Alguns dias depois, as férias de inverno haviam terminado, e as aulas finalmente recomeçaram. Voltar à essa rotina penosa de acordar cedo, assistir aulas, depois ir ao Royal Garden e assinar pilhas de documentos não era fácil, mas valeria o esforço só para ver uma pessoa em especial. Sim, se as aulas haviam recomeçado, significava que Nagihiko voltaria a ver Tadase todos os dias. Só esse pensamento já era mais que suficiente para tirá-lo da cama e rumar para a escola feliz da vida mesmo em uma manhã gélida como aquela.

Nagihiko tentou prestar mais atenção do que o normal nas aulas dessa vez, afinal, era o começo de um novo bimestre, eles teriam matéria nova, sem falar que queria fazer a inscrição para o time de basquete, e precisava de notas boas pra isso, mas o simples fato de ter um certo Rei sentado bem ao lado dele não estava ajudando muito. Volta e meia seu olhar se desviava para o garoto ao seu lado, e o Valete perdia-se em seus pensamentos, esquecendo completamente da aula. Quando voltava à realidade,  já era tarde demais, pois havia perdido uma parte da explicação e não conseguia acompanhar o resto da matéria.

No fim daquela tarde, depois das aulas, ele seguiu para o Royal Garden como de costume e, enquanto carimbava pilhas e mais pilhas de documentos, perguntava-se se não seria melhor simplesmente mudar de lugar na sala de aula e sentar em um lugar mais afastado do Rei pra ver se assim conseguia prestar atenção na aula, enquanto planejava estudar a matéria que não entendeu hoje quando chegasse em casa. Seria melhor fazer isso enquanto a matéria ainda estava no começo, não queria mais depender de Tadase para os estudos.

Quando terminaram de revisar os documentos daquela tarde, Yaya foi milagrosamente a primeira a sair, profetizando que hoje cairia uma chuva daquelas e não queria chegar em casa toda molhada. Amu foi embora em seguida, dizendo que ainda precisava fazer compras para o jantar. E quando Tadase foi guardar os documentos assinados na sala de arquivos, Rima disse:

- E então? Algum progresso?
- Hein? Do que está falando Rima-chan? - Nagi perguntou enquanto recolhia as xícaras vazias e a bandeja cheia de farelos na mesa. Rima rapidamente surrupiou-lhe o bule de chá e sua própria xícara
- Algum progresso na economia do Japão - ela falou ceticamente - Claro que estou falando sobre o Tadase né sua anta!
- N-Não saia falando essas coisas tão alto! - ele sibilou alarmado, quase derrubando a bandeja com o susto - Já te falei que não pretendo seguir em frente com isso... e-então não adianta você ficar me perguntando
- Ora tenha dó, você não pode desistir assim tão fácil. Tente pelo menos, quem sabe os seus sentimentos não são correspondidos? - ela falou com uma naturalidade espantosa, bebericando sua xícara de chá
- Não viaja Rima-chan, não tem como isso acontecer - ele respondeu com um nó na garganta - Agora pare de falar nisso por favor, ele pode ouvir
- Tá, tá... já entendi - ela respondeu meio contrariada - Aff você guarda segredos demais "Nadeshiko".

Nesse instante, Tadase havia saído da sala de arquivos. Ele observava os dois de boca aberta, um tanto aparvalhado. Parecia querer perguntar alguma coisa, mas não sabia bem o quê.

- Fujisaki-kun...? Etto... p-por que... por que ela te chamou assim?
- Hotori-kun! - Nagihiko exclamou assustado. Será que ele tinha ouvido demais?! - Ahn... há quanto tempo está aí??
- Acabei de sair da sala de arquivos... nee por que a Mashiro-san te chamou assim?
- Ei, Nagihiko... ele sabia sobre você, não é? Você disse que ele sabia! - Rima murmurou, meio preocupada que pudesse ter falado demais
- Sim, ele sabe - Nagihiko respondeu, aliviado de que Tadase só tivesse escutado a última frase de Rima - Ela também descobriu a verdade sobre mim, Hotori-kun. Rima-chan sabe do meu segredo
- Ah... certo - Tadase recolheu a bandeja com as xícaras vazias que o Valete estava juntando antes, como pretexto para se afastar dali, e não disse mais nada. Não sabia bem o porquê, mas aquilo o incomodava. Antes ele era o único a saber sobre Nagihiko, mas agora... primeiro Kukai descobriu a verdade, e agora até mesmo Rima sabia. Era possível que Amu e Yaya acabassem descobrindo mais tarde também. Isso realmente o fazia se sentir mal. Ele prometeu guardar o segredo do amigo, fizeram uma promessa juntos e tudo! Será que essa promessa não era mais tão importante assim?
- Ei, Nagihiko. O que deu nele?  - Rima perguntou, observando o Rei
- Não sei... ele parece chateado, eu acho - Nagi respondeu preocupado
- Então vai lá falar com ele e descobrir o que houve, oras! - ela deu um empurrão no Valete, na direção que Tadase tinha ido - E aproveita e trás mais chá que o meu acabou!

Sem se importar muito com o chá, Nagihiko foi até onde Tadase estava. Ele se aproximou do Rei por trás e perguntou:

- Etto... está tudo bem Hotori-kun?
- Claro que sim. Está tudo ótimo, não podia estar melhor - mentiu o loiro, sem encará-lo
- Mesmo...? Mas você não parece nada bem
- Já disse que estou ótimo, completamente perfeito, às mil maravilhas! - Tadase exclamou, sua voz se elevando algumas oitadas
- - Olha aqui Hotori-kun, eu sei reconhecer uma mentira quando vejo uma, isso porque passei boa parte da minha vida mentindo pra todos ao meu redor. E você agora está mentindo pra mim. Por que não me diz o qe aconteceu?
- Por que você contou pra ela? Por que contou pra Mashiro-san sobre o seu segredo? - Tadase indagou sem encará-lo - Até entendo que você precisasse contar pro Souma-kun, afinal, você iria se tornar o novo Valete e precisava de conselhos do seu antescessor, mas... por que deixou a Mashiro-san saber também? Antes eu era o único que sabia... prometi guardar seu segredo, e prometi que ficaríamos juntos pra sempre... eu fiz isso de coração. Mas agora... não sou mais o único que sabe a verdade sobre você. Por acaso aquela promessa... não é mais importante pra você? Pensei... que eu fosse especial.

Tadase o encarou com aqueles olhos grandes e chorosos, e uma cara tão fofa que derreteria qualquer coração mesmo em um dia gélido como aquele. Estaria completamente adorável se não parecesse tão triste.

- O que você está dizendo Hotori-kun?! É claro que você é especial... q-quero dizer...! - Nagihiko embolou-se com as palavras, tentando pensar rapidamente em algo que tirasse aquele olhar triste do rosto de seu amado Rei, mas que ao mesmo tempo não fosse comprometedor - V-Você é... b-bem, você foi o primeiro a descobrir a verdade sobre mim, e me aceitou do jeito que sou... somos amigos há tanto tempo, e você guardou meu segredo por anos... e também... é claro que nossa promessa é importante pra mim, eu penso nela todos os dias. Não é porque outras pessoas descobriram sobre minha dupla-identidade que ela deixou de ser valiosa, entende? Quero dizer... e-eles descobriram a verdade, mas você é o único com quem fiz uma promessa, então... bem... é claro que você... continua sendo espec... q-quero dizer, que você é importante pra mim
- Sério mesmo? - Tadase perguntou fazendo beicinho, ainda não totalmente convencido - Se é assim, então por que você contou pra Mashiro-san?
- Eu não contei, ela descobriu sozinha - Nagihiko respondeu, lembrando-se do dia em que Rima descobriu a verdade - Isto é, ela viu quando fiz o Chara Nari com a Temari, então... depois disso não tinha mais como negar, então...
- Ei, Nagihiko! - Rima o chamou lá da mesa - Você não ia fazer a inscrição pro time de basquete hoje? Melhor se apressar ou não vai mais dar tempo!
- Ahh droga, é verdade! Tinha esquecido! - Nagi exclamou alarmado - B-Bem, de qualquer forma... você não precisa ficar se preocupando com isso, está bem, Hotori-kun? Nada mudou entre nós.

