Possible love escrita por Sion Neblina


Capítulo 12
Ângelo


Notas iniciais do capítulo

Olá, queridos leitores,

Um novo capítulo de PL, espero que gostem.

Obs. Não betada, perdoem possíveis erros.

Boa leitura a todos!

Sion Neblina



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Ângelo

Capítulo 12

A noite caía rápido naquelas ruínas e um vento frio começou a soprar com força, causando uivos sombrios enquanto eles deixavam a encosta. Mas os dois cavaleiros pareciam pouco preocupados com isso, seguiam tranquilos, abraçados e silenciosos. Eles haviam dado um grande passo em direção ao futuro.

Futuro. Máscara da morte suspirou. Nunca pensou que teria algum, e isso desde que treinava na beira do Yomotsu. Sempre achou que morreria cedo e realmente morreu. Mas o mundo dos deuses não conhecia regras humanas e lá estava ele novamente, vivo e apto a recomeçar. Ele que nunca teve esperança em nada, descia aquela montanha, abraçado àquele garoto, cheio de esperanças.

Piccoli?

– Hum? – Shun voltou o rosto para cima, olhando o rosto do namorado.

– Posso fazer uma pergunta?

– Pode.

– É que ela pode machucar – foi sincero, precisava ser sincero com ele.

O mais novo suspirou e mordeu os lábios por um tempo indeciso.

– É sobre Hyoga? – perguntou, não conseguindo esconder completamente a tristeza da voz.

– É que se comentou que sua vinda pro Santuário deu-se por ele. É verdade, então?

– Você sabe que é – murmurou, ferido.

– Ainda dói?

– Sim. Desculpe...

Non, piccoli – Câncer parou e o segurou pelos ombros, olhando no fundo dos olhos de Andrômeda. – Non se excuse, Io entendo mais que qualquer pessoa come é difícil se libertar questas coisas. Non se desculpe.

– Mas dói bem menos – sorriu levemente e teve o rosto afagado pelos nós dos dedos do italiano.

– Em mim também – Câncer sorriu de volta e voltou a abraçá-lo, reiniciando a caminhada de volta ao santuário.

Andavam devagar, apreciando a noite de clima agradável e silêncio. Apenas o barulho dos animais noturnos cortava o santuário enquanto eles caminhavam de volta, abraçados.

– Bem... já que agora somos namorados – riu sem jeito. – Preciso saber uma coisa muito importante...

Câncer franziu as sobrancelhas.

– O quê?

– Seu nome. Não posso ter um namorado que se intitule Máscara da morte – riu, mas seu sorriso morreu quando percebeu que o outro estava muito sério.

Piccoli, Io...

– Não deve ser um nome tão ruim assim – sondou Shun, percebendo a reação do outro.

O italiano desviou o olhar para mirar as águas escuras do Egeu mais adiante. Quem ele era? Se ele não fosse Máscara da morte de câncer, o que restava? Nada. Nada.

– Desculpe – o mais novo interrompeu seus pensamentos. –, se é tão difícil pra você...

– Ângelo.

– Hã?

– Ângelo, cáspita! Sei que não tem nada a ver comigo, mas foi o nome que mia madre me deu! – resmungou.

– Ângelo! – Shun exclamou com uma expressão boba no rosto – que nome lindo...

Câncer suspirou e voltou a se aproximar do namorado.

– Não o diga a ninguém, piccoli. Já não sou essa pessoa há muito tempo. – Pediu, muito sério.

– Não direi. Mas eu acredito que o Ângelo ainda está aí dentro – falou Shun sorrindo. – Mas será como você quer: um segredo apenas nosso.

Máscara da morte segurou a mão do cavaleiro de bronze e a beijou com carinho.

Io serei Ângelo apenas pra ti, bambino – falou com um meio sorriso.

– Obrigado...

– Não agradeça. Piccoli, entenda que isso não é um presente, é um fardo. – Sorriu fraco – Não é saudável me conhecer tão de perto.

O mais novo negou com a cabeça. – Não sou mais aquela criança que você assustava.

– Tem certeza? Io acho que ainda posso assustá-lo – o outro disse com malícia, fazendo Shun rir, corando.

