Yakusoku escrita por teffy-chan, Shiroyuki


Capítulo 13
Capítulo 13 - Sayonara, my friend


Notas iniciais do capítulo

Sayonara, my friend - SCANDAL
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Tadase sentiu a movimentação ao seu lado, de Nagihiko preparando-se para dormir. Fechou os olhos com força, sentindo o coração bater tremulamente. Abraçou o edredon, tentando regularizar a respiração, para que ninguém despertasse. Ele havia ouvido as palavras do valete, no entanto, não as compreendia. Nagihiko estava feliz em tê-lo beijado? E... ele gostava de Tadase? O que isso significava?

Confuso, o loiro virou um pouco a cabeça, espiando com o canto dos olhos o seu lado. Na penumbra da noite, com a luz parca da lua iluminando o ambiente, Tadase viu a figura encolhida de Nagihiko virada de costas para ele, respirando calmamente. Ele já estava dormindo, e se contraia no canto mais afastado do futon, tomando especial cuidado para não tocar despropositadamente no garoto.

O rei sentou, observando-o dormir ao seu lado. A face, costumeiramente serena, exibia um semblante perturbado, como se sentisse dor. Os cabelos longos que se espalhavam pelo travesseiro cobriam parte do rosto, misturando-se as lágrimas recém-derramadas, que começavam a secar.

Tadase sentiu um estranho baque na região do peito, ao ver o aspecto de angústia do seu amigo. Tomando cuidado excessivo para não fazer qualquer ruído, ele puxou seus cobertores, e com delicadeza, cobriu o valete, que estremeceu com o calor e aos poucos relaxou, suspirando baixinho enquanto ainda ressonava. Tadase não pode evitar sentir uma nova onda de afeição aquecendo seu ser. Era claro agora que ele não conseguia ficar bravo com Nagihiko, como supostamente deveria. Ele era seu amigo de infância, eles se conheciam há muito tempo. Eram quase como irmãos. Não havia motivo para levar a sério uma simples brincadeira entre amigos, em uma noite de festa. Tadase havia feito uma promessa, de ficar para sempre ao lado de Nagihiko, e iria cumpri-la até o fim, houvesse o que houvesse. Um incidente como aquele não ia apagar os anos de amizade entre os dois. E no final das contas, Tadase não se importava tanto assim em ter perdido seu primeiro beijo para Nagihiko.

Enquanto esses pensamentos sobrevoavam o pensamento do jovem rei, as palavras de Nagihiko voltaram a ecoar, fazendo Tadase titubear. De que sentimentos ele falava? O que era tão pesado, a ponto de fazê-lo sofrer dessa maneira? Por mais que tentasse, Tadase não conseguia chegar a uma conclusão satisfatória.

Fitou novamente o amigo, que não parecia ter notado a sua observação atenta. A luz da lua resplandecia na sua pele pálida, refletindo nos cabelos escuros, e fazendo as marcas causadas pelas lágrimas brilharem. O impulso de secá-las fez Tadase movimentar a mão na direção do rosto adormecido, mas ele se conteve, e retornou para trás. Inclinou-se para frente, ainda observando o garoto com olhar atento, mesmo que mal conseguisse distinguir suas formas no escuro. Viu o valete se virar ligeiramente, suspirando. Com o movimento, seus lábios entreabriram-se, tornando-se visíveis com a luz do luar. Tadase os encarou fixamente, lembrando-se da sensação macia e cálida de tê-los em contato com os seus. Inconsciente, ele colocou os dedos sobre os próprios lábios, fechando os olhos e recordando do efeito que aquele toque causou em seu corpo. Um arrepio percorreu sua pele, de cima a baixo. Assustado, Tadase recuou, com os olhos arregalados e o corpo trêmulo. No que raios ele estava pensando?!

Olhou ao redor, alarmado, observando os amigos que dormiam tranquilamente. Utau largada sobre seu futon sorria tolamente, como se estivesse sonhando com algo realmente empolgante, enquanto um filete de baba escorria do canto da boca. Kairi havia se esgueirado até o lado de Amu, e estava deitado no mesmo travesseiro que ela, com seus rostos a centímetros de distância. Ikuto roncava audivelmente, enrolado no seu cobertor, e abraçado a alguma coisa pequena e redonda como se fosse um ursinho de pelúcia, que logo Tadase identificou como sendo Rima, que mal podia respirar no aperto do garoto. Yaya e Kukai dividiam o mesmo futon, deixando o outro vazio, e a ás ressonava calmamente no peito do ex-valete, com os cabelos ruivos agora soltos cobrindo seu rosto.

Vendo toda aquela atmosfera etérea, com seus amigos todos em posições um tanto quanto curiosas, e aparentemente formadas a partir da organização do jogo maluco que Yaya propôs, Tadase teve uma súbita revelação da verdade. Aquilo tudo não passava de um sonho! Um longo, desvairado e muito bem formado produto da sua mente. As confusas palavras de Nagihiko, as lágrimas que ele derramara durante o sono, e aquele sentimento pesado no peito do rei, tudo isso era um devaneio causado por algum motivo externo. Poderia ser efeito colateral do chocolate quente, que parecia cada vez mais suspeito. Talvez até mesmo o beijo entre eles dois não passasse de uma ilusão de Tadase, fruto da sua imaginação, e amanhã, quando ele acordasse, tudo isso teria sumido, e não seria mais do que a lembrança remota de uma fantasia muito detalhada e complexa.

Firme em sua constatação, Tadase voltou a deitar, fechando os olhos. Confuso, ele sentiu aquele aperto novamente em seu peito. Colocou a mão sobre a região que apertava e se retorcia, sentindo as batidas dolorosas do seu coração pulsando sobre sua pele. Segurou a camisa com força, fechando a em punho, e se encolheu até ficar em formato de bolinha. Aquilo doía demais, mesmo que fosse apenas uma ilusão, como ele conjecturara.

Antes de cair completamente na inconsciência, e se entregar ao sono, um último pensamento se formou, indistinto e longínquo.

”Eu não queria... que fosse só um sonho”.