Nagihiko sorriu, tentando confortá-lo e convencê-lo o mais rapído possível de que nada havia mudado no relacionamento deles (o que não era bem verdade) e saiu correndo em direção à saída do Royal Garden, ignorando os gritos de Rima sobre o chá que ele não trouxe.

"- Conheço bem esse sorriso... é o sorriso que ele sempre dá quando quer despistar alguém sobre a Fujisaki Nadeshiko-san" - Tadase pensou enquanto observava o amigo correndo ao longe - "É aquele sorriso tão doce e meigo que ele sempre dá... quando quer fazer os outros acreditarem em suas mentiras".

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Por incrível que pareça, as previsões de Yaya se realizaram, e um verdadeiro temporal tinha caído naquela tarde. Nagihiko chegou à tempo de fazer a inscrição para o time de basquete mas, por causa da chuva, não pôde realizar os testes com a quadra molhada, de modo que eles foram adiados para outro dia. Nagihiko havia esquecido o guarda-chuva e agora corria pela cidade, encharcado até os ossos e um frio terrível atingindo seu corpo, enquanto pensava se seria melhor se abrigar em algum lugar e esperar a chuva passar ou ir direto pra casa.

A pergunta logo foi respondida quando ele passou por uma espécie de estúdio de dança vazio, e parou diante dele. Aquele lugar pertencia à sua família, era onde ele realizava suas apresentações quando ainda era Nadeshiko, e agora não era mais usado. Vasculhou os bolsos à procura da chave, mas não foi necessário. Mal encostou na maçaneta e a porta se abriu. Entrou sem pensar duas vezes, perguntando-se se devia haver alguém lá dentro limpando o lugar ou coisa parecida. Fechou a porta e parou diante da entrada, suas roupas e cabelo formando rapidamente uma poça de água ao seu redor. Pensou se não seria melhor ele tirar aquelas roupas molhadas, trocar por algumas secas, e esperar a chuva passar. Claro que, como ele usava aquele lugar quando era Nadeshiko, só devia haver roupas femininas lá, mas isso era o de menos agora.

Enquanto ainda tentava tomar uma decisão, ao mesmo tempo que torcia seus cabelos encharcados, aumentando ainda mais a poça ao seu redor, uma pessoa o observava do andar de cima, sem que ele tivesse notado. A pessoa pensou imediatamente em se esconder ao vê-lo, já que não estava muito apresentável no momento, mas por algum motivo a simples visão de Nagihiko molhado, torcendo seus longos cabelos fez a pessoa paralizasse e continuasse observando de boca aberta. Alguns segundos passaram, e a pessoa passou tanto tempo "distraída" com aquela bela visão diante de seus olhos que se esqueceu que devia ter se escondido e soltou um sonoro espirro, que ecoou por todo o salão.

- Quem está aí?? - Nagihiko perguntou assustado - Eu sei que tem alguém aqui, eu ouvi você! Vamos apareça!

Sem outra opção, a pessoa desceu até o primeiro andar, onde Nagihiko estava. Era Tadase, e parecia bem nervoso e envergonhado, seu rosto estava corado demais. Seus cabelos estavam molhados, pingando em sua roupa e indicando que ele provavelmente também resolvera se esconder da chuva ali, mas isso não era o que importava agora. O Rei trajava um vestido azul claro, com mangas compridas e bufantes, com vários detalhes cor de rosa nas mangas, na gola e na saia, que ia até um pouco acima dos joelhos e estava coberta de laços cor de rosa e rendas. Calçava meias listradas em azul e branco e sapatilhas rosa.

Nagi reconheceu a roupa imediatamente, afinal, era uma de suas antigas roupas de quando era Nadeshiko, mas isso não importava nem um pouco no momento. A simples visão daquele garoto tão adoravelmente fofo trajando um vestido fez seu coração acelerar perigosamente. De repente o frio que tanto o incomodava já não existia mais, e foi substituído por um terrível calor que tomou conta de sua face, fazendo-o corar irremediavelmente. Ele tentou abrir a boca pra perguntar porque raios Tadase estava usando um de seus antigos vestidos, quando sentiu que tinha algo de errado consigo mesmo e virou-se de costas, cobrindo o rosto com as mãos.

- Ahh não ria, Fujisaki-kun! - Tadase exclamou, seu rosto ainda mais enrubescido do que antes, se é que isso era possível - E-Eu só vesti isso porque... b-bem, eu peguei chuva, e minha roupa ficou toda molhada, então... err... m-minha casa ainda está muito longe e eu acabei entrando aqui pra esperar a chuva passar... d-daí, resolvi trocar de roupa, já que meu uniforme estava molhado, mas... a-aqui só tem roupas de menina, então eu... e-eu não tive opção!

Nagihiko sacudia os ombros descontroladamente, e ainda tampava o rosto com as mãos, mas na verdade ele não estava rindo. Estava tentando deter uma hemorragia nasal iminente por ter visto Tadase dessa maneira tão encantadora. Vagamente teve consciência de sentir-se feliz por Tadase não ter percebido o que realmente estava acontecendo com ele e, respirando fundo, tentou controlar-se e virou de frente para o Rei.

- D-Desculpe. Tem razão, eu... não estou em posição de rir de algo assim - Nagihiko desculpou-se, embora não tivesse realmente rido dele - Mas você me assustou! Por que entrou no estúdio da minha família?
- Ehh?! Esse lugar é da sua família, Fujisaki-kun?! - espantou-se Tadase
- Sim, é o estúdio de dança que eu usava quando era Nadeshiko... por isso só tem roupas de menina aqui - explicou o Valete - Mas eu usava essas roupas quando era pequeno, é incrível que caibam em você, nem em mim elas servem mais. Talvez seja por causa da diferença de alt... de altur... aaatchim!
- Ahh não, você pegou chuva! É melhor tirar essa roupa molhava ou vai se resfriar! - Tadase falou preocupado
- Eu estou bem. Não quero ter que voltar a usar roupas femininas... além do mais, elas são de quando eu era pequeno, não cabem ma... não cabem mais em  mi... aaatchim!
- Deixe disso, Fujisaki-kun! É melhor você se trocar ou pode acabar ficando doente mesmo! - insistiu o Rei - Vamos, aproveite que não tem mais ninguém aqui, e troque essas roupas molhadas. Vamos esperar a chuva passar, quem sabe até lá nossos uniformes já secaram?
- Eu duvido muito... mas está bem, você venceu - rendeu-se o Valete - Eu já volto.

Ainda tremendo de frio, e evitando ao máximo olhar para aquela versão kawaii e tentadora de Tadase tranvestido, Nagihiko subiu até o segundo andar, onde as roupas ficavam. Examinou as roupas guardadas em um dos quartos, que ele não usava há tanto tempo. Provou algumas, mas todas eram de quando tinha uns dez anos de idade, então obviamente estavam muito pequenas agora, a maioria nem cabia mais nele. Por fim encontrou uma que servisse: Um casaco branco com uma fita e vários detalhes em vermelho, e uma saia com babados até demais, em roxo, vermelho e rosa. Lembrava-se que, na época em que sua mãe comprou aquela saia, ela batia um pouco acima dos joelhos, mas agora mal cobria o necessário, deixando boa parte das pernas à mostra. Não se importou muito com isso, mas se ficasse assim, continuaria com frio, então procurou por um par de meias. O que não adiantou muito também, já que até as meias estavam muito curtas agora, então ele pegou um par de meias brancas qualquer e sapatilhas roxas. Olhou-se no espelho por um momento. Não esperava ter que usar saia de novo nem tão cedo, e amaldiçoou profundamente a chuva que caía lá fora. Sim, ela era a culpada de tudo. Suspirou derrotado e procurou numa gaveta por uma fita para amarrar os cabelos. Lá estava ela, a fita vermelha com flores de cerejeiras na ponta que ele usara outrora. Se tinha que usar saia de novo, então era melhor voltar a ser Nadshiko de uma vez, ela sim saberia lidar muito melhor com isso.

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Amarrou os cabelos ainda molhados e voltou ao primeiro andar. Assim que ouviu os passos, Tadase virou-se de frente para o amigo, e seu queixo caiu diante daquela visão. Sério, seu queixo teria despencado e rolado pelo chão se não estivesse bem preso à sua mandíbula. Sentiu seu coração acelerar drasticamente, e o calor subir à sua face. Não estava preparado para aquilo.

