O Cara Da Porta Ao Lado escrita por EstherBSS


Capítulo 14
Capítulo 14 - Sakura


Notas iniciais do capítulo

Seus reviews me animaram a postar mais.



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Capítulo 14


Sakura


- Eu não entendo como ele pode ser tão idiota! – exclamei apontando meu refrigerante ameaçadoramente para a tela. Sasuke riu ao meu lado e disse:

- Eu já falei, Sakura. Se ele não saísse da casa, não teria filme.

    - Mas isso é totalmente falso! – ela olhou para o próprio colo – Minha pipoca acabou. Vou fazer mais. Quando os zumbis ganharem no final, me chame. - Ouvi Sasuke gargalhar – Você fala de mim, mas rir com um filme de terror é uma falta de respeito muito maior.

    - Você que está me fazendo rir, não o filme. – Sasuke respondeu. Era domingo de tarde e eu tinha pedido para ver um filme de terror na televisão dele. Era apenas uma desculpa vergonhosa para ficar com ele, mas Sasuke não pareceu se importar. Não lembrava muito bem de como a noite anterior havia acabado. Alguns flashes de memória faziam com que eu me lembrasse de estar nos braços de Sasuke, depois no carro e depois na cama. Eu tinha pensado em pedir para ele ficar comigo, porém hoje de manhã eu acordei sozinha na cama então a última parte deveria ter sido um sonho.

    - Se eu visse um zumbi, - comecei dizendo – a primeira coisa que eu iria fazer seria tentar matá-lo. O cara ficou chamando o morto. Era óbvio que iria morrer.

    - Veja pelo lado do cara. – Sasuke estava defendendo o personagem – Era a irmã dele. Não seria fácil chegar já estourando a cabeça dela. Matar nunca é fácil.

Voltei a sala e entreguei uma garrafa de cerveja para ele. Sasuke também pegou uma tigela de pipoca e deu espaço para que eu sentasse no sofá ao lado dele. Ele mantinha um braço nas costas do sofá, relaxado, enquanto levava a bebida à boca com o outro.

    - Já matou muita gente? – perguntei e senti que ele ficava nervoso. Eu já tinha descoberto um modo de descobrir quando ele ficava tenso. O rosto se mantinha indiferente, mas os ombros e o pescoço tencionavam e a linha do maxilar ficava pronunciada.

    - Algumas. – ele respondeu lacônico.

    - Quer falar sobre isso? – perguntei virando para ele.

    - Não. – ele disse e bebeu um gole direto da garrafa.

    - Acho que eu não poderia matar ninguém. Uma vez eu tentei matar um rato, mas não consegui. – eu estava olhando para a tela e vi Sasuke virar a cabeça em minha direção. Quando eu olhei para ele, Sasuke estourou em uma gargalhada – É sério. E não é para rir. Foi triste!

    - Estou imaginando você tentando matar o rato. Como foi? Você em cima do sofá com a vassoura na mão? – Sasuke falou rindo. Eu fiquei séria. Aquilo não tinha sido engraçado e eu não tinha mencionado o assunto para que ele risse. Demorei a responder e Sasuke foi parando de rir aos poucos.

    - Eu tinha um gato. – comecei e encarei a tela da televisão – Era o meu melhor amigo. Eu deveria ter uns quatorze anos. Sou filha única e o Meow era quem me fazia companhia. Só que... – suspirei e Sasuke continuou me observando, agora sem rir – Bem, Meow não caçava ratos. Meu padrasto - mesmo depois de tantos anos, falar a palavra ainda era difícil – queria se livrar do meu gatinho. Ele dizia que não iria criar um bicho sem serventia.

    - Isso é uma coisa cruel para se dizer a uma menina. – Sasuke falou baixo.

    - E o pior é que ele falava de mim, de certa forma. Eu achei que era mesmo do gato. O vizinho também tinha um gato e esse caçava. Não ria. – avisei sem olhar para ele – Eu roubava os ratos mortos do vizinho e trazia para casa, para que pensassem que tinha sido o Meow. Não ria, Sasuke.

    - Você roubava ratos mortos? – ele perguntou e eu senti a diversão em sua voz.