– Espero que não com cabeças penduradas na casa! –Ele disse, e os dois finalmente chegaram ao santuário, passando pela primeira casa que estava tranquila como sempre; Mu deveria, naquele momento, estar trabalhando em seu jardim. Seguiram, atravessando as casas restantes e chegando à casa câncer.

Shun olhou ao redor, ainda pensando nas cabeças e depois, sorrindo docilmente, disse:

– Bem, está entregue, eu preciso voltar pra... – Diria “casa”, mas interrompeu-se ao sentir o cosmo de Ikki no santuário, mais especificamente na casa de virgem, e o irmão não parecia nada bem.

Piccoli? – Máscara da morte percebeu a repentina palidez do mais novo.

– Aconteceu algo com Ikki, ele... Ele está machucado! Eu preciso-...

E dito isso, Shun saiu correndo em direção à casa de virgem. O italiano suspirou, sabia que aquilo poderia não acabar bem. Na verdade, ele também havia sentido o cosmo de fênix, um tanto debilitado, verdade, mas forte o suficiente para que fosse notado desde antes deles entrarem o santuário. Shun talvez estivesse distraído demais ou fosse mesmo incapaz de perceber, mas além do cosmo do irmão, havia outro cosmo igualmente sutil, sereno, mas tão poderoso que não conseguia disfarçar com total eficiência sua inquietação. E inquietar Shaka de Virgem, Máscara da Morte sabia, não era algo sábio a se fazer. Todavia, Fênix e Virgem eram discípulo e mestre, e ninguém tinha o direito de se envolver em suas desavenças, nem mesmo familiares, aliás, família era algo que o Santuário não reconhecia: ali existiam apenas guerreiros a serviço da deusa.

O cavaleiro de câncer conhecia as regras. E conhecia Shaka de Virgem. Sabia que o indiano não teria piedade e usaria, se necessário, todo o poder que as leis do santuário conferiam ao Mestre: o poder de vida e morte. Sim, caso quisesse, Shaka poderia matar qualquer um dos seus discípulos sem que tivesse que responder às leis dos homens para isso, embora tivesse que justificar tal ação ao Concilio, provavelmente sendo investigados os motivos e causas do “incidente” pela rigorosa e ética Kripteia.

Shun subiu com toda a velocidade que podia, chegando ao templo do virgem e atravessando o salão.

– Nem mais um passo – ele estancou ao ouvir a voz tranquila do cavaleiro de virgem. – Como ousa adentrar dessa forma o meu templo?

Shun olhou o cavaleiro que caminhava lentamente em sua direção com os olhos verdes muito abertos e aquosos.

– O que você fez a meu irmão? Por que o machucou? – perguntava o virginiano mais novo, aflito.

– Estávamos em treinamento, mesmo que eu não lhe deva satisfações, Shun de Andrômeda. – Respondeu, a voz fria, indiferente como sempre.

– Eu preciso ver meu irmão! – exclamou Shun trêmulo, nervoso – E eu o verei, nem que para isso tenha que enfrentá-lo!

Shaka riu sarcástico, aquele garotinho era tão insolente quanto o irmão. Enfrentá-lo? Era até engraçado, mas não aceitaria aquela insolência.

– Saia, Shun, eu preciso meditar – disse e saiu caminhando em direção ao seu trono.

O mais novo ficou parado, sem saber o que fazer, mas não iria recuar, precisava ver Ikki, saber como ele estava e não deixaria que nem mesmo Shaka o impedisse.

Dessa forma, Shun ignorou as palavras do indiano e se precipitou para dentro da casa de virgem. Grande erro. Não se desafia um cavaleiro de ouro de maneira tão aberta, ainda mais quando esse cavaleiro de ouro é o impiedoso Shaka de virgem.

O discípulo de Buda ainda tentou alertar o jovem cavaleiro de bronze mais uma vez:

– Se der mais um passo, eu terei que usar a força. Não me obrigue a isso, Shun.

O virginiano mais novo estancou, os olhos úmidos pelas lágrimas contidas.

– Por que está sendo tão cruel? – seu cosmo se expandiu agitado. – Ele é meu irmão!

– Ele é meu discípulo, me pertence. – Disse a voz indiferente do mais velho. – Nem mais um passo. Quando eu disser que você pode, você verá seu irmão, mas não seja insolente dentro da minha casa.

Os lábios do garoto tremeram de angústia.

