Nemesis X: A Guerra Secreta escrita por Goldfield


Capítulo 5
Capítulo 4




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Capítulo 4

 

Oportunidades e uma baixa verdadeira.

 

Krauser, sem camisa, havia transposto a cerca metálica escalando-a e pusera-se a correr para longe da base quando a forte explosão às suas costas lançou-o sobre a terra árida. Por sorte já estava a uma distância relativamente segura, e nenhum dos destroços flamejantes que voaram acima de sua cabeça o atingiram. Reavendo o fôlego, Jack prosseguiu com sua fuga, sorrindo de leve. Fitou o pôr-do-sol no horizonte. Encontrava-se desarmado e enfraquecido. Porém livre.

 

Alfa olhava para Burke com satisfação. O renegado funcionário da antiga Umbrella o estava servindo bem. O Departamento de Perigo Biológico ficara sem dúvida assustado, a já inútil base de operações em San Jose sumira do mapa e o governo não sabia como agir. Chegara o momento certo. Voltando-se para o chefe, Josh pronunciou o que ele já esperava ouvir:

         Eles abaixaram a guarda, é a hora propícia de agirmos. Tenho uma equipe pronta na costa leste, está esperando apenas uma ordem do senhor para entrar em ação!

         Dê a ordem! – replicou o misterioso homem friamente. – Deixe que seus lacaios tragam-na até mim!

         Na verdade, senhor Alfa, meus soldados humanos terão apenas um papel secundário na operação...

O aparente escandinavo coçou a cabeça loira. Como sempre, Burke tinha um trunfo a mais para tornar seus serviços mais eficientes e ao mesmo tempo agradá-lo de forma ainda maior...

 

A bordo do Black Hawk, Chris, sentado numa das fileiras de assentos, esfregava a face. Fora uma missão difícil e traumatizante, mas ao menos parte dos integrantes do esquadrão escapara com vida. Ainda não conseguia compreender como os Lickers enfrentados eram tão poderosos e de que maneira o vírus agira tão rápido no capitão Renneger e seu soldado. Os combatentes feridos, por exemplo, tiveram de ser socorridos com mais duas ou até três doses de antivírus para que a infecção fosse interrompida. Muitas perguntas careciam de resposta, e o ex-membro do S.T.A.R.S. nem suspeitava que as coisas ainda piorariam muito antes de demonstrarem melhoras...

 

Já era noite em Washington.

Impelido pelas ameaças de Burke, Leon, totalmente dominado por um pressentimento amargo como fel, dirigia seu carro a caminho da residência onde vivia com a esposa nos subúrbios de Washington. As palavras empregadas pelo antigo Vincent não enganavam ninguém. Ele aconselhara que Kennedy dissesse a seus entes queridos que os amava enquanto houvesse tempo... E pelo visto, este estava quase se esgotando.

Claire!

 

A irmã de Chris Redfield perambulava sozinha pelos corredores e cômodos da casa, atordoada e inquieta como costumava ficar com cada vez mais freqüência. Pensava em Steve e reprovava-se severamente por isso, pois estava casada com outro homem e, para todos os efeitos, Burnside morrera havia mais de dez anos. Não havia motivo aparente para o pobre jovem contaminado com o T-Veronica dominar sua mente, e ela não conseguia compreender... Era como se, de alguma maneira fantástica, previsse que voltaria a se juntar a ele em breve...

Porém, a jovem foi arrancada brutalmente de seus devaneios quando uma das paredes do quarto em que entrara simplesmente ruiu, um grande buraco sendo aberto em meio ao concreto, poeira dominando o ambiente. Caída no chão pelo susto, Claire, tossindo, viu cruzar a abertura um ser de mais de dois metros de altura, careca e trajando sobretudo esverdeado... Por um momento não creu, mas mantinha viva em sua memória a aparência daqueles monstros. Ela passara maus bocados em Raccoon City fugindo de um deles, e por sinal fora quem os apelidara da forma pela qual eram agora mais conhecidos...

         Mr. X!

