Ainda escrita por Nara


Capítulo 18
Décimo Sexto Capítulo




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/188454/chapter/18

Décimo Sexto Capítulo

Você sabe que essa é uma longa conversa, Edward. - Isabella respondeu cabisbaixa.

Edward encarou-a, franzindo a testa. - Eu não acho que seja uma conversa longa. Na verdade é uma conversa bem simples. - ele rebateu, erguendo uma sobrancelha.

Isabella se levantou e deu uns passos em direção ao rio, encarando o horizonte e o pôr do sol.

— Isso é porque você nunca se importa com o que eu sinto. - ela falou ressentida.

Edward bufou. - Como você pode dizer isso, Bella? Depois de tudo o que passamos, depois desse reencontro após tantos anos separados. Será mesmo que precisamos voltar nessas questões? - ele passou as mãos freneticamente pelo cabelo bagunçado.

— “Essas questões” são a forma como eu me sinto, Edward. Sempre foi assim, desde o começo. As pessoas sempre acham que podem passar por cima “dessas questões” e que se dane a forma como eu me sinto, como eu penso.

O homem aproximou-se dela, tocando levemente os seus ombros. - Você sabe que eu não quis dizer isso, Isabella. Eu só não quero brigar com você. - afirmou. Dessa vez foi Isabella quem bufou.

Ela então virou-se para ele.

— Sabe qual é o problema, Edward? - ela ergueu uma sobrancelha. - O problema é que tanto você quanto os meus pais, que Deus os tenha, sempre acharam que o problema estava em mim. O que te faz acreditar que eu quero brigar? Eu odeio ficar discutindo, isso me cansa. Mas sempre que eu tento dizer a forma como eu me sinto, você diz que eu quero arranjar confusão. Dizer o que eu penso é arranjar confusão? Por quê? É confusão se expressar? Como eu deveria agir então? Eu tenho que aceitar tudo que você me propõe, da mesma forma como eu tive que aceitar esse casamento que eu nunca desejei? - ela despejou tudo nele.

Antes que Edward pudesse se defender, ela prosseguiu:

— Eu lhe pergunto: por que sempre eu devo ceder? Por que você e meus pais não poderiam ter dado um passo para trás e compreender a forma como eu me sentia? Por que sempre eu tenho que acatar as suas decisões e vontades? É por que eu sou mulher? - ela indagou.

Edward abriu a boca para se defender, mas sentiu que as palavras lhe faltavam, então ele a fechou novamente. Olhou bem nos olhos de Isabella e refletiu por um instante. Ela apenas abaixou o olhar e se voltou novamente para o rio, encarando o horizonte.

— Sabe… eu acho que sim. - ele afirmou.

— Que sim o quê?

— Eu acho que é porque você é mulher, sim. - ela confessou baixo.

Isabella riu friamente. - E fala assim…

— Você tem razão, Bella. É um longa conversa. Quer voltar para a minha casa? Acho que lá nós podemos ficar mais confortáveis. - ele propôs. Isabella o encarou incrédula.

— “Longa conversa”, hein. Eu te conheço muito bem, Edward, deveria saber que você está com segundas intenções.

— O que é isso?! - Edward questionou ultrajado. - Eu estou falando sério com você aqui. Você poderia, por favor, parar de insinuar que eu sou um tarado? Eu te respeito, sabia? - ele rebateu.

— Eu sinto muito, mas você não me mostrou o contrário. Foi sempre assim, desde o primeiro dia de casados. Aliás, desde antes de casados. Você se lembra daquele jantar na casa dos meus pais em que você tentou me agarrar no jardim? E nós nem éramos casados ainda! Você me respeita de um jeito muito estranho, Edward. - ela cuspiu, virando-se novamente, não querendo encará-lo.

Ele não falou nada por uns instantes, absorvendo o que a mulher lhe havia falado. Realmente, ela não estava de toda errada, ele teve que admitir. Sempre sentiu um grande desejo por ela, desde a primeira vez que a viu, e sempre demonstrou isso.

— Pois eu lhe faço uma promessa. Eu prometo não te tocar a menos que você me peça por isso. - ele disse firme.

Isabella voltou-se para ele, surpresa. - Sério? - ergueu uma sobrancelha.

— Você sabe que eu estou falando sério.

Ela sentiu a firmeza em sua voz, assim como ela sentiu a firmeza quando ele lhe prometeu, durante o casamento, que a deixaria livre caso ela não fosse feliz com ele. Abaixou a cabeça, envergonhada, lembrando-se de que ele usou justamente um momento de vulnerabilidade dela para fazer com que ela dissesse que queria permanecer casada.