– Por que está agindo assim? – interrogou-o Shun, indignado. – Ele é meu irmão, você não tem coração?

– Isso não tem nada a ver com sentimentos, Shun de Andrômeda. – Shaka volveu friamente. – Estamos no Santuário e seguimos uma Ordem militar que me concede certos direitos e muitas obrigações. Você não entrará na minha casa até que eu permita que entre e não adianta me olhar com esses belos e lacrimosos olhos, eles não me comovem. Agora saia, antes que eu o faça sair.

Shun ergueu o queixo, embora seus lábios ainda tremessem e deu o primeiro passo para dentro da casa de virgem. Tudo aconteceu tão rápido que foi impossível para seus olhos acompanharem o golpe, à velocidade da luz, que o cavaleiro de virgem lhe lançou. Andrômeda só fez defender-se como pode, fechando os olhos até que o clarão se desfez. Quando abriu os olhos novamente, ele percebeu que algo ou alguma coisa havia evitado o impacto. E foi com grande espanto que ele viu Máscara da Morte parado de frente a Shaka.

Fora câncer quem o defendera do golpe que com certeza, se não o matasse, o deixaria inconsciente.

Shaka encarou Máscara da morte ainda com seus olhos placidamente fechados, o queixo erguido e a pose arrogante dos cavaleiros de ouro.

– Câncer, o que faz aqui? – a voz do asceta não se abalava, embora fosse visível que o outro defensor estava disposto a começar uma luta.

– Não deixarei que mate, Andrômeda! O que está acontecendo com você, Virgem, enlouqueceu? – volveu o italiano irritado. Ele controlou-se o quanto pôde enquanto sentia os cosmos se agitarem. Permaneceu no seu templo. Sabia que não poderia, ao menos não deveria, se envolver num assunto como aquele, mas era cruel, desleal e desumano permitir uma luta entre Shun e Shaka. Ele tentou, mas não conseguiu ser indiferente, não conseguiria suportar que seu garoto fosse machucado sem fazer nada.

Câncer sabia que todos os cavaleiros de ouro e até a própria deusa acompanhavam aqueles acontecimentos e não se envolveriam, mas ele não foi capaz. Que se danasse! Nunca foi tão bom em seguir regras como os outros.

– Eu vim chamá-lo à razão! Uma luta entre você e Andrômeda é desleal, Shaka de Virgem – tentou ser diplomático na medida em que conseguia. Sabia que dependendo das palavras que usasse, aquele homem cruel que conseguia vagar por todos os mundos existentes aniquilaria a si e ao garoto, até porque, ao contrário de Shaka, ele não vestia a armadura de ouro.

– Você entra na minha casa, interrompe meus assuntos e diz que veio me chamar à razão, cavaleiro? – Shaka deixou escapar um risinho irônico. – Retire-se. Quando eu precisar de conselhos com certeza não serão os seus.

Câncer riu alto.

– Nem mesmo a morte o mudou, Shaka? Arrogante! Metido! Queridinho do Grande mestre! Será que não entende que eu não tenho medo de você como essa criança? – apontou para Shun.

– Você não precisa ter medo para que eu o mate, Câncer, e creia: eu vou matá-lo se continuar sendo tão insolente dentro da minha casa. Agora saia!

O cosmo de Shaka teve uma leve oscilação, nada mais que o tremor de asas de uma libélula, mas isso foi o suficiente para que Athena, o grande mestre, o líder da tropa e da Kripteia soubessem que o cavaleiro de virgem cumpriria a ameaça ao outro cavaleiro. E antes que isso se tornasse uma tragédia sem precedentes, eles resolveram agir.

Non saio enquanto Shun estiver aqui! Ele é mio regazzo e non deixarei que encoste um dedo nele, Shaka de Virgem, estou avisando!

Quase que instantaneamente, o cavaleiro de virgem recuou e seu cosmo voltou a ser sereno, quase imperceptível, como ele gostava de mantê-lo. Tudo foi silêncio durante alguns minutos.

– Então o retire da minha frente. – O indiano disse da mesma forma calma de sempre.

– O que está acontecendo? – Nesses momento, eles reconheceram a voz e sentiram o cosmo de Fênix. Ikki saiu da escuridão de um dos corredores, caminhando de forma incerta, apoiando-se nas paredes.