O Tyrant andou até a amedrontada Redfield, seus passos titânicos sacudindo o chão. Sem que Claire pudesse reagir, ele a golpeou fulminantemente na cabeça com uma das mãos grossamente enluvadas enquanto a vítima tentava se erguer do piso sujo. Inconsciente, foi tomada por um dos braços do supersoldado e deitada acima de seu ombro esquerdo, sendo segurada pela cintura com o membro direito para que não caísse. Dessa forma o mutante raptor deixou a sala pelo mesmo buraco que abrira para entrar, rumando até o gramado dos fundos.

Um helicóptero negro o aguardava com dois soldados. Agindo mecanicamente, o T-00 levou a desfalecida Claire até a aeronave, depositando-a sobre um dos bancos. Em seguida entrou nela junto com a dupla de humanos e o transporte decolou sem delongas, fazendo voar folhas das árvores próximas e sumindo em meio à noite estrelada.

 

Leon chegou pouco depois. Deteve o carro na calçada e, encontrando a casa vazia e parcialmente destruída a partir dos fundos, correu até o quarto seu e da esposa. Mas ela não estava lá, tampouco em parte alguma da morada. Mesmo sendo difícil, encarou a realidade: ele a perdera. Desolado, o Secretário de Perigo Biológico não pôde conter sua dor e jogou-se sobre uma poltrona, chorando desesperado. A tristeza unia-se a um crescente desejo de vingança.

Burke pagaria por isso!

 

Qual o preço do poder? Será que algum ser humano é capaz de erguer-se acima dos outros sem derramamento de sangue?

Acredite, senhorita Wong, é quase impossível. A raça humana possui instintos destrutivos. Por isso inventamos a bomba de hidrogênio e o T-Virus. Ah, o T-Virus... Meu velho amigo James Marcus deve estar se revirando em sua sepultura pós-mutante por causa dele... Mas foi melhor para ele ter sido eliminado para não ter de presenciar a que ponto tudo isto chegou. Vivemos uma conjuntura inédita em toda a História. Agora um país pode fazer com que um território vizinho amanheça com seus habitantes devorando uns aos outros devido a um mero desentendimento entre seus dois líderes na noite anterior.

Isso assusta até a mim, senhorita Wong.

Não se alarme, no entanto. Continue sendo atenta e diligente como sempre foi, e terá seu lugar entre os mais fortes. Entre os sobreviventes. Minhas cartas podem parecer delírios de um velho louco na prisão, porém a humanidade caminhou para trás muitas vezes por não ter dado ouvidos aos supostos loucos...

 

De seu velho amigo e mentor,

 

S.

 

Dias depois.

Uma das salas completamente terminadas do prédio do Departamento de Perigo Biológico era um respeitoso memorial às vítimas de Raccoon City. Pelas paredes e pelo teto baixo do espaço circular havia objetos e artefatos resgatados das ruínas da cidade bombardeada que pertenceram a seus moradores: fotos, roupas, objetos de higiene, diários quase totalmente ilegíveis, quadros, pedaços de concreto... Entre as lembranças salvas via-se até, um tanto amassado e escurecido, o medalhão redondo dourado tendo a gravura de um unicórnio que antes servira como meio de ativação para alguns compartimentos e artifícios secretos instalados no prédio do R.P.D. pelo delegado Brian Irons. Andar por aquele recinto era uma verdadeira viagem no tempo, principalmente para os sobreviventes da tragédia.

Para finalizar, no centro do ambiente havia uma grande pedra retangular de mármore negro com os nomes de todas as vítimas identificadas do desastre inscritas nos quatro lados, sendo que na parte de cima fora instalada uma pira mantida constantemente acesa, a fumaça subindo por um duto no teto. Uma forma de se lembrar dos inocentes mortos devido à perfídia da Umbrella e garantir que a injustiça cometida jamais fosse esquecida.

