O Sequestro escrita por Lívia Black


Capítulo 12
Cap 11- Não Consigo Parar Isto Que Nós Começamos.


Notas iniciais do capítulo

É, eu sei. Eu digo que não vou demorar, demoro duas semanas. Vocês comentam super lindamente, e devem me odiar. Mas olha, finalmente, eu fiz um capítulo que acho que vocês vão gostar, e realmente grande para poder compensá-los. Claro que nada disso teria acontecido sem a ajuda da Mari, mas mesmo assim eu me empenhei para o melhor (mesmo com a demora medonha de suas semanas) hahaha. Vou continuar tentando reduzir o prazo, promise (yn) não me abandonem, please ! *-* amo vocês, nháaa



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Capítulo 11 - Não Consigo Parar Isto Que Nós Começamos

"Porque há horas em que você percebe, que é simplesmente tarde demais para se evitar."

 -Ah!! –Ela exclamou, e Poseidon já até armara seu sorrisinho de diversão perversa, antes que ela pudesse suspirar alegremente, como se fosse um viajante do deserto que acabara de encontrar um oásis. - Até que enfim uma tarefa decente! –Ela sorriu, parecendo totalmente sincera, e essa foi a hora em que ele soltou os talheres contra o prato, estupefato. -Mas alto lá! Se eu for tomar banho vou tirar esse Uniforme. Entenda também que eu realmente demoro nos banhos. Eles são longos, quentes, e proveitosos. Se não gosta de nada disso, pensasse duas vezes antes de me sequestrar.

Atena ficara tão contente com a notícia que ele, por acaso, deixara escapar que mal parou para refletir duas vezes sobre ela. Tudo bem, era difícil aceitar que Poseidon pudesse ter uma partícula de racionalidade em seu ser e que estivesse tendo a prudência de dar um tempo livre para que relaxasse dos trabalhos cansativos que até então vinha fazendo, mas...Sempre havia uma primeira vez para tudo, não?

-Sério mesmo que você gostou da ideia??

Ela não entendeu porque ele a olhou tão estaticamente, quase babando, como se não acreditasse no que estava ouvindo. Apenas se ajeitou melhor na cadeira, jogando os cabelos para trás de modo displicente.

-É claro que eu gostei. Acho que não poderia ser melhor.

O suspeito riso de lado, quase sexy, que ela deu, fez Poseidon praticamente gelar na cadeira.

-Quem é você e o que fez com Palas Atena?!

A deusa teve de prolongar o riso. Não conseguia entender porque ele parecia que havia visto um fantasma. Qual era o problema em gostar de banhos, afinal?

-Não fiz nada comigo mesma. Só adoro poder tomar banhos, em qualquer circunstância. O que há de tão estranho nisso?

O que há de estranho é que você não começou a dar cambalhotas porque meu corpo nu também está incluído nessa suposta circunstância. Só isso.  Poseidon estava prestes a falar em voz alta, mas achou melhor guardar as evidências apenas em pensamento. Talvez isso a instigasse a pensar no quanto era ABSURDO um banho compartilhado entre eles.  Mas se por alguma razão (Castidade e Pureza demasiadas, talvez?!) ela não achava assim tão bizarro e não ia fazer um escarcéu todo por causa disso, melhor para ele. Aliás, MUITO melhor para ele.

-Nada não. –Ele reprimiu sua vontade de falar com mais uma garfada de comida.

Tentou não olhar para ela, que parecia normal e à vontade demais da conta, mas não conseguiu. Pelos outros deuses, o que ela tinha na mente, que uma hora não conseguia nem pensar na possibilidade de um contato físico mais próximo que um olhar e na outra estava dando de ombros para o fato de que eles iriam tomar banho JUNTOS? Ela tinha até comemorado. E sim, ela havia dito com todas as letras que ia tirar o Uniforme. É, ela ia MESMO tirar o Uniforme. Como ela não conseguia se importar com isso? Será que ela pensava que eles eram, sei lá, como irmãos e que esses detalhes, não importavam? Nem mesmo ele estava falando sério quando dissera que iam tomar banho. Era só para provocá-la, vê-la corar, se estressar, e tudo mais. Essa era a essência da coisa. No máximo tudo que ele a faria fazer era preparar um banho para ele, nada além disso. Ele não era tão idiota assim. Entretanto, ela agira da forma mais natural do Universo, como se tomar banho em grupo fosse algo completamente rotineiro. E ele já sabia que ela, apesar de toda sua castidade, conseguia enxergar pelo menos um pouco as coisas do outro ponto de vista. Quer dizer, ela realmente reparara que ele ficava secando suas pernas e até fizera questão de jogar isso em sua cara e ocultá-las. Como ela conseguia não se importar com um BANHO?!

