Yakusoku escrita por teffy-chan, Shiroyuki


Capítulo 18
Capítulo 18 - Silky Heart


Notas iniciais do capítulo

Silky Heart - Horie Yui
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Fevereiro iniciou ainda gelado, preguiçosamente se desdobrando sobre o janeiro chuvoso que se despedia. O volume de neve já não era o bastante para cobrir as ruas como havia sido antes, apenas alguns flocos perdidos caíam espaçadamente por curtos períodos de tempo. O clima de inverno estava cada vez mais ameno, dando pouco a pouco lugar à primavera que não tardaria a chegar. O último período escolar estava se encerrando, e logo os estudantes da Seiyo Elementary School começariam em uma nova série.

Porém, muito mais do que frio ou o novo período, havia outra coisa muito mais relevante que fevereiro trazia consigo. Era visível o quanto a proximidade daquele dia atingia aos jovens alunos. Cada um a sua maneira, estavam todos ansiosos pelo Valentine’s Day, o dia dos namorados. As garotas estavam todas em polvorosa, agitadas com as compras e preparativos, expondo todos os seus sentimentos enquanto faziam o chocolate. Os garotos, embora fingissem estar indiferentes, esperavam secretamente pelos chocolates e cartões.

E, como todos os jovens, entre os guardiões não era diferente.





Nagihiko caminhava apressadamente pelas ruas cheias, com alguns pacotes nas mãos. Sua mãe o mandara ir buscar os obi que encomendara para os kimonos de dança, e ele foi, mesmo sendo domingo. Agora voltava para casa, com aquelas finas peças de arte empacotadas nas mãos, encobertas pelas cálidas luvas roxas que o aqueciam tão bem.

Algumas semanas haviam se passado desde que Nadeshiko havia ido até a residência dos Hotori, e colocara Tadase contra a parede, pressionando-o para que a contasse a verdade sobre as suas intenções durante aquele ataque infundado. Ainda que hesitante, Nagihiko podia perceber que o Chara Change de Rythm com Nadeshiko havia dado alguns resultados, apesar de não ter sido por métodos comuns. E ele retornara sem muitas respostas conclusivas, embora Tadase tivesse garantido que iria procurá-lo assim que tivesse organizado seus pensamentos. Ele não esperava que fosse tão cedo de toda forma, resolveu deixar esse assunto de lado, e por isso, as coisas entre os dois amigos tivesse se acalmado depois do incidente. Durante esse tempo, nenhum dos dois ousou tocar no assunto novamente, e a relação deles voltou a um nível que podia ser considerado normal, ou quase isso. Desde então, de forma inconsciente, ambos passaram a evitar ficar sozinhos em ambientes fechados por muito tempo.


Ao redor, Nagihiko notara que havia muitas jovens garotas, a maioria andando em bando, caminhando de um lado para o outro entre as lojas do distrito comercial. Elas tinham um tipo de expectativa no olhar, o rosto corado e passos apertados, que fizeram o valete se intrigar. Foi então que ele passou em frente a uma loja de doces, e notou o grande cartaz vermelho com desenhos de corações.

Ah, era isso! Sorriu fracamente, ao perceber que dia era hoje. 13 de fevereiro.

Em anos anteriores, como Nadeshiko, ele estaria às voltas com preparativos de chocolates obrigatórios para todos os seus amigos. Estaria ocupado como aquelas garotas, rodando as lojas de doces, comprando decorações, e derretendo chocolate na cozinha. Talvez estivesse com Amu, ajudando-a a preparar um chocolate de amor. No entanto, dessa vez, ele era apenas um garoto. O que ele devia fazer era esperar, como todos os outros garotos. Mas não havia a menor graça em esperar quando a única pessoa de quem ele aceitaria chocolates era também um garoto.

Ele encarou a vitrine da loja por onde passava, que trazia bonitas caixas enfeitadas, com bombons delicadamente decorados, que mais pareciam pequenas joias. Analisou a própria figura que viu refletida no vidro, por alguns segundos. Os cabelos longos e bem alinhados, a pele, o rosto delicado, os longos cílios que emolduravam os olhos dourados. Mesmo vestindo roupas masculinas, ele ainda passava por uma garota. As coisas seriam tão mais fáceis se isso fosse a sua realidade... No entanto, ele não era uma menina perfeita, e nunca seria.

Fitou seu reflexo com mais afinco, procurando também por traços masculinos. Ele tinha ombros razoavelmente largos e sua musculatura se desenvolvia rapidamente, mesmo que não fosse possível perceber através do pesado sobretudo que usava. Os dedos, cobertos pela luva, evidenciavam-se angulosos, enquanto seguravam firmemente os pacotes da encomenda de sua mãe. Nagihiko procurou por aquela determinação e independência que ele via em Rythm, o seu suposto eu, porém, tudo o que encontrou foram olhos cansados e desmotivados.

Depois de tudo o que aconteceu, Nagihiko havia procurado distrair a mente ajudando sua mãe com a academia de dança, e por esse motivo, ele estava tão exausto, mesmo em um domingo. Depois que ele fora para a Europa, ela havia começado a ensinar duas jovens garotinhas, que pareciam promissoras, e agora, preparava-se para a primeira apresentação de ambas, e o garoto acabou por virar um assistente.

O trabalho ajudava a espantar os pensamentos em que ele não queria se concentrar, embora em momentos como esse, que não exigiam foco total, ele voltasse a se perder em suas suposições. O motivo real pelo qual Tadase havia feito aquelas coisas com ele ainda assombrava sua mente. Tadase era um garoto gentil, que pensava nos outros antes de si mesmo e que agia sempre ponderada e educadamente. Não via como ele poderia ter sido capaz de fazer algo como aquilo, nem mesmo em um dos ataques mais exagerados do seu Chara Change! Nagihiko entendeu aquilo como uma resposta instintiva aos estímulos externos, após analisar com cuidado as respostas dele. Tadase era inocente ao ponto de não ter ideia da real conotação dos seus atos. Ele poderia estar sofrendo com uma alteração brusca dos seus hormônios de adolescente, e por isso, agiu sem pensar. Essa era a resposta mais coerente.

Mas ainda havia em Nagihiko uma pequena chama de esperança, bem tênue e que podia se apagar com um pequeno sopro. Ele era um tolo, por manter esse sentimento dentro de si, no entanto, o fato era que as ações de Tadase, por mais impensadas eu pudessem ter sido, ainda causavam reações em Nagihiko. As lembranças de ter sido tocado tão displicentemente por Tadase, e por iniciativa dele próprio, mantinham-se vivas em Nagihiko, e traziam a tona os seus sentimentos mais profundamente enterrados, aqueles que ele se esforçava para manter sufocados no fundo do seu ser.

