Nagihiko-sama deve estar se aproveitando da inocência do Rei pra tentar roubar o namorado da própria irmã!
– Kyaaa é um triângulo amoroso digno de novela mexicana!
– Nee, nee, quem será esse tal de Hotosaki?
– Não sei, mas seja quem for, parece que Hotori-sama e Fujisaki-sama estão cuidando dele juntos...
– Ahh! Será que os dois estão planejando se casar e adotar um bebê?! Esse tal Hotosaki pode ser o filho deles!
– Não seja burra, eles ainda são menores de idade, não podem se casar! E mesmo que fossem adultos, ambos são garotos, esqueceu?! Garotos não podem casar um com o outro!
– É mesmo? Mas eu jurava que existiam outros países que permitiam isso...
– Ahh será que eles estão planejando fugir juntos do Japão pra se casar em segredo?!
– Já falei que isso é impossível entre dois garotos, sua tonta! Hotori-sama gosta da Nadeshiko-sama, e não do irmão dela!
– Mas eu ainda acho que a Yuiki-sama tem razão... Hotori-sama fica muito mais fofo ao lado do Nagihiko-sama!
– Kyaaaa um romance proibido entre dois garotos! Kakkoiiii!!!

Assim como antes, Tadase corou furiosamente diante dos gritos escandalosos daquelas alunas sem nada melhor pra fazer além de tomar conta da vida alheia. Estava tão vermelho que parecia mais um tomate maduro com uma peruca loira no topo em cima de uma churrasqueira, visto que saía até uma fumacinha de suas orelhas. Pensou em desmentir os boatos distorcidos criados pelas alunas, que estavam cada vez mais exagerados por sinal, mas estava tão constrangido que não conseguiria proferir uma única palavra sequer. E sinceramente, não queria ter que fazer isso, já que intimamente sentia-se extremamente feliz que confundissem ele e Nagihiko como um casal de namorados. Nagihiko no entanto estava cada vez mais preocupado com aquela situação. Se aquela história saísse das paredes do colégio se e espalhasse pela cidade seria realmente um enorme problema para ele. Sentiu uma súbita saudade de Temari nesse momento, pois realmente desejava poder fazer o Chara Change com ela agora só pra poder materializar a Naginata e dar à Yaya o castigo que ela merecia por sair gritando essas coisas vergonhosas por aí.

E felizmente ou não, o professor agora iniciava a aula com os alunos do sexto ano, e chamou pelo nome de Nagihiko, que foi obrigado a deixar seus desejos homicidas para trás e voltar a se concentrar na aula. Os exercícios com os estudantes do sexto ano eram um pouco diferentes dos do quinto: Depois de fazer levantamento de barra, correr e saltar por cima da caixa, eles tinham que terminar fazendo um arremesso com a bola de basquete, e não poderiam se retirar até acertar ao menos uma cesta. Para Nagihiko isso era extremamente fácil, já que ele estava no Clube de Basquete, sem falar que realmente passou a gostar mais das aulas de Ed. Física desde que passou a viver como um garoto, e não precisava mais se controlar ou conter suas habilidades naturais como fazia quando era Nadeshiko. Tadase observava o Valete de longe, com uma atenção tão grande que ele devia usá-la nas aulas enquanto o professor explicava a matéria, e não em suas divagações. Observou cuidadosamente cada passo que o Valete dava enquanto corria pela quadra, quicando a bola, com seus cabelos esvoaçando ao vento, a camisa e o shorte encharcados de suór. E aqueles shortes... Tadase não pôde deixar de reparar neles. Não nos shortes em si, mas no que eles cobriam. Eles estavam usando o uniforme de verão, o que significava que as pernas do Valete estavam parcialmente expostas agora. Depois de se dar conta dos verdadeiros sentimentos que nutria por Nagihiko, Tadase finalmente entendeu porque sentia tanta atração pelas pernas do garoto, embora ainda não compreendesse muito bem porque seus olhos se focalizavam constantemente naquela parte do corpo em especial, sempre deixando o Rei completamente hipnotizado por aquela imagem tão atrativa.