- Err... etto... Fujisaki... san? Por que... p-por que você...
- Ah, isso... - "ela" apontou para o cabelo preso - Bem, já que tive que vestir essa saia, achei melhor voltar a ser a Nadeshiko de vez, ela sabe lidar com isso muito melhor do que eu - o Valete, ou melhor, a Ex-Rainha respondeu, sorrindo sem graça. Sua voz soou delicada e feminina, sem que ele pretendesse isso. Vai ver era uma espécie de efeito colateral da saia
- Ahn... certo. É claro... - Tadase tentou desviar os olhos da falsa garota, mas não conseguia. Sentia-se embaraçado em encará-la nos olhos, então tentou desviar o olhar para baixo e fitar o chão, mas isso não deu certo também. Ao olhar para baixo, seus olhos foram inevitavelmente atraídos para as pernas da Ex-Rainha, totalmente expostas agora. Tadase perguntou-se por um momento se ela não se incomodava com isso, afinal estava bastante frio, mas logo esse pensamento se perdeu e ele só conseguiu se concentrar em sua "observação"
- Ei, Hotori-kun! O que está olhando? - Nadeshiko o despertou de seus devaneios, mirando-o um tanto desconfiada
- Ehh?! N-Nada... é que... - ele forçou-se a desviar o olhar, coçando a cabeça sem graça - Bem... v-você não está com frio? Quero dizer, essa saia é... bem...
- Ah, sim... está curta né? - a falsa menina comentou como se não fosse nada - Mas não tinha outro jeito, esas roupas são de quando eu tinha uns nove ou dez anos de idade, então não cabem mais em mim, estão todas pequenas. Tinha outra saias lá, mas elas simplesmente não chegavam nem à minha cintura, estavam apertadas e pequenas demais, essa foi a única que serviu.

Essa informação só fez com que Tadase voltasse a se perder em pensamentos insanos. Fala sério, aquela saia não devia ter nem dois palmos, e as outras eram mais curtas ainda?! E estavam tão apertadas a ponto de não passar por suas pernas para chegar até a cintura... significava que seu corpo devia ter se desenvolvido bastante durante esses últimos anos. Tadase fazia um esforço enorme para não pensar nessas coisas e olhar para qualquer lugar que não fosse a "garota" à sua frente, mas era inútil, seus olhos foram atraídos para as pernas "dela" de novo. Ele queria continuar olhando... queria tocá-la... sabia que isso não fazia o menor sentido, mas era assim que ele se sentia agora. Mas era mais do que isso... a memória sobre a conversa deles antes de Nagihiko deixar o Royal Garden naquela tarde veio à sua mente, e ele sentiu que precisava saber mais sobre essa pessoa. De repente não bastava apenas conhecer seu segredo, afinal, ele já não era mais o único que sabia sobre isso. Queria conhecer melhor a pessoa diante dele, saber mais sobre ela, saber coisas que mais ninguém sabia, que só ele soubesse... pra que voltasse a se sentir especial. Talvez isso fosse apenas um desejo egoísta de um Rei mimado, mas não importava, era assim que Tadase se sentia agora.

- Hotori-kun! - Nadeshiko chamou, despertando-o novamente de seus pensamentos confusos - O que deu em você?! Pra onde está olhando afinal...? - ela tentou seguir o olhar fixo do garoto, e deu-se conta do que ele estava observando com tanta atenção - Ahh!! Você... e-estava olhando pra...?!
- Nee Fujisaki-san... você não se enxugou direito, não é? Ainda está molhada da chuva - Tadase falou, sem dar atenção à frase da amiga. Ele se abaixou lentamente, e tocou de leve o tornozelo da falsa garota com a ponta do dedo indicador, por onde ainda escorriam gotas d'água. Sentiu aquela pele macia conta a sua, e um cheiro bom vindo da falsa menina. Sua mão, antes fria como gelo, pareceu aquecer-se magicamente só em tocá-la. Encostou a ponta dos outros dedos também, um de cada vez, deslizando suavemente sua mão pela perna da Ex-Rainha. Como aconteceu antes, sua mão pareceu aquecer-se magicamente só em tocá-la. E então a lembrança do estranho sonho que tivera dias atrás veio à sua mente. Lembrou-se da sensação que teve quando o Valete o tocou no sonho, e se perguntou se Nagihiko, ou melhor, Nadeshiko se sentiria da mesma forma se ele a tocasse.

- E-Ei, o que você pensa que está fazendo?! Hotori-kun, você não pode... m-me tocar assim... - Nadeshiko o encarava, completamente pasma. O que foi que deu naquele garoto afinal?! Ele não podia estar apenas enxugando as gotas da chuva, bastava apenas lhe dar uma toalha pra isso! Ela tentou afastar-se, tentou recuar, mas por algum motivo estava completamente paralizada. Não conseguia mover-se um centímetro sequer, mal conseguia protestar. Era como se aquela saia sugasse todas as suas forças e a coragem pertencentes à Nagihiko, e agora essa pessoa não passasse de uma garotinha frágil e indefesa.

Sem ouvir os protestos da falsa garota, Tadase subiu um pouco mais a mão, passando pelo joelho, e agora tocando parte da coxa. Quanto mais subia, mais corado ficava seu rosto, e ele a observava como se estivesse vendo a oitava maravilha do mundo. As lembranças daquele sonho estranho afloravam em sua mente, cada vez mais claras, como se o estivesse induzindo a agir daquele jeito.

- H-Hotori-kun, pare... pare com isso por favor... p-por que você... está fazendo isso afinal?! - Nadeshiko gaguejou, mal conseguindo formar uma frase coerente naquela situação
- Não sei bem. É que... quando te vi assim, eu... não sei porque, mas senti que precisava fazer isso, que precisava comprovar por mim mesmo se sua pele era tão macia quando aparentava - Tadase respondeu ainda com o olhar fixo nela, como se estivesse hipnotizado - E sabe de uma coisa? Ela é ainda mais macia do que parece... e tem um cheiro tão bom. Um cheiro tão delicioso que... é como e eu estivesse embriagado por ele. Nee Fujisaki-san... essa tarde, eu senti que não era mais especial para o seu "outro eu", já que não sou mais o único a saber a verdade sobre você... então pensei que queria saber mais coisas sobre você, coisas que ninguém mais sabe, e viver coisas com você que ninguém mais viveu, criar memórias que apenas nós dois compartilhamos. Senti que apenas conhecer o seu segredo já não bastava pra mim... mas então... não sei porque, quando te vi assim, eu... fiquei com vontade de te tocar. Nee Fujisaki-san... eu posso continuar fazendo isso por mais um tempo?
- M-M-Mas o que é que você está dizendo Hotori-kun?! - Nadeshiko exclamou, sem saber o que pensar de tudo aquilo - Se quer saber mais coisas sobre mim eu posso contar o que você quiser, mas pare com isso! Eu sou... eu sou um garoto, você sabe! Apesar dessa minha aparência, eu ainda sou um garoto, então... se você ficar tocando um garoto assim, eu... ahh! - Nadeshiko não conseguiu terminar a frase e deixou escapar um gemido quando sentiu Tadase tocando sua outra perna com a mão livre
- Ah... você fez aquele ruído estranho de novo - Tadase comentou, tirando os olhos das pernas dela e encarando-a nos olhos pela primeria vez
- I-Isso é...! É você que... q-que está me obrigando a  fazer esses barulhos, seu...! - Nadeshiko tampou a boca com as mãos, tentando reprimir outro gemido - Vamos... p-pare logo com isso... ahhn!
- Não tampe a boca. Não sei porque, mas eu... fiquei com vontade de te ouvir fazendo mais desses sons - Tadase falou de um jeito curioso, voltando a concentrar sua atenção nas pernas da Ex-Rainha - Desculpe, mas... eu realmente não consigo parar com isso... sinto como se precisasse fazer isso a qualquer custo, então... deixa eu te tocar só um pouco mais, por favor.

