O Sequestro escrita por Lívia Black


Capítulo 16
Capítulo 15 - Ninguém nos disse para parar.


Notas iniciais do capítulo

Há apenas uma coisa que pode se ser dita sobre Lívia Black: Ela é uma vadia infiel. Não acreditem nas promessas dela ! Nunca! Ela pode prometer, um milhão de vezes, mas nunca consegue cumprir, e quando há a inspiração tem o dobro de deveres e preguiça, e quando não há inspiração há uma página do word vazia. That's it.
Bem pessoinhas, tirando o meu masoquismo aqui, queria dizer para vocês (se é que vocês ainda leem Os depois de quase um mês e meio sem atualizar, mas enfim), é que estou de férias, e pretendo voltar a atualizar esse negócio. Eu sei que não deveria nem ter começado a fic, já que eu não tenho condições de mantê-la, mas agora é tarde demais, e eu já estou viciada no enredo.
Orem a todos os deuses para que a autora aqui deixe de ser pelo menos um pouco menos irresponsável. Orem muito!!
Já vou avisando que o cap não saiu nem metade do que eu queria. Sei lá. Talvez eu seja muito crítica, mas o fato é que como dessa vez eu utilizei somente o ponto de vista de um dos personagens de cada vez, ficou meio diferente...Enfim, a cena era bem esperada por vocês kkkk
Vou adiantar para quem gosta de spoilers (cara, espero sinceramente que eu n esteja falando sozinha aqui kkk) que vai ter uma nova personagem here. Embora ela vá se destacar melhor mais tarde. Enfim, seria bom ouvir alguma opinião sobre ela.
Own, estou com muita saudades de vocês. De verdade.
Agradeço a minha sis, Mari Black, a Gih e a Bia, por me fazerem animar de novo para escrever. E a todos vocês que me deixam reviews, vcs são anjinhos iluminados e lindos.
Beijocas. E comentem, se acharem que mereço u.u
Love ya,
L.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/190247/chapter/16

Capítulo 15 - Ninguém nos disse para parar.


"Um beijo legítimo nunca vale tanto como um beijo furtado." Guy Maupassant



Era uma sensação diferente de tudo aquilo que ela já havia experimentado, em toda sua existência. Mesmo que ela já tivesse vivido por milênios, e experimentado quase de tudo. O que quer que ela pudesse ter imaginado sobre o assunto em suas típicas meditações profundas e análises estruturais do assunto, não chegava a ser, nem de longe, parecido com aquilo. Era infinitamente bom e desconcertante, era o certo e o errado, o tentador e o proibido, o físico e o emocional, o céu e a terra, a eternidade e um segundo... Era perder o fôlego, mas não querer mais ar, era sentir calor e não querer se refrescar, era sentir desejo e não querer refrear. Mas acima de tudo, era perder a razão, pela primeira vez em éons, e deixar que seu corpo ditasse o que era certo para ela.


Ah, e como era certo. As mãos de Poseidon deslizavam soltas pela cintura esguia de Atena, que por sua vez, envolvia os dedos por entre os fios negros e macios do cabelo dele.


Toda aquela sua onda de ódio e raiva absolutos, e todos os motivos que ela tinha para querer vê-lo cortado em pedacinhos, e continuar lutando e gritando, haviam sido dissolvidos completamente em sua mente com a chegada do silêncio, para dar espaço a pensamentos sobre o quão reconfortante era aquele toque, e sobre como o encaixe entre os dois corpos, um forte e musculoso, e outro delicado e frágil, era totalmente perfeito, como se tivessem sido projetados exatamente para isso. Ela notava como sua garganta parara de arder dos gritos, e como era extasiante a nova sensação que a invadia. Até havia esquecido o motivo pela qual estivera gritando. Percebeu que sentia toques em seu corpo, aplicados com violência , mas na verdade até gostava deles, e passou a corresponde-los com a mesma agressividade, mas não aquela agressividade anterior. Ela não queria machuca-lo. Bem, talvez até quisesse, mas não pelo mesmo motivo. E ele gostava de suas reações, ela sabia que ele gostava, e sob certo ângulo parecia perturbador, mas ela não estava olhando sob esse certo ângulo. Atena queria rir, mas sua boca estava ocupada demais, correspondendo, assim como todo o seu corpo. Ela sabia exatamente como agir.