— Tudo bem, Edward. Vamos conversar. - concordou. - Mas, por favor, não falte com a sua promessa.

— Alguma vez eu faltei com uma promessa? - ele parecia ultrajado.

— Faltar, propriamente, não… Mas tudo bem, vamos.

Os dois caminharam tranquilamente até a casa da floresta. Isabella observava tudo a sua volta, adorava as sombras que o pôr do sol criava. Fizeram o caminho em silêncio até que alcançaram o chalé. Edward abriu a porta, dando passagem para a mulher que adentrou em silêncio. Ele indicou que ela se sentasse no sofá e assim ela o fez.

— Sabe, Bella, eu estava pensando agora, enquanto caminhávamos, em tudo o que  você me falou lá no rio. De fato, eu  acho que você tem um ponto e eu quero compreender. Eu juro que em momento algum tive más intenções com você, apesar de que as vezes parece que tenho… - ele se sentou ao lado dela, calmamente.

— “um ponto”? - ela indagou.

— Sim, Bella. Olhe… - ele respirou fundo. - Quando eu era mais novo… há muitos anos atrás - ele riu. - Eu  tinha muitos desejos. Desde pequeno eu sempre gostei de desenhar, pintar, de criar. Venho de uma família de médicos e meus pais não concordaram nem um pouco com a minha inclinação. Teve uma época em que eu resolvi seguir com a minha vida sozinho, saí de casa, aluguei um quarto e comecei a vender quadros para me manter, mas obviamente isso não deu muito certo. Eu mal conseguia o suficiente para comer, comecei a passar por privações, mas eu não queria dar o braço a torcer. Eu queria me manter, tomar minhas próprias decisões, ser independente.

Meus pais não haviam tentado me impedir, eles deram corda acreditando que eu não iria durar nem um dia sozinho. Quando eles sentiram que a minha  fuga estava se estendendo por muito tempo, minha mãe foi me procurar muito preocupada. Ela ficou assustada ao me ver morando um cômodo caindo aos pedaços. - Edward riu com a lembrança.

— Ela implorou que eu voltasse pra casa. Eu não queria. Admitia que a situação não estava fácil, mas se voltasse para casa teria que ceder as decisões deles, teria que ir para a faculdade de medicina e eu detestava a ideia.

Nós conversamos por muito tempo, ela me contou muitas coisas, me disse muito sobre seus sentimentos, que até então eu não fazia a menor ideia. Eu compreendi que eles já haviam passado por muita coisa, que já haviam aprendido muita coisa errando e tentando de novo e eles queriam me poupar disso. Acho que todos os pais são assim, querem poupar o sofrimento dos filhos. Mas foi importante a experiência que eu tive, sempre fui um garoto que teve tudo na vida: estudo, casa, dinheiro. Foi bom aprender que a vida não é tão fácil assim, que tem seus altos e baixos. Mais baixos que altos.

Então eu decidi voltar para casa, mesmo sabendo que teria que ir à universidade. Mas prometi para mim mesmo que não deixaria de fazer o que gosto e cumpri a minha promessa. Então veio o casamento… - Isabella ouvia tudo atentamente.

— Eu fui à faculdade de medicina, me formei e admito que nem de longe foi tão ruim. Apesar de que demorei a me habituar com o sangue… - ele riu. - Mas eu me dediquei, formei-me com honras. Então eu consegui um emprego no hospital… devo admitir que o fato de eu vir de uma família importante me ajudou muito a conseguir o cargo. Mas eu gostava do trabalho, gostava de ajudar as pessoas. Minha vida parecia estar nos eixos, até que meus pais vieram com a conversa de que eu precisava “constituir uma família”. E que você estava chegando.

Eu não concordei muito com a história a princípio. Não fazia a menor ideia da sua existência, meus pais me contaram depois que eles já haviam conversado com os seus pais sobre isso e que eles faziam muito gosto da nossa união. Não estava muito inclinado a isso, eu tinha vontade de me casar, claro, mas pensava conhecer alguém, me apaixonar e então me casar. Eu já havia me apaixonado algumas vezes…

— Já? - Isabella interrompeu, com os olhos vidrados em Edward.