    - Estava tentando salvar o meu gato. – disse me defendendo.

    - Deixe-me adivinhar: te pegaram.

    - Sim. Meu padrasto aproveitou um dia em que minha mãe tinha saído. Ele me levou até a casinha de ferramentas e me mostrou um rato preso em uma daquelas armadilhas que formam uma espécie de jaula.

    - Ele exigiu que você matasse o rato? – Sasuke perguntou parecendo doce. Achei que era impressão, mas ele parecia ter se aproximado de mim.

    - Ele queria que eu jogasse água fervente no bichinho. Obviamente, a molenga aqui não conseguiu.

    - Você não é molenga, Sakura. – Sasuke falou perto de mim. Ele tirou uma mecha do meu rosto e prendeu atrás da minha orelha. Tentei reprimir a vontade de beijá-lo. Ele estava tão perto...

    - Meu gato apareceu morto dias depois. – eu disse e olhei para o peito dele – Ele foi escaldado.

    - Sinto muito, Sakura. – ele falou e sua voz parecia zangada – Agora entendo a sua falta de vontade de falar sobre a sua família. – Ele estava tão perto. Eu era capaz de sentir o perfume dele. Parecia loção de barba com algo mais. Suspirei. Eu adorava aquele cheiro. Minha mente insistiu em imaginar como seria acordar de manhã, sentindo aquele perfume. Abri minha boca lentamente depois de vê-lo fazer o mesmo. Nossos rostos estavam perto. Só que ele pôs um dedo na minha boca e se afastou. Quase gemi de frustração – Desculpe. Eu não deveria me aproveitar da morte do seu gato.

    - Já esteve apaixonado, Sasuke? – a pergunta saiu dos meus lábios antes que eu percebesse. Quase mordi a língua com raiva de mim mesma. Ele apenas levantou e foi buscar mais uma cerveja. Teria parecido normal se eu não tivesse visto que a garrafa dele ainda estava na metade.

    - Defina apaixonado. – ele falou da cozinha. Respirei fundo e ergui a cabeça. Eu tinha que enfrentar a situação afinal.

    - Do meu ponto de vista, - comecei a falar e fiquei em posição fetal sobre o sofá – você está apaixonado quando começa a pensar na pessoa frequentemente.

    - Só isso? – ele perguntou de longe.

    - Acho que você também deve se importar mais com o outro do que com si próprio. Acho que você deve entender que não conseguirá ser feliz de verdade sem ter a pessoa amada do seu lado. Também penso que quando se está apaixonado, você adora cada pequena coisa que o outro faça. Os defeitos passam despercebidos ao lado de todas as outras virtudes. – o silêncio dele me deixou nervosa e eu acabei falando mais – Você fica esperando que o outro te olhe, te toque e fale coisas que só pertencem aos dois. Creio que você deve se sentir bem apenas por estar ao lado da pessoa. Quando estão longe, um deve apenas pensar em voltar aos braços do outro. E eu penso que quando os dois estão abraçados e com os corpos apertados, tudo mais deixa de existir e só as sensações importam.

    - Você... – Sasuke falou e eu me assustei quando senti o hálito quente dele na minha orelha. Desde quando ele estava atrás de mim? – Você fala como uma mulher apaixonada.

    - A-Acho que estou. – respondi e odiei gaguejar – E você? Já esteve apaixonado alguma vez?

    - De acordo com a sua definição? – ele perguntou e eu ouvi o som que ele fez ao levar a garrafa à boca para tomar um gole – Já senti isso sim.

    - Faz muito tempo? – perguntei tentando entender porque aquela idéia não me agradava. Ele ficou um bom tempo em silêncio. Quando falou, apontou para a TV.

    - Você estava certa, afinal. Os zumbis venceram.

Mais tarde naquela noite, eu percebi triste que ele não respondera a minha pergunta.