Desde que assumira seu novo cargo, Leon costumava ir sozinho até o memorial para pensar, e ali ficava até durante horas, imóvel, geralmente apoiado na pedra negra com um braço e coçando o queixo ou os cabelos usando o outro. A sala parecia revigorar e iluminar suas idéias, como se as almas dos habitantes de Raccoon o auxiliassem de onde quer que estivessem. No período após o misterioso seqüestro da esposa Claire, Kennedy começou a passar quase o dia inteiro ali dentro, onde, longe da visão alheia, tinha maior liberdade para chorar. Seus amigos e colegas estavam muito preocupados com o secretário, tanto por nunca terem visto aquele seu lado sensível, quanto por compreenderem o calvário que vivia. Depois dele, o mais abalado era Chris, porém o atirador de elite gastava todas as horas nas quais não estivesse dormindo, e às vezes até sacrificando aquelas em que deveria, trabalhando para descobrir o paradeiro de Burke e o local para onde a irmã fora levada.

Eles teriam êxito, custe o que custasse.

 

A doutora Chambers, dentro do laboratório de pesquisas pelo qual era responsável num outro andar do prédio, terminou de examinar mais algumas amostras de sangue no computador diante de si e por fim fez a cadeira em que estava sentada recuar da mesa impelindo as pernas para trás, logo depois girando sobre as rodinhas para virar-se na direção do doutor Wilkins, cientista-chefe auxiliar. O jovem homem solteiro sentia uma grande atração por Rebecca, e o modo como ela se vestia naquela manhã, tendo um jaleco branco cobrindo o tronco, descendo até uma curta saia preta na cintura com as lindas pernas nuas terminando num par de sapatos salto-alto também negros, fazia-o divagar com mil fantasias... Até que a superiora deu um sorrisinho e chamou-o pelo primeiro nome, procurando tirá-lo das nuvens:

         Edward!

         Becca? – perguntou o rapaz, desajeitado e com vergonha. – Terminou as análises?

         Sim, e elas não deixam dúvidas. Lidamos em San Jose com uma versão mais poderosa do T-Virus, dotada de uma velocidade de infecção extremamente mais rápida e capaz de gerar mutações aprimoradas. Isso explica a força incomum daqueles Lickers.

         Como Burke conseguiu esse agente viral?

         Comparando alguns resultados de outubro passado, constatei que o vírus que contaminou nossos soldados na base foi o mesmo que dizimou a equipe de pesquisas do Laboratório Vinnewood. O agente Adams, nosso contato no FBI, confirmou que os homens de Burke invadiram as instalações para reaver os mortos-vivos de Raccoon confinados em barris que Murray, meu antigo chefe, vinha escondendo no subsolo. A origem desse T-Virus mais potente está nesses zumbis, pois o período de incubação permitiu que ele sofresse mutações. Foi assim que Josh colocou as mãos nele.

         Filho da mãe... – Wilkins cerrou os punhos. – Ele pode varrer metrópoles inteiras com uma arma dessas em poucas horas!

         Isso mesmo, e é muito preocupante. Fique aqui cuidando de tudo, vou informar Leon sobre minhas conclusões!

         OK.

Chambers levantou-se da cadeira e deixou o laboratório, não antes que Edward a admirasse por trás enquanto se dirigia à porta, e ela aparentemente nem chegou a notar. Depois o pesquisador começou a roer as unhas. Estavam lidando com um terrorista biológico em potencial, e ele podia praticamente exigir tudo que quisesse das autoridades.

 

Numa outra sala do edifício em obras, Jill Valentine também se sentara na frente de um computador, efetuando uma ampla pesquisa de dados e nomes que pudessem levar a Burke. Recentemente ela estava passando bastante tempo no Departamento e, já que Chris empenhava-se ainda mais devido ao seqüestro da irmã, o pequeno filho do casal, Barry, ficava agora sob os cuidados quase integrais de uma babá. A moça era digna de confiança, porém Jill ansiava que aquilo tudo terminasse logo para poder se dedicar à criança. Queria ter uma vida normal, ser uma mãe responsável e presente, mas a iminência do perigo biológico sempre retornava para frustrar seus planos.