– Irmão! – Shun nem sequer pensou, correu até ele e o abraçou, na verdade, o amparou antes que ele caísse.

Aiolia e Shura que já estavam ali há alguns minutos, mirou o guardião da casa e depois os dois cavaleiros de bronze. Aiolia se aproximou de Shaka e disse baixo:

– Deixe-os. Eu não entendo por que...?

–Nenhum mortal poderia entender, leão. Agora vá e leve os outros dois. Dos garotos cuido eu.

Aiolia retornou para o lado de Shura e murmurou algo ao ouvido do capricorniano.

– Câncer, venha conosco – falou o líder da Kripteia.

Máscara da morte olhou Shun, que conversava com o irmão, por um tempo, e depois seguiu os dois cavaleiros em silêncio. Shaka fez o mesmo, ficou por um longo tempo mirando os cavaleiros de bronze em um analítico silêncio, e então saiu do grande salão em direção à seu jardim.

Shun sorriu para o irmão, mas mostrou-se preocupado.

– O que aconteceu a você, nii-san? F-Foi Shaka quem o-...?

– Não importa, Shun. Se estou assim é porque ainda não estou pronto. – Ele informou, se erguendo com dificuldade e se afastando do irmão. – Eu aceitei o treinamento. Agora tenho que me curar para continuar.

O mais novo entreabriu os lábios, chocado.

– Como continuar? Ele vai matá-lo desse jeito!

– Não, não vai. Não sou tão fraco para morrer em treinamento.

– Ikki, esse homem é louco – Shun sussurrou, referindo-se a Shaka. – Ele me mataria!

– Ele me mataria, Shun, que sou discípulo dele. Essas sãos as regras do santuário.

Shun não entendia o irmão. Uma indignação crescia em seu peito, levando-lhe lágrimas aos olhos. Como ele podia achar aquilo normal? E desde quando Ikki aceitava regras?

– Venha comigo para Rodório, Ikki. Eu cuidarei de você.

– Amanhã, Shun. Hoje eu preciso ficar. Entenda, eu estou bem. – Ikki endireitou a postura com dificuldade, seu orgulho evitando um gemido de dor. – Vá você, nos vemos amanhã.

Andrômeda hesitou, mas reconheceu que o irmão não estava tão mal. O cosmo dele era capaz de fazê-lo renascer das próprias cinzas tal qual sua armadura, e Ikki sempre conseguia uma recuperação mais rápida do que todos. Isso ele soube na época das batalhas das 12 casas.

– Certo. Mas amanhã eu venho novamente. Espero que seu mestre me deixe entrar sem luta.

O mais velho apenas assentiu com a cabeça. Contra a vontade, Shun deixou o templo de virgem, e Ikki seguiu para dentro da casa em direção ao quarto de hóspedes.

Sentiu o cosmo do mestre o chamando na cozinha e, mancando, Fênix o seguiu. Ao se aproximar da porta viu sobre a mesa, chá e biscoitos recém-saídos do fogo.

– O que quer? – Ele perguntou sem animosidade.

– Você precisa comer. Mesmo sendo um cavaleiro tão forte e se recuperando rápido, é melhor que se alimente. – Disse o discípulo de Buda.

– Você é estranho, Shaka de Virgem – Ikki disse se sentando de frente à xícara fumegante e cheirosa.

– Eu sei. – Shaka disse e mirou o rosto sério do discípulo, abrindo os olhos lentamente, coisa que raramente fazia.

Ikki teve que confessar para si mesmo que sentiu um frio na barriga quando ele fez aquilo. Das últimas vezes que o mestre abriu os olhos para si, o resultando não foi muito bom, mas agora nada aconteceu. Nada além de ele ficar preso naquele mar belíssimo que eram os olhos do mestre.

– Você sabe por que fiz o que fiz, não sabe? – Shaka perguntou com a fleuma característica, mas o discípulo percebeu que havia uma inquietação muda e velada. Algo que ele não queria que fosse percebido.

O mais jovem engoliu em seco, procurando o que responder, algo que removesse a própria inquietação e também a do mestre.

– Sim, eu sei.

– Ótimo. Athena me chama. Devo voltar logo. – E dito isso, Shaka saiu porta afora.

Shun voltou para o templo de câncer e encontrou Máscara da morte no jardim, ansioso, andando de um lado a outro.

– Ângelo...