A manhã se fez presente, branca, fria e monótona. A neve cobria cada centímetro possível, deixando uma espessa camada de gelo sobre o peitoril das janelas da escola Seiyo. As árvores secas e sem folhas estavam cobertas por pequenos pingentes de gelo, que não derretiam, mesmo com a presença tímida do sol, escondendo-se nas nuvens pesadas. Era uma bonita atmosfera, porém naquela adiantada hora da manhã, de um Natal cheio de acontecimentos, não havia ninguém para apreciá-la. Dentro da escola, os jovens dormiam, alheios à paisagem matutina, encolhidos em seus cobertores e sonhando, cada um com seus próprios anseios e dúvidas.

Entretanto, entre eles, havia alguém já desperto, que fitava o teto de madeira com um semblante pensativo. O valete estava acordado há tempos, desde que o céu começou a dar os primeiros indícios de que estava clareando, e permaneceu imóvel, com o olhar vazio e desfocado, sem querer se concentrar nos próprios pensamentos, que certamente seriam de culpa e arrependimento. Não ousou olhar para o pequeno garoto que ressonava suavemente ao seu lado, mesmo que estivesse com vontade de fazê-lo. Ele sabia que se fitasse Tadase, mesmo que por poucos segundos, aqueles sentimentos todos retornariam em uma enxurrada, e ele não seria mais capaz de se conter. Tudo o que ele tinha a fazer agora era fugir, e longe de qualquer influência impulsiva, pensar com calma no que fazer, utilizando da sua razão e prudência. Antes disso, porém, teria que encontrar Rythm, que não era visto desde que saiu para comemorar o Natal com os outros Charas.

Sentindo o ar gelado da manhã invadindo, Nagihiko se destapou, só então percebendo que dividia o edredon com Tadase. Ele havia passado a noite inteira sendo aquecido pelo rei. De que maneira isso havia acontecido? Desconfiado, o valete fitou Utau, que dormia abraçada com um mangá de procedência duvidosa, e Yaya, roncando audivelmente com a perna jogada sobre o corpo de Kukai, que pendia para o lado completamente fora do futon. Certamente aquelas duas haviam aprontado mais uma vez, na tentativa tola de fazer o impossível.

Nagihiko afastou os pensamentos depressivos que o assolavam, e preparou-se para sair. Calçou as botas, levando em conta que ele havia dormido com as roupas que usara na noite anterior, e passou a mão nos cabelos desgrenhados, rapidamente colocando alguma ordem ali. Colocou o pesado casaco de inverno marrom escuro, e enrolou o cachecol azul-escuro no pescoço. Viu as luvas, que repousavam sobre ele, e as colocou, sentindo aquele maravilhoso calor que só podia vir dele, se espalhando pelo seu corpo.

Suspirou, sem resistir, e deu uma última olhada no motivo da sua agonia. Tadase, encolhido em um canto, dormia calmamente, os cabelos delicadamente caiam sobre o rosto claro e tranquilo, que mal se movimentava ao respirar. Ele era como um anjo, puro e branco. E Nagihiko maculou sua pureza, com seus desejos sujos e imorais, ao perder a razão e agir movido por impulso, como ele fez durante o jogo.

Sentindo a culpa finalmente se libertar e se espalhar rapidamente, Nagihiko se afastou, sem fazer um único ruído e se deslocou até o corredor, tomando cuidado excedente para não acordar ninguém em hipótese nenhuma. Ele não queria se encontrar e ter que se explicar para qualquer um deles. Tudo o que Nagihiko queria era chegar em casa, dormir por tantos dias quanto pudesse e só acordar no ano seguinte, quando tivesse que voltar para a escola.


Olhou ao redor, tentando detectar algum sinal do seu Shugo Chara, mas não havia nada. Colocou a mão no bolso, num ato-reflexo, apenas para senti-lo vazio. Rythm havia o alertado sobre com era perigoso andar com o ovo de Temari por aí, onde qualquer um pudesse ver, e por esse motivo, ela foi deixado em casa, em uma almofada especialmente feita para ela. Agora, Nagihiko se sentia um pouco solitário, enquanto andava pelos corredores frios e vazios da escola, sem seus companheiros costumeiros. Fitou novamente as luvas que cobriam suas mãos, sentindo seu dilacerado coração bater com força apenas com o vislumbre delas. Sorriu com melancolia. Seu coração era mesmo muito tolo, agitando-se daquela maneira com apenas um relance rápido da gentileza inata daquele garoto.

Saindo da escola, Nagihiko sentiu ar gelado da manhã saudando-o. Encolheu-se e aceitou de bom grado o vento cortante, andando rapidamente pelo caminho coberto de neve, onde seus pés, mesmo que postos nas grossas botas, afundavam-se a cada passo.

Sem querer ser detectado pelo zelador/ porteiro/ vigia-noturno/ diretor/ conselheiro/ antigo rei /cara que fornece o chá para as reuniões dos guardiões, Tsukasa, Nagihiko seguiu rapidamente e passou pelos portões, não sem antes lançar um último olhar significativo para a janela do andar onde provavelmente estavam todos ainda dormindo. Será que alguém estranharia sua saída repentina, ao acordar? Mais do que isso... o que Tadase sentiria ao notar sua ausência?

­­ ­­­­­­­­­­­— Alívio... certamente. – Nagihiko sussurrou para o nada, sentindo o peso das suas palavras esmagando os últimos resquícios de qualquer esperança que ainda podia ter sobrevivido escondida em algum lugar lá no fundo.

Andou por vários minutos, no silêncio e vazio absoluto da manhã, indo na direção da sua casa, até ouvir um chamado abafado e baixo, ao longe. Olhou para trás, sem nenhuma motivação, apenas para ver Rythm voando esbaforido na sua direção, quase em estado de desespero. Ele não notou que ele havia parado, então antes que pudesse refrear-se, bateu em cheio no peito do garoto e caiu, se afundando na neve fofa. Nagihiko o juntou, limpando o excesso de gelo. Rythm deu um pequeno e fofo espirro, e então olhou com seriedade para seu dono, quase como se o repreendesse.

­­ — Eeei! Nagihiko! Você ia me deixar para trás! – ele reclamou, depois de alguns poucos segundos para recuperar o fôlego.

— Me desculpe, Rythm – Nagihiko disse apenas, sem emoção alguma na voz. Rythm o analisou profundamente, antes de prosseguir.