Cada vez que via Tadase, cada vez que sentia sua presença, que ouvia sua voz, que sentia seu cheiro... ele se sentia inebriado, com um sentimento cálido se espalhando por todo o seu ser... mas assim que se via privado disso, um grande buraco se abria em seu peito, implorando por mais. Ele queria mais do que apenas observar de longe. Apenas migalhas já não o sustentavam mais. Não agora, que ele havia provado um pouco do sentimento de ser retribuído, mesmo que de uma maneira torta e sem fundamento. A lembrança do toque suave e macio de Tadase pelo seu corpo permanecia intacta desde aquele dia, retornando atormentando-o sempre que ele dava aberturas.

— Olá, garota. Você está procurando chocolate para o Dia dos Namorados? – a vendedora da loja acordou Nagihiko do se estado de torpor. Ele se sobressaltou, vendo a mulher jovem, usando avental, que sorria gentilmente para ele – Você não quer ver aqui dentro? Está tão frio aí, venha até aqui olhar nossos produtos. Tenho certeza que você encontrará algo para aquele em quem estava pensando. E ele ficará muito feliz quando receber sua confissão!

— Não, obrigado... – Nagihiko corou e baixou o olhar, abraçando os pacotes da encomenda e saindo dali apressadamente. Aquela mulher estava errada, completamente errada. Nada daquilo era para ele. Quando percebeu, Nagihiko já corria pela rua, na direção da sua casa. E algumas lágrimas escapavam, rolando pelo seu rosto enquanto ele corria o máximo que conseguia, querendo deixar todo esse sofrimento que o seguia para trás.

Antes que percebesse, ele já havia deixado o distrito comercial, e enveredara-se pela rua da sua casa. Correu para o único lugar que passara em sua mente, e que prometia alguma segurança. Era o velho parque onde ele brincara quando criança, e o lugar onde havia recebido a confissão de Rima. Algo naqueles brinquedos velhos, totalmente isolados mesmo sendo domingo, trazia uma nostálgica sensação de vazio. Ele apenas queria um refúgio, algum lugar para onde pudesse correr e se esconder, sem ninguém importuná-lo.

Adentrou o parque e escondeu-se no túnel de metal que servia de esconderijo para as pequenas crianças, deixado os pacotes de sua mãe de lado, e ali permitiu que as lágrimas que há tanto tempo ele segurava deslizassem livremente pelo seu rosto pálido. Cerrou os dentes, querendo que aquela dor apenas sumisse. Sentiu vontade de gritar, mas sabia que nada daquilo aplacaria a sua impossibilidade de agir. A imagem de Tadase estava impressa por trás de suas pálpebras , e ele tinha a impressão de que podia sentir o cheiro suave dele impregnado em sua memória, apenas lembrando aquilo que ele nunca poderia ter de verdade.

Soluçou por muito tempo ainda, sentindo seu peito doer e apertar, agitando-se impaciente. Escondeu o rosto, querendo que as lágrimas quentes que rolavam sem parar apenas levassem junto com elas aquela sensação esmagadora que o assolava desde sempre. Uma vozinha fraca no fundo da sua mente alertava de que essa era a hora de Nagihiko fugir, e deixar seu amor tolo e infundado para trás. Ele não conseguiria aguentar muito mais tempo daquela tortura de tê-lo tão perto e não poder nunca confessar seus sentimentos e por para fora aquilo que estava cerrado em seu coração. Talvez ele devesse voltar para a Europa agora. Entretanto, por mais que essa parecesse a solução mais sensata, ele não queria deixar para trás os seus preciosos sentimentos. Não queria deixar de amar Tadase, por que por mais que doesse e o fizesse sofrer mais a cada dia, esse amor se tornara parte do seu ser, e ele não conseguia se imaginar sem aquele sentimento dentro de si. Ele queria estar ao lado de Tadase até o fim, mesmo que isso custasse sua felicidade. Por que também não haveria nenhuma felicidade longe dele.




Nagihiko voltou para casa, depois que todo o choro cessou e ele se viu novamente na realidade, e tomou um demorado e quente banho. Sua mãe não fez perguntas, embora ele tivesse certeza de que ela havia notado seus olhos inchados e vermelhos. No silêncio do parque vazio, ele colocou para fora os sentimentos que continha em seu coração, e agora, sentia-se estranhamente apático e vazio por dentro.

Depois do banho, vestiu o seu mais velho e puído moletom cinza, o favorito, e preparou uma grande caneca de café quente e forte. Sentado no chão da varanda que tinha vista para o jardim, ele estava com o capuz do agasalho cobrindo seus longos cabelos púrpura. Contemplava a fonte de água, que descia e subia, fazendo o característico som, que Nagihiko conhecia desde a mais tenra infância e que era um verdadeiro calmante para a sua alma. Nesse momento, nada além das sensações externas assolavam sua mente, e ele apreciava calmamente o momento raro de tranquilidade. Encolheu as pernas para perto do corpo, enquanto aquecia os dedos regelados na xícara quente. Aproximou o rosto da superfície de porcelana, com o calor agradável tocando-lhe a pele, querendo apenas que aquela apatia que sentia agora, decorrente da crise de choro, apenas durasse para sempre.

Nagihiko suspirou, deixando a caneca, já fria, de lado, e puxou as mangas do moleton, escondendo seus dedos. Escorou a cabeça na parede de madeira, afundando ainda mais a cabeça no capuz, e fechou os olhos. A calma que ele sentia antes se esvaiu em menos de um segundo, dando lugar ao aperto que ele já estava acostumado a sentir. Abraçou a dor como uma velha amiga, deixando que ela se acomodasse novamente no lugar de sempre. Lá estava ele, o garoto patético, que acabara de descobrir que odiava o dia dos namorados. Tadase com certeza ganharia muitos chocolates, como todos os anos, e acabaria sem nem mesmo lugar para guardar todos eles. Nagihiko mesmo, supunha que ganharia alguns das fangirls que ele acumulara desde que havia começado sua gestão como valete. E mesmo assim, nada disso fazia sentido para ele.

O dia dos namorados devia ser supostamente uma data para se celebrar o amor, distribuir chocolates entre aqueles com quem se importava, e não uma disputa para saber qual das desesperadas conseguia alcançar o Rei primeiro. Nagihiko queria que todas essas garotas escandalosas simplesmente evaporassem. Por que, no fundo, ele sentia muita inveja de todas elas. Elas teriam a chance de dar chocolates para Tadase, e declarar seu amor por ele livremente, sem nenhum remorso. A dor foi substituída por uma breve raiva, que fez seu pulso acelerar. Ele odiava aquela sensação, mais ainda do que ao dia de amanhã ou às fãs de Tadase, por que essa raiva infundada era prejudicial e o deixava ainda mais sujo do que o sentimento que tinha pelo seu amigo. Ele não tinha motivo para ter raiva, ou ciúme, por aquilo que não o pertencia, e que jamais pertenceria.

Subitamente, Nagihiko sentiu um peso se apoiando em sua cabeça, incomodamente. Abriu os olhos, sobressaltado, e tomou um susto com a imagem que o saudou.