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Passou tanto tempo admirando Nagihiko que não percebeu quando o professor chamou seu nome, e só voltou à realidade quando o próprio Nagi voltou para a arquibancada e lhe deu um cutucão, dizendo para o garoto se apressar e fazer logo o exercício. Tadase adiantou-se, correndo até a quadra apressado, realizando a mesma série de exercícios que os demais alunos tinham feito antes dele. Nagihiko também não pôde deixar de prestar atenção em cada movimento que o Rei fazia: Viu-o correr ofegante e com o rosto corado, provavelmente pela falta de ar, o suór em seu corpo fazendo o garoto brilhar mais do que qualquer outra coisa, e fazendo com que a camiseta branca do uniforme se tornasse um tanto transparente por estar tão encharcada de suór. Tadase se saiu razoavelmente bem nos exercícios ditados pelo professor, ainda que Ed. Física não fosse seu ponto forte. Acertou a bola na cesta na terceira tentativa, o que era realmente incrível, considerando sua falta de treino e baixa estatura. Talvez o fato de sempre assistir aos jogos de Nagi tenha ajudado em alguma coisa afinal, e o Rei considerou a ídéia de talvez pedir para Nagihiko treiná-lo depois das reuniões no Royal Garden, mas não porque queria se tornar um melhor jogador de basquete. Tinha que admitir para si mesmo, era mais uma desculpa para passar mais tempo ao lado de Nagihiko do que qualquer outra coisa.

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Depois que toda a classe passou pelo mesmo exercício que eles, o professor mandou que o Rei e o Valete fossem até o almoxarifado buscar a rede e a bola de vôlei, enquanto dividia os alunos restantes em dois times. Um pouco nervoso por estar sozinho com o Rei, e no entanto sem conseguir deixar de se sentir feliz com isso, Nagihiko caminhou até o almoxarifado, com Tadase em seu encalço. Adentrou o cubículo escuro e apertado, cheio de equipamentos e objetos de todos os tipos e tamanhos, e começaram a procurar pelos objetos desejados no meio daquela bagunça. Quando finalmente encontraram, porém, ouviram um estrondo na direção da porta, e a pouca iluminação de que dispunham se esvaindo. Antes que percebessem, a porta estava fechada, deixando-os trancados sozinhos em um cubículo apertado e escuro.

– O que... o que foi isso? O que aconteceu?? - Tadase indagou com uma nota de pânico na voz
– Acho que alguém fechou a porta pelo lado de fora - Nagi foi até a porta, puxou, empurrou, sacudiu, e bateu. Nada, ela não se moveu nem uma única vez - Trancada... é, estamos presos aqui
– P-Presos?! Quer dizer... que não podemos sair??
– Bem, sim... o Kiseki não está com você, não é? - o maior perguntou
– Não, ele foi na frente para o Royal Garden fazer aquela reunião de sempre com os outros Shugo Charas
– O Rhythm também... droga, justo quando preciso daquele cabeça-oca pra fazer o Chara Change ele some! - o Valete reclamou - Bem, o jeito é esperar até que alguém nos encontre, eu acho
– Mas... e se ninguém encontrar a gente? E se... e se todo mundo for embora da escola, e continuarmos presos aqui? Sem comida, sem água, sem nada... e se continuarmos trancados aqui sozinhos Fujisaki-kun?! - Tadase indagou, tentando inutilmente disfarçar seu desespero. Ele agarrou a manga da roupa do Valete com a mão trêmula, numa tentativa de se acalmar
– Acalme-se Hotori-kun, vai ficar tudo bem! O sensei sabe que estamos aqui, se demorarmos pra voltar ele virá aqui ver o que aconteceu e abrirá a porta, só precisamos esperar. Além do mais, você não está sozinho, eu estou aqui com você, não estou? Eu prometi... prometi que iria te proteger, não foi? Pois então, eu vou continuar fazendo isso... sabe que eu não quebro minhas promessas - ele ergueu um pouco a mão e tornou a afagar o topo da cabeça do Rei, mexendo em seus cabelos distraidamente. Antes que notasse, o loiro enterrou o rosto em seu peito, segurando a camisa dele com suas mãos trêmulas, na esperaça de que o fato de estar mais perto de Nagi também o acalmasse. Curiosamente isso pareceu funcionar, já que, logo depois de abraçá-lo, Tadase sentiu os braços hesitantes do maior envolvendo-o, enquanto uma das mãos do Valete acariciava distraidamente seus cabelos. No entanto, isso causou uma série de sensações inesperadas em Nagihiko, desde uma violenta cambalhota em seu coração, até seu rosto, que pareceu esquentar tanto que dava a impressão de que ia entrar em ebulição a qualquer momento, e o Valete agradeceu aos céus por estar escuro o suficiente ali para que Tadase não percebesse o quão enrubescido ele estava.
E então, contra sua vontade, Nagihiko acabou se lembrando das palavras de Yaya:

"- Já que chegaram à esse ponto, o Nagi aqui por exemplo podia muito bem aproveitar pra levar Sua Majestade pra algum cantinho escuro e..."

Nagihiko realmente não queria saber o que vinha depois desse "e", embora fizesse uma boa idéia do que seria. Sim, agora estavam os dois trancados sozinhos em um lugar apertado e escuro, exatamente como a Às sugeriu anteriormente. E isso não pôde deixar de causar pensamentos cada vez mais insanos no Valete. Ele estava sozinho com Tadase em um lugar escuro, ninguém podia vê-los agora... por mais que esse pensamento fosse tentador, sabia muito bem que não poderia fazer nada, não com aquele menino tão indefeso e inocente que tremia de medo em seus braços.

No entanto, o que Nagihiko não sabia, era que os pensamentos do Rei não eram tão inocentes assim, e agora tomavam um rumo bem parecido com os dele. Depois que os dois se sentaram lado a lado, encostados numa parede para esperar pelo resgate, com Tadase apoiando a cabeça no ombro do mais alto, o Rei divagou se não deveria aproveitar que estavam os dois sozinhos para declarar seu amor por Nagihiko de uma vez. Não havia mais ninguém por perto pra interromper ou ouvir a conversa deles afinal, era a oportunidade perfeita! O Rei começara até a imaginar se o fato de ser constantemente interrompido não era um sinal de que ele não deveria falar sobre seus sentimentos para Nagi, se não era uma espécie de aviso de alguma força maior lhe prevenindo para não fazer isso. Mas, agora que estavam os dois sozinhos, reconsiderou essa idéia. Talvez o destino estivesse lhe dando uma nova chance afinal. Isso mesmo, Tadase não podia desistir assim tão facilmente do que era importante para ele. Demorou tanto tempo para perceber uma coisa tão óbvia, não poderia simplesmente desistir de seus preciosos sentimentos por Nagihiko sem antes ao menos se declarar, e interiormente, ele orava aos céus para que seus sentimentos fossem aceitos. Tadase pensou em como faria isso, já que, sempre que tentava falar, ou era interrompido, ou gaguejava tanto que Nagihiko parecia pensar que ele estava sofrendo de uma crise nervosa ou coisa parecida. Decidiu começar falando de algum outro assunto que levasse à declaração, para ir se preparando aos poucos, e assim aproveitar para cumprir uma promessa há muito esquecida.