Tentando relaxar, a ex-policial do S.T.A.R.S. resolveu entrar por uns instantes num site de relacionamentos on-line no qual possuía uma conta. Após inserir sua senha e passar poucos minutos navegando por comunidades de diferentes temas e fins, encontrou uma cujo nome chamou muito sua atenção: “Eu queria ter conhecido Raccoon City”. Na imagem selecionada para representar o grupo havia uma antiga foto da torre do relógio da cidade, onde Valentine travara uma das batalhas contra Nemesis e acabara temporariamente infectada. Afetada por aquelas lembranças, Jill deu conta do extremamente reduzido número de pessoas que haviam encarado o pesadelo nas ruas infestadas de zumbis e sobrevivido para narrarem seus aterradores relatos ao mundo. Um tanto irônico e amargo encontrar uma comunidade como aquela na Internet, com boa parte dos membros bradando através de postagens em letras maiúsculas que queriam ter estado lá para aniquilar todos os mortos-vivos um a um... Mas tudo bem. Havia muitos seres ingênuos no planeta.

A mulher suspirou e voltou ao trabalho.

 

Claire despertou de repente, porém achou que estava sonhando. Foi apenas quando sentiu os vários focos de dor por todo seu corpo, principalmente no rosto, que percebeu se encontrar realmente acordada. Abriu os olhos com esforço, tateando o chão no qual estava caída, aparentemente feito de algum tipo de material metálico. Seus ouvidos identificaram o alto som de motores ligados. Com a visão embaçada, arrastou-se até uma aparente caixa de madeira quase do seu tamanho e, conforme pôde identificar melhor o que fitava, sobressaltou-se ao notar o símbolo de um guarda-chuva vermelho e branco no recipiente.

Boquiaberta, a jovem recuou de costas, as palmas de suas mãos servindo de apoio para o deslocamento. Não tinha forças suficientes para colocar-se de pé. Quando seus olhos voltaram a ser totalmente capazes de enxergar, concluiu se encontrar dentro de um grande avião de carga, transportada como mero peso morto. Suas roupas estavam rasgadas, parte de seus seios expostos. Claire envolveu o busto com os braços e, menos agitada, começou a botar os pensamentos no lugar. Talvez quando aquela aeronave atingisse seu destino ela tivesse as respostas necessárias...

Escutou algo mais. Passos. Ao contrário do que achara, não estava sozinha naquele compartimento repleto de caixas e engradados possuindo o vil emblema da corporação que ela e seus amigos haviam tanto combatido. Percebeu que a outra pessoa se aproximava por trás de si, mas a fraqueza deixou-a demasiadamente lenta para se voltar a tempo. Depois de um resmungo de surpresa por parte do evidente homem, uma rápida coronhada voltou a suprir-lhe os sentidos.

 

Conforme esperava, Rebecca encontrou Leon sozinho no memorial dedicado a Raccoon. Se ele notou a chegada da cientista, aparentou não percebê-la. Chambers caminhou lentamente até o secretário e, quando se viu quase encostada nele, chamou-o com enorme discrição, quase num sussurro:

         Hei!

Kennedy ergueu a cabeça, os olhos vermelhos revelando que havia chorado há pouco. Não era a primeira vez que Rebecca achava o superior naquele estado lamentável, e por isso não se abalou. Aquela situação desesperadora estava exigindo o máximo de todos eles. Deu mais alguns segundos de silêncio ao marido de Claire para então informá-lo calmamente:

         Terminei as análises a respeito do vírus, estamos lidando com uma versão mais poderosa...

         Quanto poderosa? – Leon inquiriu muito sério.

         Capaz de contaminar inteiramente uma cidade de alguns milhões de habitantes em talvez menos de um dia...

O secretário esfregou os olhos. Será que podia ficar pior? Ele já se perguntara se não estariam caminhando rumo ao fim do mundo, ao Apocalipse descrito na Bíblia. Seu ódio por Josh Burke crescia mais e mais, e se dispunha a forçá-lo, depois de tê-lo sob custódia, a jogar roleta-russa com apenas um buraco do tambor do revólver estando sem uma bala...

Eles iam pegá-lo.