— O-o q-que você está fazendo aqui? – ele levantou num salto, confuso. A sua frente, Hoshina Utau sorriu sem cerimônia, balançando algumas sacolas de compras. Havia sido uma dessas sacolas que ela apoiara na cabeça do garoto para chamar sua atenção antes.

— Sua mãe me deixou entrar. Ela é uma mãe muito bonita, você tem a quem puxar, sabe?! – Utau disse displicentemente.

— Que casa grande! – Eru, a Shugo Chara de Utau que lembrava um tipo de anjo, exclamou, admirada, olhando ao redor.

— Baka! – Iru, a Shugo Chara capetinha, repreendeu a irmã, dando um peteleco na testa dela – Não seja tão caipira! Que coisa idiota! Ei, onde está aquele Shugo Chara que joga basquete hein?

— Aaaa! Eru também quer brincar! – as duas se agitaram, procurando por Rythm.

— Mas o que você quer comigo? – Nagihiko inquiriu, exasperado. Estava desconfiado das ações da cantora, e com razão. Nada do que ela ou Yaya estivessem envolvidas poderia ser inocente.

— Eu acho que você deveria preparar chocolates, para o Valentine’s Day – ela indicou as sacolas – então vim para ajudá-lo. Você é do tipo que precisa de um empurrãozinho para agir, Valete, e como eu era a única do grupo que estava livre, me dispus a vir até aqui!

Grupo?!? Nagihiko arquejou, horrorizado. Agora elas eram um grupo? Uma coligação do crime organizado! A Máfia! Elas eram a própria Yakuza das Fujoshis. Nagihiko se sentiu acuado, completamente exposto. E sua reação dramática e exagerada só evidenciavam o quanto estava com os humores alterados.

— E foi o seu próprio Shugo Chara, aquele da toquinha, que foi procurar a Yaya, pedindo ajuda. Mas ela estava ocupada, então sou eu quem está aqui. Yaya me deu o endereço.

Nagihiko percebeu subitamente que fazia bastante tempo que não via Rythm voando por aí e enchendo seu saco. Ele provavelmente estava se escondendo por aí, sabendo que não sairia impune dessa, e com razão.

— Não importa o que o Rythm andou espalhando por aí, eu não preciso de nenhuma ajuda! – Nagihiko argumentou, quase perdendo a paciência.

— Ei, garoto! – Eru retornou, deixando Iru procurar Rythm sozinha, e flutuou na altura de Nagihiko – O Dia dos Namorados é um dia especial, em que você pode condensar todos esses sentimentos que carrega consigo em maravilhosos doces! Não desperdice esse dia! Vamos lá, coragem! O amor está no ar~ aaah~ isso é tão lindo! – Eru dançou no ar, admirada – Os seus sentimentos são tão lindos, garoto! Eu posso sentir! Não há por que se envergonhar deles!

Nagihiko engasgou, com as palavras da pequena Chara.

— Isso mesmo – Utau concordou, sensatamente – Eu posso entender que você ainda não se sinta pronto para se declarar abertamente, mas entregar chocolates é uma boa maneira de transmitir seus sentimentos de uma forma saudável. Eu sei que é difícil manter escondidos sentimentos como esses, e eles podem se tornar pesados e dolorosos demais com o passar do tempo. A melhor maneira é deixá-los extravasar, mesmo de uma maneira indireta como essa.

— Eu não sei que raios você pensou que deveria fazer, mas eu não tenho intenções, e nem motivos para preparar chocolates esse ano. – Nagihiko rebateu, o mais calmamente que ele conseguia. As palavras de Eru e Utau o deixaram abalado, por algum motivo, e ele não sabia mais o que pensar.

— Esse ano? Então quer dizer que você já fez isso antes? – Utau intrigou-se, sorrindo.

— O que? Claro que não! Você entendeu o que eu quis dizer! – ele desconversou, irritado. Quase que seu segredo escapou, e ele percebeu que as coisas eram muito mais fáceis de lidar quando apenas Tadase sabia sobre isso.

— Bem, não importa. Eu vim aqui fazer chocolate, e não saio até ter terminado! O valete vai entregar honmei-choko esse ano, ou eu não me chamo Tsukiyomi Utau! – Ela bradou, com confiança.

— Eu pensei que fosse Hoshina...

— Esse é meu nome artístico! Agora, me diz logo, onde fica a cozinha? – ela se apressou em dizer, tirando os sapatos e entrando na casa de Nagihiko sem cerimônia.

— É por aqui – ele indicou, indo na frente – Espera aí?! Por que eu estou mostrando?? E que história é essa de honmei?? Eu não quero entregar chocolates pra ninguém!!! – se indignou, olhando exasperado para a cantora, que apenas sorria, tranquila.

— É claro que vai! – Utau colocou os ingredientes sobre a mesa, e foi amarrando o avental amarelo que encontrou por ali na cintura, muito à vontade – Se você estiver muito tímido, pode fazer alguns giri também, só pra disfarçar. Mas eu não deixarei que você passe esse ano em branco. Tadase irá receber seus chocolates, eu irei garantir isso!

Nagihiko suspirou, derrotado. Utau podia ser muito persistente, ele percebia. E, sinceramente, do fundo da sua alma, Nagihiko estava com muita vontade de fazer isso, então apenas acatou a sugestão de Utau e começou a se preparar. Amarrou o avental lilás ao redor da própria cintura, prendendo os cabelos frouxamente com um elástico, apenas como medida de higiene, e lavando as mãos logo depois. Utau sorriu, saboreando sua vitória, e os dois começaram a picar os chocolates.

— Você já parece ter bastante experiência, valete. – Utau observou – Parece saber exatamente o que fazer.

— Eu ajudei minha irmã em outros anos – ele mentiu, sorrindo logo depois. Utau nada percebeu – E você? Já entregou chocolates

— Eu faço chocolates para o Ikuto todos os anos, desde que me entendo por gente. Nem lembro mais qual foi a primeira vez. – Utau respondeu, agradando-se com o clima leve das conversas de Nagihiko. Era alguém agradável e gentil, e ela se sentia satisfeita por estar ajudando alguém como ele. Ele era perfeito para estar ao lado de Tadase, era o que ela pensava, com toda a razão. – Eu também fazia para o Tadase, mas parei depois de entrar para a Easter. Eu ia começar de novo a fazer isso, mas esse ano, vou deixar apenas para você, valete.

— Não precisa se incomodar. Ele vai receber outras toneladas de chocolate das suas fãs mesmo. – Nagihiko disse, sentindo aquele aperto incômodo e o disfarçando com um sorriso – E você pode me chamar pelo nome, não precisa usar sempre valete.

— Ah, claro! – ela colocou o chocolate picado em uma vasilha, e começou a picar outro – Fujiyama-kun?