Nadeshiko tentou protestar, mas ao abrir a boca só conseguiu soltar outro gemido, bem mais alto e longo dessa vez. Ela não entendia o que foi que deu nesse garoto afinal. É como na vez em que ele teve febre e comeu um monte de comidas estranhas graças aos conselhos sugestivos de Yaya, e tentou deliberadamente atacar Nagihiko em seu próprio quarto. Talvez fosse isso, talvez Tadase estivesse com febre de novo por causa da chuva, ou tivesse comido alguma coisa suspeita, e agora estava agindo por influência disso. Mas não era isso que importava no momento, ele precisava ser detido, e rápido, antes que fosse tarde demais.

(In)felizmente, era tarde demais. Tadase havia subido um pouco mais as mãos, até chegar à barra da saia, tocando suas pernas com delicadeza, e parando uma vez ou outra para encostar seu rosto nelas e aspirar seu cheiro, ou tocá-la com a língua. Nadeshiko já não conseguia mais deter suas exclamações e gemidos, e meio que desistiu de tentar detê-lo. Aquilo não era tão ruim afinal... e ela(ele) não estava fazendo nada dessa vez, então não era culpa sua. Seu coração estava tão acelerado que parecia que ia rasgar sua pele e saltar pra fora a qualquer momento, sua face estava inteiramente rubra, fora outras várias sensações indescritíveis das quais ela provava agora. Enquanto sentia a saliva dele escorrendo por sua coxa, sentiu suas pernas bambearem quando o Rei subiu um pouco a saia ao tocá-la, e apoiou as mãos nos ombros do garoto ajoelhado diante dela para que não caísse ali mesmo. Soltou outro gemido alto e, ao perceber que uma das mãos do garoto havia adentrado sua saia, falou:

- E-Ei, Hotori-kun! Até onde pretende ir com isso hein?! S-Se você continuar me tocando assim, eu... eu vou acabar... ahh!! - ela soltou outra exclamação de deleite, sem conseguir se conter
- Nee Fujisaki-san... você não disse uma vez que, quando uma pessoa faz esse barulho que você acabou de fazer, é por que está gostando? - lembrou Tadase - Se você está gostando, então por que eu deveria parar?
- E-Eu não disse nada disso, seu...! - "ela" interrompeu a frase ao lembrar-se de dizer uma coisa parecida durante uma ocasião em que estava no Chara Change e, graças a isso, acabou "atacando" Tadase - Ahh droga, eu disse mesmo... e dessas coisas você lembra né?! M-Mas isso não importa, você não... v-você não deveria me... ahh não! N-Não toque aí!!

Tadase aproximou seu rosto mais uma vez, na intenção de aspirar seu cheiro novamente, e acabou beijando-a, fazendo a falsa garota deixar escapar outro gemido. Ele estava prestes a tocar o que havia embaixo da saia dela, quando ouviu um estrondo no hall de entrada. Alguém havia entrado.

Como num passe de mágica, Nadeshiko tirou forças sabe-se lá daonde e conseguiu se afastar alguns passos do garoto, ficando fora do alcance de suas mãos. Ela ainda sentia-se trêmula, suas pernas continuavam bambas, e ela se apoiou em uma parece para que não desabasse ali mesmo.

- A-Alguém... t-tem alguém aqui - ela falou, um tanto ofegante - Precisamos... nos trocar. Depressa. Se alguém me ver assim... terei problemas... não podem me ver como Nadeshiko
- Ahh... certo - Tadase concordou, lembrando-se subitamente de que também estava usando um vestido - Eu... bom... v-vamos nos trocar então.

Ele voltou ao segundo andar, com Nadeshiko em seu encalço, subindo mais devagar. Ainda sentia-se estranha com o que aconteceu, um turbilhão de sensações percorrendo seu corpo. Não sabia dizer se estava feliz ou com com raiva por terem sido interrompidos.

Felizmente, eles deixaram seus uniformes em cômodos separados. Tadase entrou depressa em uma das salas sem encarar a amiga, e Nadeshiko entrou na primeira sala do corredor. Ainda com o corpo tremendo, e sentindo o rosto quente como se estivesse em brasas, tentou se trocar o mais rápido possível. Tirou as roupas femininas que usava, guardou-as de qualquer jeito no armário, e voltou a  vestir seu uniforme masculino, ainda completamente encharcado. Soltou seus cabelos, voltando a ser Nagihiko. Tinha voltado ao normal, mas, ao contrário do que pensara, isso não fez com que a sensação estranha que sentia diminuísse nem um pouco.

Ainda sentindo as pernas bambas, forçou-se a descer até o primeiro andar. Tadase já estava lá, também usando o uniforme da escola, e conversava com a pessoa que os interrompeu. Era Amu, e aparentemente o estava chamando pra ir a algum lugar. Observou o rosto do Rei por alguns segundos antes de ser notado. Ele não parecia embaraçado ou arrependido do que tinha feito... só parecia estar um tanto confuso.

- Ahh então você também estava aqui, Nagihiko! - Amu exclamou ao ver o amigo se aproximar - Como entraram aqui afinal? Parece que não vem ninguém aqui há tempos... sem falar que esse lugar me parece estranhamente familiar...
- Oi Amu-chan. Aqui é onde... onde minha irmã treinava dança e fazia as apresentações. Esse lugar pertence à minha família - Nagi respondeu forçando um sorriso. Lá estava aquele sorriso meigo de novo... um sorriso tão doce que tornava impossível para pessoas "de fora" perceberem o monte de mentiras que se escondiam por trás dele
- Ah entendi, sabia que conhecia esse lugar! - Amu exclamou - E o que vocês dois estão fazendo aqui?
- Nós viemos... n-nos proteger da chuva - Nagihiko apressou-se a dizer antes que Tadase falasse alguma coisa. Ele observou o Rei com o canto dos olhos que, quando percebeu que estava sendo observado, o olhou de volta. Nagi desviou o olhar rapidamente, sentindo-se terrivelmente embaraçado. As lembranças do que aconteceu minutos atrás não saíam de sua cabeça e, por mais que ele se forçasse a não pensar nelas agora, simplesmente não conseguia. Sentiu seu coração acelerar de novo, e suas pernas fraquejarem. Como temera por tanto tempo, suas pernas já não conseguiam mais sustentá-lo e ele desabou ali mesmo
- Ei, Nagihiko! Você está bem? O que deu em você?! - Amu exclamou assustada
- Estou bem. Eu só... a-acho que peguei um resfriado por causa da chuva... me sinto um pouco tonto - ele respondeu, encarando o chão. Amu o ajudou a se levantar e a sentar em uma cadeira.

"- Resfriado...? Fala sério, ele não está resfriado coisa nenhuma" - pensou Tadase consigo mesmo - "Ahh... não pode ser! Será que... fui eu que fiz isso com ele?".

- Nee Tadase-kun, estou falando com você! - Amu o despertou de seus devaneios - Não acha melhor ligarmos pra casa dele? Ou pra um hospital?
- Eh? Ahn... não sei... t-talvez - Tadase desviou o rosto, ainda com o pensamento anterior em sua cabeça. A simples possibilidade de ele ser o responsável por Nagihiko estar nesse estado o fez corar furiosamente
- Ei Tadase-kun, seu rosto está muito vermelho! Não me diga que também ficou doente por causa da chuva?! - Amu colocou a mão na testa do Rei, medindo sua temperatura - Não parece ter febre... o que há de errado com vocês dois afinal?! Ahh! Não me diga que...! - um súbito pensamento passou pela mente da Coringa - Nee... vocês dois estavam aqui sozinhos, certo...? Não me diga que... fizeram alguma coisa estranha enquanto estavam à sós...? Nee Nagihiko... você não fez... nada indecente com o Tadase-kun enquanto estavam aqui sozinhos, não é?

