Yakusoku escrita por teffy-chan, Shiroyuki


Capítulo 25
Capítulo 25 - Sweet Romance


Notas iniciais do capítulo

Sweet Romance - Mayumi Gojo
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Na plateia do anfiteatro da escola Seiyo, muitas pessoas encaravam com atenção o palco, onde estava sendo encenada a peça dos guardiões. Seja pelo fato dos atores serem tão populares entre os alunos, ou o rumor de um dos anões ser um sexy estudante do ensino médio, o fato era que o lugar estava muito mais cheio do que se poderia supor, e haviam espectadores até mesmo nas escadas de acesso. Todos assistiam com concentração, à cena de maior tensão até o presente momento.

Nadeshiko, caída sobre o palco, parecia verdadeiramente morta, e mais de uma pessoa comentou se ela não estaria realmente desacordada naquele momento, tal a veracidade da sua atuação. Kukai, então, prosseguiu com sua narração prodigiosa. Ele havia enfim, conseguido superar as dificuldades e relembrar-se do roteiro, embora estivesse frequentemente adaptando as partes que não recordava. Agora era impossível distinguir o que era o escrito original de Nagihiko, e o que era criação livre de Kukai.

A Princesa permaneceu desacordada até o anoitecer. Quando os anões enfim chegaram, não havia muito que pudessem fazer.

Os anões enfim retornaram, e ficaram chocados ao ver a princesa caída no chão. Ikuto foi o primeiro a se aproximar, caindo dramaticamente de joelhos ao seu lado e começando a gritar “nãaao!”. Nagihiko teve vontade de bater nele. Primeiro ele menospreza sua peça, e agora começou a exagerar. Ele deveria se manter em um parâmetro.

— Por favor, acorde, Princesa! – Ikuto berrava, desesperado, chacoalhando Nadeshiko para todos os lados. Ela se esforçou para manter-se imóvel, como uma boneca de pano, embora estivesse realmente irritada agora.

— Ela está morta? – Hikaru entoou, sem emoção alguma.

— Acorde! Acorde Cinderel... itee! – Ikuto parou de falar bruscamente, ao sentir um intenso beliscão no braço, transferido pela princesa morta, que não esboçava indicio nenhum de estar fazendo isso com ele. Ele a soltou, de volta deitada no chão, e se afastou, escolhendo a sábia opção de se manter calado por enquanto.

Naquele momento, uma sonora explosão se fez ouvir, do outro lado do teatro e a música de fundo que tocava durante todo o espetáculo, parou. Utau, que a tudo assistia com apreensão, soltou um palavrão, e foi verificar o que ocorrera. Voltou com más notícias.

— Alguma coisa deu errado na mesa de som. – ela disse para Tadase, que era o único perto dela nesse momento.

— O que nós faremos agora? – ele indagou, aflito.

— Sem música... eu não sei... ah! Ideia! – ela exclamou e sumiu pelo corredor. Segundos depois voltou com algo nas mãos, e entregou à Ikuto. Era o violino.

Ela rapidamente explicou a ele, por trás das cortinas, o que ocorrera, e então entregou o instrumento ao garoto, que entendeu imediatamente o que deveria fazer. calmamente, ele voltou a sua posição, e colocou o violino nos ombros. Uma melodia triste e aflita começou a tocar, acompanhando o desenrolar da história. Todas as garotas da plateia suspiraram ao mesmo tempo, e Nagihiko agradeceu interiormente por isso. A música se adaptava à atmosfera da ocasião, transformando-se e se adequando ao momento.

Os anões prantearam a perda da sua amiga, e não se conformaram com sua morte. Como ela ainda conservava-se tão linda, eles não a enterraram, por sorte.

Algumas flores foram colocadas ao redor do corpo desfalecido de Nadeshiko, já que não havia um caixão de vidro, e os anões a observavam calmamente, ao seu redor, com Ikuto acompanhando com sua música.

Tempos depois, em uma calma tarde, apareceu uma pessoa muito esperada, e quando a reconheceu fez um alarde – Tadase apareceu correndo, e parou ao lado de Nadeshiko – Era ninguém se não o Rei, amado de Neve. Os anões contaram a ele o que houve, e ele foi breve. Não aguentava ver sua linda Princesa daquela forma. Ela parecia estar apenar dormindo, e não morta. Não deixaria sua amada só, isso ele não faria. Depois de se despedir, ele a vingaria.

Tadase se ajoelhou ao lado de Nadeshiko, segurando-a em seus braços desajeitados. Por algum motivo, sentia algo pesando em seu peito, ao ver ela desacordada daquela forma, sem se mexer e mal respirando. Ele sabia que se tratava da atuação de Nagihiko, e ele era realmente bom nisso, mas mesmo assim, Tadase não gostava da ideia de nunca mais vê-lo abrir seus olhos. Apenas a simples sugestão desse acontecimento, já era angustiante.

— Por favor... – ele sussurrou, sendo que só pode ser ouvido por causa dos microfones espalhados pelo teatro. Acariciou o rosto alvo e macio de Nagihiko, ainda de olhos fechados. Sentiu-o estremecer com seu toque, incapaz de se manter impassível ao ter Tadase assim tão perto. Passou os dedos por toda a extensão de seu rosto, parando nos fios de cabelo cor-da-noite que se desprendiam da trança.. – Volte para mim... acorde... por favor.

A melodia apaixonada de Ikuto continuou a ecoar em seus ouvidos, doce e harmoniosa, fazendo-os esquecerem-se por alguns breves momentos, de onde se encontravam. Novamente naquele dia, Tadase só conseguia enxergar Nagihiko. Seu coração acelerou, enquanto ele o trazia para mais perto, abraçando-o, com o rosto adormecido próximo ao seu peito. Ele seria capaz de ouvir, assim, as batidas frenéticas e descontroladas do seu coração? Ele suspeitou que sim, mas já não se importava. Naquele momento, ele só queria que Nagihiko enfim acordasse, para que ele pudesse novamente ver seus olhos cor de mel, ouvir sua voz doce e acabar com aquela sensação esmagadora dentro de si.

Kukai narrou alguma coisa, com suas rimas, explicando o que acontecia, mas ele já não conseguia mais ouvir. Até a melodia do violino, ainda acariciando o ar a sua volta, parecia baixa e distante. Ele só tinha olhos para a pessoa em seus braços, e só ouvia as batidas do seu próprio coração. Lembrou-se vagamente dos ensaios. Essa era a hora em que o príncipe, ou rei no caso, beijava a Branca de Neve e a fazia acordar. Ele havia combinado com Amu, logo no início, de que a beijaria no rosto, por que era constrangedor demais de qualquer outra forma, e a plateia não saberia distinguir, de longe. Ele deveria fazer o mesmo com Nagihiko, nesse momento, no entanto, não sabia mais se era isso o que faria.