Só havia uma explicação.

Ela com certeza não devia ter interpretado corretamente o “vamos” naquela sentença. Caso contrário, a Atena que ele conhecia estaria pirando, surtando, negando, suando de nervosismo e um bilhão de coisas mais.

Bem, mas é claro que ele não faria questão de alertá-la sobre o verdadeiro sentido da frase. Agora, iria com isso até o final.

(...)

Depois que terminaram de comer, e subiram as escadas, Poseidon estava com um sorriso no rosto irrefreável. Sabia, com toda certeza que Atena estava tão iludida quanto uma adolescente apaixonada, e bem, digamos que ele odiava perder oportunidades.

Ela o seguia, arrastando pelas escadas a enorme mala cor-de-rosa que lhe fora providenciada. Não parecia muito satisfeita, e ele sabia que talvez devesse ajuda-la, mas cavalheirismo e ele, juntos para Atena, não era lá uma boa combinação.

Contudo, quando chegaram às portas duplas de carvalho, ela também estava sorrindo.

Óbvio que não pelo mesmo motivo que ele.

-É aqui que vai ser o meu banho? 

A simples menção da palavra meu foi o suficiente para ele comprovar suas expectativas. Então, ela achava mesmo que iria tomar um banho sozinha, relaxada, feliz da vida. Há. Ela iria ter uma grande surpresa.

Poseidon abriu as portas para o quarto, e fez a melhor cara carismática de sua coleção.

-É claro. Onde achou que seria?

Atena simplesmente sorriu, inconformada com a súbita generosidade do inimigo mortal. Talvez a comida tivesse o deixado um pouco mais agradável. Era semi-impossível, porém era a única explicação que encontrava.

Ela empurrou as malas rosa-shocking para dentro do quarto enquanto se lembrava feliz de como era gostosa aquela banheira e aqueles sais relaxantes.

-Pode ir preparando o banho, Atena...

 Ele acenou com a cabeça para a porta do banheiro com um sorriso quase gentil. Atena, tão feliz que estava, deixou-se levar por essa suposta gentileza, e cruzou o quarto todo, até chegar ao banheiro, enfiando a mala e o corpo lá, sem conseguir conter um pequeno sorrisinho ao fechar a porta do aposento, já quase sentindo a textura da água contra sua pele.

Ela abriu as torneiras quentes e colocou os sais mais refrescantes que encontrou dentro da banheira. Enquanto a espuma macia ia se formando e ela já ia se enchendo de anseios por mergulhar ali dentro, começou, lentamente, a despir-se do Uniforme de empregada ridículo e vulgar, que com exceção das lingeries de Afrodite, era a roupa mais odiada por ela em todo o Universo. De certo, preferia um milhão de vezes uma caixa de papelão, mas Poseidon era cruel. Isso era um fato inegável. Era de se estranhar muito que ele pudesse estar dando um banho a ela. Tanto que ela ainda permanecia confusa.

Retirou o avental, os sapatos, a gravata, e por fim o micro-vestido, sentindo um delicioso arrepio de frio, enquanto os cachos louros tilintavam sob os ombros nus.

Seu corpo agora apenas coberto pelas suaves roupas íntimas, que ela não poderia imaginar que a deixavam tão bem e atraente, ressaltando seu físico esguio e suas curvas perfeitas.

Ela caminhou lentamente para mais próximo da banheira e fechou as torneiras quando percebeu que a espuma feita pelos sais poderia tocar no teto. Suas mãos foram guiadas até as costas, e seus dedos estavam prestes a desatar o fecho do sutiã quando ouviu um barulho de repente, que mais parecia um rangido de porta se abrindo.

Seria de se esperar que ela parasse para refletir sobre o que deveria fazer em relação ao ruído, mas o instinto pela primeira vez falou mais forte. Ela se atirou para dentro da banheira, de calcinha e tudo, deixando escapar um berro de surpresa e incompreensão, e fazendo a água voar para todos os lados, enquanto seu cabelo e corpo ficavam cobertos de espuma.