 

Londres, Inglaterra.

Desde que desembarcara junto com Ada Wong no Aeroporto Internacional Heathrow, Carlos Oliveira sentia-se imensamente deslocado. Era a primeira vez que pisava em solo britânico, sendo que não estivera na ilha nem durante o período da organização anti-Umbrella, quando costumava empreender diversas viagens pelo mundo. Tudo lhe era estranho e novo: o clima mais frio, a neblina conhecia como smog, os tradicionais ônibus vermelhos de dois andares, o sotaque dos nativos, a beleza das ruas e construções... Sua acompanhante, ao contrário, parecia se sentir em casa. O brasileiro concluiu que se Ada já não houvesse morado ali antes, pelo menos estivera em Londres várias vezes.

Todavia, não estavam ali para passear, seja visitando museus ou tirando fotos diante do Parlamento e principais monumentos. Wong não revelara muito ao novo parceiro, porém deixara claro que a viagem à Inglaterra fazia parte de uma intensa investigação que ela conduzia há anos. Se estivesse correta, chegariam à resposta naquele dia nublado. E conhecendo melhor o inimigo, certamente poderiam combatê-lo de forma muito mais efetiva.

         Você me disse no avião que viemos para cá atrás da identidade do homem que pode estar por trás de Goldman, correto? – indagou Carlos enquanto caminhava com Ada por uma avenida, mãos enfiadas nos bolsos do casaco.

         Correto. Vincent não é o tipo de homem que recebe ordens, mas nossa organização obteve pistas de alguém por trás dele. Uma pessoa grande e poderosa. Faz sentido, pois Goldman não conseguiria ter se reerguido de forma tão esplêndida após seus desmandos na Ilha Sheena sem ajuda. Identificando o indivíduo no topo da cadeia de comando dessa nova Umbrella, poderemos desmantelá-la membro por membro.

         Que organização é essa para qual me recrutou, afinal? Para quem você trabalha, Ada?

Carlos tinha muitas dúvidas pulsando em seu cérebro. Em vista disso, a descendente de orientais deu uma parada e, lançando um olhar astuto sobre o sul-americano, disse-lhe num discreto sorriso com a boca suavemente coberta de batom vermelho:

         Um membro de cada vez, senhor Oliveira... Assim como uma resposta de cada vez!

Vencido pelas imbatíveis sensualidade e sagacidade da agente, o ex-mercenário se calou e continuou a andar junto com ela. Tentava ver as coisas pelo lado bom: quem sabe a forte presença dela não o auxiliasse a esquecer Jill...

 

Pouco depois os dois pegaram um dos famosos táxis londrinos, se dirigindo até o distrito de Docklands, na ilha de Cani. Olhando através da janela do carro para a imponente arquitetura das casas e lojas, Carlos ainda estava fascinado pela magia da capital britânica, outrora coração de um grande império que cobrira boa parte do globo. Ada tinha um endereço definido para visitar, e Oliveira sabia que era para ele que rumavam. Após certo tempo de trajeto, o veículo parou na frente de um velho e acabado prédio de apartamentos, e Wong fez um sinal para que descessem. Carlos anuiu, embora um pouco desapontado devido ao passeio motorizado pela fascinante Londres ter chegado ao fim.

O rapaz e a mulher subiram por uma pequena escada de pedra em meio a um pequeno jardim e cruzaram a porta de entrada. Não havia ninguém na portaria do local, apesar de uma TV ligada sobre o balcão na qual passava um documentário da BBC. De início os visitantes foram intimidados pelo macabro silêncio e a aparente ausência de vida humana no prédio, fazendo-os se recordarem dos piores momentos passados por ambos em Raccoon City. No entanto, felizmente, um senhor de idade usando bengala e boina logo surgiu por uma porta, retomando seu posto na recepção. Após endireitar-se sobre a cadeira, contemplou os recém-chegados por um minuto e então falou:

         Em que posso servi-los?

         Estamos procurando a senhora Verônica Watson – respondeu Ada empregando impecável sotaque britânico. – Ela vive aqui, não?