— O que aconteceu? – indagou preocupado, sobrevoando a cabeça dele quando este começou a andar.

— Não aconteceu nada – ele usou o mesmo tom inexpressivo de antes, afundando as mãos nos bolsos do casaco.

— Eu sou seu Chara, Nagihiko, sei quando aconteceu alguma coisa. – Rythm insistiu – E mais do que isso, você é um péssimo mentiroso.

— Mesmo? Sempre achei que eu fosse bom nisso... – ele divagou, tentando parecer descontraído. A dor vazou pela voz, deixando transparecer aquilo que ele sentia, e Nagihiko mordeu os lábios trêmulos, sentindo que choraria se não se contivesse a tempo.

­— Não, você é o pior mentiroso que eu conheço – o pequeno disse, encarando diretamente o garoto – Um bom mentiroso é aquele que não sente remorso por mentir, e usa suas mentiras para se proteger ou para prejudicar algu, mas você, Nagihiko, só fere a si mesmo, e deixa a culpa o corroer por dentro, dia após dia. Eu não aguento vê-lo assim... Se dói tanto... por que você não conta a verdade logo de uma vez?

— Não é meu segredo que está me machucando dessa vez, Rythm... – Nagihiko sorriu fracamente, surpreso por seu Chara ter errado dessa vez.

— E não era do seu segredo que eu falava. Eu estou dizendo para você contar a verdade para o Hotori. Você deve dizer a ele o que sente, Nagi! Essa é a única maneira de se libertar desses sentimentos! É a única maneira de você ser verdadeiramente feliz, e como seu Shugo Chara, isso é tudo o que quero para você.

­— Eu não vou forçar meus sentimentos dessa forma apenas para me sentir melhor, Rythm! Não mesmo! – Nagihiko se exaltou, sem se lembrar do fato de que ele certamente pareceria muito bizarro gritando com o vazio da rua no meio de uma manhã de inverno – Essas coisas que eu sinto... elas só trarão problemas para o Hotori-kun. A culpa é toda minha, eu sou quem deve arcar com as responsabilidades.

— Bem... uma parte da culpa é dele sim, por fazer você se apaixonar, não é? – Rythm pronunciou, prático como sempre, e Nagihiko corou, voltando a andar – E mais... você nunca pensou na possibilidade dele... corresponder aos seus sentimentos? – perguntou, inocentemente.

­­— Isso não é possível. De maneira nenhuma – Nagihiko negou veementemente, com um olhar triste – Você tinha que ver o semblante de pavor no rosto dele, quando eu fiz aquilo... e ele saiu correndo, com medo de mim certamente, depois do beijo...

­— B-beijo? – Rythm arquejou, arregalando os olhos, enquanto voava agitado na frente do rosto de Nagihiko. O valete o espantou para o lado, como se faz com uma mosca, e desviou o olhar, constrangido.

­­ — Pensei que soubesse de tudo o que acontecia comigo...

— Eu falava dos sentimentos! Não das coisas... físicas... – Rythm corou também, parecendo repentinamente, muito mais com um garotinho inexperiente do que aquela sua pose legal e confiante de sempre. Shugo Charas também deveriam ter seus lados escondidos – Eu não posso ajudar com isso... Acho que a Temari lidaria muito melhor com essas.... coisas... do que eu!

­— Sim.. – Nagihiko voltou o olhar para o chão, pensativo – Ela certamente teria um bom conselho para mim, nessas horas.

Sem dizer mais nenhuma palavra, Nagihiko rumou para sua casa, que agora estava há poucas quadras de distância. Adentrou os enormes portões, com Rythm em seu encalço, e atravessou o jardim, coberto pela camada branca assim como o resto da cidade. A fonte de água estava congelada, sem o costumeiro ruído de água em movimento, que era tão relaxante.

Nagihiko subiu pela varanda, rodeando a casa, enquanto imaginava se seus pais estariam ainda dormindo. Que horas da manhã eram agora? Empurrou a porta, verificando que estava aberta, e encontrou sua mãe logo depois de entrar. Ela estava em uma das salas, fazendo arranjos florais, concentrada e calma.

­­— Tadaima, okaa-san – Nagihiko disse, apressando-se para ir até seu quarto e realizar o plano improvisado de dormir até o fim do mundo, ou até o início das aulas, o que viesse primeiro.

­­— Okairinasai, querido... ei, espere! Volte aqui – ela falou, e Nagihiko retornou, tentando não demonstrar a má vontade – Como foi sua festa de Natal na escola? – a mãe indagou, interessada.

— Foi muito bem – Nagihiko mentiu esplendidamente bem, até mesmo lançando um sorriso animado depois disso. Ouviu Rythm resmungar algo, ao longe. – Yuiki-san tem muito talento para planejar boas festas.

— Que bom que se divertiu, filho – a Sra. Fujisaki sorriu para o garoto – Agora, eu tenho algo para tratar com você – disse, deixando o arranjo de lado, e Nagihiko se ajoelhou em frente à mesa baixa, prestando atenção – Logo será ano-novo, e você sabe que nossa família costuma comemorar essa data tradicionalmente. Porém, esse ano, recebemos um convite irrecusável, de um amigo do seu pai, e por esse motivo, estaremos indo até um hotel de fontes termais na cidade vizinha, passar o ano-novo lá. Você fez algum plano com seus amigos esse ano?

— Nenhum – Nagihiko respondeu automaticamente, pensando no quanto aquilo era conveniente naquele momento. Nada melhor do que uma viagem para clarear as ideias e acalmar os nervos, e mais ainda se for para uma onsen.

­­— Perfeito! Prepare-se para sair amanhã logo cedo. – a mãe de Nagihiko sorriu exultante, voltando a atenção para seu arranjo de flores.

Nagihiko se levantou, pedindo licença, e andou até o quarto, onde Rythm já o esperava, sentado ao lado do ovo lilás idêntico ao seu azul.

­­— Nós iremos viajar amanhã, Rythm. Espero que não tenha nenhum compromisso com os Shugo Charas até o ano que vem...