Em termos claros e óbvios, era um fato que ela nunca havia se sentido tão bem em toda sua vida. Porém, o mais provável naquele caso, era que, depois que o sonho acabasse, ela viesse a negar constantemente. Morderia o lábio inferior, daquele seu jeito típico, enquanto analisaria a gravidade da situação, e balançaria a cabeça em negativa antes mesmo de pronunciar qualquer palavra. Ficaria vermelha a qualquer menção do assunto, e simplesmente juraria de pés juntos que aqueles momentos foram os piores que ela já havia vivenciado em todos os seus milênios. Brigaria com a própria consciência, xingaria, gritaria, e armazenaria tudo o que realmente sentiu em seu nível mental mais longínquo e inalcançável, e quando por fim, precisasse lidar com ele, iria odiar-se vorazmente por ter sido fraca, eliminando as palavras “razão” e “resistir” de seu dicionário. Já estava escrito. E mesmo que seus olhos mentissem, e seus sentimentos também, ela daria um jeito de contorna-los, até poder destruí-los.


Mas só quando acabasse. Por enquanto, a razão ainda não falava por ela. E tudo o que importava era beijá-lo. Para sempre, enquanto fosse possível.


x-x


A intenção, inicialmente, era apenas fazê-la calar a boca. Ele não pretendia, ou melhor, não esperava que fosse ser nada diferente disso. Só queria ganhar, e se para isso era necessário apelar para medidas potencialmente drásticas, então ele o faria. Entretanto, aquela era uma medida, tão, mas tão drástica, que no momento em que recorreu a ela, se arrependeu no exato segundo. Ele sabia que aquela decisão iria ferrar tudo no futuro. E o pior de tudo é que ele não ligava.


Quer dizer, Poseidon tinha certeza absoluta que a resistência seria tanta, mas tanta, que acabaria voando até o teto e logo em seguida receberia tantos tapas, socos e chutes que precisaria ser um centímano para conseguir reter todos eles.


Porém, mesmo assim, havia ido frente, e quando tomou ciência de sua situação, seus lábios já estavam se apertando firmemente contra os dela, que por sua vez, continuava se agitando por debaixo de seu corpo. Algo que ele não noticiara até o momento em questão, mas soava, ainda que adversamente– afinal, eles estavam no meio de uma briga – violentamente excitante.


O ambiente parecia tão reconfortante, quieto e calmo, que ele sequer se permitiu sentir mal pela explosão de violência que viria a seguir.


Só estava feliz demais para se importar, e os lábios de Atena, por mais penoso que lhe fosse admitir, pareciam ser feitos de mel. Tão delicados sob a pressão dos seus, invasivamente agressivos. E à medida que os segundos passavam se convertendo em minutos, parecia mais difícil para ele resistir à tentação de abrir caminho por ali.


Não, ele não perdia nem por um milésimo de segundo a consciência de que a mulher que estava, por falta de palavra melhor para descrever, beijando, era sua irritante inimiga Atena. A prisioneira de um Sequestro. E muito menos esquecia que eles estavam presos em uma briga justamente naquele instante.


Entretanto, sua certeza sobre os tapas, socos e chutes que deveriam vir, estava desaparecendo progressivamente, conforme o tempo passava e ela permanecia toda imóvel, como se seus mecanismos mentais tivessem entrado em curto-circuito.


E pela proximidade que ele os desafiara a enfrentar, podia sentir o corpo dela, frágil e frio, metaforicamente implorando pelo seu, abrangente e caloroso.


Pensando que aquilo não podia ficar mais estranho do que já estava – afinal, era para Atena estar batendo nele, ou pelo menos tentando- Poseidon desistiu de segurar seus impulsos e começou a tentar beijar Atena. Desta vez, de verdade. Ele podia até odiá-la, mas isso não a impedia de ser tentadora, tão tentadora quanto proibida, e o cheiro de cereja do cabelo dela estava enlouquecendo-o tanto que ele não tinha nem como descrever.


Começou a mordiscar levemente o lábio inferior dela, como que para estimulá-la a ter alguma reação, e não foi possível para ele dizer o que o surpreendeu mais, se foi ela não tentar se desprender quando suas mãos pararam de comprimir seus pulsos contra o colchão, ou se foi o fato de que, ao invés de lhe dar uma dentada, como ele bem esperava que fizesse, Atena suavemente abriu os lábios, para a tão desejada passagem de sua língua, e deixou com que a dela continuasse aquele jogo brincando contra a dele.


Ele sabia que devia estar sonhando, ou que devia estar preso em alguma realidade próxima disso, porque aquilo que estava acontecendo era impossível. Total e completamente impossível. Atena com certeza queimaria os próprios livros, destruiria o próprio templo, e chamaria Zeus de nomes bem sujinhos antes de sequer considerar beijá-lo. Ele tinha certeza absoluta disso. Não que suas certezas valessem muita coisa, já que estavam se provando serem bem duvidosas, considerando que não havia recebido nada do que esperava dela, e sim totalmente o oposto.