         Sim, no apartamento dezessete, alguns andares acima... – confirmou o funcionário e morador do prédio, apontando levemente para cima com um dos dedos enrugados. – Vocês desejam serem anunciados?

         Não será necessário, obrigada! – Wong dispensou o esforço do velhinho com um encantador sorriso. – Nós vamos subir, acredito que a senhora Watson não terá objeções em nos receber.

O inglês assentiu, voltando sua atenção para a TV enquanto Ada e Carlos avançavam pelos degraus de madeira desgastada. Aquela construção parecia ter parado no tempo anos antes, como se ali vivessem pessoas que a sociedade quisesse esquecer, ou ao menos alguém influente dentro dela... Se as suspeitas de Wong fossem mesmo verdadeiras, então realmente aquele era o lugar perfeito para a senhora Watson habitar.

Intrigado, Oliveira acompanhou a parceira até o apartamento dezessete. Ela deu duas suaves batidas na porta branca encardida na qual se encontrava pendurado um escudo de São Jorge. Do outro lado, uma mão feminina velha e calejada girou a maçaneta, abrindo a entrada apenas parcialmente, já que ela estava trancada por uma corrente presa ao interior da residência. Através da fresta liberada, Ada pôde ver parte do rosto de uma singela senhora de cabelos brancos, que perguntou com voz rouca:

         Sim?

         Senhorita Verônica Watson?

         Sou eu.

         Gostaríamos de conversar a respeito de um certo assunto... – disse a espiã amavelmente. – Acredito que não tomaremos muito de seu tempo. É a respeito de seu antigo trabalho como mãe de aluguel...

         Uma investigação policial?

         Bem, mais ou menos.

         Ora, mas que moça educada! – alegrou-se a idosa, destrancando a porta. –Por favor, entrem!

 

Ada bebeu mais um gole de chá e depositou a xícara de porcelana junto com o pires sobre a mesinha da sala. Ela e Carlos estavam confortavelmente sentados um ao lado do outro em duas antigas poltronas, de frente para a simpática senhora Watson, esta por sua vez acomodada numa cadeira de balanço. Depois de servir o brasileiro e sua linda colega com mais bebida quente, ela foi direto ao ponto:

         Então, podem ser mais precisos? Meu ventre serviu de berço para filhos que acabaram não sendo meus por vários anos...

         O ano que buscamos é 1971 – explicou Wong. – A senhora deu à luz a mais de um bebê, sendo que cada um deles foi registrado num local diferente do Reino Unido para apagar quaisquer indícios que levassem à senhora...

         Deixe-me lembrar... Ah, sim! 1971. Eu estava começando a servir de mãe de aluguel. Os tempos eram difíceis. Desde que meu marido falecera, eu mal tinha o que comer. Por isso fui obrigada a me sujeitar à humilhação de parir crianças para outras pessoas... Perdi minha dignidade, e nunca mais a recuperei!

         A senhora se lembra de quem a procurou para que iniciasse a gestação?

         Foi um médico. Ele nunca me disse seu nome, mas sempre andava bem vestido a parecia pertencer à nobreza. A inseminação foi realizada numa clinica aqui de Londres há muito desativada... Na verdade, creio que ela fechou as portas pouco antes dos bebês nascerem...

Carlos apenas ouvia e observava, sem ainda entender do que se tratava nem muito menos suspeitar quem era a pessoa que Ada buscava. O jeito seria continuar prestando máxima atenção à conversa, e talvez logo suas indagações fossem sanadas... Ou não...

         Foi um parto difícil? – questionou Wong.

         Sim, dar à luz a mais de um bebê sempre é mais arriscado e sofrido... Ainda mais trigêmeos...

         Trigêmeos? – surpreendeu-se a agente. – Eu sempre pensei que fossem apenas duas crianças... Um casal!

         Não, minha querida... – foi a vez de Verônica dar um sorriso tenaz. – Eram três bebês... Uma menina e dois meninos!

Dois meninos, dois homens... Fantástico. Era tudo que Ada procurava confirmar.

 

Continua...


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