O rosto de Tadase, antes apenas rosado, atingiu rapidamente um tom escarlate berrante, mudando de cor tão rápido quanto um semáforo. Ele tentou falar alguma coisa, mas as palavras simplesmente não saíam. A simples suspeita da amiga parecia ter despertado Nagihiko de seu estado de fraqueza, e ele teria até achado graça da pergunta, se a situação não fosse tão séria. Não, ele realmente não tinha feito nada com Tadase... pelo menos não dessa vez. Nagihiko respirou fundo e falou:

_ O que está insinuando Amu-chan? Dizendo que fizemos coisas indecentes, daonde foi que tirou isso? Nós somos dois garotos caso tenha esquecido... isso simplesmente não é possível. Não diga essas coisas, está nos constrangendo assim... ou melhor, está nos ofendendo - Nagihiko falou as palavras que lhe assombravam todo santo dia desde que se dera conta de que estava apaixonado por Tadase, com um terrível nó na garganta. Achou irônico que as palavras que mais lhe torturavam servissem pra alguma coisa agora
- Sim... é claro... vocês dois são garotos, o que estou pensando? - Amu sacudiu a cabeça, tentando se convencer de que aquilo era um completo absurdo - Desculpem, não sei o que deu em mim. D-De qualquer forma, vocês vêm ou não??
- Ir pra onde? - Nagi perguntou
- Ahh sim, você não ouviu. A Rima está lá fora de carro, ela estava me dando uma carona pra casa, e pra Yaya também. Eu pensei ter ouvido a voz do Tadase-kun aqui dentro, então entrei pra ver se era ele mesmo. Vocês vêm com a gente?
- Ah, claro... uma carona é bem vinda numa chuva dessas - Tadase respondeu, ainda com o pensamento longe
- Ótimo! - Amu exclamou feliz - Você vem também Nagihiko?
- Sim... acho que vou aceitar - ele tentou se levantar, mas suas pernas ainda tremiam muito e ele se apoiou no encosto da cadeira para não cair de novo
- Etto... você consegue andar sozinho? Se quiser eu posso te ajudar... - Tadase falou timidamente, segurando um dos braços do Valete. Ele tentou passá-lo por cima do próprio ombro, mas Nagihiko afastou-se o mais depressa possível, sem encará-lo
- E-Estou bem. Consigo andar sozinho, não se preocupe
- Bem... então vamos? - chamou Amu, ainda meio confusa com aquela situação.

Os dois a seguiram para fora do estúdio, onde Rima e Yaya aguardavam. As duas os cumprimentaram alegremente (Rima nem tanto) e os três se acomodaram junto á elas no banco de trás. Nagihiko tomou o cuidado de não sentar perto de Tadase, ficando ao lado de Amu e perto da janela, ainda pensando no que raios teria levado o Rei a fazer aquilo com ele.

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Nagihiko passou o resto daquele dia deitado em sua cama, pensando no que raios poderia ter levado um garoto supostamente ingênuo como Tadase a cometer tais atos. Pensou por horas, mas nenhuma resposta vinha à sua mente. Sentia-se melhor agora que tinha tomado um banho e comido alguma coisa, suas pernas não tremiam mais e seu rosto voltara à cor natural, mas a resposta para tudo aquilo continuava indefinida.

- Ei, Nagi... tem certeza de que está se sentindo bem? Você está aí deitado há horas! - Rhythm exclamou preocupado. Seu dono havia lhe contado sobre o ocorrido, cortando algumas partes, é claro, na esperança de que alguém tão liberal e aparentemente experiente quanto Rhythm pudesse ajudá-lo, mas nem mesmo seu Chara tinha uma boa teoria sobre isso
- Eu estou bem Rhythm. Apenas... não consigo entender porque ele fez isso - Nagihiko respondeu sem encará-lo
- Mas você não me parece nada bem... se bem que, comparando ao jeito que chegou aqui, até que está melhorzinho, você estava em um estado deplorável, tinha que ver! - o Shugo Chara exclamou - E pensar que foi o Tadase quem te deixou daquele jeito... é como se você fosse o uke e ele fosse o seme agora!
- Rhythm!! O-Onde foi que você aprendeu sobre isso?! - Nagihiko gritou assustado, sentando-se rapidamente e encarando seu Chara pela primeira vez
- Eu ouvi a Yaya e a Utau falando sobre isso durante aquela festa de Halloween, lembra? Depois perguntei pra Yaya... e ela me explicou
- Ahh mas é claro, só podia ser coisa delas! Aquelas duas parece que estão corrompendo todos ao meu redor, é impressionante... principalmente a Yaya-chan - Nagihiko resmungou irritado
- Ahh, esquece isso, é verdade mesmo, Nagi! - Rhythm insistiu no comentário anterior - Agora você sabe como o Tadase se sente quando você faz aquelas coisas com ele... hoje vocês só inverteram os papéis, é como se ele fosse o seme e você fosse o uke agora hahahahahaha!
- Humm... então é assim que o Hotori-kun se sente toda vez, é...? - Nagihiko murmurou para si mesmo, pensativo - Ser uke não parece uma coisa boa... não gostei disso
- O Tadase que o diga hahahahaha!! Agora você sabe como ele se sente!
- Pode até ser, mas isso não explica porque o Hotori-kun fez aquelas coisas comigo!
- Sabe... pensando bem, também não explica porque você não resistiu - observou seu Chara - Quero dizer, você é maior do que ele, deve ser mais forte também, porque não o empurrou pra longe ou simplesmente se afastou??
- É o efeito Nadeshiko...
- "Efeito Nadeshiko"?! - repetiu Rhythm - Que raios é isso?!
- É tudo por causa daquela maldita saia! - o Valete gritou, entre irritado e constrangido - Quando estou como Nadeshiko e tenho que usar aquela saia... é como se ela sugasse todas as minhas forças, me sinto inseguro e frágil, não consigo fazer as coisas que normalmente faria... passei tanto tempo fingindo ser uma garota e tendo que usar aquela saia que isso acabou se tornando uma espécie de efeito colateral
- Humm... que interessante - Rhythm comentou, coçando o queixo com uma de suas mãozinhas e fazendo uma pose de sábio que não combinava com ele - Em outras palavras, você passou tanto tempo agindo como menina que é como se você se tornasse o uke quando está assim! Viu só, agora você sabe como o Tadase se sente! Tá vendo como você deixa o seu uke maluquinho?! Ahahahaha!! - Rhythm caiu na gargalhada
- Pare de ficar dizendo essas palavras!! - pediu o Valete cansado - E não é como se eu quisesse fazer essas coisas com ele... q-quero dizer, eu quero, mas... sei muito bem que não posso. É só que... às vezes acontece de eu perder o controle e acabar fazendo besteira... mas eu só faço essas coisas porque o amo! Gosto tanto dele que é difícil me controlar... mas isso não explica porque ele me... ah... n-não pode... ser...
- O que? O que não pode ser? - Rhythm indagou curioso
- Nada... eu só preciso... confirmar uma coisa amanhã.

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No dia seguinte, Nagihiko evitou ao máximo falar com Tadase, e este também não puxou conversa com ele. Muito mal trocaram um "bom dia", e evitavam ao máximo se encarar. No entanto, por mais difícil que fosse falar com Tadase agora, Nagihiko ainda precisava confirmar suas suspeitas, por mais absurdas que fossem. Para isso, saiu mais cedo da última aula, indo direto até o Royal Garden, já que sabia que Tadase era sempre o primeiro a chegar. Precisava ter uma conversa definitiva com o garoto enquanto os outros não chegavam.

- Hotori-kun! - Nagihiko chamou assim que avistou o garoto sentado sozinho à mesa
- Ahn... o-oi - Tadase desviou imediatamente o olhar, corando levemente - Etto... e-eu vou vou buscar os documentos na sala de arquivos
- Deixe os documentos pra depois - Nagihiko o deteve no instante que Tadase se levantou, preparando-se pra fugir para a sala de arquivos - Hotori-kun, eu preciso falar com você urgentemente. Ontem você... isto é... a-aquilo que aconteceu depois da reunião... v-você sabe - Nagihiko atrapalhou-se com as palavras, sentindo o rosto esquentar rapidamente. Não podia simplesmente perguntar "você me atacou por que tem uma queda pela minha versão garota?". Agora que parou pra pensar, tinha planejado apenas esclarecer as coisas com Tadase, mas não pensara em como faria isso - B-Bem, o que quero dizer é... você... p-por que você... por que você me...?
- Yahoo, Tadase, Nagi! - Yaya gritou escandalosamente da porta do Royal Garden, com Amu e Rima em seu encalço - Chegaram cedo hein, o que foi que houve?! Não me digam que estavam pretendendo fazer uma limonada sem a Yaya por perto?! Hahahahaha!!
- Que história é essa de limonada, Yaya, nós sempre tomamos chá - Rima falou, sem entender o comentário de duplo-sentido
- Não é isso, Rima-tan! Limonada é "aquela outra coisa", lembra que a Yaya explicou? - a Às cochichou animadamente com a Rainha
- Ah é... tinha esquecido - a loira falou, corando levemente
- Aff parem de falar de comida, suas esfomeadas - Amu revirou os olhos, alheia ao conteúdo da conversa das duas - E aí Nagihiko, tá melhor?
- Sim.. era só uma gripe passageira por causa daquela chuva, estou melhor agora - Nagihiko respondeu forçando um sorriso - Hotori-kun - Nagi chamou baixinho - Sobre ontem...
- Depois falamos sobre isso - o Rei interrompeu, evitando encará-lo - Agora não... elas podem ouvir - mais rápido que um raio, ele se abrigou na sala de arquivos, voltando com uma pilha de documentos tão grande que faria qualquer um esquecer qualquer outro assunto posterior. Ou melhor, quase qualquer um.