– Nee Fujisaki-kun... você se lembra quando fomos ao estúdio de dança da sua família?
– Humm? É claro, foi quando aquele Batsu Tama apareceu, não é? - Nagi recordou - Apesar de que não me lembro muito bem da ocasião toda em si, já que acabei sendo possuído...
– Não é disso que estou falando - Tadase interrompeu - Eu quero dizer... a-antes disso. Falo daquele dia de chuva... q-quando nós dois nos molhamos, e... tivemos que trocar nossos uniformes pelas roupas antigas da Fujisaki-san... e então, eu... b-bem... e-eu te...
– Ahh... l-lembro... claro que lembro - Nagihiko desviou os olhos dele, sentindo o rosto corar furiosamente, e estranhando Tadase ter tocado nesse assunto depois de tanto tempo. Instintivamente puxou as pernas mais para perto do corpo, colando-as na própria barriga e escondendo-as com os braços - O... o q-que tem isso?
– Eu... bem... d-depois que isso aconteceu, eu... prometi que pensaria muito no assunto, e quando compreendesse porque tinha feito.... err... a-aquelas c-coisas.... e-eu te daria uma satisfação, não foi? - Tadase continuou, tão embaraçado quanto o Valete - Eu... bem, eu pensei muto, e... f-finalmente entendi porque fiz aquilo
– Sério?! - Nagi indagou meio incrédulo, se afastando alguns centímetros para poder encará-lo melhor, de modo que Tadase foi obrigado a desapoiar a cabeça do ombro dele. Nagihiko já tinha desistido de obter uma resposta, já tinha até se conformado em deixar esse assunto de lado e nunca mais falar nisso. Ver Tadase voltando a falar sobre esse dia, e dizendo que chegou a uma conclusão ainda por cima realmente o surpreendeu - E... a qual conclusão... v-você chegou?
– Bem... d-depois daquilo, eu percebi... que, por algum motivo, eu realmente sempre acabo sendo atraído por... b-bem... p-por elas - o loiro apontou timidamente para as pernas de Nagi, que se encolheu ainda mais, constrangido - M-Mas isso não acontece com qualquer pessoa! Isso... e-eu percebi recentemente que isso... s-só acontece com você. Isto é, seja com o Fujisaki-kun ou com a Fujisaki-san... isso sempre acaba acontecendo. E... e-existe um motivo pra isso
– Bem, eu espero que sim - Nagi resmungou, cada vez mais embaraçado - E... q-que motivo é esse afinal? - ele encarou o Rei com o canto dos olhos
– É... é porque... F-Fujisaki-kun, eu... bem... s-se lembra de que tem uma c-coisa que eu v-venho querendo te contar já faz muito tempo... m-mas nunca consigo? Isso é... t-também é o motivo de eu ter f-feito a-aquilo - Tadase torceu as mãos nerovoso, corando tanto até que sua face estivesse inteiramente rubra. Em um impulso, ele agarrou as mãos de Nagi, segurando-as entre as suas, fazendo com que o Valete arquejasse de surpresa, seu olhar vacilando entre o chão, a parede oposta, e o próprio Tadase - Eu... e-e-eu fiz aquilo p-porque.... e-eu... F-Fujisaki-kun... e-eu... por você... n-n-na v-ve-verdade e-eu t-t-te...
– Yahoo! Finalmente encontrei vocês, hein?! Anda, o professor está esperando, vamos logo seus molengas!! Por que essas caras de bobos afinal? Principalmente o Tadase... não que o Tadase já não tenha cara de bobo, mas... ahh já sei, aposto que ainda está pensando em como o Nagi estava incrível jogando basquete, né?! Tipo, imaginando ele em câmera lenta, com brilhinhos ao fundo, e tudo o mais hahahahahaha! Assim o Tadase pira com o "Nagi kira-kira"! Ahh! Rimou! Kyaaa sugoi, Yaya é uma poetisa!! - Yaya irrompeu pela porta, abrindo-a com certa violência, deixando a luz do sol entrar, e interrompendo novamente o pobre Rei. Lentamente, e amaldiçoando Yaya por dentro, Tadase soltou as mãos do Valete antes que a menina visse o que ele estava fazendo e começou a pegar os equipamentos que precisariam para a aula. Os três deixaram o almoxarifado, com Yaya ainda rindo e falando aos berros, Tadase fingindo que ouvia, e Nagihiko seguindo um pouco mais atrás, ponderando distraidamente se não seria Yaya a responsável por ter trancado os dois naquele almoxarifado apertado, e com pensamentos muito mais confusos e preocupantes do que esses assolando sua mente.