O loiro tinha a vaga noção de que o público esperava por essa cena, apreensivamente, mas isso era apenas uma evidência distante, em sua mente. Tudo na sua cabeça girava agora ao redor de Nagihiko, indefeso em seus braços. Tadase se inclinou por sobre ele, visando sua bochecha, e preparando-se para isso, porém, chamou sua atenção os lábios róseos entreabertos, que respiravam fracamente e se mexiam minimamente com sua aproximação. Perdeu-se em sua observação, com os lábios a meio caminho de tocar a macia e corada pele de Nagihiko.

Tadase fechou bem os olhos, com a melodia suave do violino o embalando, e esqueceu-se completamente de onde estava e o que deveria fazer. Esqueceu-se da peça, do público, e do constrangimento. Tudo o que tinha em seus pensamentos agora era Nagihiko, e somente ele. Segurou o rosto dele, trazendo-o para a sua direção, e se inclinou. Sentiu o doce cheiro de sakuras fazendo seu nariz formigar, e seu coração agitou-se dolorosamente, pedindo por mais. Ele girou a mão, entrelaçando-a nos cabelos macios, e se inclinou naquela direção. Sentindo a respiração quente de Tadase bater em sua pele, Nagihiko arfou surpreso, tão minimamente que ninguém notaria. Não ousou abrir seus olhos. O loiro enfim terminou com a distância que os separava, selando os seus lábios, desajeitadamente.

Ao longe, Kukai narrava os últimos acontecimentos, e concluía explicando o destino de cada um dos personagens, inclusive a Rainha e todo o resto, porém, o Rei e sua Princesa nada escutaram.

Tadase sentia-se completo, com a sensação macia dos lábios de Nagihiko nos seus. Em algum lugar da sua mente, girava a ideia de que eles estavam sendo observados por toda a escola, mas isso também não fazia mais sentido para ele, assim como as palavras rimadas de Kukai, ao longe. Ele trouxe Nagihiko para mais perto, passando a mão por sua cintura, e ele enfim retribuiu, tonto e desconcertado, erguendo lentamente sua mão e enlaçando o pescoço de Tadase. Sentiu a mão dele, trêmula, em sua nuca, e ergueu-se, sabendo que o menor não sustentaria seu peso. Por causa de suas posições anteriores, Nagihiko estava agora entre o colo de Tadase, e a mão dele ainda repousava em sua cintura. Tomado pelo toque e pelo perfume de Tadase, Nagihiko tocou os lábios fechados dele com a ponta da língua, pedindo permissão, e o loiro, gemendo baixo, entreabriu-os. Nagihiko tomou o controle, urgente, abraçando Tadase e segurando-o pelo rosto, aprofundando o toque indefinidamente, sem dar a ele chance para pensar.

A cortina enfim fechou. Os aplausos ecoaram, assim como alguns gritos entusiasmados, e assobios. Ikuto terminou a música, repousando o violino. E Nagihiko nem mesmo pensou em soltar Tadase, prendendo-o em seus braços que tanto ansiaram poder tocá-lo, e finalmente tinham agora seu desejo realizado. Quando a necessidade de oxigênio se fez mais presente do que a necessidade que tinham um do outro, enfim se afastaram. Tadase, com o rosto em chamas, mal podia se erguer. Tinha as pernas bambas, assim como todo o corpo, e ainda sentia sua vista girar. Era uma sorte estar sentado no chão, pois do contrário, desabaria. Olhou ao redor, querendo evitar trocar olhares com Nagihiko, e viu que todo o elenco da peça assistia aos dois. Utau e Yaya tinham ambas cascatas vermelhas descendo pelos seus narizes, e Rima parecia ter o início de uma, enquanto encarava-os sem piscar e com o rosto muito vermelho. Ikuto sorria presunçosamente, abraçado ao violino. Kukai e Kairi pareciam que tinham os queixos para fora do rosto, tamanho seu choque. Os garotinhos anões, então, estavam completamente paralisados, fora de órbita, inclusive Hikaru, que estava, pela primeira vez na vida, em completo e total choque.

Nagihiko então percebeu o que havia feito. Novamente, ele cometera o maior dos erros. Perdeu a noção dos acontecimentos, sua razão se fora pro espaço, e ele se dobrou às suas vontades, explodindo todo e qualquer bom senso que restasse com dinamites ACME. Mais uma vez, ele teria que se afastar de Tadase, por causa da sua incapacidade em controlar seus impulsos, e dessa vez, muito provável, não teria um retorno à amizade que tinham antes.

Só então, recapitulando o acontecimento, ele reparou bem no que tinha acontecido. Foi Tadase quem o beijara primeiro. Ele nada tinha feito para iniciar aquele beijo. Talvez estivesse, realmente, ansiando por isso em segredo, no fundo da sua mente, mas jamais passou pela sua cabeça que Tadase realmente o faria. Seu coração se acelerou com a possibilidade. Para só então, a realidade cair sobre suas esperanças, como uma pesada pedra esmagando um grão de arroz. Tadase não se apaixonaria por ele, em hipótese alguma. Eram ambos garotos! Isso nunca aconteceria.

Todo esse pensamento de Nagihiko durou menos de um segundo. Durante esse tempo, ele se levantou, com dificuldade por causa do vestido, e Tadase fez o mesmo, ainda trêmulo. Nagihiko queria se desculpar, mas não sabia exatamente como fazer. “Desculpe-me por você ter me beijado” não fazia o menor sentido. Enquanto pensava nisso, Tadase, com seu rosto mais vermelho que um farol de trânsito, se afastou. Seu olhar estava estranhamente parado, e ele não sabia como se portar nem o que dizer depois do que tinha feito. Tudo o que queria era fugir para um lugar sozinho, para pensar. Mas não teve tempo de fazê-lo.

Logo Utau surgiu, a primeira a se recuperar, e sorriu animadamente.

— Nós conseguimos! A peça foi um sucesso! Nós temos que agradecer agora! Anda, vamos lá, gente! – ela os conduziu para frente do palco, através da cortina fechada, e todos se colocaram lado a lado, curvando-se para a plateia. Utau estava ao lado de Nagihiko. – Vai dar tudo certo... – ela sussurrou para ele, discretamente, enquanto se curvavam.

A plateia aplaudiu empolgada, de pé e tudo mais, enquanto os atores agradeciam. Ikuto, empolgado, arrancou a barba que tinha pendurada no pescoço, e atirou na plateia. As garotas gritaram, ensandecidas, e se amotinaram para tentar pegá-la. Yamabuki Saaya foi mais rápida, puxando os cabelos das adversárias, e conseguiu fisgá-la.

Assim que terminaram de agradecer, Tadase fugiu pelo lado oposto, sem dar a Nagihiko a chance de procurá-lo. Ele correu para os bastidores e trocou de roupa na velocidade da luz, voltando a vestir o uniforme escolar, e então saiu do teatro, pela saída lateral, sem que ninguém o visse. Tudo o que ele queria agora era um lugar silencioso e vazio, onde pudesse pensar com calma e organizar o turbilhão de pensamentos confusos e emoções bagunçadas que se agitava em seu interior.