­— Mesmo que fosse esse o caso, eu não o deixaria sozinho logo agora, Nagi – Rythm sorriu solidário, e Nagihiko acariciou sua cabeça, enquanto tocava com a outra mão o ovo quente e silencioso, que não reagiu ao toque. Quando é que Temari voltaria para sua vida? Ela estava fazendo tanta falta agora...







Logo após o almoço, no qual mal tocou na comida, Nagihiko saiu, andando sem rumo certo pelas ruas ao redor da sua casa. Rythm se recusou a ficar para trás, e seguiu o garoto, fielmente, por todo lugar onde ele andou. Talvez fosse algum instinto inconsciente, mas seus passos o levaram até o parque onde ele brincava durante a infância. Com Tadase.

Com um buraco abrindo-se em seu peito, as lembranças o invadiram sem pedir licença, arrastando tudo em seu caminho e se espalhando-se dolorosamente rápido. Rythm percebeu que o dono precisava ficar sozinho agora, e correu até o escorregador, deslizando pela superfície congelada um uma espécie de snowboarding em miniatura. Nagihiko limpou a neve de um dos balanços próximos e se sentou, quase desejando não ter saído de casa. Balançou levemente o mesmo, mantendo os pés firmes no chão enquanto os pensamentos voavam para longe.

­­— Você parece deprimente demais. É melhor mudar essa cara, ou então as pessoas que passarem por aqui começarão a chorar só de olhar para você. – uma voz ríspida e dura soou ao seu lado. Nagihiko levantou os olhos, notando a figura, que era mais baixa que ele mesmo estando sentado. O corpo diminuto estava todo coberto por um enorme casaco branco e rosa, e a única coisa que se via além disso eram os cabelos ondulados e loiros e algumas sacolas nas mãos. Os olhos dourados transmitiam tédio mortal e desprezo profundo, como sempre.

­­— Ah, é você Rima – Nagihiko pronunciou, sem nenhuma surpresa na voz. Quem mais falaria com ele naquele tom, se não a Rainha mal-humorada?

­­— O que está fazendo aqui? – ela indagou, sem parecer verdadeiramente interessada na resposta. Kusu-kusu riu, acenando para Nagihiko e voou rapidamente para onde Rythm brincava, deslizando junto com ele, e dando divertidas gargalhadas.

­— Quem deveria fazer essa pergunta sou eu. Você não mora do outro lado da cidade? O que está fazendo por aqui? – Nagihiko rebateu, enquanto a garota limpava desajeitadamente o balanço do lado e sentava-se, com as inúmeras sacolas de papel no colo. Seus pés ficaram flutuando do chão, e ela começou a se balançar levemente, mesmo sem querer.

— Eu vim fazer compras... – ela indicou as sacolas discretamente, e voltou a olhar para o valete – E você? Por que sumiu tão de repente hoje de manhã? Yaya tinha preparado um enorme café-da-manhã. Muito esperto da sua parte, fugir para não precisar ajudar a limpar a escola depois.

­— Me desculpe, e prometo que vou recompensar por isso depois. Posso ficar até mais tarde em outro dia, ou algo assim... é que.. eu só precisava ir embora sem falar com ninguém, só isso. – ele explicou, sem nem saber o certo por que falara aquelas coisas.

— Isso tem algo a ver com aquele beijo com o Hotori-kun? – Rima perguntou, com a voz tão baixa que mal passava de um sussurro. Seu rosto corou levemente, com a citação a um fato tão constrangedor. Nagihiko também sentiu seu rosto esquentando, e desviou o olhar para os próprios pés, que se movimentavam compassadamente para frente e para trás, firmes no chão. A falta de resposta foi a confirmação que a garota esperava. Ela fitou as sacolas em seu colo, e então voltou a olhar para o garoto ao seu lado – Como eu pensei... – ela divagou, adquirindo logo após isso, um semblante determinado. Olhou decididamente para Nagihiko, e sem hesitar, bradou – Tem algo que eu preciso contar a você!





Tadase andava apressado pela calçada, com a encomenda de flores que sua mãe havia feito nas mãos. Era difícil se concentrar no caminho com todas aquelas plantas nos braços, e o frio cortante que machucava suas mãos. Ele se encolheu nos casacos, ajeitando o cachecol vermelho do pescoço para que cobrisse também suas orelhas, que se congelavam e ardiam. Sentiu o tecido macio acariciando sua pele, e o aquecendo. Era o presente de Nagihiko... esse pensamento fez o loiro corar, enquanto aumentava a velocidade e abraçava as flores com mais força.

Tentando espairecer os pensamentos confusos, ele olhou ao redor, tentando prestar atenção na paisagem de inverno. Aquela rua, pela qual ele não passava há muito tempo, o fez sentir uma sensação familiar. Olhando com mais atenção, ele logo identificou o parque onde brincava quando criança, e certamente era a fonte do sentimento de recordação remota.

Sentindo-se repentinamente muito nostálgico, o garoto se encaminhou na direção do parque, apenas para vê-lo por alguns minutos antes de seguir seu caminho. Porém parecia que outras pessoas tiveram a mesma ideia que ele, pois os balanços do parque já estavam ocupados, por duas figuras que rapidamente Tadase reconheceu. Seu coração deu um doloroso salto, impelindo-o a continuar. Ele andou suavemente, sem fazer ruído algum, e se ocultou atrás dos arbustos, que agora eram apenas um emaranhado de galhos secos, e bem fechados, que o mantinham muito bem escondido. Ele nem mesmo sabia o porquê de estar agindo de maneira tão suspeita e estranha, mas intimamente, sentia aquela necessidade quase desesperada de saber o que Nagihiko e Rima estavam fazendo sozinhos naquele parque.

Espreitou acima dos galhos, com os olhos carmesim fixos na figura do valete, que fitava Rima com especial atenção. Segurou com força as flores em suas mãos, e ainda agachado, apurou os ouvidos, tentando entender o que diziam.

­— O q-que você disse, Rima? – Nagihiko parecia muito espantado, com o rosto ruborizado. Rima o encarava diretamente, de costas para o lugar onde Tadase se escondia.

— Exatamente o que você ouviu! – ela bradou, nem um pouco abalada, embora seus ombros tremessem levemente. Ela apertou as sacolas que tinha no colo com as mãos envoltas em fofas luvas cor-de-rosa, nervosamente, e fechou os olhos com força, tentando parecer mais tranquila e segura do que de fato estava – Eu gosto de você, seu valete estúpido! É isso!