— Fujisaki – ele corrigiu, com uma gota descendo ao lado da cabeça. A garota estava invadindo sua casa e nem ao menos sabia seu nome! – Fujisaki Nagihiko.

— Comprido demais! – ela repreendeu – Ah, já sei! Nagi! É assim que a Yaya te chama! Nagi!

Nagihiko constrangeu-se com a repentina familiaridade. Utau era um tanto quanto folgada, muito mais do que ele supunha que uma idol deveria ser. Talvez esse fosse algum tipo de traço genético dos Tsukiyomi...

— Isso aí, Nagi-kun! Eu vou ajudar você! Nós somos amigos, não somos? Pode me chamar de Utau, se quiser! Utau-onee-sama!

— Tsukiyomi-san está de bom tamanho para mim – ele sorriu se graça, virando-se para pegar uma panela.

Depois disso, os dois se focaram exclusivamente na tarefa de preparar os chocolates. Nagihiko mostrou à Utau todas as suas receitas, e ela se admirou com a habilidade do garoto na cozinha. De fato, ele não precisava da sua ajuda, era mais como se ela fosse a novata e estivesse aprendendo com ele. Após muitas horas em frente ao fogão, e mais outras tantas ajeitando as forminhas, o chocolate enfim estava pronto. Já era noite quando eles terminaram de embalar os pequenos pacotes e amarrá-los com fitas. Nagihiko queria entregar giri-chokos para todos os guardiões, mas Utau não sossegou até fazê-lo desistir dessa ideia. Ainda mais estranho do que um garoto entregar chocolates para outro, era um garoto distribuindo chocolates por aí, ela disse, e isso chamaria muita atenção desnecessária. Era melhor que ele fizesse os chocolates apenas para Tadase e mais ninguém, e entregasse a ele da maneira que melhor conviesse.

Utau também estava fazendo chocolates para ela mesma entregar, para os amigos e para Ikuto, mas era notável o quanto o de Tadase se destacava dos demais. Maior que todos os outros, e com o dobro de chocolate que o resto. Nagihiko já não podia mais negar, aquele era definitivamente um honmei, recheado de segundas intenções, como a cantora havia dito momentos antes.

Eles admiraram o trabalho bem feito, com satisfação. Eru sorria extasiada, com aqueles pacotes que brilhavam impecáveis. Utau havia trazido embalagens diversas para guardar os chocolates, mas o garoto escolheu pela mais simples, a caixa em vermelho-escuro com fitas douradas amarradas cuidadosamente ao redor. Por fim, Nagihiko deixou-se cair sobre a cadeira mais próxima, tirando o elástico da ponta dos cabelos, e suspirou pesadamente.

— Já pensou em como vai entrega-los amanhã? – Utau indagou, tirando o avental e o dobrando cuidadosamente.

— Ainda não – Nagihiko respondeu, com o tom de voz controlado e muito mais calmo do que ele estava interiormente – Se eu pensar muito nisso, vou acabar desistindo.

— Então não pense. Apenas entregue – Utau aconselhou, lavando as vasilhas rapidamente – Eu tenho certeza de que o Tadase vai adorar. Ele ama chocolate!

— Ah, eu sei disso – Nagihiko lembrou-se exatamente do quanto, embora ainda pensasse que Tadase não ficaria exatamente muito empolgado com a ideia de receber chocolates de Dia dos Namorados de um garoto. Quem ficaria?

Enquanto pensava em Tadase, levantou-se para ajudar Utau a terminar de arrumar a cozinha, até que ela estivesse como antes, o que não levou muito tempo.

Depois de tudo arrumado, Utau preparou-se para ir embora. Pegou a sacola com seus chocolates e despediu-se rapidamente do valete, que insistiu em levá-la até a estação, considerando que já era noite. Ela apenas negou, dizendo “Guarde suas gentilezas para o rei”, e foi para casa. A mãe de Nagihiko, que estava ligeiramente animada com a ideia do filho ter uma amiga garota, que não era guardiã e ainda era famosa, não ousou interrompe-los nenhuma única vez, e ainda sorriu sugestivamente para o garoto ao ver Utau sair. Nagihiko apenas sorriu de volta, constrangido. Não queria decepcionar sua mãe, de maneira alguma, e sabia das expectativas que ela depositava nele como filho, mas se ela apenas supusesse o quanto a situação que imaginava era impossível...

Nagihiko retornou à cozinha e sentou novamente na cadeira que ocupava antes, olhando fixamente para a caixinha que repousavam sobre o balcão. Aquelas cores, ele percebia, não foram escolhidas por mero acaso. Ele podia ver refletido nelas, os olhos carmesim, brilhantes e inexplicavelmente doces de Tadase. E também seus cabelos dourados, macios e com cheiro de morango. Deitou a cabeça sobre os braços cruzados em cima da mesa, e fitou seu trabalho com afeição. Ele havia depositado todos os sentimentos que pesavam em seu coração naqueles doces, a agora sentia-se incrivelmente mais calmo. Toda a aflição que o atormentava antes tinha se atenuado, e sobrara apenas aquela sublime leveza que Nagihiko sentia sempre que estava com Tadase por perto. Era o sentimento de amor, puro e simples. Ele havia conseguido transmitir seus sentimentos aos chocolates, e extravasado um pouco aquilo que guardara há tanto tempo dentro de si. Era reconfortante. Nagihiko, repentinamente sorriu, imaginando o rosto de Tadase ao receber seus chocolates. Ele coraria? Sorriria gentilmente? Nagihiko surpreendeu-se ao perceber que mal podia esperar por isso. Apenas nesse dia em especial, ele se permitiria sentir, e não se culparia pelos seus sentimentos. Apreciaria por inteiro a sensação de estar apaixonado, só dessa vez. Era somente por um dia, não haveria problema.







O dia 14 de fevereiro começou agitado na Escola Seiyo. Havia garotas coradas e garotos impacientes por todos os lados. O clima de Valentine’s Day se instalara por todos os cantos, e era possível enxergar a áurea de romance e coraçõezinhos cor-de-rosa que se espalhava gradualmente.

O Rei de Seiyo, mal entrara pelos portões do colégio, fora atacado por um bando de cinco garotas, todas animadas e esperançosas. Elas barraram seu caminho, oferecendo seus chocolates para ele. Porém, Tadase já estava preparado. Antes de entrar, havia feito Chara Change com Kiseki, e agora se sentia confiante para fazer o que tinha que ser feito. Havia instruído Kiseki a agir com especial educação, como ele fazia durante as reuniões da escola. As garotas, que sorriam envergonhadas, não conseguiam enxergar a pequena coroa dourada que adornava a cabeça do Rei.

— Tadase-sama – Elas falavam todas ao mesmo tempo, sem que Tadase pudesse distinguir qual delas dizia o que – Por favor, aceite nossos sentimentos!

— Eu amo você, Tadase-sama!

— Fiz esse chocolates especialmente para você!