Os outros retornaram calmamente para os bastidores, e se separaram nos camarins, trocando de roupa. Nagihiko manteve-se em silêncio esse tempo todo, enquanto despia o vestido e recolocava o uniforme. Ikuto e Kukai falavam alguma coisa, mas ele apenas respondia no automático, sem prestar realmente atenção. Desfez a trança lentamente, observando seu reflexo no espelho. Novamente havia tocado Tadase, e novamente ele fugiu antes que pudesse se explicar. Quantas vezes mais isso teria que acontecer para esse garoto tolo aprender que nada mudaria?

Depois, todos se reuniram novamente no palco. A plateia já estava vazia, e eles combinaram de arrumar tudo no outro dia. Agora, teriam tempo para aproveitar o resto do festival.

— Você vai procurar por ele? – Utau perguntou para Nagihiko, disfarçadamente, enquanto todos discutiam seus planos para o resto da tarde.

— O que? – Nagihiko baixou o olhar, e falou para que apenas Utau escutasse – Eu não acho que deva... se ele fugiu é por que não quer me ver, não é? Acho que as coisas já estão bem confusas entre nós para que eu vá lá e estrague tudo de novo.

— Droga, Nagi! Como que você não consegue enxergar o que eu vejo?!?! Se o Tadase fugiu, e está confuso, é por que ele sente alguma coisa, não é?

— Ele deve estar...

— Pare de fazer suposições e vá já atrás dele!!! Deixa de ser lento, seu baka! – Utau parecia meio irritada com a falta de iniciativa do garoto. Nagihiko pensou por alguns segundos, e assentiu fracamente, ainda hesitante.

— Tudo bem, eu posso... tentar conversar com ele... – Nagihiko deu-se por vencido, admitindo interiormente que era exatamente isso o que queria fazer. Utau sorriu triunfante.

— Então, vamos logo! – Yaya berrou repentinamente – A Yaya quer provar o crepe da barraca do quarto ano! A Yaya tá morrendo de fome! Atuar cansa muito! – ela agarrou o braço de Kukai, que era quem estava mais perto – Vamos lá, Kukai! Você vai pagar a comida da Yaya! – ela anunciou, e então rebocou o garoto para fora do palco, sem dar a ele chance de responder.

— Vamos logo! Eu quero dar mais uma olhada naquela casa do terror – Ikuto pronunciou, bocejando, e então escorou os braços em Rima e Kairi, levando-os consigo. Utau piscou um olho para Nagihiko, e então os seguiu.

Nagihiko respirou fundo, tomando coragem, e então se preparou para sair.

— Ah... Nagihiko-kun... onde estão todos? – uma voz ecoou no salão vazio, quando Nagihiko saia pelo mesmo corredor por onde Tadase deveria ter ido. Ele estancou, olhando para trás. Era Amu. Ela ainda estava com o Chara Nari.

— Já foram, para aproveitar o festival... se você correr, alcança eles. – Nagihiko respondeu, vendo a líder de torcida se aproximar até chegar a ele.

— Você não vai também?

— Não. Tem algo que eu devo fazer... – ele respondeu, começando a andar, e Amu o acompanhou – Você ainda está com o Chara Nari... – ele apontou, mesmo que ela já devesse ter percebido isso por si só.

— Sim, eu sei. Ninguém percebe por que estamos no meio do festival, tem muita gente fantasiada por aí. E essa roupa é mais confortável do que aquele vestido...

— Entendo... – ele pronunciou, relembrando-se superficialmente do interesse de Tadase por líderes de torcida. De alguma maneira, ele desejou que Amu fosse e se trocasse o quanto antes, e se Tadase não a visse, melhor.

— Eu vi a peça. – ela disse de repente – Cheguei aqui na metade. Você foi bem, muito melhor do que eu iria – Amu disse sinceramente, sorrindo logo depois.

— Obrigado. – ele agradeceu, corando ligeiramente, sem que ela percebesse – O Batsu tama, você conseguiu purificar?

— Sim, ele estava correndo para fora da escola, e eu o peguei naquele parque que fica na outra rua... era o ovo do coração do garotinho que fugiu da peça.

— Isso explica tudo – Nagihiko ponderou, enquanto saia pela porta dos bastidores e a trancava, guardando a chave no bolso.

— Etto... Nagihiko-kun... eu sei que você disse que tinha algo a fazer... mas será que você poderia fazer algo por mim? Eu prometo que não vai demorar... – Amu pediu, vacilante, parecendo arrependida.

— Do que você precisa, Amu-chan? – Nagihiko indagou, prestativo e preocupado. Ainda que tivesse motivos de sobra para querer fugir e deixar Amu para trás, ela ainda era, de certa forma, a sua melhor amiga. Ele não conseguia deixar de se preocupar com ela.

— Hmm... eu queria... conversar com a Nadeshiko. Eu sinto muito a falta dela, e precisava muito vê-la novamente... – ela balbuciou, torcendo as mãos nervosamente.

— Mas, eu… - Nagihiko foi pego de surpresa – Eu não posso levá-la até onde ela está... eu quero dizer... eu não sei se seria possível ligar para ela agora, então…

— Não... eu sei que ela está se esforçando na sua dança, eu não quero atrapalhá-la... sem falar no fuso horário, eu não faço ideia de que horas são na Europa agora. Mas, quando eu o vi no palco, como princesa, eu pensei que... talvez, você poderia... imitar a Nadeshiko de novo, como você fez daquela vez?

Nagihiko ficou um pouco sem reação diante daquele pedido, mas, em nome da sua amizade com Amu, e por que ela fazia aquela cara tão sofrida e suplicante, ele não teve como negar. Pegou uma das fitas que amarrara as tranças do dia anterior, e fez um alto rabo de cavalo, rápida e habilidosamente, e quando abriu os olhos novamente, Amu viu refletido neles a gentileza e refinamento de sua amiga, e era como se ela estivesse ali outra vez, o que era de fato, verdade.

— Qual o problema, Amu-chan? – ele indagou, usando pela segunda vez naquele dia a sua voz feminina.

— Nadeshiko! – Amu se empolgou, e sorrindo, rodeou os braços na ‘garota’ – Eu senti tanto a sua falta! Precisava muito conversar com você...

— Está tudo bem! Vamos lá, me diga o que houve – Nadeshiko disse, sorrindo calmamente, e tomando lugar no degrau de acesso à porta, com Amu a acompanhando.