Segunda e terça eu estudei como uma louca. Na quarta eu fiz as últimas provas do semestre e finalmente entrei de férias. Subi as escadas do prédio saltitando. Até fiz uma dancinha da vitória enquanto subia. Estava feliz com aquela sensação de dever cumprido. Assim que chegasse, eu tomaria um banho, comeria algo e iria limpar o apartamento do Sasuke como tínhamos combinado. Eu geralmente limpava um dia sim e outro não e ele me pagava semanalmente. Estaquei nos últimos degraus.

    - Você parece feliz, Sakura.

    - Boa tarde, Itachi. – cumprimentei-o e terminei de subir os últimos degraus. Ele me deixava nervosa e desconfortável – Sasuke não deve ter chegado ainda.

    - Eu sei. – a resposta dele me pegou de surpresa e eu senti o nervosismo se espalhando pelas minhas costas. Tive um mau pressentimento – Vim aqui para falar com você.

    - Infelizmente. – eu disse – Já estou de saída. – tentei ignorar o quão ridícula a minha desculpa parecia já que eu estava acabando de chegar – Só vou tomar banho e então sairei de novo.

    - Sua aliança está apertada de novo? – Itachi perguntou e eu olhei para a minha mão, desejando que o anel do Sasuke brotasse em meu dedo – Talvez...você esteja esperando pela aliança do Gon.

Congelei quando ele falou. Seria difícil explicar todos os sentimentos e pensamentos que passaram pela minha cabeça. Suspirei fundo, usando minha melhor expressão de indiferença.

    - Não entendi o que você quis dizer. – abri a porta e entrei rapidamente. Preparei para fechá-la quando ele botou o pé no vão da entrada – Eu realmente tenho que sair daqui a pouco, Itachi.

    - Nada mais de cunhado? – ele riu sem humor – Acho que você entendeu exatamente o que eu quis dizer e você VAI conversar comigo.

Deixe-o passar sabendo que tinha perdido o jogo. Itachi entrou sem cerimônia e se sentou no meu sofá. O olhar avaliativo que ele passou pela minha casa me irritou. Sentei em frente a ele depois de jogar minha mochila de lado. Toda a minha alegria tinha sumido.

    - O que? – ele perguntou com um olhar de deboche – Nem um café?

    - Não tem café pronto e eu estou com pressa. O que você quer?

    - Quero que termine com Sasuke. – ele falou e se inclinou sobre os joelhos para me observar. Mantive a minha indiferença e me recostei no sofá. Obviamente ele não sabia a verdade.

    - Por que eu faria isso?

    - Porque eu sei quem você realmente é. – ele disse estreitando os olhos. Eu ri. Sei que não foi uma boa ideia, mas aquilo realmente me divertiu.

    - E quem eu sou, cunhado? – perguntei cruzando as pernas e dando ênfase a palavra “cunhado”.

    - Você é uma vagabunda, oportunista que seduziu o meu irmão por causa do dinheiro dele. – meus olhos se estreitaram a cada adjetivo e eu respondi com raiva.

    - Está na minha casa. É melhor moderar o seu tom quando falar comigo.

    - Ficando nervosa? – Itachi riu e retirou um envelope do casaco. Ele o jogou na minha direção – Pegue.

    - O que é isso? – perguntei sem me mexer.

    - Pegue. – ele repetiu a ordem.

Estiquei meus braços e alcancei o envelope amarelo. Abri-o e vi vários papéis lá dentro. Quando os puxei para fora, tive que recorrer a toda a minha força de vontade para não parecer desesperada. Tinha uma ficha minha completa. E o pior é que eu nunca imaginei que tivesse uma ficha. A primeira folha tinha meus dados básicos como nome, endereço, telefone, tipo sanguíneo, data de nascimento, local de nascimento, nome dos pais, peso, cor de cabelo. Tinha fotos minhas que eu nem sabia que existiam. Passei a folha e ofeguei.

    - Isso é o meu histórico médico?

    - Deveria ter pensado bem antes de tentar enganar uma família de policiais. – ele disse entre dentes e eu sabia que ele analisava cada expressão minha.

    - Revirar correspondência alheia ainda é crime. – olhei para ele – São as cartas da minha avó!

    - Tem coisas bem piores na sua ficha. Acredite. – implorei para que ele não estivesse mencionando aquele fato. Quando virei algumas folhas eu gemi. Acho que ele esperava por isso – Acho interessante como apesar de danificar patrimônio público e jogar pedras na polícia você não tenha uma ficha na cadeia.