Mas seja lá o que estivesse acontecendo com Atena, Poseidon só conseguia concluir que gostava. Gostava muito dessa Atena. Ela não era chata, entediante, e briguenta. Era apenas uma mulher que seguia seus instintos. Talvez fosse impressão sua, mas o corpo dela pareceu arquear de prazer quando liberou seus pulsos para poder passar a correr as mãos sobre suas macias pernas, outra coisa que ela também jamais ousaria fazer. E mais chocante ainda: ela, uma vez que possuía as mãos livres, começou a puxá-lo para mais perto, ainda que já estivessem no limite da proximidade, e percorrer os dedos em seu cabelo. Ele simplesmente estava pasmo demais para acreditar, que aquilo estava mesmo acontecendo. Sua única certeza naquele momento era que ele não queria que acabasse.


Era vergonhoso admitir que estava gostando daquilo muito mais do que deveria, porém, algo que Atena - e somente ela - tinha conseguia mexer com ele de uma forma que as milhares de mulheres com quem já estivera jamais conseguiriam. Era simplesmente bom demais beijá-la, por mais que ela parecesse tímida e arisca, e era um contato tão viciante que, mesmo não parando de tê-lo, ele ansiava por mais.


Porém tudo foi interrompido quando, repentina e inesperadamente, puxaram-no para verdadeira realidade, abrindo a porta do quarto, e gritando o seu nome.


x-x


Despertar do transe foi péssimo. Foi como se tivesse sido bruscamente acordada depois de sonhar por um milhão de anos. Arrastada à força de um lugar próspero, uma subconsciência imensamente feliz, sem nem ter como resistir. Porém, por mais que esse choque entre realidades houvesse sido brusco e horrendo, não fora, nem de longe a pior parte de tudo aquilo.


Suas pálpebras se desfecharem. Esta sim foi a pior parte de todas.


Acontecera dessa forma:


Primeiro, ela havia ouvido aquele grito horrendo, uma palavra ininteligível, mas que a despertou e quase a ensurdeceu.

Depois, conseguiu respirar com precisão de novo, porque alguma coisa parecia impedi-la de fazer isso antes.

E logo após, foi o momento que seus olhos se cansaram de ficar fechados, e resolveram se abrir tão rápido quanto janelinhas em uma tarde de verão.


Antes tivessem ficado fechados.


Atena não sabia o que esperava ver ao abri-los. Seu quarto, muito provavelmente. A paz, em sua forma mais pura. Mas os olhos, que nunca haviam mentido antes para ela, conseguiam apenas focalizar o brilho esmeralda que pulsava apenas a alguns centímetros distantes de sua face. Era um tom tão distinto de verde, que a partir daquele momento, ela foi obrigada a se dar conta de onde estava, de como estava, e de com quem estava. Levou de brinde ainda, o recuperar da ciência de tudo que se transcorrera para estivesse ali naquele instante. Absolutamente tudo mesmo.


As informações pareceram conflagrar, sendo impressas em sua mente, concordando com os toques que inconcebivelmente sentia na pele e com o desacelerar de seu coração, que parecia querer rasgar a carne com a intensidade das batidas.


Atena nunca havia antes amaldiçoado com palavras chulas o próprio corpo, mas sempre há uma primeira vez.


Quando seus olhos, de repente, se cansaram de navegar em mares verdes, começaram a involuntariamente explorar o sorriso, que, sem falha alguma, estava lá. Resplandecente e com notas de sarcasmo, um sorriso completamente dele, pronto para fazê-la, pela primeira vez em milênios, não querer ser imortal. Isso e mais a sensação de ter mãos pousadas sobre as suas pernas, e um corpo confortavelmente debruçado sob o seu.


Era um absurdo!


Atena era inviolável. Ninguém tocava nela. Nunca. Pelo menos não daquela forma.


Ela jurara que esfregaria no asfalto a cabeça de quem tentasse tocá-la. E arrancaria a própria, se tivesse permitido. Lidando com a verdade, já era para haver dois corpos gravemente feridos naquele local. Mas ela não estava fazendo nada!!!


Então, como num impulso gerado por suas reflexões, Atena arremessou-o de cima de si. Tinha usado muita força, porque achava que enfrentaria resistência, mas como estava despreparado, Ele literalmente voou por de cima de seu corpo, sendo apenas impedido de se chocar na parede porque enroscara-se no dossel, muito embora agora ela se recusasse a olhá-lo.


Era capaz de assimilar, mas não era capaz de aceitar, o que estava acontecendo há segundos atrás. Continuaria acontecendo, talvez, se não fosse pelo grito. Ela tinha de admitir pelo menos para si mesma, que estivera fora de si. Somente a vibração sonora fora capaz de despertá-la. Mesmo que ela preferisse viver no Hades do que num mundo onde aquilo havia acontecido.