Tadase arquejou, sentindo seu peito ferver e se agitar, de maneira tão dolorosa que ele teve que desviar o olhar por alguns segundos. Aquilo era uma confissão! Uma declaração de amor! E de dois dos seus amigos, ainda por cima. Era a primeira vez que Tadase presenciava algo desse tipo em sua vida. Com o rosto em chamas, ele se rendeu a curiosidade, e voltou a espionar, repentinamente muito interessado na reação de Nagihiko. Como ele responderia a isso?

Nagihiko parecia atordoado, perdido e sem ação. Sua boca entreabriu-se para dizer algo, mas nenhuma palavra saiu.

­­— Você não precisa responder, se não quiser. Na verdade, eu até mesmo já sei sua resposta. E também, não é como se eu quisesse sair com você! – ela disse, tão baixo que Tadase não conseguiu ouvir.

Ele se aproximou mais dos galhos que o escondiam, tentando ouvir os sussurros da garota. “Ela disse algo sobre ‘sair com você...’. Isso significa que ela e Nagihiko irão começar a namorar?” Bem... isso era mais do que natural, considerando que ela havia acabado de se declarar para ele. Então por que parecia tão errado... era tão doloroso, se quer pensar nessa possibilidade?

Tadase não aguentou ficar ali por muito mais tempo, e sabia que o correto era deixar Rima e Nagihiko a sós, onde poderiam usufruir de sua privacidade e... fazer as coisas que os namorados devem fazer, seja lá quais forem elas. Levantou-se, ainda tomando cuidado para não ser detectado, e deu as costas para o casal de guardiões.

Sentindo seu peito apertado, Tadase nem mesmo sabia para que lado estava andando, só sabia que queria sair dali o mais rápido possível. A imagem de Nagihiko e Rima voltou a aparecer em sua mente. Eles ficavam bem juntos. Embora o fato de Rima estar o tempo todo implicando com Nagihiko deixar Tadase confuso, as palavras dela eram indubitáveis. Ela o amava.

Eles sairiam juntos, começariam a namorar. Rima e Nagihiko andariam de mãos dadas embaixo das cerejeiras. Ela daria comida na boca dele, e os dois ririam juntos de alguma brincadeira boba. Ele daria seu casaco a ela nas noites de frio, e eles veriam a chuva cair, juntos, em algum lugar aquecido. Nagihiko... iria beijá-la... daquela mesma maneira que ele fez com Tadase. Só que dessa vez, estaria certo. Rima era uma garota, e Nagihiko um garoto. Eles poderiam ficar juntos para sempre, perfeitamente bem.

Um dia, Nagihiko compraria uma aliança, e pediria Rima em casamento. Ela ficaria feliz, e com um lindo vestido branco, entraria em alguma igreja, onde Nagihiko a esperaria. Eles sairiam de lá casados. Será que Tadase seria convidado para padrinho?

Anos mais tarde, Nagihiko poderia ser visto com um bebezinho no colo, brincando com ele naquele mesmo parque. O bebê teria as feições delicadas e serenas do pai, com os cabelos escuros e sedosos... ou então teria o rosto redondo da mãe, os cabelos esvoaçantes e dourados. Seria uma perfeita mistura dos dois, e certamente muito fofo...

Tadase balançou a cabeça, colocando ordem nos pensamentos. No que ele estava pensando??? Aquilo era loucura! Colocou os dedos gelados na testa, apenas verificando se não estaria por acaso febril. Que tipo de hipóteses desvairadas e sem nexo sua mente estava criando? E... por que elas pareciam tão dolorosas?

­­— Isso é tão ruim... – Tadase sussurrou para si mesmo, apertando a mão sobre o peito, na região do coração. Algo se alojara ali, era desagradável, angustiante, e deixava Tadase sem saber como agir ou o que pensar. O que seria?





Nagihiko fitava a pequena loira com surpresa, sem saber nem mesmo no que pensar. Como assim, ela gostava dele? Não havia como! Rima era sempre tão desagradável, irritante e irônica com ele, o tempo todo... Ele a olhou novamente, tentando detectar algum sinal de que aquilo não passava de uma brincadeira de muito mau gosto. Embora ela sustentasse a pose altiva e orgulhosa, seus olhos transpareciam uma tímida e reprimida expectativa, esperando que ele dissesse algo.

­— Você não precisa responder, se não quiser. – ela disse, subitamente, desviando o olhar – Na verdade, eu até mesmo já sei sua resposta. E também, não é como se eu quisesse sair com você!

Um barulho vindo da direção dos arbustos pode ser ouvido, sobressaltando a garota. Algo como passos duros e rápidos, se afastando ao longe. Deveria ser algum gato, ou algo assim.

— Rima, eu... sinto muito. Não posso corresponder aos seus sentimentos... – ele disse incerto, usando um tom culpado e hesitante. Fitou o chão, sentindo-se terrível por dentro. Por mais que Rima fosse um pouco incômoda e sarcástica às vezes, ele não desejava machucá-la. Ela era sua amiga e ele sabia exatamente o que ela sentia agora. Era uma situação muito parecida com a que ele também passava. Ele resolveu acabar com aquilo de uma só vez, sendo verdadeiramente sincero com seus sentimentos – Tudo o que eu posso oferecer a você é a minha amizade, e nada mais. Eu gosto de outra pessoa, me desculpe.

Rima riu fracamente, levantando o olhar.

­­— Você acha que eu sou idiota? É claro que eu já sabia disso! – ela tentou parecer tranquila, mas seus olhos ainda estavam distantes do ideal – Eu me confessei sabendo exatamente o que você diria. Eu nunca quis que você realmente me correspondesse. É egoísmo da minha parte, sei bem disso, mas eu só queria que você soubesse, só isso.

Nagihiko suspirou, deixando seus ombros caírem. Rima começou a se balançar com mais velocidade, e seus cabelos voaram para frente do rosto, escondendo as lágrimas teimosas que insistiam em cair. Disfarçadamente, e torcendo para que Nagihiko não notasse, ela as enxugou, enquanto ia e vinha no balanço.

