Possessão escrita por Mallagueta Pepper


Capítulo 20
Capítulo 20




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Silêncio total. Bianca olhou para o rosto dele, que parecia endurecido como pedra. Seu olhar era frio e cortante e não havia o menor sinal de um sorriso naqueles lábios.

- O... que foi que você disse?

- Você ouviu muito bem. Eu não voltei para você. Voltei apenas para evitar que você faça mal a essas pessoas!

- Mas eu fiz tudo isso por você...

- Eu não pedi que você fizesse nada, então pare com isso! Você está machucando todo mundo e agora estão colocando a culpa em mim!

- E é culpa sua! – ela gritou, com as lagrimas correndo pelo seu rosto. Dessa vez eram de mágoa e tristeza.

- Culpa minha? Eu saí da sua vida há décadas!

- Por isso mesmo! Você foi embora, nunca mais voltou e nem deu noticias. Por que? Nós íamos nos casar e ser felizes! O que aconteceu com você? O que te fizeram?

Mauricio perdeu a paciência. Estava na hora daquela moça enxergar as coisas como elas eram de verdade.

- Você quer mesmo saber por que eu fui embora? Pois bem! Eu fui embora porque não queria me casar com você, é isso! Eu só queria dinheiro! Quando seu pai me deu o dinheiro que eu queria, então eu fui embora para nunca mais voltar. Pronto! Satisfeita?

- Não, é mentira! Eles estão te obrigando a dizer isso!

Bianca gritava e chorava desesperadamente, sentindo o coração em pedaços. Aquilo não podia ser verdade! 

- Deixe de ser tola, mulher! Durante toda a minha vida, eu sempre fiz isso! Você não foi a primeira e nem a última! Eu te enganei, entendeu? Só queria dinheiro!

- Não, por favor, pare! Diga que não é verdade, por favor!

Todos acabaram ficando com pena dela, até Toni. Apesar de tudo, era só uma moça desiludida e abandonada. Como aquele sujeito podia ser tão cruel?

- Bem, a verdade é essa. Durante todo esse tempo, você estava esperando por um charlatão. Como você pode ter sido tão burra? Será que ninguém lhe avisou?

Sim, as pessoas já tinham lhe falado várias vezes quando ela era viva. Depois de morta, D. Morte também tentou alertá-la, mas ela não acreditou em ninguém.

- Eu achei que estivessem mentindo...

- Não, sua tonta! Você é quem estava mentindo para si mesma! Você desperdiçou sua vida, uma vida boa e cheia de fartura, por causa de um malandro! Como você pode ter sido tão burra?

- Pare!

- Não, eu não vou parar. Está na hora de você deixar de ser burra e enxergar a realidade. E a realidade é que eu nunca te amei! Deu para entender agora?

Magali quis pedir para que ele parasse com aquilo. Era cruel demais até para a Bianca. No entanto, D. Morte fez um gesto pedindo que ninguém interviesse. Bianca precisava daquilo para se livrar de todas as ilusões. Tudo poderia ter sido evitado se ela não tivesse sido tão teimosa, mas a moça não quis escutar ninguém. Toda ilusão tinha sua conseqüência e estava na hora de Bianca colher tudo o que havia plantado.

Bianca tinha caído no chão, de joelhos. Tudo em vão, tudo inútil. Ela sofreu, esperou, ficou doente, morreu e depois passou décadas vivendo naquela casa velha só esperando por ele. Foram anos de espera, tristeza e solidão. Nunca mais ela vira sua família, seus pais, ninguém. Nunca mais pôde ser feliz novamente. Ela tinha deixado tudo de lado só para esperar por ele. E depois de tanta espera, ela apenas encontrou um homem frio, egoísta e cruel que mentira e enganara de forma covarde e leviana. Não, aquele não era seu amado.

Ao olhar aquele homem que estava a sua frente assistindo seu sofrimento sem demonstrar nenhum tipo de compaixão, ela chegou à conclusão de que seu amado nunca existiu de verdade. Durante todo aquele tempo, ela alimentou uma ilusão inútil que no fim só trouxe sofrimento para ela e para outras pessoas.

Tantas vidas foram tiradas! Tantas pessoas feridas, tanto estrago! E tudo aquilo a troco de nada!

- Olha, Bianca, eu não posso fazer mais nada por você, já que não posso fazer nem por mim mesmo. Mas posso te dar um conselho: me esqueça. Siga em frente, vá com a D. Morte e pare de machucar as pessoas. Isso não vai te levar a lugar nenhum. Eu não sou e nunca fui o homem que você pensou que eu fosse, por isso não alimente mais essa ilusão. Não vale a pena.

- E o que eu vou fazer agora?

- Isso é com você. O que eu tinha que fazer, já fiz. Agora é você quem tem que achar seu próprio caminho.

Ela voltou a chorar amargamente, sentindo seu coração em pedaços. Se fosse possível, ela sumiria dali para sempre. Seu único desejo era poder esquecer tudo, desaparecer, nunca mais se lembrar de nada. Se fosse possível morrer uma segunda vez, ela faria sem hesitar.

Tudo estava acabado. Ela tinha investido tanto naquele amor, renunciara a tudo e no fim, terminou sozinha, abandonada e infeliz. Bianca não sabia mais o que fazer. Mauricio era seu objetivo, seu rumo e seu norte. A única coisa que ela sabia fazer era esperar por ele. 