De dentro da água, sem poder respirar e inundada pelo nervosismo, ela já conseguia ouvir uma risada quase familiar aos seus ouvidos. E que nunca, em hipótese alguma, deixava de ser irritante.

-POSEIDON! – Atena berrou, enquanto saia da água, balançando a cabeça e secando a água dos olhos com as mãos. Estava tão furiosa, que até sua admiração por ele ter sido “gentil” havia se dissipado por completo.

Ela ainda tomava o cuidado de permanecer com o corpo inteiramente submerso.

O deus, que estava despojadamente apoiado no batente da porta, vestindo nada mais nada menos que uma boxer preta, ainda não tinha terminado de rir da reação automática e desesperada de Atena, cujos cachos balançavam de um lado para o outro lembrando-o comicamente um Golden Retrivier.

-Qual o problema, Ateninha?!

Ela mal ouviu e já estava resmungando com raiva, ainda enxugando os olhos ultra-sensíveis. 

-Não me chame de Ateninha, criatura anelídea , ou serei obrigada a chamá-lo de Poseidonzinho. O que não seria nem um pouco agradável. Agora, me diga, como você se acha no direito de...  –Ela não pretendia perder a voz, mas não foi algo que ela pode impedir. Depois de piscar três vezes, com os olhos enxergando com clareza mais uma vez, ela tratou de dirigir o olhar à direção do som da voz pseudo-irritante do energúmeno. O que ela não imaginaria, nem em seus mais profundos delírios, é que encontraria o ser em questão, ahn...tão vestido quanto ela. E ela simplesmente não conseguiu continuar o discurso, ou sequer impedir que o espanto fizesse seu queixo cair alguns milímetros.

 -...No direito de? Continue o que estava dizendo, Atena. Não consegue mais falar?! –O súbito “tapa na cara” que ela levou com essa pergunta fez com que ela o olhasse indignada, mas mesmo assim surpresa. –Não fique constrangida por isso, nenhuma delas consegue produzir um mínimo vocábulo por uns cinco minutos depois de admirar minha beleza.

Esse “tapa” a fez franzir as sobrancelhas, balançando a cabeça em negação, recusando-se a encarar por mais um segundo o físico perfeito que ele exibia sem o menor pudor. Que maldição! Fale qualquer coisa, Atena, qualquer coisa que destrua com elegância o ego ultra-mega-inflado dessa criatura execrável subaquática. 

Mas ela definitivamente parecia ter perdido as palavras em algum lugar do tempo, e isso era tão estranho quanto revoltante.

-Ah, e a propósito, não iria ser desagradável ser chamado de Poseidonzinho. É até carinhoso, se formos pensar pelo lado positivo. A não ser que você esteja se referindo não a mim, e sim a uma parte de mim, então nesse caso teríamos que trocar o “zinho” por um enorme “zão” e assim seríamos...

-Argh, silêncio!!! –Ela exclamou, finalmente, soltando o fôlego quando já não aguentava mais ouvir as babaquices que ele falava estática. - O que você está fazendo aqui?!  É A SEGUNDA VEZ QUE VOCÊ INVADE O BANHEIRO ENQUANTO EU ESTOU DENTRO! DÊ O FORA! –Ela ordenou, rígida e nervosa, sem nem ponderar que o banheiro não pertencia realmente à ela para que ela pudesse mandar qualquer coisa. Estava quase rosnando. – E eu não estava admirando a sua,só pra contar,inexistente, beleza.

-Ei. Vamos com calma nisso. Eu não estou invadindo nada. Eu mandei você preparar o banho, somente isso, e você concordou numa boa. E sim, você ficou admirando a minha beleza, por um longo período de tempo,e não adianta negar pois eu tenho fotos mentais que comprovam isso com fidelidade.

-Espera aí. Você mandou preparar o meu banho, mas isso não te dá o direito de entrar aqui para me assistir tomando-o, seu mentecapto repugnante! E NÃO, ISSO NÃO É VERDADE.  Eu estava apenas olhando-o chocada por sua ousadia de ter entrado. Eu poderia estar nua. – Ela inevitavelmente corou quando disse isso, e olhou para baixo para ver se a espuma estava mesmo sendo uma grande salvadora – exatamente como acontecera em O Cálice de Fogo,e ela se perguntou de onde tirara essa analogia-, o que o fez produzir um sorriso difícil de ocultar.