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Mais tarde, na casa da Família Hotori...

- E agora, o que eu faço... o que eu faço?! - Tadase se perguntava, andando de um lado para o outro no quarto, sem conseguir chegar a uma conclusão - Ele vai querer me cobrar uma resposta de novo amanhã... é claro que vai. Mas eu não sei o que dizer! Não sei nem porque fiz aquilo!
- Ô Tadase, quer parar de ficar andando de um lado pro outro feito uma barata tonta?! - Kiseki interrompeu os pensamentos confusos do dono - Por que não me conta o que aconteceu? Talvez eu possa ajudar
- Não sei se você entenderia uma coisa dessas, Kiseki... não sei nem se consigo falar sobre isso, é embaraçoso demais - o loiro murmurou aflito. Lembrava-se claramente de tudo que havia feito no dia anterior, mas ainda não conseguia entender porque agira assim. Embora tudo tivesse começado com o desejo de Tadase de saber mais sobre o Valete, se tornarem mais íntimos, e de sentir que apenas conhecer seu segredo já não era mais o suficiene, em algum momento esse desejo misturou-se com a lembrança do sonho de dias atrás, e acabou resultando naquilo. Tadase só podia concluir que foi influenciado por aquele sonho estranho, e isso o levou a agir daquela maneira, mas não podia dizer isso para Nagihiko, já que não queria contar um sonho imoral daqueles ao Valete
- Vamos Tadase, me conte o que aconteceu!  - Kiseki insistiu, despertando-o mais uma vez de seus pensamentos - É pra isso que servem os Shugo Charas, pra ajudar os donos nas horas difíceis! Se você não me contar o que está acontecendo não vou poder te ajudar!
- Bem... está certo - Tadase finalmente deu-se por vencido, pensando que, na situação em que ele estava, qualquer ajuda era bem-vinda - Bom... tudo começou ontem, quando eu descobri que a Mashiro-san também ficou sabendo sobre o segredo do Fujisaki-kun. E ele não me contou que tinha falado sobre isso pra ela também. Então, bem... quando vi os dois falando sobre isso, me senti estranho... quero dizer, antes eu era o único que sabia disso, mas agora o Souma-kun e até a Mashiro-san já sabem. Talvez a Hinamori-san e a Yuiki-san também descubram algum dia... e eu não quero isso. Eu gostava quando era o único a saber da verdade... me fazia sentir... não sei, especial, eu acho. Mas agora sinto como se não fosse mais tão importante assim pra ele, entende? Como se tivesse sido... não sei, traído, eu acho... como se já não importasse mais
- Tadase - Kiseki chamou, alguns instantes depois de refletir - Você está com ciúmes...?
- O que?! P-Por que está dizendo isso Kiseki?? - ele se afastou alguns passos assustado, sentindo o rosto esquentar
-  Bem, é que... do jeito que você falou, parece que está com ciúme. Realmente não entendo muito dessas coisas, mas foi o que deu a entender... mas se for isso mesmo, você está certo, Tadase!
- Eu estou?! - ele indagou, entre supreso e confuso
- Claro que está! Que tipo de Valete é esse que nem sequer informa o seu Rei que o segredo dele foi descoberto por outra pessoa?! Ainda mais depois de você passar tantos anos guardando o segredo dele... francamente, que ingratidão! - Kiseki bufou, estufando o peito - Esse plebeu devia ser mais grato à você, é lógico que você é alguém especial! Você foi a primeira pessoa que descobriu a verdade sobre ele, e mais, é o Rei a quem ele deve obediência e fidelidade eternas! Se tem alguém culpado nessa história, esse alguém  é ele!!
- Não... acho que não é bem assim - Tadase discordou, sentindo uma onda de culpa invadir-lhe ao ver os papéis de culpado e vítima sendo invertidos dessa forma - Mesmo  que eu esteja certo quanto a isso, eu também tenho culpa no cartório. Por causa disso... e por causa de outras coisas, eu... fiz uma coisa com ele... algo que não deveria ter feito jamais... ele com certeza está com raiva de mim por causa disso
- Seja lá o que você tenha feito, foi merecido, você apenas castigou aquele Valete mal-agradecido, ora bolas!
- Mas Kiseki... eu fiz uma coisa realmente terrível. Mesmo se eu estiver certo quanto a isso, não justifica o que eu fiz com ele. E se você estiver certo no que disse antes... então significa que sou apenas egoísta
- Como assim egoísta?! - Kiseki indagou confuso
- Bem, é que... em primeiro lugar, eu fiquei chateado porque ser o único a saber a verdade sobre ele me fazia sentir especial. Mas a verdade é que não sou eu quem decido isso, o segredo é dele afinal, e não meu. Então é ele quem tem que decidir quem sabe ou deixa de saber a verdade sobre ele. Se eu realmente fiquei chateado ou com ciúmes por causa disso... significa que não passo de um garoto e mimado e egoísta
- Não diga isso Tadase, eu já disse que você tem razão em se sentir assim! - Kiseki exclamou alarmado
- O que só comprova que minha teoria está certa. Não me leve a mal, mas você geralmente é meio egoísta, Kiseki, e se o que  você disse é verdade... então só prova que isso é fruto do meu desejo egoísta de querer monopolizar um segredo que não é meu. Eu não posso mandar no Fujisaki-kun afinal, essa decisão quem tem que tomar é ele
- Ora francamente Tadase, não acredito que disse isso! - Kiseki exclamou ofendido - Aquele Valete lhe deve obediência cega depois dos anos que você passou guardando o segredo dele, você tem todo o direito de monopolizar a vida dele se assim desejar! E se está se sentindo culpado por causa disso... você é um pamonha mesmo!! - o pequeno Chara saiu voando pela janela aberta sem dizer mais nada
- Mais essa agora... preciso resolver as coisas com o Kiseki também, era só o que me faltava - Tadase suspirou cansado, observando seu Chara voar ao longe - Mas isso não resolve o assunto com o Fujisaki-kun... e nem cheguei a contar porque estava tão aflito no fim das contas. Por que eu fiz aquilo afinal... a única explicação que encontro é por causa daquele bentido sonho, mas  não entendo nem como fui sonhar uma coisa daquelas!! Droga... o que eu devo fazer afinal?

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Enquanto isso, na casa da Família Fujisaki...

- Tem certeza de que vai fazer isso Nagi?! - Rhythm perguntava atônito
- Certeza absoluta. Ele está me evitando, e com certeza vai enrolar o quanto for possível pra não falar desse assunto, então será melhor se eu o pegar de surpresa
- Isso é verdade, mas... perguntei se você tem certeza de que quer ir vê-lo vestido assim! - Rhythm apontou para os trajes que o dono vestia
- Tenho certeza sim. Não foi comigo que o Hotori-kun fez aquelas coisas afinal... foi com a Nadeshiko. Então será melhor que ela mesma resolva isso.

Nagihiko saiu de casa sem que ninguém o visse, tomando o cuidado de seguir por caminhos diferentes e ruas mais desertas para não ser visto por ninguém conhecido. Agora, estava com os cabelos presos em um rabo-de-cavalo, e usando roupas femininas. Vestia uma blusa branca com um casaco amarelo com rendas por cima e uma saia azul clara com babados. Tomara o cuidado de escolher uma saia longa dessa vez, afinal, não queria repetir o incidente do dia anterior. Logo chegou à casa da Família Hotori e, assim que abriram a porta e lhe deixaram entrar, rumou direto para o quarto de Tadase. Antes que entrasse, porém, sua mão paralizou antes mesmo que tocasse a porta. Não sabia como conseguiria arrancar uma resposta coerente do Rei, não sabia nem se teria coragem pra perguntar aquilo.