- Bianca, acho que agora chega. Você não tem mais nada a fazer aqui. Venha comigo e vamos acabar com tudo isso. – D. Morte chamou estendendo a mão para a jovem.

- Você pode me matar de novo?

- Não, criança. Não podemos matar um espírito. Você continuará vivendo com o peso dessas lembranças e terá que assumir a responsabilidade pelos seus atos.

- Eu só queria poder esquecer tudo!

- Mas não pode, então não adianta ficar aí chorando. – Mauricio voltou a falar – Pela primeira vez, pare de se fazer de vítima e assuma a responsabilidade pela sua vida, mulher!

Ela levantou-se e disparou olhando para ele com raiva e indignação.

- Foi por sua causa que tudo isso começou! Então não venha me falar em responsabilidade, seu cretino!

Ele deu um sorriso, apesar de tudo. Chamá-lo de cretino era um sinal de que ela tinha perdido as ilusões, afinal de contas. Melhor assim.

- Eu assumo a responsabilidade pelo que EU fiz, não pelo que VOCÊ fez.

- Mas eu fiz tudo porque você me abandonou!

- Mesmo? Como eu falei antes, você não foi a primeira e nem a última. No entanto, eu nunca ouvi falar de nenhuma outra mulher enganada por mim agindo da mesma forma como você agiu!

Aquilo foi para ela como um tapa na cara.

- É isso mesmo! E olhe que com você eu até fui mais brando! A única coisa que eu fiz foi roubar o dinheiro do seu pai e ir embora! Com as outras eu fiz coisas muito piores e nem por isso elas fizeram o que você fez. Então não venha colocar em mim a culpa pelos seus atos insanos.

- Basta, Mauricio. Agora vamos embora daqui. Mas antes, Bianca, você precisa fazer uma coisa. Devolver o corpo da Mônica.

- Não posso... eu expulsei a alma dela! Se eu sair desse corpo, ele morrerá!

- A alma dela está bem aqui – a bola de energia que continha a alma da Mônica apareceu na sala, diante de todos. Toni arregalou os olhos ao ver que a moça ali dentro era a Mônica. Era ali que ela estava durante todo aquele tempo?

- Ela ainda está ligada nesse corpo?

- Sim, eu providenciei para que ela ficasse segura. Agora você sairá desse corpo devagar, da forma mais suave possível para que eu possa colocá-la de volta. Faça isso e será uma responsabilidade a menos para você assumir no futuro.

- Está bem. Não quero mais viver nesse corpo.

D. Morte abriu a bola de energia com sua foice, fazendo com que a alma da Mônica se transformasse em um vapor vermelho.

- O que você...

- Calma, Cebola. Isso é para que ela entre novamente em seu corpo. Pode começar a sair, Bianca.

Um vapor esbranquiçado foi saindo aos poucos da boca e dos olhos de Bianca e ao mesmo tempo um vapor avermelhado foi entrando. A forma do corpo foi mudando gradualmente. Os cabelos foram diminuindo e as feições se transformando até assumir totalmente a forma da Mônica. Quando tudo acabou, o corpo desfaleceu e teria caído se Cebola e DC não tivessem segurado.

- Mônica, tudo bem?

- Mônica? Acorda, amiga! A gente está aqui!

Após chamarem por um tempo, ela murmurou algo que ninguém entendeu e abriu os olhos lentamente, sentindo-se tonta e confusa.

- Que bom, ela acordou! – todos comemoraram, aliviados por terem a verdadeira Mônica de volta. Cebola e DC até a abraçaram ao mesmo tempo e sem brigar, deixando a moça confusa.

Bianca tinha terminado de se materializar, voltando a ter sua forma fantasmagórica original, com seus trapos e tudo.

- Bem, agora que tudo acabou, nós vamos embora.

- O que aconteceu? – Mônica perguntou olhando ao redor, vendo que não estava mais em seu quarto. – como eu vim parar aqui?

- Seus amigos irão explicar tudo. Mas não se preocupe, os problemas acabaram.

- Bianca...

A moça abaixou a cabeça. Encarar Mônica depois do que ela tinha feito era difícil demais. No fim das contas, ela nunca quis atrapalhar seu caminho com Bianca pensara.

- Vai ficar tudo bem com ela?

- Por que você se preocupa? – Bianca perguntou, desconfiada.

- Porque sim, ora essa!

- Sim, agora ela vai ficar bem. Pela primeira vez em muito tempo.

Antes que os três fossem embora, Mauricio se aproximou de Toni, olhado o rapaz de cima a baixo. Toni também o admirava impressionado pela semelhança. Era como se fosse sua versão um pouco mais velha.

O fantasma inclinou um pouco para sussurrar algo no ouvido de Toni.

- Aproveite sua vida. Aproveite bastante. E fique de olho na dentucinha. Se fosse você, não deixava essa beldade escapar!

- Pode deixar. Se cuida, valeu?

- Claro.

Os três foram embora usando o portal de D. Morte e sobrou apenas os jovens dentro da sala vazia, iluminada fracamente pela luz das velas que Bianca tinha acendido. Tudo estava acabado, finalmente.


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