Seu inimigo mortal. O execrável. O asqueroso. O peixe anencefálico e estúpido. O platelminto pérfido e pernicioso. Que dizia odiá-la, quase tanto quanto ela o odiava. Que havia levado-a para aquele lugar. Que a fizera limpar, lavar e esfregar, como se lhe fosse digno. Que a enganara, mentira, para ela e para todos. Que havia reduzido seus poderes e segurado seus pulsos como se ela fosse uma garotinha fraquinha e indefesa. Aquele que ela não conseguia suportar ter de respirar no mesmo ambiente. Fora com ele. E não havia escapatória, porque ele ia esfregar isso em sua cara até que virasse cinzas. Fora para ele, que Atena cedera seu primeiro beijo. E não fora nem capaz de evitar. Não sabia o que havia acontecido, mas havia sido traída por si própria. A ideia a enojava tanto que ela quase não conseguiu ficar sentada na cama, como era seu desejo. Levou os dedos aos lábios, só para constatar que ela não havia imaginado tudo aquilo num pesadelo cruel.


E em seguida voltou a olhar para ele.


Resmungando por conta do impacto, e cambaleando enquanto ia se levantando, enrolado no dossel do lado esquerdo da cama, Poseidon enunciava “ai” como se fosse um refrão de uma canção.


Ele nunca parecera tão detestável e repugnante para ela. Por mais improvável que isso fosse, considerando as incontáveis vezes que ele parecera detestável e repugnante.


Atena só foi se recordar, que, por alguma razão, eles não estavam sozinhos no quarto, quando uma outra lufada de gritos veio a atormentar seus ouvidos, fazendo sua cabeça instintivamente mover-se naquela direção.


–Ah, deuses. O que foi que eu fiz, o que foi que eu fiz? Desculpe! Por favor, me perdoem, eu....eu não sabia que...eu... ah, que vergonha, que vergonha, eu não acredito nisso, eu... Ah, não. É ela! É Atena, e eu vou conhecer a melhor deusa de todos os tempos feito uma enxerida, ah, não... –Os ruídos emitidos pela náiade eram pronunciados com tanto desespero e fervor, que saiam freneticamente rápidos. Enquanto falava, andava de um lado para o outro, com a mão na testa, sem olhá-los. Seu rosto estava todo vermelho, combinando com o tom de seus cabelos escorridos e lisos, e com o vestido que trajava. Havia apontado para Atena em um momento da fala, mas como a loira estava tentando lidar com um bolo de culpa do tamanho do continente asiático preenchendo sua garganta, as palavras soaram ininteligíveis. -Poseidon, meu amado, eu não quis que vocês...Era...Era importante para...


–Shhhhhh! – Uma exclamação de silêncio, feita por quem Atena preferia esquecer-se de que existia, silenciou os apelos desesperados da mulher. –Não há nada para pedir desculpas, Lans. Isso...não foi nada. –Disse ele, referindo-se ao que a ruiva havia presenciado.


O quê??! Que estúpido!Isso foi, definitivamente, e com toda certeza do universo, alguma coisa! Atena pensou, como resposta as palavras dele, cujo significado ela conseguiu interpretar muito mais facilmente do que as da naiáde, por alguma razão estranha. Repugnante, imperdoável, errada e ridícula, mas foi alguma maldita coisa.


–Ahn...-Como Atena, a ruiva não parecia pensar o mesmo que Poseidon, que aquilo havia sido “nada”. Estava explicito no pequeno murmúrio. –Eu...Precisava muito falar com o senhor. –Ela disse, dirigindo-se a Poseidon. Porém Atena sentia claramente aqueles olhos escuros sobre si, como se a ninfa a estivesse analisando. Desta vez compreendeu as palavras dela, mas sentiu um absurdo nojo de como foram proferidas. –É importante.


Ela não deveria trata-lo assim! Senhor... Argh, Nunca! Nem que ele seja senhor das algas e dos camarões. A loira pensou, mas a piada não a ajudou a relaxar, nem mesmo nos ombros. Sabia que seu aspecto devia ser semelhante ao de uma de suas várias esculturas feitas de pedra.


–Ah, beleza. Vamos conversar. Mas...ahn, será pode esperar lá fora uns minutinhos Lans? Tenho que vestir algo mais apropriado...


Ahnnn...O quê???! NÃO. NÃO OUSE SAIR DESSE QUARTO, GAROTA. NÃO! NÃO ME ABANDONE, LANS! POR FAVOR, EU LHE IMPLORO! NÃO ME ABANDONE! PELO MENOS NÃO SOZINHA...COM ELE. AAAAAAAAAAAH!


–É claro que sim, senhor. Com licença. – Lans sorriu um sorriso constrangido, em seguida fez uma pequena reverência. Parecia contente de sair. – Com sua licença, também, Senhora Atena.