-O que não seria necessariamente um problema. Você não tem nada que eu já não tenha visto pelo menos umas quatro milhões de vezes. – Ela franziu o rosto com nojo, e estava prestes a contra-argumentar afirmando que ele nunca tinha visto algo comparado à ela, mas ele foi mais rápido. – E quem disse que o banho seria seu? Quando eu disse “vamos tomar banho”, e você aceitou, eu estava sugerindo um banho compartilhado, em que você pode esfregar minhas costas e coisas do tipo, e não um banho só seu. Que espécie de patrão você acha que eu sou?! –Ele fez a pergunta com uma pequena parcela de ironia, e conforme ela ia escutando, o queixo, que custara a fechar voltava a cair, e ela se perguntou como podia ter sido tão estúpida em acreditar que Poseidon estaria mesmo lhe dando um benefício.

-Eu não acredito nisso! E você realmente achou que eu havia entendido que era isso e aceitado alegremente?!

-É claro. Qualquer uma em seu lugar ficaria assim. Achei que estava tentando ser normal pelo menos uma vez na vida. – Ele sorriu, assentindo canalhamente e saindo do batente da porta para se infiltrar ainda mais no banheiro.

Atena arregalou os olhos, estupefata.

-Poseidon, você só pode ser mesmo uma criatura marinha energumenamente platelminta e acéfala, para crer que existe alguma espécie de universo alternativo onde nós dois tomaríamos banhos juntos.

Ela estava crente de que ele a deixaria em paz depois desse “pequeno” tapa.

Ledo engano.

-Bem, sinto decepcioná-la, Atena, mas essa realidade acaba de existir. –Ela curvou a sobrancelhas e se encolheu, não só porque tinha um inevitável medo das palavras dele e de seu sorriso maléfico, mas sim porque ele tinha se aproximado tanto, mas tanto, que estava quase na borda da banheira. E ela não havia se esquecido de que estava só de calcinha e sutiã. - Porque a partir desse exato segundo... –Então, ele fez algo que parou o coração dela. Fez seus olhos saltarem das órbitas. Fez a parede da banheira quase se quebrar de tanto que suas costas exerceram pressão nela. Ele simplesmente colocou um pé dentro da água, depois o outro, e em seguida abaixou-se, com muito mais cautela do que ela fizera, afundando lentamente na água que ela também ocupava. –...Nós estamos tomando banho juntos. –Atena abriu e fechou a boca para a constatação “feliz” que ele fez, enquanto esticava as pernas de modo que elas inevitavelmente roçavam nas suas, mesmo ela tendo se espremido, totalmente em choque, se defendendo com a espuma no canto. – Ahh. Olha, não sei você, mas eu não costumo tomar banho com qualquer tipo de roupa no corpo. Portanto...-Essa foi a segunda vez que ele tomou uma atitude que a fez congelar. Isso porque ela ainda não estava conformada com o fato substancial de que eles estavam numa mesma banheira juntos. Mas dessa vez, se é que era possível, tornou-se um bilhão de vezes pior. Ele adentrou as mãos na água, curvou-se, se concentrando por alguns segundos. Ela sentiu as pernas dele roçarem nas suas com mais força, e segundos depois: ali estava! A cueca que há segundos atrás era a única peça que cobria o corpo dele, agora havia sido arrancada por suas mãos, que agora a arremessavam contra o chão do banheiro, molhando todos os obstáculos pela frente.- Ah, sim! – Ele suspirou, afundando-se ainda mais na água como se a sensação fosse de um prazer infinito. -  Agora está bem melhor.

Nesse momento, o cérebro de Atena levou tão ao pé da letra o “ficar imobilizado de choque”, que um mamute poderia bater sobre ela, e ela continuaria naquela mesma posição, com os mesmos olhos vidrados, a boca escancarada, o corpo comprimido e paralisado debaixo da água.

Até que tudo isso se reverteu em uma questão de milésimo e ela começou a se debater como um peixe fora da água. O que é muito contraditório, por sinal.

-AAAAAAAAAAAAAAAAH! –Esse deve ter sido o terceiro de seus berros ensurdecedores. - NÃO! NÃO! NÃO, NÃO, NÃO! EU E AQUILO NÃO PODEMOS ESTAR COMPARTILHANDO O MESMO LOCAL!

