Alguns meses se passam e o fim das aulas se aproxima. Patrícia está com quase seis meses de gravidez, mas não deixou os estudos. Pelo contrário, agora freqüentava as aulas e costumava fazer os trabalhos com Cecília e Fabiana.

No inicio foi complicado pra ela, pois toda a escola a apontava, e toda vez que ela passava via alguém cochichando. Porém Mateus sempre estava com ela, o que a deixava mais segura.

Todos que conheciam Mateus estavam surpresos com a mudança dele. Em tão pouco tempo ele havia amadurecido muito e ao contrário do que se esperava, suas notas melhoraram e muito e ele estava até mais sociável.

Conversava bastante com Cecília e Luis. Fabiana aos poucos ia se permitindo conhecer melhor essa nova fase dele. O mais complicado era Murilo. Pra ele aquela mudança havia sido rápida demais.

Um dia durante o intervalo o grupo começa a conversar sobre a formatura e o que pretendem fazer depois que as aulas acabarem.

– Vou prestar vestibular pra administração mesmo. Ao menos se acha emprego em qualquer área. – diz Fabiana.

– Eu vou fazer engenharia eletrônica mesmo, o mercado não é lá essas coisas, mas vai crescendo até eu terminar a faculdade. – diz Luis.

– Eu ainda não sei pra falar a verdade. Estou entre pedagogia e psicologia. – diz Cecília.

– Eu queria fazer pedagogia também, mas agora vou ter que adiar isso um pouco. Tenho outras prioridades agora. – diz Patrícia.

– Mas você pretende estudar ainda, depois que o bêbê nascer? – diz Cecília.

– Sim, mas vai demorar um pouco. Mas não faz mal, o que importa é estudar.

– Eu também penso assim. Eu mesmo não vou prestar vestibular agora. - diz Murilo.

– Não vai? – diz Cecília surpresa.

– Não. Primeiro vou procurar um emprego melhor, onde eu ganhe mais. Depois vou começar a guardar uma grana no banco e comprar um carro. Quando estiver mais estabilizado, o que não vai demorar muito, aí sim engato uma faculdade.

– Entendi. Mas o que você vai fazer, já sabe? – pergunta Cecília.

– Já. Marketing.

– E você Mateus? Vai fazer o que? – pergunta Luis.

– Nada. Tenho que trabalhar isso sim. – diz desanimado.

– Ainda não encontrou nada? – pergunta Patrícia mexendo no cabelo dele.

– Não. E tenho que achar alguma coisa logo, daqui a pouco você tem neném e como fica? Sua mãe e a minha não em obrigação nenhuma.

– Ta procurando emprego é? – diz Luis. – Você já trabalhou antes?

– Trabalhar mesmo não. Fazia uns esquemas aí pra juntar um dinheiro, mas nada fixo.

– E você quer trabalhar com o que?

– De boa Luis? Não estou em condições de escolher não. O que aparecer eu faço.

Murilo apenas ouvia a conversa, mas atendo as respostas de Mateus.

– Pior que você está quase em idade de exército e não é todo mundo que contrata nessa fase. – comenta Fabiana.

– Eu sei. Mas tenho que continuar procurando, uma hora aparece.

Naquele mesmo dia, na hora da saída, Murilo e Cecília andavam na direção da casa dela quando viram Mateus e Patrícia um pouco a frente deles.

– Mudaram o caminho de casa é? – pergunta Cissa.

– Não, hoje vou fazer um ultra-som e ele vai comigo. – diz Patrícia feliz.

Enquanto as garotas conversavam, Murilo respira fundo e resolve puxar conversa com Mateus.

– Então não ta conseguindo encontrar um trampo?

– Não. Na verdade está sendo até muito mais complicado do que eu esperava.

Murilo fica um tempo calado até que diz de uma vez.

– Me leva um currículo seu na escola amanhã.

– Pra que você quer um currículo meu? – pergunta Mateus surpreso.

– Pra mandar pro papai Noel e ver se ele te dá um emprego de presente! Puta que pariu, que perguntinha hein!

– Sei lá, você mal fala comigo.

– Não vou mentir que apesar de ver que você está mudando e tal, ainda não vou muito com a sua cara não. Mas ouvindo a conversa hoje no intervalo me coloquei no seu lugar.

– Sério?

– Sério. Se pra mim que não tenho tantas responsabilidades agora ficar sem emprego seria complicado, quem dirá você que está com um filho pra chegar.

– É e minha mãe já disse que criança gasta muito.

– Mas relaxa me leva o currículo na escola amanhã e eu vejo o que posso fazer por você.

– Valeu Murilo.

– Não posso garantir nada, mas vou tentar.

– Já é uma força e tanto. Amanhã te levo o currículo então.

Eles se despedem e Murilo segue o caminho com Cecília.

– O que você estava falando com o Mateus bêbê?

– Pedi pra ele me dar um currículo dele. Acho que vai precisar lá na papelaria.

– Sério mesmo que você vai ajudar ele?

– Não prometi nada, mas vou tentar.

– Você não tem mais raiva dele então?

– Não... Mas também não é por isso que vou virar amiguinho de infância. Ele pra lá e eu pra cá está muito bom.

– Verdade, nunca imaginei vocês amiguinhos mesmo. – diz Cecília rindo.

– Vai rindo... Eu não tenho o sangue frio que você tem.

– Sangue frio que eu tenho? Por quê?

– Agora você é toda amiguinha da Patrícia. Lembro bem que no começo do ano você detestava a menina.