— Eu sinto muito – Tadase as interrompeu, com o tom de voz controlado e altivo – Eu não posso aceitar todos os seus sentimentos.

As garotas o fitaram chocadas.

— Mas você sempre aceita nossos chocolates, todos os anos, Tadase-sama!

— Eu percebi que fazer isso era como iludir todas vocês. Não quero dar falsas esperanças à ninguém, então não vou aceitar nenhum chocolate honmei esse ano. Desculpem-me. Por favor, deem seus chocolates para os garotos que realmente merecem eles.

As garotas saíram correndo mais do que imediatamente, algumas irritadas e outras tristes, mas Tadase sabia que elas se recuperariam logo. Aquilo que aquelas garotas acreditavam sentir por ele não era amor de verdade. Era apenas uma breve admiração, nada demais. Chegando a entrada, mal havia começado a subir as escadas, Tadase foi novamente impedido de prosseguir. Hoje o dia seria longo, pensou consigo mesmo. Dessa vez eram apenas duas garotas, de aparência bastante tímida. As duas ofereciam seus chocolates, sem olhar Tadase nos olhos.

— Gomenasai – Tadase se curvou levemente, mantendo a pose orgulhosa do Chara Change – Eu não posso aceitá-los.

— Hotori-sama... – uma das garotas começou a lacrimejar, nervosa – E-eu gastei a noite inteira p-preparando... eu...v- você não precisa retribuir...

— Sinto muito, mas eu não posso aceitar seus sentimentos, seria indigno da minha parte, se eu não puder retribuí-las – Tadase pronunciou seguramente – Por favor, não insistam.

— E-eto... Hotori-sama... – a outra garota se esforçava para dizer, fechando os olhos com força e falando tudo em um só fôlego - e se... e se fosse a Nadeshiko-sama?

— O que? – Tadase indignou-se com a pergunta. O que Fujisaki-san tinha a ver com isso?

— Bem... todos diziam que a ex-Rainha nutria sentimentos pelo Hotori-sama... quer dizer... – ela fugia do olhar questionador de Tadase, se contorcendo abraçada ao chocolate – V-vocês ficavam realmente bem juntos, e se não fosse ela ter saído, eu não teria feito chocolates... eu... eu sinto muito! – ela se curvou, e saiu correndo, acompanhada da amiga.

Tadase ficou para trás, abobalhado. Ele sempre recebeu chocolates de Nadeshiko, e ficava muito feliz com isso. Era apenas natural para ele, não havia nada de estranho nisso. Porém, elas não imaginariam que Nadeshiko não poderia mais entregar seus chocolates a ele. Repentinamente, Tadase se sentiu solitário, o que não era comum no Chara Change. Esse ano ele não receberia os chocolates de Nadeshiko, pela primeira vez, e isso o perturbou. Balançou a cabeça, para organizar as ideias, e concentrou-se em rumar para a sala de aula, antes que mais garotas o atacassem. Seu esforço foi em vão, considerando que mais três garotas o procuraram antes que ele terminasse de subir os primeiros lances de escadas, e ele as rejeitou da mesma forma que vinha fazendo com as outras. Porém, as palavras das garotas anteriores ainda o intrigavam. E se fosse Nadeshiko...?

Com a dúvida, o Chara Change evaporou, deixando o Rei desarmado. Tadase olhou ao redor, mas não havia sinal de Kiseki. Agindo rapidamente, ele desviou do caminho original, usando as escadas de emergência, e chegou à sala de aula. Será que o dia inteiro seria essa correria? Algo o dizia que sim.

Adentrou a sala, que estava agitada assim como toda a escola. Na classe ao lado da janela, Tadase procurou com os olhos por Nagihiko, que sorriu ao vê-lo. Retribuiu ao sorriso, sentindo o coração ligeiramente trêmulo. Ignorou a sensação, e se dirigiu a sua classe, ao lado da do valete, sentindo-se cansado.

— Eu vi pela janela você chegando – Nagihiko disse calmamente, fazendo Tadase corar levemente com a ideia de estar sendo observado por ele – Você está surpreendentemente popular esse ano, Hotori-kun.

— É mesmo... – Tadase sorriu sem graça – Eu não gosto muito de ter que rejeitá-las... mas e você, Fujisaki-kun, também é muito popular... – ele observou o lugar embaixo da classe de Nagihiko, que estava abarrotado de pacotes coloridos e bem feitos.

— É meu primeiro ano recebendo chocolates – Nagihiko comentou – Nunca pensei que seria assim... Talvez nós possamos comê-los juntos mais tarde, como você fazia com a Nadeshiko – Nagihiko sugeriu, desviando o olhar. Sentiu-se constrangido, mas era muito confortador ter uma conversa normal e tranquila com Tadase dessa forma.

Tadase lembrou-se dos outros anos, com Nadeshiko. Depois de ele receber dezenas de chocolates, eles dois sentavam-se no telhado da escola e comiam juntos, rindo de algumas coisas que as garotas faziam, como colocar seus telefones escritos sobre as barras, ou fazer miniaturas da cabeça de Tadase com o chocolate. Fora exatamente por isso que Tadase decidira-se por negar as declarações e não receber os presentes esse ano. Se não pudesse dividi-los com Nadeshiko, o Dia dos Namorados perdia o significado para ele. É claro que ele não imaginava que teria Nagihiko ao seu lado tão breve, o que tornava seus preparativos um pouco sem propósito.

— É claro! – Tadase respondeu rapidamente, sorrindo sincero – Eu adoraria! Mas... você não se incomoda? Afinal, são os seus primeiros chocolates...

— Eu não os dividiria com mais ninguém – Nagihiko respondeu, e ao se dar conta do que havia falado, corou, desviando o olhar – E além disso... tem algo que eu... que eu...

— Que você...? – Tadase ficou curioso, antecipando-se.

— Não é nada importante... eu falo depois. – Nagihiko disfarçou, sem muita habilidade, mas antes que Tadase começasse a questioná-lo, Rima surgiu do outro lado da sala, com os olhares de todos os seus fãs escravos a observando atentamente. Ela tinha uma sacola nas mãos, o que tornava óbvia suas intenções.

— Aqui está! Giri-choko! – ela enfatizou, ligeiramente corada, entregando um pacote azul para Tadase e outro lilás para Nagihiko.

— Arigatou, Mashiro-san – Tadase agradeceu, sentindo-se desconfortável ao ver Nagihiko aceitando o presente da garota. Ela tinha sentimentos por ele, era óbvio que aquele não era um simples giri, como o que ele recebeu.

— Foi você quem fez? – Nagihiko indagou, preocupando-se com a resposta.

— Claro que não! Acha mesmo que eu ia sujar as mãos fazendo chocolate? Comprei pronto – ela disse altivamente, e Nagihiko respirou aliviado.

— Mas você não comeu nenhum não é? – ele provocou – Sabe, aqueles efeitos colaterais...