Foi estranho ouvir aquele nome. Há tanto não o escutava, que ele nem parecia ser seu, mas aquela voz tão suave, chamando-o por seu nome de batismo foi capaz de aquecer seu coração como ele nunca imaginou possível.

Voltou-se para o belo garoto parado à entrada do jardim e ficou somente o admirando. Ele era tão lindo, tão imaculadamente perfeito. Não acreditava na própria sorte, até porque, ela nunca o sorriu de verdade. Desde muito cedo aprendera a perder, a ser preterido, humilhado. Na infância, na miserável infância na Sicilia, e até mesmo ali no santuário, ele só conseguiu se impor pela força.

Então como agora aquele menino lindo, puro, inteligente e meigo se aproximava dele? Por quê? Não seria cruel deixar que toda sua rudeza e maldade contaminassem Shun?

Piccoli...

O garoto não esperou mais, caminhou até ele e o abraçou com força.

– Obrigado por me proteger – ele sussurrou. – Eu nunca esquecerei...

O coração do italiano batia forte no peito, ele riu e afagou os cabelos castanhos do garoto, beijando o topo da sua cabeça.

– Eu nunca deixaria aquele lunático tocar em você, bambino...

– Sinto-me mais seguro – riu o mais novo e ergueu o rosto, buscando os lábios do italiano que o beijou com ardor e carinho na medida. O beijo durou longos minutos, até que, sem fôlego, eles se afastaram.

– Podemos tomar um banho e jantar? – o mais velho sugeriu.

Shun pensou um pouco. – Tenho uma ideia melhor. Que tal ir comigo para Rodório?

Câncer ergueu uma sobrancelha.

– Rodório?

– Sim, comer pizza e beber vinho até tarde.

– Ma-

– Ora, Ângelo, você nunca sai desse santuário. A vila é tão perto, nada vai acontecer enquanto estiver fora, fique tranquilo, sim?

– Oh-... É-... Sim! Então!

Shun riu. Estava tenso com tudo que havia acontecido. Não entendia o que se dava com Shaka, qual o motivo da sua crueldade, mas não queria ficar pensando naquilo ou explodiria. Tinha que confiar, Ikki sabia se cuidar e ficaria bem. O cavaleiro de virgem também não era louco de matar seu irmão durante um treinamento, aquilo seria um grande problema para ele no santuário, precisava acreditar que tudo ficaria bem.

Andrômeda esperou Câncer se arrumar e quando ele saiu do quarto, o garoto franziu as sobrancelhas, deixando o outro sem jeito.

– O que foi? – Máscara da morte perguntou olhando para o próprio corpo, sem jeito.

– Você vai sair assim? – Shun perguntou, cruzando os olhos com um bico de reprovação nos lábios.

– Assim como, cáspita! Acabei de tomar banho, estou limpo e cheiroso, o que tem de mal em mim? – Irritou-se o mais velho.

O mais novo mirou a calça justa, as sandálias de treinamento e as ombreiras de couro metal que protegiam os ombros do cavaleiro.

– Você acha que vamos encontrar inimigos numa pizzaria, Ângelo?

Máscara da morte fez um gesto de derrota com as mãos e os ombros.

– Um cavaleiro precisa estar sempre pronto. Ademais, o que eu devo vestir, então? - indagou, indeciso.

– Roupas normais. Sei que temos que estar sempre prontos, mas pelo menos hoje, vamos esquecer que somos militares. Vamos sair para comer pizza e nada vai acontecer.

– Não pode ter certeza...

– Eu tenho certeza, vamos! Vou ajudá-lo a encontrar uma roupa – Shun disse rindo, empurrando o outro, que praguejava, para dentro do quarto. O mais novo abriu o armário e começou a procurar entre as roupas, jogando sobre a cama uma calça Jeans-claro e uma camiseta branca.

– Encontrei! Agora vista! – sorriu satisfeito.

A contragosto, Câncer começou a se livrar das roupas que vestia, olhando atravessado para Shun.

O adolescente engoliu em seco ao ver o outro somente de cueca e desviou o olhar, embora permanecesse ali. Shun não estava pronto para a onda de excitação que o tomou ao perceber o quanto o corpo de Máscara da morte era sexy. Ele não era excessivamente musculoso, possuía músculos perfeitos e na medida, moldando um corpo másculo, forte. Mas era muito mais forte que Hyoga, o corpo também era mais trabalhado, traçado...