NÃO! VOCÊ NÃO POSSUI MINHA LICENÇA! Atena gritou em pensamentos, mas só teve tempo de ofegar e desembaçar o olhar antes de ver a ninfa partir. O seu desejo mais profundo era sair correndo desesperadamente, como uma criança, em direção a porta, e acompanha-la, partindo para nunca mais ter de encarar Poseidon outra vez. Mas isso era impossível e enquanto seu orgulho vivesse não a deixaria fazer isto.


Ela tinha de enfrentar as consequências, e o barulho da porta se fechando foi a deixa.


Porém, mudou de opinião, antes mesmo de se virar para vê-lo novamente, e tudo o que fez foi recobrar os movimentos para deslizar até a ponta mais extrema da cama, encolhendo-se toda como se quisesse sumir. Bem, na verdade queria. Se o chão abrisse e a engolisse, ela ficaria toda a sorrisos.


Merda. A senhorita me deve um dossel novo, acabo de rasgar este aqui. E tudo porque você me empurrou. – Reclamou Poseidon, terminando por fim de se desembaraçar do artefato e começando a caminhar na direção do guarda-roupa. Atena conseguia sentir os olhos dele sob ela, e portanto desviou o rosto para baixo. Não queria mais ter a visão obscena do corpo dele descoberto. Era perturbador demais. –Aliás, por que fez isso, Ateninha? Não havia necessidade de forjar esse drama. Lans é de casa. E gosta de você. Nunca contaria para ninguém que estávamos dando uns amass...


A garganta de Atena parecia estar se fechando conforme sua raiva aumentava progressiva e descontroladamente. Queria simplesmente tapar os ouvidos com os dedos para não ter que ouvir a voz irritante dele e suas palavras arrogantes e maliciosas, mas não queria dar o prazer a ele de fazê-la agir infantilmente. Seu cérebro idiota processou as vibrações sonoras fazendo-a compreender aqueles desaforos quase instantaneamente. Confortou-se com a imagem do icor dele escorrendo até alcançar o chão.


Nós não estávamos fazendo nada disso! Estávamos duelando! –Cortou a deusa, com uma voz forte que ela não soube da onde arranjou, antes que ele pudesse completar nojentamente a frase. E ela não estava mentindo, duelando era exatamente o que eles estavam fazendo...antes.


Mas o antes era irrelevante para ela.


Ouvir o riso de graça dele, fez Atena destruir os bordados do edredom com as unhas.


–Aham, é claro que estávamos. –Comentou Poseidon, sorrindo sarcasticamente para porta do guarda-roupa antes de abri-la. –Deu para ver o quanto você é feroz.


Argh. Atena estava determinada a se jogar de um abismo naquele instante, mas ao se lembrar que permaneceria viva mudou de ideia. Que excrementos de ruminante dominaram seu cérebro momentos atrás para que conseguisse encostar os lábios... naquilo??? Eca. Só queria uma caixa d’Água para poder vomitar e mais uns 295 mil litros de desinfetante para se lavar. Mas nem isso ela podia ter. Tinha que continuar presa num quarto com ele.


Cale isso que chama de boca e desapareça logo daqui, Poseidon, ou senão... Eu nem sei o que sou capaz de fazer com você! –Atena finalizou a ameaça com uma respiração profunda, para não perder o controle, e finalmente desviou os olhos para ele, encolhendo-se mais um pouco. O energúmeno parecia indeciso sobre qual roupa vestir. E quando ouviu suas palavras olhou para ela. Daquela sua forma bem safada e nojenta.


–Isso que eu chamo de boca, Atena, não parecia assim tão ruim agora há pouco.–A frase nem parecia assim tão ofensiva, mas a forma que ela a pronunciou fez toda a diferença. – E pode ter certeza de que eu não sei do que você é capaz... - Aquele seu tom asqueroso sugeria alguma fantasia de conotação sexual. Assim como os olhares que ele lançava, não para ela, e sim para o corpo dela, por mais encolhido que estivesse -Mas estou ansioso para descobrir...


–GRR, ENTÃO VÁ DESCOBRIR NO HADES!!!


Ela ficou com tanto ódio que berrou, com força, esquecendo-se de que a pobre Lans poderia estar ouvindo tudo. Levantou-se da cama, abandonando sua forma encolhida para poder se impor. Não deixaria ninguém trata-la desse jeito, como se ela fosse uma...uma qualquer. Ela era Atena, a Deusa da Sabedoria, e agiria como tal, mesmo que não tivesse sido nada sábio deixar que as coisas chegassem aquele ponto.


–SEU... – Ela tentava desesperadamente encontrar em seu histórico de palavras baixas algo perfeito para se referir a ele, mas todas pareciam escapar por entre seus dedos enquanto o olhava. -Seu...