Rima irritou-se, inflando as bochechas. Ela tinha certa fraqueza contra chocolate, qual o problema? Qualquer um pode se embriagar de doces! Bufando, deu as costas para Nagihiko, não sem antes lançar um significativo olhar para a mochila do garoto, onde podia ser notada uma parte do pacote vermelho. Olhou para Tadase, e novamente para Nagihiko, sorrindo maldosamente antes de sentar em sua classe.

O valete sentiu-se estremecer, ao olhar novamente para Tadase que parecia um pouco perturbado, mas logo se recuperou e sorriu docemente. Como ele faria para entregar seus chocolates?! Não tinha ideia.

Nesse momento, a porta abriu-se num rompante. Amu entrou, esbaforida, seguida das suas Shugo charas, que voaram para o lado de fora e sumiram no mesmo instante. A Coringa, ofegante, sentou em seu lugar, tentando se recuperar. Por algum motivo, ela tinha se atrasado. Foi então que Nagihiko viu. Na pasta dela, era possível enxergar, a ponta de um pacote de chocolates, cor-de-rosa, se evidenciando. Nagihiko sentiu um repentino mal-estar. Diferente dos chocolates das alunas normais de Seiyo, aqueles eram verdadeiros honmei, e Nagihiko conhecia os sentimentos da amiga. Ele não tinha como lutar com isso. Tadase os aceitaria.





Depois de uma entediante aula de Nikaido, os guardiões rumaram para o Royal Garden. Tadase ainda foi parado por três grupos de garotas, querendo entregar seus chocolates, e negou todos. Nagihiko recebeu de quatro garotas diferentes, e não havia mais espaço nos seus braços para carregar tantos. Rima resmungava coisas como não ter recebido nenhum agradecimento por ter entregado chocolates, Yaya saltitava na frente, com uma cesta de vime nas mãos, e Amu estava estranhamente silenciosa, enquanto acompanhava o passo dos amigos vagarosamente.

Eles chegaram ao Jardim, e Yaya correu até a mesa, fazendo um meio passo de dança enquanto colocava a cesta na mesa.

— Aqui está, o presente de Valentine’s Day da Yaya para vocês! – ela sorriu, animada – É um enorme bolo de chocolate!

Os guardiões se aproximaram, curiosos, mas só encontraram a cesta vazia.

— Hmm... Yaya, não tem nada aí dentro...

— É por que a Yaya não resistiu e comeu tudo no caminho e durante a aula! – ela admitiu, matreira – Estava muito bom, vocês iam adorar!

Os quatro guardiões sentiram gotas descendo pelos seus cenhos, sem nem mesmo se indignar ou se irritar com isso. Na verdade, não conseguiram nem ficar surpresos com aquilo.

— B-bem... eu também trouxe algumas coisas para vocês... – Amu começou a dizer baixinho, abrindo a pasta, e revelando pequenos pacotinhos. Distribuiu-os entre todos os guardiões, deixando Tadase por último.

— E-eu fiz para você... – ela sussurrou, com o rosto em brasas, entregando a caixa que era maior que as outras para Tadase. Ele corou também, em dúvida se deveria rejeitá-la, como fez com as outras. Nagihiko apertou sem perceber o pacotinho que Amu o entregara, até que ele estivesse completamente amassado, enquanto via o semblante tímido de Tadase ao receber o chocolate.

Ele achava que estava apaixonado por Amu até bem pouco tempo, então deveria estar muito feliz com isso. Talvez aquele fosse o único honmei-choko que ele aceitaria hoje. Porém, Tadase, não pensava assim. Ele estava confuso, afinal, estava recebendo chocolates da garota por quem julgava-se apaixonado, então deveria estar extasiado, mas não era essa a verdade. Ele se surpreendeu pensando em maneiras de rejeitá-la sem magoá-la. Parecia apenas errado aceitar sentimentos de Amu. Não eram aqueles os chocolates que ele queria. No entanto, antes que ele pudesse dizer qualquer coisa, Yaya interviu, aproximando-se pelas costas de Amu.

— Nee, esses são giri, não são, Amu-chii? – Yaya, disse animada, apontando para o pacote que Tadase ainda não havia pegado.

— S-sãao! C-claro que s-são! – Amu mentiu, jogando o pacote na direção do loiro. Yaya sorriu triunfante, e enquanto Amu se afastava, ela saltitou na direção de Tadase.

— Tadase! – ela disse, para que apenas ele escutasse – Divide esses com a Yaya? Parece tão bom!

— Claro, Yuiki-san – Tadase sorriu gentilmente, abrindo a caixa e oferecendo um dos bomboms para a Ás, que comeu um, sorrindo logo depois. Ela estava apenas verificando, e o resultado era exatamente o que ela esperava. Tadase não abriria mão tão facilmente de algo que considerasse precioso. Só restava a Nagihiko ter iniciativa e agir logo, o caminho estava livre para ele!


— Yoo! Como vão meus pirralhos favoritos? – uma voz ecoou na estufa, sobressaltando os guardiões, mas não havia ninguém na porta. Subitamente, um vulto surgiu da abertura do teto, aterrissando no meio dos guardiões. Era Ikuto, obviamente. – Eu vim buscar meus chocolates de Dia dos Namorados! – ele sorriu, provocante.

— Aaah! A Yaya já comeu tudo! – ela bradou animada, esperando pela confusão que se seguiria – Aposto como a Amu-chii tem alguma coisa aí!

Ikuto sorriu, estendendo a mão na direção da rosada, que apenas colocou um pequeno pacote, menor que todos os outros, na mão do garoto.

— E se dê por satisfeito – ela resmungou, ao ouvir Ikuto bufar de decepção.

— E você, Chibi-chan? – ele se adiantou até Rima, que não se deixou abalar por sua presença – Tem algo para mim?

— Não é como se eu tivesse pensado em você na hora de comprar. – Rima declarou, presunçosamente – Apenas aconteceu de sobrar um. – ela disse, colocando uma caixa preta e branca na mão do garoto, que a fitou diretamente, satisfeito.

— Você vai ficar para o chá, Nii-san? – Tadase indagou, trazendo a bandeja cheia para o meio da mesa.

— Não mesmo! – Amu rebateu, empurrando Ikuto na direção da saída, mas ele se esquivou e voltou para frente, habilmente.

— Eu vou aceitar sua oferta – Ikuto aproximou-se da mesa – Eu sempre tive curiosidade de saber o que vocês tanto fazem nessa estufa!

Os guardiões se acomodaram em seus lugares, e Ikuto puxou a cadeira extra, que fora colocada especialmente para as visitas de Kukai, sentando entre a Rainha e a Coringa. Amu cruzou as pernas irritada, e Rima suspirou, aborrecida, incomodando-se com a presença espaçosa do garoto. Ikuto serviu-se de chá, com a elegância de um inglês, enquanto olhava para todos com semblante atento. Ninguém tinha nada a dizer, e ter Ikuto na mesa do chá apenas parecia muito errado, então todos se concentraram na tarefa de comer. Yaya puxou algum assunto aleatório, entediada com o silêncio, e Tadase continuou, e assim, todos começaram a falar e conversar, como faziam normalmente.