— Sim, já, quando eu era mais garoto, mas não o suficiente para eu querer me casar, obviamente. Mas então me apareceu você e, sem que eu sequer soubesse, já era seu noivo. Eu não sabia como você era, mas imaginei que fosse uma moça educada, doce e bondosa. - ele divagou.

— Eu sou isso? - ela estaria muito corada se pudesse.

— Não, eu disse que imaginei.

Isabella o fuzilou com os olhos, fazendo com ele gargalhar.

— Olhe, às vezes você não é assim tão educada, doce e bondosa… mas eu quero saber o porquê. Eu nunca havia me casado antes, mas tentei de tudo para ser um bom marido. Eu quero saber o que você sente e entender você. Eu já não sou mais a mesma pessoa que eu era há noventa anos atrás. Eu mudei e o mundo mudou também. Hoje eu tenho certeza de que preciso te compreender. Fale-me como você se sente, por favor. - ele implorou com os olhos.

Isabella respirou fundo, não estava animada a ter uma discussão com Edward, mas ficou feliz em ver o quão disposto ele estava a se abrir com ela. Não sabia desse lado dele e foi bom ter ouvido suas histórias. Não fazia ideia de que Edward havia tentado outras coisas.

— Eu não tive uma vida muito alegre… - ela começou. - Bem, eu me lembro de ter sido bem feliz quando criança, mas depois dos meus dez anos as coisas ficaram bem complicadas. Minha mãe havia sido criada na Inglaterra, havia recebido uma educação muito rígida, mas que segundo ela era a melhor. Meus pais me mandaram para aquele colégio de freiras para que eu recebesse a mesma educação que minha mãe havia recebido, a melhor.

Eu aprendi muitas coisas lá. Não posso negar que, de fato, o ensino era excelente… Mas eu não sei se valeu a pena. Eu passei anos longe de meus pais, sequer recebia visitas. Fiquei trancada naquele lugar por anos, sozinha. Quando eu ficava triste, as freiras me mandavam orar. - ela riu com a lembrança. - Eu sempre acreditei em Deus, mas não era o que me faltava. O que me faltava era uma família.

Edward a ouviu atentamente, com um aperto no coração.

— Eu passei os anos mais cruciais da minha vida sozinha, sem a presença de um pai, sem a presença de uma mãe. Foi muito difícil para mim. Com o passar dos anos eu fui me habituando, mas isso demandou muito tempo. Quando eu já estava me formando, recebi uma carta dos meus pais. Eles diziam que eu deveria voltar para Chicago, pois eles já haviam acertado o meu casamento.

Isabella se recordou, seu peito estava apertado.

— Eu te odiei desde o momento em que eu li aquela carta. - Aquelas palavras acertaram Edward como um soco. Isabella se levantou e caminhou de um lado pro outro pela sala.

— Me odiou? O que eu fiz para você me odiar? - ele questionou com a voz rouca.

— Não só você. Eu odiei meus pais, odiei tudo. Eles não me criaram, me privaram de uma convivência com eles, sequer sabiam qual a minha aparência depois de tantos anos que eu passei trancada naquele lugar. Como eles se achavam no direito de decidir com quem eu deveria me casar, quem eu deveria amar? Será possível que eu não tinha nem um pouco de direito sobre mim mesma, nem sequer para eu escolher a pessoa com quem eu gostaria de passar os meus dias.

O homem passou a mão pelo cabelo freneticamente, mordendo o lábio. Estava nervoso.

— Eu sequer sabia como você era, se era jovem ou velho, alto ou baixo, se era engraçado, se era inteligente, não sabia o que você gostava de fazer. É o mínimo, não? É o mínimo a se saber sobre uma pessoa com quem você vai ter que dividir uma vida, uma casa, com que você vai ter filhos. Mas eu não sabia nada. A única coisa que eu sabia sobre você, e isso era bem óbvio, é que você era rico. Eles não teriam me arranjado para você se não fosse.

— Você acha que eu te comprei? - ele indagou indignado.

— Talvez não você exatamente, mas, sim, meus pais me venderam. Usaram a minha vida como uma moeda de troca. - sua voz soava cortada. - Sabe, Edward, eu nunca pude ser mãe, mas tenha certeza de que se eu fosse, jamais teria tratado uma filha como meus pais me trataram. Você acha que eu não chorei quando meus pais me mandaram para aquele internato? Eu implorei! Eu sofri! Mas nada disso fez com que meus pais mudassem de ideia. E com o casamento eu protestei desde o primeiro minuto. Tudo o que eu queria era que ao menos uma vez eles tivessem me escutado, mas eles não fizeram isso. E nem você.