Mas o que estava fazendo?! Comparando? Corou com os próprios pensamentos. Não havia como comparar, Hyoga apesar de um cavaleiro era um adolescente quando eles se envolveram. Ângelo era um homem mais que pronto. Sorriu, balançando a cabeça com a própria bobagem.

– Pronto, estou bem assim? – indagou o outro, que agora pegava coturnos marrons num canto do quarto.

– Melhor... – o mais novo fingiu desdenhar e recebeu um travesseiro na cara, rindo com isso. Máscara da morte terminou de calçar os coturnos, pegou uma carteira no criado-mudo e chamou Shun para sair, coisa que eles fizeram sem nenhum receio, pedindo a permissão dos donos das três primeiras casas para passar.

Eles foram para a vila de Rodório, e Shun apresentou ao cavaleiro mais velho a pizzaria gosto da terra, uma velha conhecida de Shun e Ikki quando eles estavam com preguiça de cozinhar, naqueles meses de santuário.

Eles jantaram num clima bom e conversaram bastante sobre coisas banais. Não queriam nenhum assunto que trouxesse sombras, queriam aproveitar a noite, torná-la especial como foi o dia, mesmo com o incidente na casa de virgem.

No santuário, Shura e Aiolia conversavam com Saga sobre o ocorrido no sexto templo. O grande mestre mostrava-se preocupado com aquilo e, a pedido do líder da Kripteia, resolveu convocar uma reunião informal de emergência.

Os líderes estavam reunidos, Saga se sentava à cabeceira da grande mesa, tendo Saori à sua frente. Além deles, estavam presentes naquela reunião, Aiolia, líder da tropa, Shura, líder da Kripteia, Marin, a Epístata dos Prítanes, que delegava sobre as regras de condutas e era a única que poderia convocar assembleias e votações além de Athena e o Grande mestre, Shion e Dohko, conselheiros solenes.

O grande mestre se ergueu e todos com ele, mas ele solicitou que os demais se sentassem, embora permanecesse de pé.

– Cavaleiros de Athena – ele começou –, essa reunião informal foi convocada a pedido do cavaleiro de capricórnio, líder da Kripteia, então eu lhe passo a palavra.

Shura se ergueu respeitosamente, com seu jeito sério, a expressão ainda mais grave.

– Cavaleiros, Marin, Athena, eu convoquei essa reunião por causa de algo que considero preocupante e embaraçoso. Preferi a reunião informal, algo que ainda não envolvesse uma assembleia e sem a necessidade de se convocar o Concílio.

– Do que se trata, cavaleiro? – Marin perguntou, preocupada. – Está deixando todos curiosos.

– Estou falando da declaração pública do cavaleiro de câncer sobre seu envolvimento afetivo com o cavaleiro de Andrômeda.

Os presentes se entreolharam um pouco confusos.

– O que você quer discutir a respeito disso, Shura? Ainda não conseguimos entender – volveu Saori, calmamente.

– Acredito que a postura do cavaleiro de câncer ao fazer tal declaração não foi adequada. Eu a considero como falta de decoro militar. Acredito que devemos adverti-lo para que a partir de agora ele prossiga no seu relacionamento de maneira mais... discreta. Entenda, senhores, que o que desejo não é nenhum tipo de retaliação às relações existentes, mas não podemos esquecer nossos papéis aqui que é garantir a segurança da Terra e da Deusa, e não exibir romances e intrigas pelos cantos do santuário. Por tal motivo, eu considero a postura do guardião da quarta casa inadequada.

Um silêncio pesado se estabeleceu quando Shura calou-se e se sentou. Saori ensaiou dizer algo, mas calou-se. Todos pareciam meditar sobre as palavras de capricórnio, e as opiniões divergiam entre achá-las paranóicas ou sensatas.

Quando alguém falou, foi Dohko que exibia um sorriso nos lábios e seu olhar calmo e sábio. Um olhar de mais de 200 anos, embora sua aparência conservasse, agora, o frescor da juventude.

– Shura, está pedindo para que o cavaleiro de câncer seja advertido por expor seus sentimentos?

– De forma alguma, conselheiro, o que eu quero é que a ordem militar seja mantida no Santuário, apenas isso.