Repentimente, Nagihiko sentiu algo batendo em suas pernas, ininterruptamente. Após uma contida interjeição de dor, ele olhou para frente, e viu o semblante impaciente de Rima, que o chutava por baixo da mesa e indicava com a cabeça para que ele andasse logo e entregasse à Tadase seu chocolate.

— Eto... Fujisaki-kun, acho que nós deveríamos ir logo até o telhado, se quisermos mesmo fazer isso ainda hoje... – Tadase observou, após terminar sua xícara de chá.

— O que? – Nagihiko engasgou-se com o convite inesperado, fitando surpreso o loiro.

— No telhado? – Ikuto interessou-se – O que vão fazer lá?

— É apenas uma velha tradição... – Tadase explicou-se.

— Velha tradição? Como, se o Fujisaki só entrou na escola esse ano? – Amu inquiriu, intrigada.

— Eles são amigos de infância, Amu-chii! Eles já têm uma história juntos bem antes de você os conhecer! – Yaya explanou sensatamente, olhando sonhadoramente para os dois garotos logo depois, e Amu bufou irritada, não gostando nem um pouco disso.

— Amigos de infância, é? – Ikuto sorriu por trás da xícara de chá – Eu só me lembro de ver você com aquela garota magrela de rabo de cavalo quando era criança, Tadase...

— Eu conheci Fujisaki-kun na mesma época que a Fujisaki-san – Tadase mentiu desajeitadamente, e Nagihiko decidiu que era a hora de intervir.

— Vamos logo, Hotori-kun, estamos perdendo tempo – Nagihiko se apressou em dizer, pegando sua pasta e saindo rapidamente do local, seguido de perto por Tadase.

Os dois atravessaram os jardins, só suavizando o ritmo quando o Royal Garden diminuiu ao longe, tornando-se um pequeno diamante de luzes refletidas no meio da floresta.

— Me desculpe, Fujisaki-kun – Tadase pediu, voltando ao passo normal – Eu quase expus seu segredo na frente de todos, fui muito descuidado.

— Você não fez nada, Hotori-kun, Amu-chan e o Ikuto é que são muito atentos aos detalhes. – Nagihiko se apressou em dizer, não querendo mais ver o semblante preocupado no rosto do rei.

— Tudo bem, então... – Tadase concordou, e eles logo alcançaram o pavilhão principal, e adentraram pela entrada dos fundos, para seguir pela escada de acesso e assim não serem notados pelas fangirls atrasadas que ainda não haviam entregado seus chocolates.

Enquanto subiam as escadas, Nagihiko sentiu sua mochila pesando. Era agora, a sua chance de entregar os chocolates para Tadase. Com esse pensamento, ele abriu a porta do alto do último lance das escadas, vendo o espaço vazio e cinzento, cercado por grades de metal e pelos telhados pontiagudos da escola.

Tadase correu na frente, sentando no local onde sempre ficava com Nadeshiko. Era logo em frente, e dali era possível enxergar o pôr-do-sol sem nenhuma interferência. Virou-se, colocando os braços para trás e esperando por Nagihiko, que se aproximava vagarosamente demais. O loiro sentia-se extremamente bem disposto agora, e impaciente, mesmo sem motivo aparente. Seu coração agitava-se, com expectativa e ansiedade.

Nagihiko viu o semblante alegre do amigo, que mais parecia uma criança na manhã de Natal, e sentiu-se fraquejar diante daquele sorriso adorável. Ele tinha que fazer isso agora, ou jamais conseguiria. Respirou fundo, reunindo toda a sua coragem, e concentrou-se no seu desejo de ser alguém mais espontâneo e confiante, como Rythm. Sim, ele podia fazer isso.

— Hotori-kun. Tem algo que eu... preparei para você – ele disse, se esforçando para manter o tom de voz natural e brando.

— Mesmo? – ele se surpreendeu – O que?

— Eu... fiz para você – Nagihiko puxou a caixa vermelha de dentro da pasta, hesitante. Repentinamente, lembrou-se de que Tadase estava rejeitando todos os honmei. O que ele pensaria disso? – É chocolate. – disse, sentindo-se tolo, e esticou o braço na direção do rei – Eu pensei que como fazia isso todos os anos anteriores, seria ruim parar de repente... quer dizer, eu... acho que Nadeshiko faria isso também.

Tadase o fitava, sobressaltado. Inesperadamente, sentiu-se trêmulo, e uma espantosa alegria espalhou-se pelo seu ser. Sorriu brilhantemente, segurando a caixa que Nagihiko o oferecia.

— Você... você fez para mim, Fujisaki-kun – Tadase parecia maravilhado – Eu nem sei o que dizer. Muito obrigado!

— Você... vai aceita-los? – Nagihiko estava incrédulo. Nunca pensou que Tadase ficaria assim tão feliz. Era mais do que o que esperava.

— Claro que vou! Afinal, não é exatamente a primeira vez que recebo chocolate de você, mesmo que de certa forma seja essa uma primeira vez, não é? – Tadase pronunciou adoravelmente – Eu achei... que esse ano não receberia, e fiquei um pouco triste com isso – admitiu, corando e fitando o chão – Então, saber que você pensou em mim, me deixa realmente muito, muito feliz, Fujisaki-kun.

Nagihiko ficou sem palavras diante do que Tadase disse, e apenas sentou no chão, no seu lugar de sempre. Tadase sentou ao seu lado. Em silêncio, os dois olharam ao mesmo tempo para o céu colorido que se estendia diante deles. Os tons de rosa, lilás, laranja, vermelho se misturando e tornando a se separar, as nuvens de algodão, que brilhavam alegremente ao redor do sol poente. O céu era o mesmo que eles viam durante os anos que passaram juntos, rindo e conversando, naquele mesmo terraço. Porém, para os dois, a constatação era de que quanto mais os anos passavam, mais bonita era aquela vista. Tadase tinha certeza de que o que deixava o céu mais brilhante era a companhia de Nagihiko. Durante o tempo que ele ficou fora, Tadase não conseguia sentir esse bem-estar e calma que sentia agora, com ele ao seu lado. Até mesmo a paisagem vista dali de cima, que sempre fora estonteante, parecia sem graça e sem cor.

Subitamente, o celular de Tadase tocou, acordando-o da sua submersão. Ele viu na tela, uma mensagem de Yaya.

“Yeei! A Yaya sabe que o Nagi deu chocolates pra você, Tadase! *u* Vai dividir esses com a Yaya? >.<


Tadase riu da mensagem, imaginando como que a ás conseguia sempre essas informações privilegiadas, e respondeu rapidamente, sem que Nagihiko visse.