— Eu?

— Sim, Edward. Meus pais jamais me ouviriam, afinal de contas eu era apenas uma menina. Mas você poderia ter dito não àquele casamento. Eu deixei claro desde o começo que não desejava aquilo, sempre fui fria, sempre fui rude com você, mas você não respeitou a minha vontade. Preferiu ter em seus braços uma noiva frígida, sem emoções, a desfazer aquele noivado.

— Eu não pensei que seria assim, Isabella. Não sabia que você se sentia dessa forma. - ele tentou se defender. Ela se virou para encará-lo.

— Mesmo, Edward? Eu sempre deixei tão claro que não desejava aquele casamento, será mesmo que você nunca imaginou que eu me sentia dessa forma? - ela o encarou com uma sobrancelha erguida, seus lábios estavam fechados em uma linha.

— Eu também tive dificuldade para aceitar, no começo. Achei que eu conseguira te conquistar aos poucos. - ele confessou, abaixando o olhar. - Mas pelo visto eu não consegui, não é?

Isabella se chocou com a pergunta. Não podia dizer se ele havia conseguido conquistá-la.

— Eu gostava de morar com você, nós tivemos bons momentos. - ela confessou.

Edward aproximou-se dela e tomou uma de suas mãos entre as dele. Olhou firmemente nos olhos de Isabella.

— E será que isso não basta? Eu também gostava muito de morar com você, você sempre foi uma boa esposa.

Ela abaixou o olhar acanhada. - Não é tão simples, Edward. - ela contra argumentou.

— Como não é tão simples? Gostamos da presença um do outro.

— Edward, um relacionamento não se constrói assim. Não se pode construir uma casa sem ter um bom firmamento. Nós tivemos bons momentos, mas o nosso relacionamento foi construído sobre mentiras, sobre mágoa, ganância, vaidade. Não sobre amor.

O homem largou a mão de Isabella.

— Eu compreendo. - ele lamentou.

— Muito obrigada por compreender, Edward. Foi bom ter essa conversa com você. - ela disse com muito ressentimento.

— Mas eu não quero que você vá. Bella, nós só temos um ao outro, nada mais. Eu passei tantos anos imaginando como as coisas seriam se ainda fossemos casados, não vá embora de novo.

— Eu não quero ir, não sei pra onde mais eu iria. Mas eu sinto que finalmente posso escolher o meu caminho.

— Então escolha por mim. Eu prometo fazer de tudo para que você queira escolher estar aqui. Podemos recomeçar. Do zero.

Isabella respirou fundo. - Edward, eu… - mas ele a interrompeu colocando um dedo nos lábios dela.

— Vamos começar do inicio, Bella, podemos nos conhecer, dessa vez propriamente, e então decidir qual rumo nosso relacionamento tomará. Eu não vou forçar nada nem usar o fato de que nós já somos casados. Eu quero te cortejar, como se fosse a primeira vez que nos vemos. - ele sorriu um sorriso emocionado, cheio de verdade.

— E você me deixaria escolher? Você permitiria que eu tivesse liberdade para decidir o que eu quero ou não?

— Eu só quero ser feliz e que você seja feliz também. É disso que você precisa e eu estou disposto a te dar tudo o que você quiser, tudo o que precisar. - ele segurou uma das mãos dela e beijou ternamente.

— Por que você faz tudo isso? - ela questionou, realmente curiosa, enquanto sentia sua mão queimar sob o toque dele.

— Bella, eu tenho uma família, Carlisle, Esme, meus irmãos, eles me fazem feliz. Mas nenhum deles, nem nenhuma outra pessoa que eu já tenha conhecido, me faz sentir como eu me sinto quando estou com você. Parece que não se passou nem um dia, parece que eu ainda sou um jovem adulto recém casado. Você faz com que eu me sinta humano de novo, com que eu me sinta vivo, eu preciso disso, Bella.

A mulher emocionou-se com as palavras dele. Olhou firmemente em seus olhos.

— Sabe que eu tinha dúvida, mas agora eu tenho certeza que isso não é uma imaginação minha. É realidade. Nem o mais perfeito sonho poderia me proporcionar essa mistura de emoções. Isso tem que ser vida, não sonho. Eu aceito. Eu aceito recomeçar.

Edward a abraçou fortemente, mantendo-a muito próxima. Sentia o alívio que aquelas palavras lhe traziam, um alívio que ele não sentia desde que era humano.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!