–Seu lindo, perfeito, imensamente gostoso, e irresistível? –Sugeriu Poseidon, com um erguer de sobrancelhas convencido.


Olhou-a até que ela ficasse vermelha – de vergonha, ou de ódio, ou dos dois- enquanto pegava alguma coisa no armário.


–NÃO! Eu queria dizer algo como... Acéfalo paralítico ambulante e pretensioso, progenitor de verborreias constantes.


–Hã?! – O deus franziu a testa, não compreendendo nem mesmo 1% dos xingamentos sofisticados dela. – Ah, deixa para lá, eu não quero saber, deve ser mais uma dessas mentiras que você diz que pensa ao meu respeito. –Deu de ombros, enquanto ia caminhando na direção onde Atena estava, congelada de ressentimento por ele nem se importar em saber de que nomes horrendos o estava chamando. Trazia consigo duas camisas havaianas, uma mais puxada para tons de azul e outra para tons de verde. Quando chegou suficientemente perto, ergueu as duas e as exibiu para ela. – Qual delas eu devo vestir, Atena?


–A mais verde. Parece mais casual e combina com o tom dos seus olhos. –Ela falou tão espontaneamente, que nem refletiu sobre o quão estúpida era aquela pergunta. Até se dar conta do que tinha feito e se repreender tanto que quase deu um tapa na própria cara. Tinha sido automático, mas quando o viu sorrindo e largando a outra camisa no chão para vestir a verde, teve um semi-infarto. Ele estava mesmo seguindo a sua dica. – Ei, espere aí. Desde quando eu sou consultora de moda?...Ou melhor, desde quando minha opinião importa para você?!

Poseidon revirou os olhos. Atena parecia querer contestar tudo, e ele estava ficando surdo pela forma com que ela elevava o tom de voz para pronunciar com indignação algo que tinha noticiado.


–Os casais costumam dar dicas sobre o que querem ver vestido um no outro. –Contra-argumentou, simplesmente, voltando a atravessar o quarto para buscar uma bermuda branca, num outro compartimento. Vestiu-a super habilmente, enquanto Atena o observava, incrédula.


Dessa vez, a frase a fez sentir um mal-estar que lhe deu índicios de desmaio.


–NÓS NÃO SOMOS E NUNCA SEREMOS UM CASAL! DE ONDE VOCÊ TIROU ESSA IDEIA ABSURDA, POSEIDON?!


O deus se voltou para ela com uma expressão descontraída.


–Eu nunca disse que nós erámos. Você que está aí sonhando coisas ABSURDAS, Atena.


Ele finalmente esgotou o estoque de paciência da deusa com aquele comentário. Ela começou a andar de um lado para o outro para reter a ansiedade. Tinha que fazer alguma coisa contra ele, e urgentemente, antes que acabasse tendo um surto nervoso e destruísse tudo que encontrasse pela frente.


–Qualquer coisa que envolva você, Poseidon, não pode ser chamada de sonho. Tem que ser no mínimo, um pesadelo.


–Hahahaha. – O sarcasmo de sua risada foi tão grande que quase pareceu entrar na pele dela. Agora que, Graças a Zeus, estava completamente vestido – exceto pelos botões da camisa havaiana, que ele ainda não abotoara- Poseidon andou em sua direção mais uma vez. Atena ficou imaginando como ele sorriria esse sorriso malicioso se ela lhe desse um soco que o fizesse perder os dentes. –Seus atos contradizem suas palavras, minha querida.


–MEUS ATOS? – A deusa não teve medo de ir ao encontro dele. Queria ter o prazer de machuca-lo, de alguma forma. –Você me ataca, dessa sua forma nojenta e repugnante, e depois vem falar dos MEUS ATOS?


Ele foi negando com a cabeça cada uma das palavras dela. Divertia-se pela forma com que ela parecia achar tudo um grande insulto, mas dessa vez, foi ele quem se sentiu insultado.


–Alto lá, minha querida. –Poseidon já não estava mais usando o tom descontraído de antes. Parecia finalmente ter entendido que se continuasse sem agir com seriedade teria que contê-la de novo, porque ela tentaria esbofeteá-lo. -Você estava me ensurdecendo, e eu não podia usar minhas mãos para calar essa sua linda boca, porque elas estavam ocupadas te segurando, depois de você vir querendo me encher de socos e tapas. Eu não tinha outra opção senão “te atacar dessa minha forma nojenta e repugnante”! – Ele fez aspas com os dedos, fazendo uma engraçada imitação da voz dela.


Atena grunhiu de raiva.


–É claro que você tinha outras opções, você é um deus, e eu estou vulnerável, poderia fazer eu parar de gritar, se quisesse. E PARE de me chamar de querida!