Eu permaneci em silêncio. Quanto menos eu falasse seria melhor. Minhas meias irmãs tinham me enganado para que eu invadisse uma casa e quando a policia apareceu elas jogaram pedras nos policiais. Passei mais algumas folhas, tinha o meu histórico escolar, um resumo da minha vida em cada instituição de ensino pela qual eu passei.

    - Não acredito que você vasculhou a minha vida inteira. – eu disse chocada com tudo o que eu via.

    - Eu gosto, especialmente, das últimas folhas. – ele falou e riu.

Suprimi mais um gemido e continuei folheando os papéis. Tinha tanta coisa ali. No final, tinha fotos minhas dos últimos dias. Reconheci uma em que eu e Sasuke estávamos almoçando naquele restaurante brasileiro. Havia outra em que eu saía do SPA para encontrar Sasuke que me esperava junto ao carro. Tinha fotos minhas na padaria, saindo da faculdade e algumas com Gon. Junto as fotos que ele aparecia, tinha uma ficha dele também. E a última foto era do último jantar meu com o Gon. Na imagem, ele estava se inclinando sobre a mesa e me beijava.

Eu poderia dizer a verdade e sair com a minha dignidade intacta. Eu podia contar que eu nunca estivera com Sasuke e que ele estava me ajudando a achar um noivo de verdade. Só que se eu fizesse isso, Sasuke seria descoberto e ficaria completamente envergonhado em frente a família. Encarei Itachi em silêncio. Quando nós “terminássemos”, provavelmente eu nunca mais iria encontrar a família dele. Ignorei a tristeza que senti ao me imaginar longe de Sasuke. Podia viver sabendo que eles pensavam mal de mim. Sasuke sabia da verdade e a opinião dele era a única que me importava.

    - Montagem. – eu disse erguendo o queixo em desafio.

    - Eu digo que não.

    - Eu digo que sim. – falei tentando parecer calma. Ele se levantou e me prendeu contra o sofá. O rosto dele estava próximo e eu vi ódio em seus olhos.

    - Em quem será que Sasuke vai acreditar quando eu mostrar a ele?

    - Ele vai acreditar em mim. – eu disse e ele viu a certeza em meus olhos.

    - Posso tornar a sua vida um inferno.

    - Isso é uma ameaça?

    - Tive uma agradável conversa com seu padrasto. Você roubou a sua família antes de fugir de casa. – ele falou e eu senti a raiva borbulhar. Empurrei-o para trás e ele caiu sobre a minha mesinha de centro, quebrando-a.

    - É bem a cara daquele sem vergonha falar isso. Eu não fugi de casa. Eu SAÍ de casa. E eu não sei de dinheiro nenhum! Aposto que ele perdeu a quantia no jogo e resolveu me acusar.

    - Quer colocar o adjetivo caluniadora na sua ficha também? – ele perguntou se levantando.

    - Fora da minha casa! – eu gritei – FORA!

    - Não vou deixar uma va-ga-bun-da como você humilhar a minha família! – ele falou e eu andei para o lado da cozinha.

    - FORA! NÃO QUERO MAIS VOCÊ AQUI! – Eu trouxe o envelope comigo e percebi que ele me seguia. Peguei a minha maior faca e me virei para ele.

    - O-por-tu-nis-ta. – ele falou devagar – Mulherzinha de quinta.

    - SAIA AGORA! – ameacei-o com a faca e vi ele se endireitar para a porta. Peguei uma jarra de vidro e lancei na direção dele. Itachi desviou e o vidro se espatifou contra a parede. Procurei outra coisa para jogar nele. Ele abriu a porta e eu lancei um copo. Bateu no chão ao lado dele. Corri atrás dele com a faca abaixada. Eu não iria cortá-lo, mas ele não precisava saber disso.

    - Sakura?

Eu e Itachi paramos de olhos arregalados e viramos para Sasuke que subia a escada. Ele tinha parado nos últimos degraus e olhava para a gente com o cenho franzido.


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