— Você já deve saber que eu... finalmente tomei coragem e me confessei para o Tadase-kun. Eu... cometi um grande erro... ele não correspondia aos meus sentimentos, e eu fui rejeitada… – ela dizia, enquanto lágrimas brilhantes se juntavam na borda dos seus olhos – Eu fui uma covarde, esse tempo todo. Estou fugindo dele tanto quanto posso, e até mesmo usei a desculpa de ir caçar o batsu tama hoje para não ter que atuar com ele na peça... o que eu faço, Nadeshiko? Eu não tenho nenhuma chance de conquistá-lo, e mesmo assim, nada faz ele sair da minha cabeça! Isso dói tanto... eu não quero mais sentir isso...

— Amu-chan... esses assuntos de amor são mesmo muito complicados... e existem casos ainda mais difíceis do que o seu, você nem acreditaria. Eu admiro muito a sua coragem de se declarar abertamente, assumindo o risco de ser recusada, não tem ideia do quanto. Eu sei que isso pode ser muito doloroso, mas muito mais doloroso do que isso é ter que guardar tudo dentro de si, sozinha. Você foi corajosa, e fez o que estava ao seu alcance, Amu-chan, não deve ter vergonha disso. Se o Hotori-kun não é capaz de retribuí-la à altura... bem, quem sai perdendo não é ele? Você foi sincera com seus sentimentos, e isso é admirável. Eu sei que você é forte, e vai superar isso...

— O Iinchou disse o mesmo naquele dia, no aniversário do Tadase-kun... – Amu enxugou uma lágrima teimosa que vazava, se esforçando para não parecer tão depressiva.

— E ele tem razão. Não se deixe abater, Amu-chan, não é o fim do mundo. Eu sei que está doendo ainda, mas você vai superar! Você só tem que decidir o que quer fazer agora. Superar o que aconteceu ou… tentar de novo? Você ainda quer ficar com o Hotori-kun, Amu-chan? – Nagihiko perguntou, e mesmo que sua voz estivesse calma e indecifrável, algo se agitou em seu interior, muito pesado e desagradável.

— Você acha que eu devo, Nadeshiko?

— Eu não sei. Se o que você sente ainda é forte o suficiente para fazê-la querer que Hotori-kun a ame de volta, então eu acho que você deve tentar sim. – ele disse, mesmo que isso o fizesse sentir mal, o que pensava sinceramente – Agora… se você já não tem forças para prosseguir nesse amor…

— Eu acho que devo desistir… não tenho mesmo chances – Amu deixou as lágrimas caírem livremente, descendo sobre seu rosto, e então abraçou as próprias pernas – Eu penso que… ele já tem alguém que ama. Na verdade, eu tenho certeza disso...

Nagihiko deixou escapar um arquejar de surpresa, mas não conseguiu pensar em nada para dizer. Se fosse mesmo verdade... bem, não havia nada que ele pudesse fazer, e inevitavelmente, compreendia que esse dia chegaria. Mas ele sabia que Amu estava errada, afinal, Nagihiko seria o primeiro que Tadase procuraria no caso de estar apaixonado por alguma garota, assim como ele fez quando pensava estar por Amu.

— Está tudo bem, Amu-chan – Nadeshiko disse suavemente, passando a mão pelos cabelos de Amu, por cima da viseira transparente e da presilha de coração vermelha – Você é uma garota realmente bonita, eu tenho certeza de que há vários garotos por aí que se apaixonariam por você... o Sanjou-kun, inclusive. – ela disse, sorrindo, e vendo Amu corar mais do que imediatamente.

— E-ele... ele se d-declarou p-para mim... n-naquele dia... – ela balbuciou, com dificuldade, secando as lágrimas das bochechas e escondendo o rosto vermelho.

— E o que você disse?

— Eu ainda não o respondi... – ela admitiu, encolhendo-se nas pernas. – Mas estava pensando que, talvez... eu devesse tentar.

— Então... por que não faz isso? – Nadeshiko sorriu docemente, e Amu sorriu fracamente de volta.

— Você acha que eu posso?

— Eu acho que você deve fazer o que puder para ser feliz, Amu-chan!

— Ah, Obrigada, Nadeshiko! – a cheerleader saltou sobre Nagihiko, apertando-o em um grato abraço – Obrigada a você também, Nagihiko. – ela sussurrou por fim, timidamente, soltando o garoto e levantando de pé.

— Você vai ficar assim, com essas roupas? – Nagihiko indagou, voltando ao tom de voz normal, e soltando os cabelos.

— É mesmo! O que eu faço? Minhas roupas estão lá dentro! – ela se agitou, aflita.

— Aqui, a chave – Nagihiko entregou a ela o chaveiro que estava em seu bolso – Você pode se trocar lá dentro, e depois, entregar ela para o Tsukasa-san.

— Obrigada, Nagihiko! – Amu entoou alegremente, mostrando um sorriso que não era visto desde o aniversário de Tadase, e subiu os degraus até a porta – Desculpe tomar o seu tempo. Espero que ainda possa fazer aquilo que queria...

— Sim, eu acho que dará tempo... – Nagihiko disse rapidamente, lembrando-se de que não tinha a menor ideia de onde Tadase havia se metido, para falar com ele. Tolamente, ele começou a olhar ao redor, mesmo que o fundo do teatro estivesse completamente vazio, esperando encontrar os curtos cabelos loiros a qualquer momento.

— Boa sorte, Nagihiko – Amu disse, e sem esperar, adentrou o teatro novamente e fechou a porta. Nagihiko não se demorou, e começou a andar sem rumo certo, até chegar ao pátio principal, onde estavam os estandes principais, e muitas pessoas indo e vindo.

A tarde estava alta, e o sol brilhava intensamente. As pessoas, tanto os alunos quanto os visitantes, pareciam alegres, conversando, rindo e comendo, as crianças corriam e brincavam. Nagihiko até mesmo viu o garotinho que deveria ter sido o anão, correr alegremente com seus amigos. Tudo estava bem. Mas o valete não viu nem sinal de Tadase em lugar algum por onde andou, e imaginou se ele não teria ido para casa. Essa alternativa logo foi descartada, afinal, Tadase era alguém responsável, que colocava suas obrigações acima de tudo, e não sairia da escola fora de hora em hipótese alguma.

Nagihiko vagou pelo pátio, e sem nenhum resultado, entrou no prédio principal, espiando cada sala. Viu Yaya, com Kukai, no restaurante de uma das turmas. Ela estava dando um grande desfalque com doces, e fazia muito escândalo, chamando a atenção, mas o ex-valete não parecia se importar. Na saída da casa do terror, ele viu Ikuto, com Utau pendurada em um braço, muito pálida e assustada e Rima, que não demonstrava nada, mas parecia bem abalada, segurando na ponta do seu casaco com os dedos trêmulos. Mais atrás, Kairi parecia impassível, mas um bom observador notaria o quanto ele estava branco, com os óculos tortos e os olhos sem brilho. Ikuto era o único que parecia perfeitamente satisfeito com essa atmosfera, e se preparava para entrar na sala do lado que continha previsões do futuro.