Todo o dramalhão da deusa deixava Poseidon tão preocupado quanto um gatinho preguiçoso. Enquanto ela se debatia, ele somente sorria como se aquele fosse o melhor dia de sua vida. Seus braços se esticavam sobre a borda da banheira e seus ombros fortes cobertos por espuma estavam totalmente relaxados.

Até ele crispar os lábios com um pequeno detalhe no que ela dissera.

-Aquilo?! Não, espera aí.  Está louca de chamá-lo assim, Atena? Ele é um herói! Muitas desgraças teriam acontecido ao Mundo se não fosse por ele. –Poseidon proclamava as palavras com um sincero e infinito orgulho. - Sua filha, só para constar, estaria sem namorado nos dias atuais, se não fosse por ele.

-Ah! Até parece! – A deusa exclamou, ainda colérica, mas um pouco menos nervosa, revirando os olhos de ironia. -Annabeth poderia encontrar facilmente um parceiro romântico que não tivesse como progenitor um acéfalo cabeça-de-alga e não fosse proveniente de algo tão repugnante quanto você sabe o quê. –Ela franziu o rosto de nojo diversas vezes, o que dava um efeito hilário em sua expressão.

-Ele não é repugnante! –Poseidon logo se indignou, empertigando-se .- Você pode ver se qu...

-NÃO! NÃO, NÃO, NÃO! NEM PENSE! –Ela berrou, e então se lembrou do porque estava tão histérica. – Por Zeus. Eu preciso sair daqui. Agora. –Ela prendeu o fôlego e olhou para os lados eufórica, em busca da melhor saída que ainda a mantivesse afastada daquilo. Então, ela bateu na própria testa, inconformada, ao se lembrar de que estava simplesmente ignorando um fato crucial: Ela não estava corretamente vestida! -Ah, meu pai, eu não posso! Poseidon, saia! Arrume um jeito e saia.  –Ela falou de um modo tão imperativo e forte que foi quase convincente para ele. Quase. Havia desespero demais na fala para que ele se intimidasse.

-Hmm...Se você não pode sair, o problema não é meu, Atena. Eu bem poderia ordenar à você que ficasse, mas nem isso é necessário. Você pode sair daqui se quiser. Mas a banheira é minha. A água é minha. E eu não vou sair daqui, muito menos porque essa é a sua vontade.

A deusa sentiu vontade de pular no pescoço dele, cravar as unhas ali, e assistir se contorcendo de prazer a pausa de sua respiração. A raiva que ele causava nela com seus argumentos era absurda demais da conta. Mas tudo que ela pode fazer foi suspirar.

Não tinha escolha diante daquela tragédia.

-O que você quer para sair daqui, Poseidon? –Ela inquiriu, com um tom de voz extremamente seco, mas que sugeria cansaço.

O sorriso dele se alargou, e ele até pensou em dizer que “ela não tinha nada que ele queria”, mas isso realmente não era verdade.

Olhou-a fixamente antes de dizer qualquer coisa. Atena estava mais comprimida e estressada do que nunca. Era ao mesmo tempo cômico e trágico. Para ela, obviamente.

-Só vou sair daqui depois que terminar meu banho. Ter os cabelos lavados e as costas esfregadas não seria nada mal. –Essa última frase sem dúvidas soara mais como uma indireta-direta.

A deusa o encarou com o canto dos olhos, intimidada, enquanto refletia sobre os riscos que corria de ter algum contato INTEIRAMENTE indesejável se esfregasse as costas dele e lavasse seus cabelos. Era estranho, repulsivo, e havia uma porcentagem de perigo, mas o que ela poderia fazer se não havia outra opção?

-Ok, ok. Mas jura pelo Estige que vai sair depois, se eu fizer isso?

-Sim, juro por Ele.

Pela primeira vez desde que Poseidon entrara no banheiro Atena deixou-se demonstrar um traço de riso. Realmente, o juramento era cômico e inquebrável, só pela forma com que ele mencionou a palavra e fez uma reverência com a mão no coração depois que a pronunciou.

-Tudo bem então, vamos logo com isso. –Ela logo escondeu seu riso e falou rígida e raivosamente. -Vire-se. Quanto mais cedo essa tormenta terminar, melhor.

-Ok. Mas abra as pernas primeiro. –Ele exigiu, como se isso fosse a coisa mais natural do mundo.

Atena revirou os olhos, e tentou disfarçar o maldito rubor que acompanhou-a de repente.

-Essa piada foi ridícula e não teve a menor graça.