­­— Nós... ainda podemos ser amigos, não podemos? – Nagihiko indagou, sentindo-se um pouco culpado.

­— Sim, claro – Rima finalmente parou de se balançar, perfeitamente recomposta – Até por que, eu estou curiosa para saber o desfecho da sua história de amor.

— H-história... de amor?? – ele refreou-se, olhando alarmado para Rima.

— Pode parecer estranho... mas apesar de gostar de você, eu não quero realmente estar ao seu lado, como namorada – Rima corou com a palavra, mas prosseguiu – Estou torcendo para que o seu amor dê certo, e você possa ser feliz, Fujisaki. Mas antes disso... é necessário que o Hotori deixe de ser tão pamonha e perceba de uma vez o que acontece!

Nagihiko quase caiu do balanço, com o susto que as palavras de Rima causaram.

— Do que você está falando!?! – ele se exaltou, corando, e Rima riu muito mal disfarçada da cara engraçada que ele fazia.

— Como eu já disse, eu não sou idiota. É verdade que eu não havia percebido antes... mas depois que eu li aquele mangá que a Hoshina Utau me deu no Natal, tudo passou a fazer muito mais sentido.

O valete teve vontade de chorar, ao perceber que Utau havia conseguido corromper mais uma mente inocente para o lado fujoshi da força. Olhou desconfiado para as sacolas que Rima trazia seguras no colo.

­­— Rima-chan... o que você veio comprar aqui? – ele indagou, cuidadosamente. Rima corou até as orelhas, e abraçou as sacolas com força.

Nagihiko não se segurou, e as pegou com facilidade, sem nem notar a força que a garota fazia para mantê-las consigo. Abriu a primeira sacola, tirando dela um pacote, com vários livros. Observou com cuidado o primeiro. Na capa, um homem de cabelo preto abraçava pelas costas outro homem, de cabelos longos e claros e óculos redondos, enquanto claramente tentava tirar sua camisa. O número embaixo no título indicava que aquele era o volume 5. O rosto de Nagihiko atingiu vários tons de vermelho, e ele soltou o mangá, como se este desse choque, fitando com repreensão a garota ao seu lado.

— Eu precisava saber o que acontecia na história, por isso comprei todos os volumes... – ela argumentou, com displicência, como se isso resumisse – Eu vim até uma loja longe da minha casa, afinal, não poderia ser reconhecida enquanto os comprava, não é mesmo?

— E precisava mesmo comprar DVD’s, doujinshis, artbooks e figures? – ele enumerou os itens contidos nas sacolas de compra, balançando o bonequinho de ação de um dos personagens, com orelhinhas de urso e um jaleco de laboratório – Você andou caminhando por Akihabara, enquanto comprava todas essas coisas, Rima?! –ele indagou alarmado, tentando encaixar a imagem de Rima junto com todos aqueles otakus de óculos e mochilas que andavam por aquela rua. Simplesmente não era concebível!

Rima avançou contra as sacolas, tirando-as das mãos do valete, e as abraçando. Puxou também o figure, colocando-o de volta na sua caixa.

­— Eu gostei muito da história, e daí? – ela resmungou – Você também deveria ler... é muito interessante...

— E sobre o que fala a história?

Rima olhou fixamente para o chão durante um segundo. Seus olhos brilharam perigosamente, enquanto uma estrela e uma gota verdes surgiam nas suas bochechas. Ela sorriu brilhantemente, olhando para Nagihiko, que tinha uma gota descendo pela cabeça.

­— Kyaaaah!!! É tão lindo!!! – ela explodiu como um foguete, repleto de empolgação. Soltou as sacolas, pulando no mesmo lugar para falar – Você tem que ler Nagi!!!

­— Nagi? – ele arqueou uma das sobrancelhas com o repentino apelido, indignado pelo fato de um mangá yaoi ter ocasionado o chara change de Rima.

— A história é tão inspiradora! É sobre um homem que é apaixonado pelo senpai dele! E o senpai é muito mal-humorado, e não gosta de gays... Um dia o senpai toma uma bebida estranha... e é a oportunidade para ele se aproveitar! Mas ele fica hesitante, afinal... como ficaria o relacionamento deles caso acontecesse? E é assim tão impossível que esse amor se realize...? – Rima gesticulava amplamente, variando os tons e agindo como uma narradora de filmes da sessão da tarde. Nagihiko notou algo de familiar naquele pequeno resumo, porém, resolveu não ligar muito, ou acabaria pirando. Folheou algumas páginas do mangá que estava mais acima na sacola, sem prestar muita atenção, até que uma página em específico o alarmou. Ele a abriu, corando furiosamente até a raiz dos cabelos. Rima riu com vontade, ao notar a reação do garoto. A página em questão era de uma das cenas de lemon do mangá.

— E-então... é assim que acontece... – ele balbuciou incrédulo, com o rosto pegando fogo. Fechou o mangá com rispidez, colocando-o novamente no lugar, e não olhou mais naquela direção.

— O que foi, Naaaaagi? – Rima o fitou com perspicácia, sorrindo maliciosamente – No que você estava pensando, hein?

— Rima, pare com isso, você está começando a me assustar... – Nagihiko disse, imaginando se seria válido sair correndo agora. Que tipo de garota faz insinuações desse tipo ao garoto que acabou de se declarar?

Um pequeno barulho similar a sinos soou, e os desenhos no rosto de Rima sumiram. Ela adquiriu novamente o ar taciturno, e sentou com dignidade no balanço. Para completar a cena, só faltava um gole de chá.

— Você já decidiu o que vai fazer? – ela indagou de repente, como se o episódio com o chara change nunca tivesse acontecido.

— Sobre o que?

— Sobre o Hotori, claro. Você o beijou, ontem à noite, e ele certamente ficou abalado. É a sua chance de se declarar. Ele pode entender, e aceitá-lo. Ele pode sentir o mesmo por você! Nunca se sabe que se passa na cabeça das pessoas...

— Mas... é impossível que ele goste dessa maneira de mim. Impossível.

— Você também devia achar que era impossível eu gostar de você, não é? – a rainha disse – As pessoas podem te surpreender...