– Desculpe-me, conselheiro – volveu Aiolia com sua voz grave e imponente –, mas eu entendo as desconfianças de Capricórnio. Sabemos que até pouco tempo, relações do tipo eram proibidas. Athena e o Grande mestre flexionaram as leis, humanizaram-nas, mas isso não significa que poderemos viver em estado de anarquia. Cavaleiros e amazonas relacionam-se, cavaleiros e cavaleiros, essa não é a questão, mas não podemos deixar que tais relacionamentos virem escândalos como o ocorrido hoje na casa de virgem. Quase tivemos uma luta dos 1000 dias entre Shaka e Máscara da morte por causa disso. Não é sensato.

– Shaka foi intransigente – falou Dohko. – Não sei os motivos que impulsionam o cavaleiro de virgem, mas já algum tempo abolimos os treinamentos excessivamente cruéis.

– Shaka tinha o direito de proibir a entrada em seu templo. Isso está nas leis – volveu Shura. – Andrômeda o desafiou e ele poderia matá-lo se assim quisesse, o que não fez.

– Mas não acha que isso é muito cruel, Shura?! – Saori disse, triste. – Matar uma pessoa apenas por isso? Eu sei que todos vocês, cavaleiros, foram criados sem nenhuma espécie de amor, tendo a conduta militar como única regra e a sede de justiça como único sentimento. Mas não estaria na hora disso mudar? Acha correto Shaka matar alguém adorável como Shun somente por que tem direito a isso?

Aiolia suspirou e encarou a deusa.

– Athena, sabemos que tens um bom coração, mas se começarmos a abolir todas as regras do santuário, isso se tornará uma anarquia. O grande mestre há de convir que além da questão do decoro, uma lei foi quebrada. O cavaleiro de virgem teve sua casa invadida, foi aviltado e desafiado dentro do seu templo, se ele quisesse...

– Sim, ele poderia matar, sabemos – Dohko completou e calou-se, mirando todos por um tempo e se detendo em Aiolia. – Leão, será que estaria sendo tão duro se o ocorrido não envolvesse o cavaleiro de Câncer?

– Como assim? Minhas motivações não são pessoais, conselheiro – volveu Aiolia, ofendido.

– Eu discordo – Shion finalmente se posicionou. – Todas as nossas motivações são pessoais, Aiolia, essa não seria diferente. Entretanto, se uma regra milenar foi quebrada, se o incidente de hoje teve tal gravidade a ponto de poder iniciar uma luta entre dois cavaleiros de ouro, acho lícito que seja investigado e, se for o caso, entregue para A corte de Helieia.

Saori suspirou. A corte de Helieia julgava a maioria dos processos que poderiam ocorrer dentro da jurisdição do santuário. Seus jurados eram escolhidos dentre os 88 cavaleiros que, sob juramento, julgavam os casos que iam desde homicídios a qualquer pequena quebra de conduta pelos membros da sagrada ordem dos cavaleiros de Athena.

– Marin? – a deusa interrogou a amazona, que pensou um pouco antes de responder.

– Creio que a entrega do caso à Helieia deve ser feita após a apuração de todos os fatos. Devemos instituir o ato dos archeiros citas da Kripteia. Após essa averiguação, se for o caso, convocamos a Helieia.

– É o mais sensato. Eu concordo. – Falou o Grande mestre. – Convocaremos os cavaleiros envolvidos no incidente para esclarecimentos.

– E quanto às declarações do cavaleiro de câncer? – o líder da kripteia quis saber.

– Eu sou a favor da democracia dentro do Santuário. – Volveu Dohko. – Não acho que um homem deve ser constrangido por dizer que ama ou que tem alguém.

Saga sorriu discretamente com o canto dos lábios, concordando com o conselheiro.

– Shura, eu creio que mesmo sendo nós cavaleiros, nossas escolhas pessoais não precisam ser feitas de forma escondida como se cometêssemos crimes – tornou Marin. – Eu tenho certeza que nem Máscara da morte e nem Shun tiveram uma conduta imprópria o suficiente para merecerem advertências.

– Câncer defendeu a pessoa que ama, isso é condenável? – indagou Shion.

O cavaleiro de capricórnio continuou com seu semblante grave sem nenhuma mostra de aborrecimento ou felicidade.