-Ei, e quem disse que foi uma piada? Para você esfregar minhas costas, fica bem melhor eu me encaixar entre as suas pernas. No bom sentido, é claro. – Ele acrescentou quando notou sua malícia instintiva bem explícita na frase.

Ele falava tão seriamente, e ao mesmo tempo algo para ela tão absurdo que Atena não sabia dizer se ele estava tirando com sua cara ou não.

-Mas você está pelado! – Ela protestou, incontrolável e indignada.

-O que não vai fazer diferença alguma. –Ele assegurou, falando com uma seriedade tão diferente do que ele costumava ser que Atena quase se convenceu. – Eu juro. Vai dar certo. Abre as pernas para ficar mais fácil.

-Mas Poseidon...

-Use sua lógica,Atena.Seu braço não vai conseguir alcançar minhas costas se eu não estiver bem na sua frente,e,por conseqüência,eu não vou sair daqui,e você vai ficar na banheira comigo infinitamente. – Enquanto ele falava, ela já conseguia enxergar um sorriso de “estou certo, admita” no rosto do deus. Um daqueles sorrisinhos convencidos da infinita coleção dele, que ela odiava com todas as partículas de seu ser.

Percebendo que, só de pirraça, era bem possível que ele realmente ficasse para sempre ali dentro, ela afastou um pouco as pernas, com relutância. Ele logo foi se encaixando, invasivamente, deixando-a repleta de constrangimentos.  Suas pernas roçavam no corpo dele.

Atena tentou evitar que o pensamento se dirigisse às coisas maliciosas que ele insinuara alguns minutos antes.

ECA.

-Isso é muito, MUITO, MUITO estranho.

-Relaxa. Só porque nos odiamos isso não significa que nós não podemos tomar banho juntos e que você não pode esfregar minhas costas para se livrar de mim.

-Er, isso não faz muito sentido, mas vou fingir que faz para não ter que discutir. Mesmo assim, isso continua sendo o banho mais esquisito de toda a minha vida.

-É porque você tem uma vida muito idiota e sem aventuras. – ele comentou rindo, como se dissesse a assertiva mais óbvia da face da Terra - Aqui está a esponja.

-Isso não é verdade. Eu já tive muitas aventuras. – ela rebateu, indignada, enquanto pegava a esponja molhada e já cheia de espuma com as pontas dos dedos,e a esfregava delicadamente nas costas dele.Não o fazia desse modo porque era sua intenção,mas simplesmente porque não podia negar sua natureza de fazer tudo minuciosamente. Ele controlava alguns espasmos de prazer e a vontade irracional de relaxar totalmente, ficar ainda mais perto do corpo macio dela, mesmo que eles já estivessem mais próximos do que jamais estiveram e até mesmo estariam. Quer dizer, quando ele poderia imaginar que ficaria entre as pernas dela?!!

-Ah, é mesmo? Aventuras? Alguma delas que envolvesse o sexo oposto...?

-Não esse tipo de aventura, Poseidon! Pelo amor de Zeus, será possível que seu cérebro não consiga assimilar nenhum outro assunto?

-Então não foram verdadeiramente aventuras! E não tente desviar da conversa, vai ser inútil.

-Foram sim, seu insensível! Não é só porque eu preferi me privar da luxúria que não posso ter minhas diversões.

Ele bufou sonoramente.

-Eu nem consigo imaginar, Atena, como deve ser chato viver a sua vida. Esses seus conhecimentos infindáveis e entediantes, esse seu juramento estúpido de castidade, essas suas brigas em que você tem que ser sempre a melhor. Não entendo como você pode ser feliz com tudo isso. Sério. Principalmente sem o sexo. -  ele deu de ombros,como se fosse alguma coisa que nenhuma alma viva no Universo inteiro pudesse entender.

-Mas eu sou. Feliz, sabe. –Atena não entendeu a hesitação que ocorreu em sua própria voz.

-Será que você não pensa em como seria a sua vida sem tantas preocupações desnecessárias, sem esse voto ridículo que não te deixa transar, sei lá...?

-Olha, eu realmente prefiro não falar sobre isso. E meu voto não é ridículo, Poseidon. Você que é insensível demais e não tem capacidade de pensar com a cabeça certa.

-Ei, espera. –Ele pediu, enquanto desconsiderava a última afirmação afiada dela. - Prefere não falar sobre o quê? Sobre o voto?