– Verdade, mas era por causa do Mateus, agora não tem nada a ver.

– Eu nunca fui muito com a cara dele, desde quando cheguei à escola. Depois que vi que você chorou por causa dele então...

– Você se lembra disso?

– Claro. Você foi até estúpida comigo quando perguntei se podia te ajudar. Mas a minha raiva por ele aumentou mesmo o dia que fomos ao cinema e ele tentou agarrar você. Não sei como me segurei ali.

– Eu fiquei com medo. Não esperava que ele fizesse aquilo.

– É, mas fez. E se eu não tivesse chegado lá? Já pensou nisso?

– Não e nem gosto de lembrar.

– Ele mudou, admito, mas é sempre bom manter um pé atrás, um olho no peixe e outro no gato sabe?

– Ta Murilo, já entendi. Só não sei o porquê você estar me falando essas coisas agora. Eu nem com ele estava falando, estava falando com a Patrícia.

– É que você é muito ingênua Cissa, não vê maldade em ninguém.

– Ta me chamando de burra?

– Eu disse isso?

– Disse, com outras palavras, mas disse!

– Você também hein! Pelo amor de Deus! Você entende as coisas do jeito que te convém.

– Eu entendo do jeito que me dizem e você disse indiretamente que sou burra!

– Se você fosse burra hoje quem estaria grávida do Mateus seria você e não a Patrícia. Oh mania de entender as coisas que eu digo erradas.

– Quem entende as coisas erradas aqui é você. O Mateus era uma má pessoa? Era, mas ele mudou, todo mundo consegue ver isso, menos você.

– Eu disse que vi que ele mudou, até vou dar uma força pro cara arranjar um emprego. O que eu disse é que no caso dele é bom confiar desconfiando.

– Então é melhor não confiar Murilo!

– Nada a ver Cecília!

– Você confia desconfiando de todo mundo?

– Sim!

– Sim Murilo? Isso inclui a mim?

– Claro que não! Você é todo mundo por acaso?

– Sei lá! Não sei se devo acreditar em você.

– Ah, então é assim? Em mim você não sabe se pode acreditar, mas na mudança radical do Mateus você nem desconfia?

– Não mistura as coisas Murilo.

– Não mistura as coisas você Cecília! Não disse que você gosta de acreditar só no que te convém? Prefere acreditar num cara que quase te beija a força do que em mim.

– Eu não disse isso Murilo...

– Cecília, de boa? Pra mim já deu.

– Do que... Você está falando?

– Cansei dessa conversa. Amanhã te vejo na escola.

– Amanhã? Mas e hoje à noite? Você disse que íamos ver filme na minha casa.

– Melhor não. To sem clima pra isso.

Cecília olhou para Murilo confusa. Na primeira briga que tiveram ele não agiu daquela forma, pelo contrário. Ele quis conversar e ajeitar as coisas entre eles. Porém agora isso não parecia que ia acontecer.

– Ta bom, como você quiser. – diz seca e tentando disfarçar ao máximo o aperto que estava sentindo.

– Amanhã nos vemos na escola. – diz ao chegar ao portão da casa dela e lhe dar um selinho, saindo para ir ao trabalho.

POV Murilo

Não sei o que deu em mim pra ajudar o Mateus. Ta certo que o filho dele e a Patrícia não têm culpa de eu não ir nem um pouco com a cara dele, mas se eu não tivesse inventado de pedir um currículo pra ele, não teria tido mais uma briga estúpida com a Cissa.

Eu sabia que a Cecília me amava e eu também era louco por ela, mas ouvi-la defender o Mateus me enraivecia.

Puta que pariu, será que ela havia esquecido o que ele havia feito com ela? O jeito que ele a fez sofrer?

Eu sabia que ela não sentia mais nada por ele, que agora ela era a minha namorada, mas mesmo assim. Nunca fui do tipo de cara que se acha inseguro, mas também nunca tinha gostado de alguém como eu gostava daquela CDF. Eu amava a Cecília e não suportava a idéia de ficar sem ela, por mais remota que fosse a chance disso acontecer.

Eu só havia brigado com ela uma vez e me senti péssimo. Fui atrás e pedi desculpas, mas agora seria diferente. A Cecília tinha o jeitinho meigo, mas era orgulhosa. Se a cada briga que tivesse eu fosse pedir desculpas ela ia se acostumar e sempre ia achar que estava certa, mesmo quando não estivesse, fora que ia esperar eu dar o braço a torcer.

Eu amava aquela CDF, amava como nunca amei ninguém na minha vida, mas não ia fazer sempre as vontades dela. Não mesmo!

Eu não queria brigar, na verdade nem sei como começou aquilo tudo, mas dessa vez eu não iria atrás dela pedir desculpas não.

Exagerei sim, é verdade, mas ela não ficou atrás.

Eu tinha marcado de ver filme com ela aquele dia, mas decidi que não ia. Quem sabe assim ela se desculpasse?

Mas não se desculpou, disse que seria como eu queria. Filha da mãe teimosa!

Resolvi jogar o jogo dela. Ela era teimosa? Eu era muito mais, bastava eu querer.

Assim que chegamos ao portão da casa dela me despedi e fui trabalhar, apenas disse que nos veríamos no dia seguinte na escola.

Lá eu veria a reação dela e aí sim decidiria que estratégia seguir. Ela estava a fim de guerrinha de nervos? Seria isso que ela teria então.