Depois de passar na biblioteca e sair abraçada em três livro, Atena se dirigiu ao seu templo, passeando calmamente pelo jardim, por mais que não tivesse nenhuma razão para se sentir calma. Por incrível que parecesse, ela sentia que tudo ia dar certo, e isso só piorava as coisas, porque ela odiava “sentir” algo. Para a deusa da sabedoria, tudo devia ser claro e lógico, sem incertezas ou improvisos e, ainda assim, ela simplesmente sentia que ia dar tudo certo.

Talvez fosse o efeito da taça de vinho que bebera, a deixando menos preocupada. Ela simplesmente arrastava seus pés pela grama, sentindo a brisa no seu rosto. Até parecia que nada havia de fato acontecido, que era apenas mais um de seus sonhos, fruto de sua imaginação fértil.

Antes fosse.

Poucos detalhes impediam Atena de esquecer tudo aquilo por um tempo. Os olhares, por exemplo, que a seguiam quando passava. As cabeças virando, as vozes sussurrando. Ah, como ela odiava fofoca.

Mas entre tudo, das marcas, do céu fechado, dos gritos de seu pai, o detalhe que fazia tudo aquilo parecer realmente verídico era o sorriso da deusa.

Involuntariamente, se pegava sorrindo ao sentir o gosto do beijo de Poseidon. Aquilo ela nunca pôde criar, imaginar de um jeito tão... perfeito.

–Palas. - A voz dele preencheu o templo da deusa e a fez erguer a cabeça do livro que estava lendo.

–Pescador. - Ela se virou e caminhou até ele, que estava escorado na entrada, a observando. - Há quanto tempo está aí?

–Importa? - Ele afastou uma mecha do cabelo dela de seu rosto e sorriu, encantador como sempre.

–Se eu perguntei é porque importa. - Atena sorriu, desafiadora, fazendo Poseidon revirar os olhos.

–Uns dez, talvez vinte minutos.

–Por que não falou nada? - Atena se escorou na parede, ao lado de Poseidon.

–A frase certa seria “Ah, porque você fica linda quando está concentrada”, mas a verdade é que eu estava com preguiça de falar. - Poseidon virou para a deusa, que o olhava perplexa.

–Nossa, acho que até uma estátua consegue ser mais romântica que você, sabia?

–Como se você gostasse de romantismo. - Poseidon a desafiou com o olhar enquanto Atena tentava segurar uma risada.

–Quem disse que não gosto? - A deusa colocou as mãos na cintura.

–Eu disse. - Poseidon se aproximou e beijou sua bochecha, fazendo-a sorrir.

–O que aconteceu, hein? Nós não conseguimos mais brigar. - Atena encostou a cabeça na parede, olhando para o teto.

–Rá! Eu sabia que você gostava de discutir comigo! Eu não podia estar sempre totalmente errado, você é quem gosta de me insultar.

–Você merece, sabia? - Disse, sorrindo. - Não é como você não fosse um cafajeste desalmado, abestalhado, um pescador imaturo e desprovido de células estreladas.

–Hey, eu não sou tão burro, você sabe disso! Ao menos sou mais inteligente que seu pai.

–Não sei de nada.

–Ah, não se faça de louca, você consegue discutir por horas comigo, isso quer dizer algo, não? Se fosse o Ares, por exemplo, você venceria a discussão depois de dois minutos.

–Venço de você do mesmo jeito.

–Certo, mas ao menos comigo demora mais!

–Isso só quer dizer que você toma mais do meu tempo do que o necessário, atrapalhando minha rotina.

–Ah, esquece! - Poseidon bufou e jogou os braços para cima, se rendendo.

–Retiro o que eu disse, nós ainda conseguimos brigar. - Atena falou, triunfante.

–Pescador – Atena quebrou o silêncio -, já podemos parar de fingir. Nós dois sabemos a real razão de você ter aparecido aqui. - Fez uma pausa e acrescentou, diante do estado inabalável de Poseidon -, certo?

–Certo. Ao menos, eu tenho certeza que sei porque vim.

–Ótimo, engraçadinho. Comecemos, então, que isso está me matando por dentro.

–Meio que literalmente. - Poseidon se virou para encarar a deusa e quase pôde suspirar aliviado quando a viu sorrindo.

–Eu sou imortal, Pescador.

–Por isso o “meio que”.

–Certo. Então eu “meio que” estou enrascada.

–Somos dois. Principalmente com seu pai.

–Ah, pois eu ainda tenho fé que Hera conseguirá domá-lo, até porque ela parece ter algo a ver com isso tudo.

–Sério? - Poseidon parou e refletiu por um tempo. - Eu não tinha percebido.

–Que ela podia domar meu pai ou que ela deve estar por trás disso com Afrodite?

–Puff, todo mundo sabe que ela pode domar o Zeus. Ele come na mão dela. - Ele falou, passando a mão nos cabelos e os bagunçando. Atena sorriu antes de continuar. E fechar a cara.

–Entretanto, por mais que Afrodite tenha me parecido surpresa quando contei sobre tudo...

–Tudo o quê? - Interrompeu, fazendo a loira revirar os olhos.

–Os sonhos. Enfim, eu não duvido das habilidades teatrais dela.

–Sim, sim, concordo com você, mas não foi bem por isso que eu vim aqui. - Atena, levemente confusa, fechou seu olhar no deu Poseidon e recuou um pouco, se escorando na parede um pouco mais perto da porta. - Eu vim aqui por causa da sua situação..

–Ah, claro! Eu ia chegar nisso. Como Zeus pode ser domado, minha maior preocupação são as Donzelas.

–Pois é, eu cheguei a conversar com Ártemis e saí com isso de brinde. - Poseidon mostrou marcas de pequenas e raivosas mãos nas suas costas e braços.

–Sinto muito por isso, sinceramente, mas você não deveria ter ido falar com Ártemis logo de cara, você sabe que ela não é exatamente... delicada.

–Sim, mas seria pior ter de conversar com a Héstia. Você sabe como ela é, ela não precisa agredir fisicamente para fazer você se sentir a lesma da mosca da pior montanha de estrume já agrupada.

–É, eu sei, mas ela é sua irmã, achei que com você seria um pouco mais leve.

–Seria mais fácil ela me tratar pior, sendo assim.

–Pois eu não sei mais o que fazer! - Atena deixou escapar, batendo a cabeça na parede e fechando os olhos, frustrada.

–Eu sei o que você pode fazer. - Poseidon disse, mordendo o lábio inferior de nervosismo.

–O quê? - Atena perguntou, hesitante, por mais que já tivesse ideia de qual seria a resposta.

–Case-se comigo.