-Hm... Também.

-O que é há com ele? Um segredo obscuro? – o deus perguntou, virando-se para Atena, os olhos cintilantes como os de uma criança prestes a ouvir uma história de terror.

O descontentamento dela com essa reação foi obviamente explícito.

-Se é um segredo você é o último para quem eu contaria. – ela retrucou, cáustica.

-Por quê? Você nunca ouviu dizer que alguns inimigos podem ser mais confiáveis que amigos em determinadas situações? – falou, numa cara emburrada, os cantos da boca repuxados propositalmente para baixo de um jeito quase...fofo. Quase.

-Não. E muito menos nesse caso. Agora, Poseidon, faça o favor de virar de volta, eu ainda preciso lavar seu cabelo para poder sair daqui – ela completou, num tom de voz que claramente expressava tédio e resignação.

-Mas eu não contaria para ninguém. Palavra de escoteiro. Há formas bem mais prazerosas de machucar sem ficar tocando em segredos obscuros. – ele deu uma piscadela antes de voltar à posição original. - Agora eu fiquei curioso, Atena.

-Nossa, estou tããããããão preocupada.  – foi a única coisa que ela se deu ao trabalho de responder, parecendo subitamente concentrada em espalhar o shampoo nas mãos.

-Mas eu odeio ficar curioso!

-Seja bem-vindo ao clube. – ela continuou, sem fazer nenhum esforço para mostrar um mínimo de empolgação.

Poseidon ficou irrequieto com a resposta. Balançou o corpo, olhou para alguns pontos de água que não estavam cobertos pela espuma e com um simples toque mais caprichado, a mesma ficou totalmente sob seu controle.

Ele quase pensou em fazer toda a espuma se diluir, o que seria interessante, mas focou seus poderes em algo diferente e um pouco mais persuasivo. Ele esboçou um sorriso, e bastou um mínimo pensamento para uma parcela da água tomar vida e se erguer ao ar, chamando a atenção da deusa, e formando a frase em transparente: “Conte o segredo, Atena!”

Ela balançou a cabeça de um lado para o outro, inconformada com os gracejos dele, e quase sorrindo. Ficou satisfeita que ele não estivesse a olhando naquele momento. Então suspirou, e sem pensar duas vezes afirmou:

-Nem pensar. –A água imediatamente voltou para a banheira a menção da frase secante. -Agora, quer fazer o favor de ficar quieto para eu poder lavar seu cabelo?Por Zeus,uma criança de dois anos se mexe menos do que você, Poseidon.

Ele poderia retrucar de um milhão de maneiras diferentes, mas estava muito ocupado tentando ficar quieto quando sentiu os dedos de Atena massageando – sim, porque não havia outra palavra para descrever o que ela estava fazendo, ainda que obrigada- seu couro cabeludo.Tudo ali ficara deliciosamente sensível,e,ele nunca admitiria,mas era muito relaxante ter os cabelos lavados por ela. Os dedos dela eram angelicalmente macios e suaves. Em contrapartida, era uma coisa tão diferente de qualquer outra, tão deliberadamente delicada, que assumia uma conotação quase sensual. Ou talvez fosse o simples fato de ele estar numa banheira cheia de espuma, sentado entre as pernas – e que pernas, por sinal – de Atena. Ele teve que fazer um grande esforço para que pensamentos inapropriados não tomassem conta dele. Não queria ataca-la de repente. Nem conseguia imaginar quais seriam as reações dela se fizesse isso.

Pelos outros deuses, eles ainda estavam no terceiro dia de sequestro! Se continuasse assim, ele não ia querer nem imaginar o que aconteceria depois. Ou melhor, querer ele até ia, só não enquanto estivesse próximo de uma Atena que poderia usar a embalagem do shampoo para acertá-lo na cabeça ou a toalha para enforcá-lo. Vai saber.

 -Você nunca contou para ninguém?

-Hã? – Ela tinha perdido totalmente qualquer ideia de conversa que eles pudessem estar tendo, enquanto se concentrava em não se acabar de nervosismo e ansiedade por estar esfregando os cabelos dele.

-O voto. – Ele enunciou, revirando os olhos, ainda que ela não o visse.

-Oh. Achei que esse assunto já tinha acabado. Não quero falar sobre isso, Poseidon. Será possível que eu vou ter que desenhar para que você entenda?

-Mas por quê? É tão péssimo assim?