Aquela expressão no rosto de Tadase.... as palavras interminadas dele... lembravam terrivelmente os garotos desavisados que caíam de amores por Nadeshiko. Mais uma vez o Valete considerou sua suspeita absurda sobre o Rei ter desenvolvido sentimentos românticos pelo seu lado feminino, e intimamente sentia-se um tantinho feliz e esperançoso diante dessa possibilidade, ainda que soubesse que isso era no mínimo preocupante. Nagihiko não era uma garota afinal, e por mais que se parecesse com uma, jamais seria uma mulher completa. Isso só faria com que Tadase se machucasse futuramente, e se essas suspeitas fossem verdadeiras, Nagihiko teria que dar um jeito nelas e esclarecer a situação com o Rei o quanto antes.
E ainda havia o que o loiro lhe disse... ou melhor, tentou dizer. Depois de tantos meses, ele havia enfim compreendido porque assediou o lado feminino do Valete naquele estúdio de dança. Nagihiko estava realmente curioso pra saber a razão disso agora, mas sabia que teria que esperar até que não houvesse mais ninguém por perto para poder interrogar Tadase sobre isso.

O resto da aula passou depressa, assim como a Reunião do Royal Garden. Milagrosamente Yaya foi a primeira a ir embora dessa vez, ao invés de ficar na escola até o último minuto para se intrometer na vida dos outros como geralmente fazia. Depois de se despedir rapidamente dos amigos, ela correu até a saída da escola, e esperou alguns minutos ali sozinha, até que avistou alguém vindo correndo em sua direção.