O valete continuou a caminhar e procurar, mas não conseguiu encontrar nem mesmo pistas de onde Tadase estava. Perguntou a todos que encontrava, mas ninguém sabia dizer a ele. Se ele tivesse prestado mais atenção, enquanto procurava pelo terceiro andar, teria reparado em uma parte da parede que era sutilmente diferente do resto, como se tivesse uma mínima e quase invisível elevação. Mais precisamente, era uma das muitas passagens secretas da escola Seiyo, e não tinha como Nagihiko saber sobre sua existência, ou mesmo reparar naquele local tão discreto e despercebido. No entanto, era naquele lugar que Tadase se escondia, já fazia algum tempo.

Ele estava encolhido dentro das paredes da escola, em um tipo de compartimento de fuga, que se fosse percorrido, levaria até a sala do diretor, mas ele não foi até lá. Permaneceu logo na entrada, abraçado aos joelhos e com o rosto enterrado, tentando limpar a mente. O que era relativamente inconcebível, considerando que Nagihiko não saia dela de maneira alguma.

O gosto dos lábios dele ainda estava impregnado em Tadase, e sempre que ele fechava os olhos, revivia a incrível sensação de tê-lo beijado novamente. Dessa vez, foi muito mais memorável – e aprazível, para Tadase. Talvez por que ele soubesse o que fazer quando Nagihiko invadiu sua boca, como já haviam feito antes. Ou então, simplesmente, por que ele desejara fazer isso por si só, esperando e tocando os lábios do desacordado Nagihiko agindo por vontade própria. Não importando o motivo, era fato que Tadase gostou de ter beijado Nagihiko, e com muito constrangimento, ele admitira para si mesmo que não se importaria, ou melhor, gostaria muito, de fazê-lo outra vez. E muitas outras depois dessa, provavelmente.

Esses pensamentos indecorosos e confusos, todos ao mesmo tempo, deixavam o pequeno Tadase atormentado. Aflito, ele não sabia o que estava acontecendo consigo mesmo, e por mais que repasse milhões de vezes o acontecimento em sua cabeça, ele ainda não fazia o menor sentido. Levou o dedo aos lábios, sentindo seu coração dar um salto doloroso ao sentir novamente o calor e o toque dele. Abriu os olhos, assustado. Como isso era possível?

— O que está fazendo aqui, Hotori-kun? – ele ouviu uma voz masculina ecoando no espaço escuro e vazio, e sobressaltou.

— T-tsukasa-san... e-eu... eu só estava... – ele se levantou, acanhado, sem nada que pudesse dizer passando pela sua cabeça. Nela só havia espaço para Nagihiko, agora.

— Fugindo – Tsukasa completou, sorrindo – Já pedi que não fosse assim tão formal comigo quando estivermos a sós, meu sobrinho. No entanto, acho que nesse momento... tem alguém que precisa de uma bebida quente e uma conversa, o que acha?

— T-tudo bem... – Tadase concordou, virando-se para sair pelo lugar que entrou.

— Não seja bobo, Tadase – Tsukasa o apoiou pelos ombros, conduzindo-o pelo lado oposto – Por aqui.

Os dois seguiram pelo corredor estreito e com pouca iluminação, que era adornado por insígnias de madeira com o emblema de lua e estrela da escola, até chegar a uma passagem já aberta do outro lado, que revelava o que seria o escritório de Tsukasa, bem iluminado pelo Sol da tarde, que já parecia mais baixo do que estava quando Tadase chegou ao seu esconderijo. Quanto tempo teria se passado desde então?

Tsukasa tomou a dianteira, servindo café em uma caneca branca toda decorada com gatinhos laranja, e estendeu à Tadase, que encheu de açúcar, tanto que o gosto do café deve ter ficado irreconhecível.

— Então, diga-me, Tadase – Tsukasa sentou em sua cadeira giratória do outro lado da mesa, e o loiro acomodou-se na poltrona a sua frente – O que está afligindo o meu sobrinho preferido e mais querido?

— E único, não é? – Tadase riu da velha piada, mas sem humor nenhum. Tsukasa o fitou, atento e observador, e esperou que começasse a falar – Bem... eu não sei o que dizer... estou confuso.

— Se você não sabe o que te preocupa, como pode querer fugir? Não faz sentido. Você só pode ter medo daquilo que conhece, o medo do desconhecido não é medo, é covardia. Então... o que é que te deixa confuso?

— Ah... eu... eu... q-quero d-dizer... ah... tem a-aquilo d-de.. b-bem...

— Tadase... eu não posso ajudá-lo se você não me disser nada. Você sabe que pode se abrir para mim, e eu não vou julgá-lo nem rir de você. E também, não contarei à sua mãe – ele piscou – Pode me dizer tudo o que pesa em se coração, sabe disso.

— Tudo bem... me desculpe, tio... eu só... – Tadase baixou o olhar, tomando um pequeno gole do café doce. O liquido quente, de alguma forma, o deixou mais confortável. Ele enterrou o corpo na poltrona cômoda, e fechou os olhos – Isso é um pouco constrangedor, e é difícil de falar em voz alta, por isso... e-eu não serei capaz de explicar o que está acontecendo, quando nem mesmo eu sei do que se trata, então... o que acontece é que... t-tem uma pessoa... alguém que eu conheço há muito, muito tempo... mas ultimamente... algumas coisas estranhas vem acontecendo, e eu já não sei mais como me portar quando estou perto dele, e sinto coisas esquisitas quanto ele está perto... e hoje... eu fiz algo muito errado com ele...

— Você pode ser mais claro, Tadase? Diga-me, exatamente, o que foi que aconteceu – Tsukasa disse, incentivando o sobrinho a continuar.

— B-bem... devido a certas circunstâncias... e-eu b-beijei... essa pessoa... – Tadase gaguejou, com muita dificuldade, dando mais uma sorvida no café quente para ser acalmar. Seu rosto estava em chamas, quando ele disse isso, e Tsukasa sorriu, imaginando quando foi precisamente o momento em que o seu pequeno Tadase cresceu tanto, a ponto de já estar fazendo essas coisas.

— Acho que sei do que se trata... – Tsukasa riu – Eu assisti a sua peça, e vi o que você fez. Você beijou a Nadeshiko-san, por que ela era a Princesa e você o Rei. Não é isso?

— S-sim, mas... eu não deveria necessariamente ter... tocado os seus lábios... eu fiz isso por que... por que eu quis... – Tadase admitiu, corado, sentindo-se o mais indecente de todos.

— E por que você quis fazer isso? – Tsukasa impulsionou, sentindo que Tadase estava perto de chegar a uma conclusão sozinho.

— Eu fiz por que, bem... por que tive vontade. Muita, muita vontade. Nem consegui pensar direito… eu só… fiz… - Tadase dizia lentamente, fitando o líquido escuro em sua caneca.