-Já disse que não vou falar.

-Tem alguma coisa haver com algum homem?

-Cale a sua boca! Olhe, seu cabelo já está bom. – ela disse, enquanto terminava de enxaguar o dito cujo - Já está na hora de você sair.

-Antes eu preciso repassar e lavar outras partes, no chuveiro.

-Sem problemas. Eu não faço questão de olhar.

-Você deve ter algum tipo de distorção na mente. –Ele afirmou, inconformado com a última frase da deusa.

-Pelo menos eu tenho mente. – ela deu um sorrisinho minúsculo ao dizer isso.

Atena levantou um pouco os joelhos – a espuma ainda estava muito densa na superfície, de modo que fazer isso não seria embaraçoso – e encostou a cabeça neles, cerrando os olhos com muito mais força do que o necessário, enquanto sentia a água se mexer bastante, indicando que ele saíra da banheira.

-Não seja tão perversa, Atena. Nem tão cruel. Isso machuca, sabia?

-Eu não sou. Só você tem o poder de me tornar um pouco perversa,e só um pouco. – ela não se deu ao trabalho de responder melhor ao sarcasmo tão visível dele.

-Esse é só o primeiro dos meus poderes. – ele disse,enquanto dava seu melhor sorriso propaganda-de-creme-dental, muito embora soubesse que ela não estava vendo,o que fez o sorriso parecer meio bobo na hora,mas ele não podia controlar esse reflexo.

-Não preciso saber onde isso terminará.

-Um dia você vai descobrir,Ateninha.

-Que maravilha,Poseidonzinho.Mal posso esperar para que esse dia chegue.

Ele não se deu ao trabalho de responder ao sarcasmo, e ela começara a ouvir o barulho da água do chuveiro caindo, indicando que ele já havia começado a segunda etapa de seu banho. Pressionou com mais força ainda os olhos, não que estivesse tentada a olhar (bem, talvez só uma parte de seu inconsciente estivesse), mas só porque não queria vê-lo comentar qualquer coisa com escárnio a respeito dela estar curiosa.

Um cinco minutos depois, em que ficara apenas pensando no quanto aquilo tudo era bizarro, ouviu o barulho de água cessar, e perguntou:

-Já posso abrir os olhos?

-Pode. –Ele afirmou na mesma fração de segundo.

Atena se travou.

-Hm...Não, não vou acreditar assim. Só depois que você não estiver mais aqui.

-Tá bom então, você não sabe o que está perdendo.

-Eu não quero saber. Se é que eu estou perdendo alguma coisa– depois de algum tempo,e depois de ter escutado os passos e a porta ser aberta e fechada, ela foi abrindo os olhos, receosa. - Já foi? Poseidon? Ah, Graças aos Deuses.  –Soltou um suspiro de alívio.

 -Bu!!!! – Antes que Atena pudesse sequer pensar, já estava gritando, enquanto ele saia de seu esconderijo (na borda da banheira,o único canto em que ela não o veria) e a assustava.

-Aaaaaah! Seu ridículo! – Xingou, enquanto notava que, pelo menos, ele estava com uma toalha branca ao redor do corpo, o cobrindo.

-Puxa, Atena, assim nem parece que você me ama. – e,outra vez,o deus fez sua tão famosa cara de cachorrinho abandonado.

-Hahaha, deve ser por que eu não te amo mesmo, sabe?

-É claro que ama, só que seu orgulho não permite admitir.

-Ah, sim, claro. Totalmente certo. –Ela apenas revirou os olhos.

-E não é?

-Aham, é lógico. –Ela percebeu que nunca havia sido tão sarcástica em toda sua vida. -Agora vá!

Seria de se esperar que ele negasse, mas eles tinham um acordo.

-Tudo bem. Já vou.

Ainda rindo, ele saiu e fechou a porta, mas Atena ainda esperou algum tempo para se certificar que ele não voltaria.

-Tomara que realmente não volte mais! – A deusa acrescentou para si mesma, agora sim, com um verdadeiro suspiro de alívio, que soou quase como um riso. -Inferno.

Nunca que ela iria admitir que,além do mais estranho,aquele fora possivelmente o banho mais engraçado – de um jeito meio perturbado,talvez,mas ainda assim engraçado - que ela já tivera em todos aqueles milênios.

Pelo amor dos deuses, o que era aquilo que estava acontecendo com ela?


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Notas finais do capítulo

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