- Ei, Nagi! O que foi? Não vai entrar? - Rhythm perguntou
- Eu vou, mas... estou com medo... não sei se vou conseguir perguntar isso pra ele
- Bom... se é assim, então eu te empresto um pouco da minha coragem! Vamos fazer o Chara Change!
- Não!! - o garoto tranvestido sibilou assustado - Por favor Rhythm, não faça isso... não posso fazer o Chara Change numa hora dessas... além do mais, eu sou a Nadeshiko agora! Não posso o Chara Change com você!
- Ah é... você é a Nadeshiko agora - Rhythm falou como se tivesse esquecido que a pessoa ao seu lado estava usando roupas de menina - Bem, nesse caso... vamos descobrir o que aconteceria se a Nadeshiko fizesse o Chara Change comigo! Vamos nessa yay!!
- Não Rhy...!

Antes que pudesse detê-lo, antes que pudesse sequer completar a frase, Rhythm ativou o Chara Change. Nagihiko, ou melhor, Nadeshiko, abriu a porta sem pesnar duas vezes e adentrou o quarto do Rei com passos decididos.

- Fujisaki... san? P-Por que você... c-como...
- Tsukasa-san abriu a porta e me deixou entrar - a falsa garota respondeu a pergunta inacabada do Rei. Mesmo no Chara Change, sua voz ainda soava feminina, mas não chegava nem perto da voz meiga e delicada da dama perfeita que era Nadeshiko. Ainda que fosse feminina, sua voz estava mais decidida e mais forte agora, como a de uma mulher experiente que já passou por todo tipo de coisas na vida
- Ahn... certo - Tadase desviou os olhos, sem saber o que dizer - Então... p-por que você está...?
- ... assim? - Nadeshiko completou a frase para ele, apontando para o seu próprio corpo - Porque quem tem assuntos a tratar com você é a Nadeshiko, e não o Nagihiko. Por isso vim assim. Apesar de que você não deve estar muito contente né... a minha saia é bem longa hoje
- O que?! E-Eu não...
- Nee Hotori-kun, me responda uma coisa - ela o interrompeu - Por que você fez aquilo comigo ontem? Por que ficou me tocando daquele jeito, mesmo quando eu te pedi pra parar?
- E-Eu... eu não quero falar sobre isso! - Tadase recuou alguns passos, corando drasticamente
- Você me molestou - Nadeshiko o acusou - E acha que vai ficar por isso mesmo? Eu quero saber se você fez isso só porque é algum tipo de tarado inrustido ou se teve algum motivo relevante pra isso. E eu não vou embora daqui até você me responder. Posso passar o dia inteiro aqui, posso até dormir aqui se for preciso - ela cruzou os braços decidida - Além do mais, eu tenho o direito de saber. Foi o  meu  corpo que você tocou afinal de contas. Então essa pergunta é mais do que justa, não acha? Me responda, por que você fez aquelas coisas comigo??

Tadase forçou-se a encará-la enquanto tentava tomar coragem pra dizer alguma coisa. O que estava acontecendo com a pessoa diante dele afinal?! Essa manhã, parecia tão embaraçado quanto ele mesmo, e agora estava ali, fazendo aquelas perguntas constrangedoras! Daonde havia tirado coragem pra perguntar tudo aquilo afinal??

- Ahh... fones de ouvido - Tadase reparou nos fones ao redor do pescoço da falsa garota - É isso... você fez o Chara Change! Ah não, isso é mal... você nunca me escuta quando está no Chara Change...
- Ei, isso não responde a minha pergunta - ela falou, andando alguns passos na direção de Tadase, que tornou a recuar, até sentir suas costas baterem contra a parede - Diga de uma vez, por que fez aquelas coisas comigo?!

Nadeshiko avançou mais alguns passos. Como já estava encurralado contra a parede e não tinha mais pra onde fugir, Tadase fechou os olhos com força e se encolheu assustado.

- Ano nee Hotori-kun... se você precisa de um "incentivo" pra me responder, é só falar que eu te dou
- "Incentivo"...? - ele repetiu confuso, abrindo minimamente os olhos
- Sim, um incentivo - ela confirmou com um sorriso tão sugestivo que poderia ser confundido com o famoso sorriso pervertido de Ikuto - Por exemplo... se você responder minha pergunta e, dependendo se eu gostar da sua resposta... quem sabe eu não deixo você fazer aquilo de novo?

Nadeshiko levantou minimamente a saia, seu sorriso pervertido se alargando, e Tadase sentiu o queixo despencar diante do que ela estava fazendo. Seu rosto esquentou rapidamente, queimando como se estivesse em brasas.

- Hotori-kun... é disso que você gosta, não é? - ela perguntou, ainda sorrindo - Antes eu não tinha reparado, mas finalmente acabei notando... e não falo só de ontem. Quando estávamos nas termas você também ficou olhando pras minhas pernas, e também naquela vez em que você me viu usando roupa de líder de torcida, se lembra? Juntando tudo agora, faz mais sentido... você tem uma espécie de fetiche por pernas, certo? Eu devia ter percebido isso antes. Então, já que você gosta tanto disso, por que não responde a minha pergunta, e quem sabe eu não deixo você ter um pouco mais disso hein?
- E-Eu não... não posso... p-por favor pare com isso Fujisaki-san! - Tadase tentou desviar os olhos, mas era inútil, era como se eles fossem atraídos naquela direção por uma espécie de ímã invisível, de modo que Tadase ficava fixando sua atenção no chão do quarto, no pé da cama e nas pernas da Ex-Rainha, mudando de direção invariavelmente. Sentia-se surpreso e tremendamente envergonhado com a possibilidade de que aquilo que a falsa menina falou fosse verdade, e fez uma nota mental para mais tarde procurar a palavra "fetiche" no Google
- Ah, eu não paro não. Ontem eu também te pedi pra parar. Pedi várias e várias vezes. Mas você parou? Não. Agora aguenta - ela levantou um pouco mais a saia, na altura dos joelhos
- É sério, pare com isso!! - ele tornou a pedir, seu rosto rapidamente atingindo um tom escarlate - V-Você precisa parar, ou eu... eu vou acabar...
- Vai acabar se aproveitando de mim outra vez? - ela perguntou, erguendo uma sombrancelha - Já disse que posso deixar você me tocar de novo, dependendo da sua resposta. Então pare logo com essa enrolação, acabe com esse sofrimento e responda a droga da pergunta caramba!! Por que senão... vai ter que continuar aguentando as minhas provocações.

Ela levantou um pouco mais a saia, acima dos joelhos. Tadase não conseguiu evitar de olhar, mesmo que seu rosto estivesse queimando tanto que daria pra fritar um ovo na testa dele. Não entendia bem porque se sentia tão embaraçado agora, considerando que tinha feito coisas bem mais constrangedoras no dia anterior. E entendia menos ainda por que raios tinha feito tudo aquilo. Ainda assim, mesmo que ele não entendesse, precisava dar uma resposta, e rápido.

- E então? Vai me responder ou vou precisar arrancar essa saia fora? - Nadeshiko indagou impaciente, despertando-o de seus devaneios - Não entendo porque você está todo envergonhado agora, ontem você não parecia sentir vergonha nenhuma enquanto abusava de mim!
- Eu não... não quis a-abusar de você nem nada do tipo, eu juro!! - Tadase apressou-se a dizer alarmado - É só que... aquilo... eu não sei bem porque fiz aquilo... a-além do mais, você agindo assim de repente me deixa nervoso, é claro que qualquer um ficaria constrangido!
- É, eu também fiquei constrangida ontem, mas você não pareceu se importar nem um pouco com isso - ela comentou um tanto irritada - Sabe, Hotori-kun... não sei se você se deu conta disso, mas aquilo que você fez comigo ontem é uma coisa que só se deve fazer entre namorados. Por isso estou tão impaciente pra saber o motivo de você ter feito aquilo
- Entre... n-na-namorados? - Tadase repetiu perplexo, corando ainda mais, se é que isso era possível
- Sim, isso mesmo. Entende agora minha preocupação? - Nadeshiko falou - Nee Hotori-kun... vê essa marca na minha perna?  - ela levantou um pouco a perna esquerda, mostrando uma marca avermelhada acima do joelho - Foi você quem fez isso em mim. Claro que não é uma coisa que eu deva me preocupar muito, afinal, isso não dói nem nada, e as roupas escondem isso em problemas, sem falar que vai sumir em um ou dois dias. Esse é o mesmo tipo de marca eu eu deixei no seu pescoço uma vez, se lembra? Mas já chega de enrolação, eu já falei muito aqui. Está na hora de você responder a minha pergunta. Me diga de uma vez por todas Hotori-kun, por que você fez aquilo comigo?!