“Esses eu não dividirei. Desculpe-me Yuiki-san”.

— O que houve, Hotori-kun? – Nagihiko indagou, ao ver Tadase novamente perdido em pensamentos.

— Não é nada... eu só estava pensando... o dia dos namorados é uma data maravilhosa, não é? – Tadase divagou, e Nagihiko não entendeu. Abriu a pasta, deixando cair as dezenas de caixas de chocolates, de todos os tipos e maneiras existentes.

— Parece que o seu primeiro dia dos namorados como garoto rendeu bastantes coisas, Fujisaki-kun – Tadase observou, enquanto Nagihiko abria a primeira caixa, e oferecia para Tadase, servindo-se de um.

— É. Acho que é muito mais lucrativo ser um garoto nessas horas. Embora fazer os chocolates também seja de certa forma um pouco divertido, e uma experiência enriquecedora. – Nagihiko perdeu-se nas palavras, comendo calmamente seu chocolate.

— De que forma? – Tadase indagou de volta, comendo tranquilamente o bombom.

— Poder condensar seus sentimentos em forma de chocolates – Nagihiko lembrou-se de Eru, a pequena cupido – é algo único, e relaxante. É uma forma de se sentir aliviado, e amenizar aquela sensação ruim de culpa...

— Eu não entendo... – Tadase o fitou, suplicante, e Nagihiko riu da expressão confusa que Tadase fazia naquele momento. Dava vontade de abraçá-lo.

— Então deixe assim, está bom por enquanto – Nagihiko respondeu evasivamente, deixando o garoto ainda mais confuso. Notou a mancha de chocolate na bochecha de Tadase, e agindo por puro impulso, tocou-a com o polegar – Está sujo aqui... – Nagihiko disse, sentindo a textura quente e macia da pele de Tadase novamente em seu toque.

Tadase deixou-o limpar, inclinando o rosto na direção da mão dele, e apreciando o toque gentil de Nagihiko. Ele esfregou cuidadosamente o polegar na face de Tadase, e depois levou-o aos lábios, lambendo o chocolate. Tadase riu, corando.

— Você costumava fazer isso antes, como Fujisaki-san... – ele recordou, deixando Nagihiko surpreendido.

— Parece que a Nadeshiko não sumiu completamente... – o valete respondeu, voltando ao seu lugar.

— E ela nunca vai sumir. Nadeshiko faz parte de quem você é. E para falar a verdade, eu gosto de você assim, uma mistura perfeita dos dois. – Tadase sussurrou para si mesmo, corando, e Nagihiko alarmou-se.

— Tadase, você...

— Então, por isso, por favor Fujisaki-kun, pare de se culpar e agir dessa maneira, sempre como se tivesse punindo a si mesmo. Eu não gosto de vê-lo triste, mas parece que ultimamente, você tem estado muito mais triste do que o normal. Eu não sei o que aconteceu com você, mas se for algo que eu fiz, ou se eu puder ajuda-lo em qualquer coisa, não hesite em me chamar, quando precisar! – Tadase suplicou à Nagihiko, movendo-se na direção dele – É para isso que os amigos existem, Fujisaki-kun, e eu quero poder fazer tudo o que estiver ao meu alcance para ver você feliz!

— Você já consegue fazer isso apenas sendo quem você é, Hotori-kun – Nagihiko não se conteve em dizer, com o coração aquecendo e completando-se de afeição pelo pequeno loiro que estava a sua frente. Sentiu que poderia transbordar, com tantos sentimentos acumulados. Colocou a mãos sobre os cabelos macios e dourados, bagunçando-os levemente, e Tadase corou furiosamente com o toque inesperado, mas não recuou.

Os seus olhares se encontraram, carmim e mel, e um viu sua imagem refletida nos olhos do outro. Por um breve momento, foi como se tivessem enxergado muito mais do que apenas isso, mas mantiveram isso para si mesmo, voltando aos seus lugares. Nagihiko sentiu vontade de tocar Tadase por mais tempo, e este quis que Nagihiko estivesse mais perto, mas nenhum dos dois realizou seus desejos, e permaneceram apreciando o pôr-do-sol por muito mais tempo, até que os chocolates terminassem e a noite começasse a despontar e não fosse mais possível distinguir mais do que os suas silhuetas através da escuridão iminente.

Depois, os dois foram para casa, cada um pensando no dia que se passou. Aquele havia sido um dia dos namorados inexplicável. Tadase sentia-se contente, depois de dividir os chocolates com Nagihiko, como imaginava que nunca mais poderia fazer, e foi para casa abraçado à caixa vermelha e dourada, que agora repousava ao lado da sua cama, intocada, como uma relíquia. E Nagihiko percebeu que não odiava o dia dos namorados tanto assim. E que também, não poderia fugir para sempre dos seus sentimentos. Um dia, inevitavelmente, eles viriam à tona. Mas ele não precisava agir agora, não estava pronto para isso. Até lá, ele poderia se contentar com a amizade de Tadase, pois sabia que, quando se confessasse, provavelmente nem isso teria.

— Então, como foi? – Rythm foi correndo recepcionar Nagihiko quando ele chegou, impaciente, e nem lembrava mais que o dono poderia estar furioso com ele depois do que fez.

— Foi melhor do que eu esperava – Nagihiko disse, sorrindo melancolicamente – Mas parece que nunca não é o bastante...



















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Notas finais do capítulo

Yoo, minna-san! Shiroyuki desu~
Espero que tenham gostado desse capítulo regado de muito chocolate e totalmente atrasado no tempo! Eu sempre achei que os dias dos namorados daqui deveriam ser que nem no Japão u_u Pelo menos assim pessoas como eu aproveitariam alguma coisa, já que eu nunca passei um único dia dos namorados (e nem nenhuma outra data da minha vida, diga-se de passagem) namorando *fuckthepolice*
Provavelmente eu tbm não ganharia nem chocolate de amigo, mas tudo bem T^T *pessoa que só se interessa pelo chocolate e nada mais*
Deixando de lado as minhas divagações (ninguém deve ta lendo essa budega aqui...) queria explicar algumas coisinhas! Usei algumas palavrinhas japonesas no meio do texto, e acho que pode ser que alguém que leia não saiba, ou algo assim...
Então!
Obi, que é o que a mãe do Nagi mandou ele buscar, é aquela faixa que usam no kimono, e alguns deles são muito muito caros e raros, peças de colecionador e tudo isso, então o Nagi deveria ter mais cuidado com essas coisas!
Giri-choko é o chocolate obrigatório, aquele dado para os amigos, e Honmei-choko é o que você entrega para o seu amado, a fim de se declarar, cheio de sentimentos e segundas intenções~ Nem preciso dizer qual desses era o do Nagi, nee?
Então! Se gostaram do capítulo, e também se não gostaram, deixem reviewzinhos aqui embaixo~ Não dói nada e me deixa muuuuito feliz nyan~
♥Kisuu♥