Os cachos loiros de Atena caíram no rosto dela quando ela gritou, deixando a frase mais enfática. Agora estavam próximos o suficiente para que ele enxergasse o brilho de ódio na íris dela, mas não próximos o bastante para o mínimo toque que fosse.


–Seria injusto usar das minhas capacidades, uma vez que você não pode usar das suas. – Ele se justificou, com uma pose de orgulho e nobreza.


Atena bufou.


–VOCÊ vem me falar de justiça? Logo você, Poseidon?! Você,que rouba até no par ou ímpar? Poupe-me, por favor. Isso é ridículo. –Ela sabia que o que falaria a seguir poderia destruir sua imagem de paciência e racionalidade, e até mesmo soar arrogante e mesquinho, mas Atena não se importava. Estava com tanta raiva que tinha que jogar aquilo fora, de um jeito ou de outro, antes que explodisse. –O fato é que você queria me beijar, Poseidon. Talvez sempre houvesse querido. Eu vejo você me olhando às vezes, e eu posso ser inocente, mas não sou idiota. –Atena cruzou os braços, espantando sua timidez e vergonha em relação ao assunto.- Você se aproveitou do meu ódio para poder me beijar.


Os lábios do deus iam se abrindo progressivamente, enquanto Atena jogava o que achava na sua cara, sem a menor noção de com quem estava lidando. Poseidon pareceu querer rir, várias vezes durante o discurso, mas se controlou, e guardou a risada para quando ela terminou de falar. Teve de rir por uns bons 30 segundos até conseguir replicar, enquanto Atena o amaldiçoava mental e verbalmente.


–Ah, tá bom. E depois ela diz que eu sou o egocêntrico por aqui. – Poseidon continuou rindo, aproximando-se dela um pouco mais, o que Atena encarou como uma ameaça não verbal. –De tantas mulheres lindas por aí implorando de joelhos e com lágrimas nos olhos para que eu fique com elas, é claro que eu escolheria, sem dúvidas, você, Atena. Tão linda, engraçada, simpática, meiga, gentil, sexy...Aham. Essa é você. –O sarcasmo dele era como um veneno, que parecia fazer com que Atena diminuísse um pouco a cada palavra, e a deixava, por alguma razão, com um ódio comprimido dentro do peito, sobre o qual ela não gostaria de discutir. -Ok, vamos fazer de conta então que tenha sido isso que você falou. Eu aproveitei seu ódio para te beijar, como sempre foi o meu sonho secreto. Bela forma sua de demonstrar esse seu ódio por mim, hein, Atena? Correspondendo ao beijo.


A deusa ia contra argumentar, xingá-lo de nomes feios, amaldiçoa-lo, ou coisa pior, mas o fato é que sua honra não a permitia fazer isso. Poseidon tinha razão. Por mais que preferisse arrancar suas entranhas e dar de comer a algum animal, tinha de admitir isso. Ela o odiava, sabia que o odiava, sentia, no seu sangue, que o odiava...e entretanto...entretanto...


–Você podia ter simplesmente resistido. Lutado. Fechado a boca. O fato é que não foi isso o que você fez. Você também queria me beijar, Atena. Então, se quer culpar alguém por estar desrespeitando aquele seu voto idiota, culpe primeiro você, e depois venha falar comigo... –ele piscou um daqueles seus olhos ardentemente verdes.

–O meu voto não é idiota. –Foi tudo que Atena conseguiu murmurar, em um tom de voz baixa. Lembrar-se do voto fez com que seus ombros se enchessem de pesar, tanto que era até demais para que ela suportasse. Havia desobedecido seu juramento. Ela nunca poderia ter feito aquilo. NUNCA. –Retire o que disse.


–Eu não vou retirar nada. Pela forma com que você correspondeu deu para sentir o quanto este voto é um peso nas suas costas. Você devia abandoná-lo. Conselho de quem já viveu alguns milênios a mais.


–Poseidon, sua idade mental deve ser de uns 3 anos. Para menos. –Ela comentou. O deus apenas deu de ombros.


–Dane-se. Pelo menos eu sou feliz assim. E você?


–Eu o quê?


–Você é feliz, Atena?


Sim. Sim, sim, sim. Responda sim. Agora. Já! Imediatamente!


–Sou. –Uma voz em sua mente pareceu suspirar de alívio. Embora o tom dela tivesse tremido. – Mas confesso que ficaria muito mais se você me prometesse que não vai contar o que aconteceu aqui para ninguém que saiba respirar.


–Ah, é? E o que eu ganharia com isso?