Tadase sentia-se como um vampiro entre a cruz e a espada. A única explicação plausível que ele via para isso era a que ele menos queria dar, já que não queria contar sobre aquele sonho comprometedor de jeito nenhum. Tentou pensar em alguma outra coisa para usar como justificativa, mas, para alguém que passou horas pensando nisso e não chegou a nenhuma conclusão, não era agora, em questão de segundos, que ele ia chegar. Seus olhos tornaram a girar na direção de Nadeshiko e viu que ela tinha erguido ainda mais a barra da saia, deixando parte das coxas à mostra.

- Não faça isso Fujisaki-san!!! - em um impulso, ele agarrou os dois braços da falsa garota, impedindo-a de levantar ainda mais a saia - Pare com isso... você é uma garota, não deveria ficar se mostrando assim!!
- Garota? - ela repetiu erguendo uma sombrancelha - Francamente Hotori-kun, de todas as pessoas, você é quem deveria saber melhor do que ninguém que não sou uma garota de verdade. Por que isso agora?
- Mas você é uma garota agora! Nesse momento você não é mais o Fujisaki Nagihiko-kun... é a Fujisaki Nadeshiko-san agora. Se está fingindo ser uma garota, e vestido como uma garota, então haja como uma! - Tadase exclamou, com o rosto queimando, sentindo seu coração bater tão forte que parecia que ia saltar pela boca. Ele respirou fundo numa tentativa inútil de se acalmar e, fitando o chão, continuou - Eu... sinto muito, mas não posso responder sua pergunta. Isso porque nem mesmo eu sei a resposta... não sei bem porque fiz aquilo. Apenas... quando te vi daquele jeito, eu... meio que parei de pensar por um instante... minha mente ficou turva e meus pensamentos embaralhados, nada fazia sentido... isto é... acho que fazia tanto tempo que eu não via a Fujisaki-san que... a-antes que me desse conta, comecei a ter desejos estranhos... simplesmnte senti vontade de fazer aquelas coisas... e fiz. Eu sabia que estava errado, podia ouvir uma vozinha na minha cabeça me dizendo pra parar, que o que eu estava fazendo era um absurdo, era desrespeitoso, e não estava certo... mas não conseguia mais parar. Era como se eu precisasse daquilo... como se dependesse daquilo pra sobreviver, como se fosse algo muito importante. Sei que, falando assim, parece um monte de bobagens... e eu realmente não posso te dar uma resposta muito clara... mas eu prometo à você que, quando eu conseguir entender isso, quando compreender o real motivo de ter feito o que eu fiz, eu irei correndo dizer à você. Eu sinto muito... se te ofendi ou se te magoei, a última coisa que iria querer é faltar com o respeito com você... não foi essa minha intenção, eu juro. Só que realmente não consigo entender porque fiz aquelas coisas. Simplesmente... senti vontade, como se estivesse sendo atraído por você por uma força misteriosa. Sei que isso não é uma resposta satisfatória... mas é a melhor resposta que posso te dar agora. E prometo que, quando eu entender o verdadeiro motivo de eu ter feito aquelas coisas, vou esclarecer esse assunto devidamente com você.

Nadeshiko afastou-se alguns passos, avaliando-o. Tadase estava se forçando a encará-la nos olhos, numa tentativa de reforçar sua seriedade quanto ao assunto. O rosto dele ainda estava muito corado, o coração pulsando dolorosamente, lutando contra sua caixa toráxica, batendo tão alto que era possível escutar suas palpitações agora que estavam em silêncio. Ele não podia estar mentindo... não sobre algo tão sério. Nadeshiko finalmente largou a barra da saia, que deslizou suavemente por seu corpo, cobrindo suas pernas, soltou um suspiro e, colocando as duas mãos na cintura, falou:

- Está bem. Isso realmente não explica nada... mas entendo o tipo de situação que você descreveu. Já passei por circunstâncias parecidas, e sei como é difícil lidar com esse tipo de coisa... então vou te dar um desconto dessa vez. Essa resposta me satisfaz por enquanto
- Verdade? - Tadase exclamou, mal acreditando que ela tivesse aceitado esse tipo de resposta evasiva - O-Olha, eu sinto muito mesmo por ontem... juro que não quis te ofender nem nada, eu juro!
- Você não me ofendeu - ela respondeu, encarando-o nos olhos - Me constrangeu, me assustou, me fez sentir coisas que não posso descrever porque você provavelmente não entenderia... mas não me ofendeu. Mas eu acho bom você entender logo porque fez aquele tipo de coisa comigo, porque essa resposta incompleta não vai me satisfazer pra sempre, entendeu? Eu ainda quero saber a verdade
- S-Sim, claro... assim que eu assimilar bem os fatos, vou te explicar tudo
- Ótimo. Espero que esse dia chegue logo - ela deu meia-volta, e já ia sair do quarto do garoto, quando lembrou-se de uma coisa - Ah sim, e outra coisa: Como essa sua resposta evasiva não me satisfez por completo, eu não vou deixar você me tocar de novo
- E-Eu nunca disse q-que queria fazer isso!! - Tadase apressou-se a dizer, o vermelho em sua face se intensificando
- Não precisa nem dizer, está na cara que era isso que você queria - ela falou, revirando os olhos - Mas você não vai ter isso agora. Tchauzinho, Hotori-kun... nos vemos na escola.

Ela deixou a casa da Família Hotori, e mal pôs os pés na rua, quando o Chara Change se desfez.

- Yay foi divertido! Fazer o Chara Change com o Nagi é legal, mas fazer com a Nadeshiko pode ser bem interessante também! Vamos repetir a dose algum dia yay! - Rhythm exclamou extremamente satisfeito, como se tivesse concluído uma árdua tarefa
- Rhythm... o que foi... que você me fez fazer??? - Nadeshiko agarrou o pequeno Chara entre as mãos, espremendo o pobre coitado entre os dedos
- Aieee!! Isso dói, Nagi! Quero dizer, Naddy! - o pequeno Chara debatia-se entre os dedos da falsa menina, tentando respirar - Qual é o problema, só te ajudei a arrancar a resposta do Tadase, não precisa se zangar!
- Nâo preciso me zangar?! - Nadeshiko repetiu exaltada, o rosto tingindo-se de vermelho rapidamente, com raiva e vergonha misturadas - Você me fez falar aquele monte de coisas terrivelmente comprometedoras pra ele seu cabeça-oca irresponsável!! E ainda me fez agir estranho... daquele jeito parecia até que eu estava tentando... t-tentando seduzí-lo ou coisa parecida... ahhh droga é tudo culpa sua Rhythm!!!
- E qual o problema?! Ele ainda se sentia tão culpado pelo que fez com você que nem se ligou nesse detalhe! Também né, pudera, é o maior pamonha...  - Rhythm argumentou revirando os olhos, ainda tentando se soltar - Além do mais, independente dos métodos... o importante é que você conseguiu sua resposta, não foi?
- Bem... sim... - Nadeshiko finalmente soltou o Chara, se acalmando aos poucos - Uma resposta incompleta e que não explica muita coisa... mas ainda é melhor do que nada
- Isso aí, assim que se fala! Então bola pra frente, desencana disso de uma vez e siga adiante yay! - Rhythm deu uma cambalhota no ar, erquendo o polegar com uma piscadela
- É... está certo. Não adianta ficar me preocupando com isso agora, o estrago já foi feito, e não vai mudar em nada mesmo - a falsa garota falou, tentando se conformar - Vamos Rhythm... vamos pra casa.

Ela tomou o caminho de casa, com o Chara cantarolando alegremente ao seu lado, ainda pensando em qual seria o verdadeiro motivo que teria levado Tadase a agir daquela maneira.