— É diferente... – ela suspirou, apreciando as tentativas de Rima de encorajá-lo – E além do mais... a maneira como ele reagiu ontem, deixou bem claro que ele quer se afastar o quanto antes de mim.

— Eu não acho isso. – ela rebateu, altivamente – Hoje de manhã... Tadase se preocupou muito quando acordou e não o viu ao seu lado. Na verdade, ele quase entrou em desespero... queria ligar para você, para seus pais, e quase saiu porta a fora para procurar por você. Por sorte Ikuto o segurou, e todos o convenceram de que você provavelmente já estaria seguro em casa, considerando que Rythm também tinha ido embora.

— Ele... fez mesmo isso? – ele murmurou, sem acreditar. Encerrou-se novamente em seus pensamentos, um tanto confuso.

— Eu acho que tenho que voltar para casa. – ela disse repentinamente, como se fosse a coisa mais natural do mundo.

— Para ler esses mangás enquanto enche a cara de chocolate quente? – Nagihiko supôs, e Rima mostrou a língua, sem mais argumentos válidos ou um comentário ácido para dizer. Virou-se, chamando por Kusu-kusu, e as duas se apressaram na direção oposta, com Rima carregada com suas várias sacolas.

Nagihiko a viu se afastar e também se levantou, indo para casa. Ainda tinha que organizar suas coisas para a viagem, e isso certamente tomaria seu tempo e sua atenção, e era disso que ele precisava no momento: uma distração.







Depois de entregar as flores para a mãe, Tadase, ainda sentindo-se agitado por dentro, foi direto para seu quarto, sem dizer nada a ninguém. Kiseki o viu entrar esbaforido porta adentro, e se jogar sobre a cama, cobrindo-se até a cabeça, e não ousou dizer nada. Ele havia sentido que seu dono estava atordoado desde a noite anterior, porém, como ele não havia o procurado pedindo por ajuda, ou dito qualquer outra coisa a esse respeito, Kiseki achou por bem deixá-lo a sós por um momento, para organizar seus pensamentos, e se isso continuasse, ele interferiria.

Tadase, mal cobriu sua cabeça, se rendeu ao sono. Ele não estava acostumado a dormir tão tarde como havia feito na noite anterior, e todos aqueles sentimentos conturbados eram muito para ele. Exausto, ele dormiu.



Que lugar brilhante e esplêndido era aquele? Coberto de flores por todos os lados, havia um corredor único e vermelho, que levava até um altar. Tadase estava posto ao lado do altar, e esperava ansiosamente. Os assentos onde deveria haver convidados estavam completamente vazios, mas isso não parecia estranho, de maneira alguma. A porta se abriu em um rompante, e uma silhueta, usando um enorme vestido branco, cheio de babados, fitas e bordados, com um véu na cabeça surgiu, segurando um bouquet de rosas vermelhas nas mãos cobertas por delicadas luvas até acima dos cotovelos.

Tadase viu a figura se aproximando, um passo de cada vez, e olhou para o lado. Do outro lado do altar, Nagihiko sorria exultante, esperando pela noiva. Olhava para ela com os olhos brilhando de emoção, e então fitou Tadase, com um sorriso de gratidão. O loiro sentiu um aperto estranho no coração, e olhou novamente para noiva. Agora, seu rosto estava reconhecível. Era Mashiro Rima.

Ele sentiu desespero, que aumentava a cada passo que Rima dava em direção ao altar. Queria poder dizer alguma coisa, qualquer coisa, mas nenhuma palavra saia de seus lábios. Angustiado, ele viu Nagihiko ir ao encontro de Rima, e os dois seguraram as mãos um do outro. Rima sorria suavemente, com os cabelos loiros presos em um coque atrás da cabeça, e algumas mechas soltas emoldurando o rosto. Nagihiko, com aquele fraque branco, parecia ainda mais elegante e notável, quase como se estivesse brilhando, e Tadase não conseguia tirar os olhos dele, mesmo que continuasse a sentir aquela aflição inexplicável.

Subitamente, seu ponto de vista mudou. Ele não estava mais vendo a cena de fora. Sua visão estava coberta por um fino véu branco, e do outro lado dele, Nagihiko sorria magnificamente, segurando com força as mãos de Tadase nas suas. Seu coração deu um salto, agitando-se mais do que imediatamente. Tadase olhou em volta e para si mesmo. Não havia sinal de Rima, e ao invés disso, Tadase era quem usava o vestido de noiva. Sentia o calor do corpo de Nagihiko, tão próximo do seu, e seu coração se aqueceu com aquela proximidade. Era ele quem Nagihiko olhava agora. Era para ele que Nagihiko sorria. Era por ele que Nagihiko estava aqui. Essas constatações deixavam Tadase extasiado. Isso era tudo o que ele queria.

Nagihiko se aproximou, ainda sorrindo, perfeito como sempre, e afastou delicadamente o véu dos olhos de Tadase. Ele sentiu seu corpo estremecer com a eminente aproximação. Nagihiko acariciou o rosto de Tadase, segurando-o pela cintura, e se inclinou na sua direção. Tadase entreabriu os lábios, lançando os braços ao redor do pescoço dele, e então...

— Tadase, onde você está?! Vem aqui! – ouviu o chamado da mãe ao longe, e sentou na cama, sentindo-se atordoado. As imagens distantes de um sonho recente se formavam em sua mente, aleatoriamente, mas não faziam sentido algum. Ele colocou a mão na cabeça, sentindo o coração batendo alto e ligeiro, quase saindo para fora do peito. Seu corpo ainda estava trêmulo, com a expectativa de algo que não aconteceu. Ele se assustou, colocando as mãos sobre os lábios como um reflexo, apavorado, quando enfim as imagens se organizaram.

­— O que... o que foi que eu sonhei?!?





O carro estacionou, em frente a uma pousada pequena e antiga, no pé da montanha. Sua arquitetura antiga e tradicional pareciam saídos de um seriado de época da TV. Ao redor, só havia o céu, a montanha e a floresta, e nada mais. Nagihiko respirou fundo, sentindo o ar puro entrar em seus pulmões, e seguiu seus pais até a entrada, onde uma bondosa senhora de kimono os esperava.