Atena não esperava uma pergunta dessas. Esperava ouvir um sim, direto. Havia se esquecido de com quem estava lidando. Mas agora ele tinha a corda sob seu pescoço. Não podia deixar que ele a soltasse, o que ele com certeza faria se isso o agradasse. Ninguém podia saber daquele beijo. Ninguém. Se ela mesma conseguisse esquecê-lo, tudo poderia ficar bem outra vez.


–Ahn, eu o acharia um pouco menos repugnante. E não vou mais tentar mais mata-lo por mentir, enganar, e abusar de mim. E, ah, é claro, por me sequestrar como se eu fosse um objeto.


Atena tinha certeza de que ele não iria aceitar. Já estava esperando o não, vindo como um tapa em sua cara.


–Ok. Eu aceito os seus termos, Atena. – Ela quase não pode acreditar quando o ouviu dizer aquilo. –Porém, sob uma condição. –Ah, estava bom demais. Lá vem. –Que você seja um pouco menos entediante enquanto eu quiser mantê-la aqui.


A loira franziu o cenho.


–É um insulto que você me considere entediante, Poseidon.


Ele deu de ombros.


–Não posso fazer nada. Você é. E muito.


Atena empinou o nariz, o orgulho levemente ferido.


–Tudo bem. Tentarei ser menos entediante, então, Poseidon. Trato feito?


–Aham. – Ele estendeu a mão, com um sorriso galanteante, para que ela a apertasse. A loira fitou-a por um momento, como se estivesse em duvida se deveria mesmo fazê-lo. Tocá-lo...Não parecia uma boa ideia no momento em questão. –Vamos logo, aperte. Não vou morder você. Se tivesse de fazer isso teria feito antes.


Atena corou até que não restassem mais pedaços de pele para ficarem rosados, e lançou para ele um olhar de reprovação, mas apertou sua mão. O cumprimento durou apenas 3 segundos, mas foi suficiente para que ela suspirasse de alívio quando enfim cessou.


–Seria bom que você convencesse a sua amiga a não dizer nada também. – Ela pontuou, ainda meio sem graça.


–Alana não vai falar nada. Mas se você faz questão, eu a aviso para não dizer. Ahn, isso me lembra que já fiz a coitada esperar demais. Tenho que ir.


Atena estava curiosa para saber o que a ninfa queria falar de tão importante para o Deus dos Mares e Oceanos, de modo a ter ido até sua bolha particular, mas não se atreveu a dizer nada.


–É bom que feche a camisa antes.


Poseidon soltou uma gargalhada alta com o alerta sério da loira. Aqueles olhos verdes a fitaram com descrença.


–Isso soou um pouco ciumento, não acha?


–O quê? Ciúmes?? Eu de você? Ficou maluco, Poseidon? – A deusa protestou, soltando um “tsc, tsc, tsc” para o comentário dele. – É só que é uma visão desagradável demais para a coitadinha.


–Aham. Seeeei sim.


–E vou aproveitar para informa-lo que tudo que aconteceu, e esse trato, não mudaram nada entre nós. Eu continuo odiando-o, como sempre, Poseidon. –Atena noticiou, rígida, e sem hesitar, demarcando palavra por palavra. Um pouco pretensiosa, mas justa, ajeitando uma mecha de cabelo loiro por detrás da orelha enquanto enunciava.


Ele, ao contrário do que ela esperava, não se intimidou nem um pouco com a fala. Na verdade, as palavras o fizeram sorrir, daquele jeito seu, como se tudo fosse uma piada que ele jamais contaria para qualquer outro alguém.


–E você acha que alguma coisa mudou para mim, Atena? –Bufou. – Eu te odeio mais do que a qualquer outra, e isto aqui ainda é uma vingança. Um sequestro. E não é qualquer beijinho que vai mudar isso...


–Não. Definitivamente não. –Ela concordou, enquanto Poseidon ia se afastando aos poucos, bem lentamente, dissecando-a com seus olhos verdes, até virar de costas para seguir até a imensa porta dupla do quarto. Parou apenas por um momento para colocar seus chinelos com desenhos de golfinho, e depois prosseguiu.


Quando ele pousou a mão, de forma decisiva, sobre a maçaneta, e a girou, Atena respirou fundo, e quando ele finalmente saiu, sem lançar mais nenhum olhar para trás, ela soltou o ar, e depois sorriu.


Um sorriso que durou apenas uns dois segundos. Quando sentiu o silêncio e a solidão repercutirem sobre o quarto, invadindo-a avassaladoramente, teve que se jogar na cama, de forma desajeitada, e se encolher, o máximo que conseguia, para poder fazer, também em silêncio, o que queria fazer desde que fora despertada, e tomar ciência do que acontecera com seu juramento. Tentar espantar lembranças de um passado onipresente, e chorar...chorar... Sem se importar se isso era sua mais profunda demonstração de fraqueza. Queria apenas...chorar.


E foi isso que fez.





Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!