– Kukai! Está atrasado! - Yaya gritou ao avistá-lo, pulando em cima dele e o envolvendo em um sufocante abraço
– Gomen, gomen... eu tive aula até mais tarde hoje - ele desculpou-se, rindo sem graça, se soltando do abraço da garota e começando a caminhar ao lado dela
– Hunf, aula até tarde, sei... - ela bufou descrente - Não sei pra quê você tem aulas até mais tarde se no final nunca aprende nada mesmo e acaba colando nas provas pra passar de ano! Aposto que você estava era jogando video game em algum canto da cidade e esqueceu da Yaya ou coisa parecida... ou então... ahh! Não me diga que estava tendo um encontro?!
– M-Mas o que você está dizendo, sua louca?! - ele desviou os olhos da mais nova, sentindo o rosto esquentar - É claro que não! Com quem eu poderia ter um encontro afinal??
– Eu não sei, com alguma garota da sua nova escola talvez... você é um ginasial agora, está crescendo mais rápido que a gente, e deixando seus amigos kouhais de lado... como vou saber se não está namorando alguma menina da sua nova escola, hein?! - ela também virou o rosto, um tanto incomodada com a suposição feita por ela mesma. Era verdade que Kukai já não era mais um Guardião, e nem sequer estudava mais na mesma escola que ela, mas a simples possibilidade de Kukai estar namorando com uma garota mais velha que Yaya não conhecia não lhe agradava nem um pouco. Na verdade lhe causava uma incômoda dor no peito que ela não sabia de onde vinha
– Quer parar de falar besteiras, sua tonta?! Acha mesmo que, se eu estivesse... err... n-na-namorando uma menina da minha escola, eu não contaria pra vocês? Acha mesmo que, seu não gostasse mais de você e dos outros, e os estivesse deixado pra trás, eu continuaria vindo aqui praticamente todo santo dia?? É claro que não! Então vê se pára pra pensar antes de falar, sua baka! - ele deu um tapa de leve na cabeça da Às, que reclamou de dor e esfregou a cabeça no lugar onde ele bateu, mas conseguiu inexplicavelmente se livrar daquela dor incômoda em seu peito
– Você jura? Realmente contaria pra Yaya e pros outros se algo assim acontecesse? - ela indagou, fazendo um adorável biquinho e parecendo ainda mais infantil do que realmente era
– É lógico! Você seria a primeira a saber, Yaya! - Kukai confirmou - Afinal, você...
– Eu o que?
– Você... err... v-você é a que... m-mais chega perto de ser... a-algo assim... eu acho - ele ele murmurou tão baixinho que Yaya podia jurar que tinha ouvido errado
– Como é que é?! A Yaya chega perto do que?? Repete isso Souma Kukai! - ela exclamou, sentindo sua face esquentar drasticamente
– E-Eu... eu quis dizer que você é a que mais parece entender desse tipo de assunto, oras! - ele disfarçou, virando o rosto pro lado e fingindo não estar embaraçado - Afinal, você... você está ajudando com aquela história do Nagi e do Tadase, então deve entender do assunto
– Ahh sim, "desse" tipo de assunto a Yaya entende, e muito! - a ruiva exclamou com empolgação excessiva, o embaraço que sentia antes sendo rapidamente substituído pela sua paixão por yaoi - Aliás Kukai, lembrei porque te chamei aqui! Você estará livre nas férias?
– Bom, se eu tiver uma nota boa na próxima prova, acho que consigo escapar das aulas de reforço de verão, então sim... por que a pergunta?
– Porque a Yaya está planejando uma suuuuuper viagem para os Guardiões, inclusive os que já deixaram a escola! - ela começou a pular no mesmo lugar, mais empolgada do que o necessário - Já combinei tudo com os outros na reunião de hoje, até o Iinchou vai, e também convidei a Utau-chan e o Ikuto, só falta você!
– Pois agora não falta mais, é claro que eu vou! - ele exclamou, tão empolgado quanto a Às - Mas até a Utau e o Ikuto você chamou?! Pensei que era uma viagem só para os Guardiões, aqueles dois nem sequer estudaram em Seiyo
– Yaya sabe, mas se fosse só a gente seriam poucas pessoas, aí não teria tanta graça... Yaya pensou até em convidar a Naddy também pra matar a saudade, mas não faço idéia de como entrar em contato com ela
– Ahn... n-não acho que a Nadeshiko poderia ir nessa viagem - Kukai falou, imaginando o que Nagihiko diria se ouvisse Yaya falando nisso
– Pois é, e sem a Naddy seriam mesmo muito poucas pessoas, sem falar que teriam muitos meninos... por isso Yaya chamou a Utau-chan também! Como o Ikuto estava por perto, ele se convidou pra viagem e vai junto com a gente, mas tudo bem, ele até que é divertido, cria cada confusão! - ela riu, só em imaginar as muitas confusões pelas quais esperava nessa viagem - Então, precisamos planejar os detalhes, Kukai! Mas faremos isso... enquanto lanchamos!
– Como é que é?!
– Tem uma lanchonete nova aqui perto, e a Yaya quer muito provar o pudim de lá! - ela voltou a pular, mais animada do que o normal - E depois podemos ir ao karaoke!! Ahh isso, isso, vamos cantar até virar a noite!!
– Não podemos cantar até virar a noite, amanhã temos aula! - Kukai exclamou com uma gota na cabeça
– Não importa, Yaya é uma Guardiã, então mesmo se ela se atrasar ou dormir na aula não vai ter problema! Ahh vamos, anda logo, Kukai!! - ela agarrou a mão do garoto e começou a puxá-lo em direção à tal lanchonete, enquanto falava de seus muitos planos para a viagem, que prometia tantas surpresas que nem mesmo Yaya poderia imaginar.