Depois de conhecer seu quarto, e colocar o yukata da pousada, que era azul e cinza, Nagihiko resolveu andar pelo lugar, a procura de algo para distrair sua mente. Havia decidido, durante a viagem, que iria se livrar de tudo aquilo que pesava em seu coração. Nem que para isso, tivesse que abrir mão do seu amor por Tadase. Aquilo já havia passado a muito tempo dos limites aceitáveis, e estava na hora de Nagihiko encarar a realidade. Ele jamais seria correspondido, e estava cada vez mais difícil ficar ao lado de Tadase sem se conter ao máximo. Eles seriam para sempre apenas amigos, e isso era o máximo que Nagihiko podia esperar. Se não se livrasse dos seus sentimentos logo, nem mesmo isso ele teria.

Nagihiko vagou pelos corredores, com Rythm sempre voando ao seu lado. Ele havia arrumado um pequeno yukata, do seu tamanho, sabe-se lá aonde, e agora parecia muito mais com um Shugo Chara da Era Edo, do que o jogador de basquete em miniatura que era, embora se recusasse a tirar a touca branca e os fones de ouvido, o que o transformava em uma mistura bizarra de elementos.

Os pais de Nagihiko estavam nas fontes termais, relaxando, já que a viagem havia durado a manhã inteira e mais metade da tarde. Ele voltou para seu quarto sozinho e sem ideia do que fazer.

Foi para a sacada do quarto, escorando-se e observando o céu mudar de cor, de laranja para vermelho, e então rosa e lilás. Seus pensamentos vagaram indistintos, e ele acariciou o Shugo Tama de Temari, que trouxe junto. Ele ainda estava aquecido, e isso era um alívio.


Pensou nas palavras de Rima, no dia anterior. Mesmo que ela tivesse dito aquelas coisas, ele não se convenceu. Tadase ficaria preocupado com qualquer um, era parte da natureza dele. Estava óbvio para Nagihiko que nesse momento tudo o que Tadase podia nutrir por ele era desprezo profundo. Considerando o fato de aquele garoto ser incapaz de odiar, independente do quão detestável seja o objeto em questão, Nagihiko considerou que ele pudesse estar aterrorizado, com medo dele.

Apenas uma era a certeza de Nagihiko. Tadase não iria querer vê-lo tão cedo. Assim é melhor, sua parte racional insistia em apontar. Sim, era melhor para todo mundo, menos para ele mesmo. Era Nagihiko quem iria conviver com a culpa, afastado da pessoa que mais importava para ele no mundo inteiro, e mais do que isso, sentir todos os dias que havia tocado em Tadase, realizado seu mais escondido desejo, e que isso causou tanto sofrimento. Estava mais do que claro agora que não era seu destino estar ao lado dele.


— Temari iria adorar esse lugar, não é mesmo? – Nagihiko comentou, tentando espairecer, olhando para o céu. Trazia o ovo nas mãos, como se quisesse que Temari também apreciasse o lindo pôr-do-sol ao longe. – Ela gosta de prédios históricos como esse...

— Eu tenho certeza que sim! – Rythm tentou animá-lo – Mas ela não irá voltar enquanto você estiver fazendo esse tipo de expressão! Tente se animar um pouco! Eu sei que você está tentando organizar seus sentimentos no seu próprio ritmo, mas você não deve se entregar! Não desista, Nagi!

— Tudo bem... – Nagihiko suspirou, tentando sorrir – Vamos lá para baixo então?

— Você vai tomar um banho?

— Acho que não... meu pai está lá agora, eu prefiro ir quando não houver ninguém.


Os dois desceram, Nagihiko ainda com seu Shugo Tama firme nas mãos, até a recepção. Nagihiko sentou em um dos sofás dali, vendo as pessoas irem e virem, as garçonetes trabalhando apressadas, e a recepcionista atendendo telefonemas sem parar. Aquela agitação se contrastava com a imagem de relaxamento do resto do lugar, e Nagihiko gostou disso. Ajudava a manter seus pensamentos distraídos e leves.

Rythm sobrevoava todo o local, repentinamente muito agitado, como se tivesse sentido algo, mas não contou do que se tratava. A porta se abriu, com a gentil senhora de antes à frente, e uma família sendo conduzida atrás dela. Nagihiko sentiu seu chão sumir, e o ar todo sumir do seu pulmão, ao vê-lo. Ali, naquele mesmo local, junto com seus pais, estava Hotori Tadase.







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Notas finais do capítulo

Yoo o/ Shiroyuki desuu~
Espero que tenham gostado do capítulo. Particularmente, eu achei ele um pouco confuso, mas era mais do que esperado depois daquele capítulo cheio de emoções da Teffy-senpai, nee?
A música que eu escolhi, tenho que ressaltar, é uma das minhas favoritas, e eu tive o trabalho *cof cof* (hohoho sim, estou tentando parecer importante agora) de traduzi-la do inglês só pra poder coloca-la aqui no capítulo, por que eu realmente amo muito ela. Tenho vontade de chorar cada vez que ouço, mesmo sem motivo por que eu sou uma baka, mas agora, cada vez que eu ouvir vou lembrar de TadaHiko u_u
Bom, agora vamos a um pedido especial da Teffy-senpai. Ela queria que eu desenhasse o Tadase de noiva u_u Sim, ela me pediu isso na cara de pau. Eu ia fazer, mas como estou totalmente sem tempo, fiz só uma montagenzinha tosca e rápida para suprir esse desejo indomável *exagero* Então~ vamos ao Tada-kun de noiva. Só não pirem (isso é especificadamente para você, senpai -.-)
http://kouhii-daisuki.tumblr.com/post/21620947140
Ah! Antes que eu me esqueça, o mangá que a Rima comprou, que também é o que ela ganhou da Utau e que o Nagi viu e teve a mente corrompida se chama Koisuru Boukun, e é o meu yaoi favorito, que serviu de inspiração para algumas cenas aqui da fic, aliás, e eu precisava citar. Se não conhecerem ainda... O QUE AINDA TÃO FAZENDO LENDO ISSO DAQUI? VÃO JÁ BAIXAR E LER, POR QUE ELE É PERFEITO!!! Ah... não é recomendado para menores de 18 anos, okee? //apanha muito
Jaa neeee o/
kisu *u*