— Essa é a primeira vez que acontece? – Tsukasa indagou, escorando o rosto nos braços sobre a mesa, cruzando os dedos. Tadase atingiu o tom escarlate, e quase era possível ver a fumaça saindo das suas orelhas. Ele abriu a boca para falar algo, mas nada saia, e ele ficou apenas vacilando o olhar entre a caneca, a mesa de Tsukasa e a parede ao lado. Tsukasa não precisou de resposta dessa vez – Tadase... você pode fazer uma breve... descrição... do que sente nesses momentos que você classificou como sendo “estranhos”?

— D-descrever...? Eu não sei dizer com precisão... bem... ás vezes eu sinto como se me faltasse o ar, e em outras, um aperto doloroso no peito, minhas mãos suam e eu não consigo raciocinar direito... meu coração bate tão alto que eu mal consigo ouvir meus pensamentos... quando ele me... toca... eu fico tão trêmulo... que nem consigo me mexer...

— E isso é ruim?

— De maneira nenhuma! – Tadase se apressou em dizer, recuando, timidamente, logo depois – É... sempre bom...

— E... o que mais? Você consegue comparar isso com algo que conheça?

— Não, não posso comparar com nada. Antes eu achava que eram os meus sentimentos de amizade, de tantos anos, mas agora parece que apenas amizade já não é o suficiente para descrever tudo isso... – Tadase tentava ser sucinto, mas as palavras certas fugiam da sua compreensão – Parece mais como... eu não sei... é tão grande! Eu quero... cuidar dele, e ter ele perto de mim... e a ideia de que ele se afastará um dia é angustiante demais, só de pensar – Tadase dizia, com o rosto corado, mas muito obstinado em tentar entender o que se passava em seu coração. À medida que ia colocando seus pensamentos em palavras, parecia que ficava mais claro e fácil de explicar. Estava tão concentrado que nem mesmo percebeu que falava de pé, na frente da mesa e de Tsukasa, que apenas o fitava com um sorriso enigmático – É um sentimento egoísta da minha parte, sei disso... eu quero que ele esteja sempre comigo, e não olhe para mais ninguém... E-eu... me sinto bem só com sua presença, no entanto, apenas isso nunca parece o suficiente. Não parece simplesmente com o que se entende por amizade... parece algo mais... é como se... – ele gesticulava, deixando a xícara de café de lado, e seu rosto se iluminou com a proximidade do raciocínio. Quanto mais falava, mais perto de uma conclusão ele se sentia – Como se... é como descrevem o sentimento de a-amor... é como se... eu estivesse... apaixonado... pelo Fujisaki-kun... – ele disse por fim, pausadamente, tomando cuidado com cada sílaba. Seus os olhos estavam arregalados e incrédulos com as palavras que pronunciou. Ele sentiu-se trêmulo e vazio, com a mente em branco, e essas palavras ecoando em sua mente, colocando-se em ordem e fazendo sentido, pela primeira vez. Olhou para Tsukasa, com o rosto pálido e em choque.

— Então... é isso? – Ele apenas alargou seu sorriso, contente por Tadase ter chegado sozinho a esse raciocínio.

— E-eu acho que... – Tadase voltou a sentar, em câmera lenta e ainda processando a informação – Então é por isso que eu sempre... eu sempre q-quero... t-t-t-tocá-lo e b-b-b-beijá-lo? Eu... e-e-eu estou... e-eu s-sou... m-mas...

— Você queria fazer essas coisas e ainda tinha dúvidas sobre o que sentia? – Tsukasa inquiriu, surpreso com a tolice do sobrinho – O que você pensou que era?

— Eu achei que eu p-pudesse ser algum tipo de... p-pervertido... – ele sussurrou inaudivelmente, escondendo o rosto constrangido. Tsukasa riu alto, e Tadase se encolheu ainda mais.

— Certo... agora você já sabe. Está apaixonado pelo Fujisaki-kun. Estou certo?

— A-acho que s-s-sim... – Tadase balbuciou, torcendo as mãos nervosamente no colo, e fechando os olhos com força. Seu rosto parecia um tomate maduro, e estava tão quente que poderia evaporar. Aquela ideia tão repentina e absurda, estar apaixonado pelo seu melhor amigo, ecoava em altos brados na sua mente, deixando-o atordoado. Apaixonado...? Que tipo de sentimento é esse? É diferente do que ele achava que sentia por Amu, muito diferente. E, no entanto, parecia tão coerente e razoável que dava a impressão de que tudo se ajeitava, desde sempre, para que fosse assim. – Q-quero dizer... é r-realmente p-p-possível que.. que... n-nós s-somos dois g-g-g-garotos... n-não há nada de e-errado... c-c-com isso....?

— O que você acha? Os sentimentos que você sempre possuiu por Fujisaki-kun, parecem errados para você? Não há nada de errado em amar, Tadase, sendo um garoto ou uma garota. Você ouviu o que você mesmo disse há pouco? Você quer cuidar dele, e quer tê-lo por perto. Isso é lindo. Não há nada de censurável em um sentimento tão puro e genuíno. Não deixe que as pessoas de mente fechada falem essas coisas sobre aquilo que você cultiva há tanto tempo, e com tanto cuidado.

— O-obrigado.. tio... Eu acho que... você está certo. – Tadase assentiu, convicto.

— Tadase, tem algo importante que eu preciso saber antes de continuar. Você pode me responder sinceramente? – ele perguntou, adquirindo um ar taciturno de repente.

— S-sim.

— Você sabe muito bem do segredo do Fujisaki-kun, melhor do que ninguém. Você tem conhecimento da dupla identidade que ele carrega, por isso eu gostaria de saber... o que você pensa disso?

— Como assim? Fujisaki-kun é Fujisaki-kun. O que há para pensar sobre isso? – Tadase inquiriu de volta, confuso.

— Você é capaz de separar o lado Nadeshiko e o lado Nagihiko, e, ao mesmo tempo, ter em mente de que se trata da mesma pessoa? Você é capaz de amar Fujisaki por inteiro, Tadase?

— Por que você pergunta isso, tio?

— Eu apenas tive uma suposição de que... talvez você tivesse se encantado apenas pelo lado feminino do Fujisaki, e como ele estava vestido como uma princesa quando você... bem, apenas me responda. Você é capaz?

— Esse tempo todo... eu sempre fui capaz de tratar Fujisaki Nadeshiko e Fujisaki Nagihiko como pessoas distintas – ele disse firmemente, embora sua voz tenha falhado um pouco ao dizer o nome da ex-rainha e do valete de modo tão repentino – e, nunca deixei de lado o fato de que se tratavam da mesma pessoa. Eu não me esqueci disso. Os... sentimentos confusos que eu venho tendo... aparecem para os dois... – ele baixou a voz, e Tsukasa riu – Embora... embora eu possa perceber que... talvez... prefira um pouco mais... o seu lado masculino... – ele encerrou, corando furiosamente e com a voz embargada.