– Creio, senhores, que vocês estão romantizando as coisas, e isso dentro de uma ordem militar é perigoso...

– Shura – Dohko se voltou para o mais novo que o encarou com todo seu respeito.

– Sim, conselheiro?

– Posso te dar um conselho?

– Sentir-me-ia honrado – o espanhol curvou-se um pouco em respeito.

– Vá namorar.

– Quê?... – ergueu os olhos para o chinês, espantado, o rosto corando, principalmente devido às risadas dos outros.

– É isso mesmo. Você é jovem demais para levar a vida tão a sério. Vá, arranje uma namorada ou namorado, o que for da sua escolha e relaxe! Tenho certeza que Câncer e Andrômeda estão melhores que nós que estamos perdendo nosso tempo nessa reunião chata numa noite bonita como essa!

O clima se descontraiu de vez, todos riam muito, menos Shura que, constrangido, retirou-se assim que o grande mestre encerrou aquele encontro informal. Aiolia também ria muito. Ele concordava com Shura em algumas questões, mas não perderia a piada de forma alguma, e Dohko era o melhor do santuário nisso.

Enquanto isso, após um ótimo jantar, Câncer e Andrômeda passeavam tranquilamente pelas ruas de pedra da vila, sentindo a calmaria noturna e o calor dos braços um do outro.

– Você vai ficar por aqui ou vem comigo para o santuário, Piccoli? – o mais velho perguntou, parando e encarando o rosto do outro.

– O que você prefere? – Shun provocou com um sorriso tímido.

– O que você preferir.

– Assim não vale. – Riu, bobo. – Tudo bem, eu vou para o Santuário com você. É isso que quer?

– Você é quem está dizendo...

– Ângelo! – ele o socou de leve no braço, e Máscara da morte riu. Ainda era estranho para ele ser chamado por aquele nome. Estranho, mas não ruim. Isso provocava no cavaleiro de ouro um sentimento de intimidade profunda e reconfortante.

– Venha piccoli, vamos para minha casa.

Ele abraçou o cavaleiro mais novo e os dois seguiram, caminhando calmamente, para o santuário. Não havia pressa ou preocupações naquele momento. Havia somente dois homens profundamente envolvidos um com o outro e em seus pensamentos nada além deles constava naquela noite.

Chegaram ao quinto templo quando a aurora já rompia em tons diversos no céu grego, fazendo uma confusão de nuances amarela, laranja e azuis pairarem sobre o Egeu.

Eles pararam um pouco na escadaria lateral, o que antes era conhecido como “caminho secreto”, pois não queriam acordar os outros cavaleiros, e admiraram aquela beleza estonteante por um tempo.

– Nunca pensei que fosse gostar tanto de estar na Grécia – Shun murmurou, abraçado ao corpo forte do italiano. – Obrigado...

Câncer riu de leve e beijou-o no topo da cabeça.

Perché?

– Porque você me ajudou a enxergar que a vida é bonita novamente, mesmo para nós, cavaleiros.

Máscara da morte afastou-se levemente do mais novo e o segurou pelo queixo, olhando dentro dos belos olhos verdes.

– E você me ensinou o valor da vida, piccoli, me ensinou que ela é bem mais que guerra e dor. Com você... – ele hesitou, não gostava de dizer aquelas coisas, não gostava de sentimentalidades, achava, sempre achou, que aquilo era demonstrar fraqueza, mas naquele momento, naquele momento despido de armas e ideologias bélicas, despido de tudo que acreditou e que deixara no Hades, ele sentiu uma necessidade inédita de se dispor, de se entregar e de confessar o que pairava no íntimo de forma intensa e assustadora.

– Comigo? – Shun incentivou, deixando pairar nos lábios um sorriso lindo.

O mais velho mordeu os lábios numa estranha timidez e depois sorriu também.

– Com você, eu me sinto alguém melhor, um homem melhor. Mi fate bene, piccoli.

Shun sorriu mais abertamente e enlaçou o pescoço do mais velho, o puxando para um beijo apaixonado, enquanto o sol rompia no horizonte, anunciando um novo dia no santuário de Athena.

Continua...


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Notas finais do capítulo

Obrigada a todos que leram e comentário.

Beijos, feliz natal e um ano novo maravilhoso a todos!

Sion Neblina

Postado em 22/12/2013