Tsukasa levantou, e rodeou a mesa. Tadase ergueu-se também, sentindo-se pequeno e vulnerável nesse momento. Suas mãos estavam frias como gelo, e ainda tremiam de nervosismo. O homem repousou a mão com confiança no ombro do garoto, e ele ergueu os olhos brilhantes, tomados de receio, dúvida e afeição.

— Eu estou orgulhoso de você, Tadase. Mesmo que tenha sido tardiamente... você foi capaz de perceber o que sentia, e de se orgulhar por isso. Mas não é de todo tarde demais. Você deve pensar cuidadosamente no que quer fazer a partir disso. Existem muitos caminhos a seguir, mas você deve escolher por si mesmo, sem a minha interferência, ou de qualquer outra pessoa. Também haverá muitos obstáculos para você, assim que tomar sua decisão. Mas eu sei que você é forte e saberá distinguir o que trará a felicidade a você. Apenas... siga o seu coração, e não o pensamentos dos outros. Eu sei que você será feliz assim.

— Obrigado, Tsukasa-san. – ele sorriu brilhantemente para o tio, e foi retribuído com igual intensidade – Eu irei... ponderar com cuidado no que fazer a partir de agora.

— Eu sei que vai. – ele abraçou o sobrinho rapidamente, e logo depois, Tadase tomou o caminho da saída, com um semblante pensativo e ainda tímido. Tsukasa o viu se afastar, fechando a porta logo a seguir, e se virou para o lado da janela, onde todos os integrantes da escola se reuniam no pátio para acender a enorme fogueira que marcaria o final do Festival Cultural. O céu, iluminado em tons de vermelho, escondia o sol poente, e gradativamente se tornava mais escuro. O diretor da Escola Seiyo suspirou, vendo toda a explosão de juventude aos seus pés. – Eles crescem tão rápido...







Tão logo saiu do escritório de Tsukasa, Tadase correu para as escadas, descendo os lances depressa, tão agitado por fora quanto por dentro. Estava já perto da porta de saída do primeiro andar, quando topou com Yaya e Kukai, que se dirigiam para o pátio externo.

— Tadase! Onde foi que você se meteu, garoto? A Utau passou agorinha há pouco procurando por você! Está quase na hora da fogueira lá fora, e ela...

— Eu estava com o Tsukasa-san – ele explicou rapidamente, um pouco ofegante pela corrida. Seu rosto brilhava, ainda corado, e a ás, ainda que muito sutilmente, notou que havia algo diferente no seu olhar.

— Vamos logo lá para fora, eu não quero perder nada! – Kuki bradou, andando na frente, e os dois menores o seguiram.

Chegando ao pátio da escola, eles foram saudados pela luz flamejante da fogueira, que se alastrava à altura dos olhos. Tadase admirou a luz fulgurosa, iluminando a noite que acabara de se instalar. O horizonte ainda era vermelho, mas se esvaia gradualmente, e em breve estaria completamente tomado pela escuridão e pelas estrelas. A lua, tímida atrás das nuvens, já começava a surgir, do lado oposto.

Tadase seguiu com os olhos Yaya, que pulava logo à frente seguida de perto por Kukai, e parou logo a frente de alguém, que também observava a fogueira, com as mãos no bolso. Seu coração descontinuou, assustado, saltando apressadamente logo depois, e ele sentiu algo como um nó na garganta ao ver Nagihiko, de costas para ele, iluminado pelo fogo, conversando com a animada ás. Ele tinha sido muito tolo por não ter percebido tão logo. Como poderia confundir essa invasão de sensações tão evidentes com qualquer outra coisa?

Nagihiko falou qualquer coisa com a garota, e logo depois seus olhos se voltaram para trás, na direção de Tadase. Ele sentiu seu corpo todo vacilar, reagindo a isso. Trêmulo, ele mal conseguia dar um passo, e seu coração era tão eloquente que se alguém chegasse a um metro de distância, já poderia ouvi-lo. Depois da breve troca de olhares, em que Tadase nem mesmo ousou respirar, muito menos desviar, o valete se dirigiu até ele. O loiro sentiu-se paralisado, à medida que o via se aproximar. Com a recente descoberta que havia feito, parecia que estava muito mais sensível às ações do garoto. Finalmente, Nagihiko chegou à frente dele, colocando-se afastado, ainda um pouco receoso.

— Então... eu o procurei por todos os lados depois da peça... pensei que pudesse estar com fome depois de tudo, então iria comprar comida com você, mas não o encontrei e ninguém sabia onde você estava. A Utau queria até colocar um recado nos autofalantes, para achá-lo – Nagihiko disse primeiro, um pouco sem graça e atropelando as informações. Quando Tadase sorriu, suave e gentil como sempre, um grande alívio tomou conta do seu ser. Pelo menos, ele não estava bravo com o que tinha acontecido.

— F-fujisaki-kun... e-eu... – Tadase começou a articular, e sentiu seu coração martelando contra sua cabeça, violentamente. De repente ele já não sabia se queria falar para Nagihiko o que tinha descoberto. No fundo da sua mente, o medo da rejeição começou a crescer, e antes que percebesse, lágrimas se formaram no canto dos seus olhos.

— Hotori-kun, você está bem? – Nagihiko indagou, transbordando preocupação. Tadase apenas acenou afirmativamente, incapaz de dizer qualquer coisa, pois se falasse, elas desceriam, e seria muito mais complicado explica-las do que qualquer outra coisa.

— Ah, aí estão vocês! Procurei por toda a parte!! – Utau surgiu das sombras, entre os dois garotos, segurando a ambos pelo ombro e os trazendo para mais perto um do outro. – Está na hora da Dança Folclórica! E só falta vocês dois acharem um par!

— C-como assim? – Tadase olhou ao redor, e viu que todos os alunos ao redor fixavam o olhar nos dois guardiões.

— Você não sabia? Tem uma tradição de que os guardiões iniciam a dança folclórica, a Yaya me falou, e só estavam esperando por você.

— Tradição? Eu nunca ouvi falar disso – Tadase observou, hesitante.

— Eu acho que o Tsukasa-san disse algo sobre isso quando anunciou o Festival desse ano, Hotori-kun... – Nagihiko não pode concordar com o Rei dessa vez, e sorriu sem graça ao vê-lo corar envergonhado por não ter prestado atenção.

— Bem, o que estão esperando! Vão já para lá! – Utau empurrou os dois na direção da fogueira, que crepitava alta e iluminando os rostos alegres e cheios de expectativas de todos.

Como havia sido informado, os guardiões começaram a arrumar pares para iniciar a dança o quanto antes. As alunas mais agitadas esperavam ansiosamente serem escolhidas, enquanto outros faziam apostas sobre qual seriam as escolhas. Yaya, mais do que imediatamente, já havia capturado Kukai, que estava ao seu lado, o que sugeria sutilmente que eles poderiam ter combinado antes. Amu, que finalmente retornara nessa hora, decidiu agir e, de modo muito tímido, convidou Kairi para dançar com ela, e ele aceitou prontamente, parecendo muito surpreso, e ao mesmo tempo, feliz. Rima ficou um pouco perdida, e considerou rapidamente convidar Nagihiko, mas ao vê-lo ainda perto de Tadase, mudou de ideia. No meio tempo em que ela decidia se ia ou não chamar um de seus escravos para a dura tarefa, foi enlaçada por Ikuto, que praticamente a carregava no colo, e com a desculpa dele de querer participar ativamente de um festival. Ainda restava a dúvida de por que ele não fazia isso em sua própria escola, ao invés de invadir escolas alheias. Tadase viu que todos se arranjaram, e fitou de soslaio Nagihiko, que olhava ansiosamente para a fogueira.

— Etto... F-fujisaki-kun... você deveria ir logo achar um par, a dança logo irá começar... – ele disse com voz fraca, relutante e nervoso.

— Não há nenhuma garota com quem eu queira dançar, Hotori-kun... – ele respondeu sinceramente, olhando para o chão - E você? Vai chamar quem? – ele perguntou, preocupado, sentindo-se patético. Estavam ambos atrasando o início da comemoração, mas quem se importa?

— Eu não queria dançar... Eu não sei... como se faz para dançar. – Ele confessou, segurando ambas as mãos uma na outra.

— Não é difícil, Hotori-kun... – Nagihiko explicou docemente, olhando fixo para o fogo – Você só tem que segurar a mão da outra pessoa, e olhar nos olhos dela... e então rodopiar e rodopiar até se cansar...

— Eu não esperava por uma explicação tão simples de um profissional... – Tadase ponderou, sentindo-se agitado com aquela imagem. Repentinamente algo passou pela sua cabeça, e ele arquejou em choque. Incapaz de se conter, ele acabou agindo por impulso, e antes que se impedisse, as palavras apenas tiveram vontade própria e se colocaram em seus lábios – Será que... será q-q-que n-nós p-p-p-podemos... ir... j-juntos?

— Juntos? – Nagihiko quase saltou para trás, de susto. Sua mente girou, em milhões de hipóteses destorcidas, algumas muito mais agradáveis do que deveriam. Tadase o encarou com os orbes escarlates, suplicantes, parecendo que iria quase chorar de novo.

— E-eu... e-eu n-não conseguiria ir com mais n-ninguém... t-tenho medo de errar e... e... com v-você, F-fujisaki-kun, e-eu me s-sinto seguro... – ele enfim pronunciou, com muita dificuldade, e a cabeça prestes a explodir de tanta vergonha e ansiedade.

Nagihiko sorriu, diante da insegurança do garoto. Então era apenas isso. Ele estava com medo de dançar mal. E o que mais seria? Sinceramente... a mente de Nagihiko deveria parar de ser tão masoquista e inventar suposições absurdas, por que quando a realidade retornava, era sempre muito mais dolorosa.

O valete estendeu a mão para o pequeno loiro, num ato que não necessitava de palavras. As garotas da escola arquejaram assombradas ao notar o ínfimo gesto, e Utau, no meio delas, preparou a sua filmadora.

— Não vai haver problema nenhum, Hotori-kun. Nós somos guardiões, afinal, e seu tio é o diretor da escola... enfim, não estamos quebrando nenhuma regra, pois não há nenhuma que impeça dois garotos de dançarem no festival. Ainda mais quando um deles nem sempre é um garoto. – acrescentou em tom baixo, piscando um olho para o pequeno Rei, que corou furiosamente, antes de enfim, colocar seus dedos, um de cada vez, na mão que lhe era oferecida.

Tadase sentiu um enorme bem estar, ao enfim segurar a mão do valete. Sentiu-o acariciar sua pele, segurando firme os seus dedos, e conduzindo seu braço para o lado. A outra mão segurou a que estava livre, delicadamente, e juntos, eles foram para o centro da roda que se formava para observá-los. A música começou a tocar, suave e conhecida, e os cinco pares de guardiões começaram a rodopiar ao redor da fogueira, que lançava suas cinzas para o alto, parecendo pequenas estrelas que se desprendiam do céu.

A luminosidade tocou o rosto de Tadase e ele sorriu, levantando os olhos carmim que refletiam a luz avermelhada numa harmonia perfeita. Nagihiko poderia jurar que nunca vira nada mais lindo na vida, e tentou a todo custo gravar aquela imagem permanentemente em sua memória. Tadase também admirou o lindo rosto de Nagihiko, tocado pelas chamas, e sentiu seu coração batendo agitado e descontrolado, ao mesmo tempo em que se apertava dolorosamente contra as costelas. Não pode deixar de sorrir. Agora, nos braços de Nagihiko, ele se sentia completo. Não importava se fosse um sentimento platônico. Ele só queria poder ficar assim por mais alguns instantes.

Os dois giraram, sem nem mesmo ouvir o ritmo da música. Nagihiko conduzia Tadase maravilhosamente bem, com seus passos leves que nem mesmo faziam ruídos, e sendo acompanhado pelo menor, ainda que desajeitadamente. Os alunos não podiam deixar de observá-los, admirados. Cada passo de Nagihiko era como uma obra de arte, e ninguém nunca o vira dançar com tanta desenvoltura e alegria no olhar. Seus movimentos fluíam com naturalidade, enquanto ele era seguido por Tadase, que parecia hipnotizado pelo valete, e o fitava com assombro e admiração, com o rosto ainda corado.

Momentos depois, a música se agitou. Era a hora de todos se juntarem à dança, e os pares se desfizeram, unindo-se ao restante dos estudantes em dois grandes círculos ao redor da fogueira. Giraram alegremente, cada um sentindo-se como parte de um todo.

Era o fim do Festival Cultural, algo que muitos podem julgar como sendo corriqueiro, ou normal. Mas, de diferentes formas, em momentos distintos e intensidades variadas, alguns mais evidentes que outros, aquele evento havia transformado profundamente a todos. E em especial, aos queridos guardiões.

Diversos sentimentos foram compostos, expressando-se em cada olhar, cada movimento, cada respiração. E sempre que davam risada, por algum motivo, sentiam seus corações pesarem um pouco. Mas quando aquela noite acabasse, certamente... provavelmente... tudo ficaria bem.







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Notas finais do capítulo

Etto... owari desu~ o/
Acabou-se o festival, o próximo é com a Senpai *u* Estou ansiosa para saber como ela vai continuar agora hohohohohoohohohoh
Estou muuuuuuuuuuuuito ansiosa para saber o que vocês acharam do capítulo, viu?! Não deixem de escrever um reviewzinho, não dói nada, onegai *u*
Vou ficar aguardando ansiosamente!!
Ja nee~