Amor De Gato escrita por Mallagueta Pepper


Capítulo 34
O rei do Parkour




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- Gentemmmm! Vocês não sabem do babado que eu acabei...
- Denise, onde você estava, criatura? O meu desafio vai começar e você tem que filmar tudo! Eu quero ficar bem bonito na fita!

Não houve como ela falar nada, já que a movimentação ali era grande. O jeito foi se preparar para filmar tudo. A grande fofoca podia ficar para depois.

Todos lhe falavam palavras de incentivo e boa sorte, já que a Mônica tinha deixado claro que quem o pressionasse ou deixasse nervoso, teria que se entender com seu punho. Era preciso que ele entrasse no desafio calmo e sem stresse.

Ele entrou na arena junto com sua competidora e ficou surpreso ao ver que daquela vez o adversário seria uma garota. Ela parecia muito séria e compenetrada.

Antes de anunciarem o inicio do desafio, ele se aquecia e fazia vários alongamentos.

- Ué, você não vai se aquecer não? Um bom alongamento é muito importante.

Ela não respondeu nada. E nem podia, já que poderia ser punida por confraternizar com um humano.

- Boa sorte aê...

Outra vez nenhuma resposta e ele acabou desistindo. Aqueles gatos levavam tudo muito a sério!

A grande pista que estava à sua frente representava para ele a pura essência do parkour. Os obstáculos eram perfeitos, bem organizados e ele torcia para que Denise estivesse filmando toda a sua performance.

Quando foi dado o sinal, ambos saíram correndo enquanto o público torcia freneticamente. Para a surpresa de todos, Cascão tinha conseguido passar na frente em pouco tempo ao passo que a gata tropeçava em alguns obstáculos.

- Confesso que estou confuso! Como o seu amigo consegue percorrer os obstáculos tão bem?
- Entre os humanos há um esporte que tem esses mesmos desafios. Se chama parkour e o Cascão é bem treinado nele, majestade.
- A ponto de conseguir passar na frente de um gato?
- Digamos que sim.

Naquela hora era difícil explicar para o rei que a essência do parkour era superar obstáculos por meio de movimentos eficientes utilizando somente os recursos que o corpo pode oferecer. Os gatos apenas pulavam de forma desordenada, não tinham nenhuma filosofia ou critério ao contrário dos humanos que por terem um corpo mais limitado, tiveram que aprender a usar o que tinham de forma mais eficiente, desenvolvendo a concentração, força de vontade, determinação e coragem.

Lord Teigr parecia muito tranqüilo apesar da situação. Claro, ele tinha um bom truque na sua manga que seria liberado a qualquer hora.

Quando eles se depararam com um enorme muro a sua frente, Cascão teve que fazer várias manobras para conseguir transpor o obstáculo e seguir em frente. A gata apenas saltou diretamente e acabou caindo em um pequeno fosso que tinha do outro lado do muro. Ela havia saltado tão rápido que não deu tempo de enxergar a armadilha e isso deu a ele boa dianteira. Por pouco tempo.

Um rugido se fez ouvir e ele viu que havia uma fera enorme no encalço deles. Que diabos era aquilo?

- O que? Quem mandou soltar essa fera? Ela não fazem parte do desafio!
- Fazem sim, caro irmão. Originalmente a fera fazia parte do último desafio, que foi feito para testar a habilidade de superar obstáculos e fugir do perigo.
- Ficou louco? Ela não é mais usada há gerações!
- Ainda assim faz parte das regras. E como ninguém mudou as regras, a fera continua valendo.
- Ai, você não presta mesmo, viu? Que coisa feia! E se aquele bicho devorar sua campeã?
- Não me faça rir! É mais fácil ele devorar o seu amigo!

Ela voltou a olhar para a pista, com o coração apertado. Se soubesse que iam colocar aquele bicho enorme no meio, ela jamais teria pedido ao Cascão para fazer aquele desafio!

“Então eles colocaram um gatinho para brincar com agente, né?” Ele ficou com medo, claro. Mas aquilo não o deixou apavorado. Afinal, o parkour também foi feito como uma forma de fugir com eficiência, a fim de ganhar a maior vantagem possível. E se tinha uma coisa que ele sabia fazer bem era fugir, graças aos anos de fuga das coelhadas da Mônica.

A gata fugia agilmente e a fera acabou dirigindo seu foco ao Cascão, que parecia mais fraco. No entanto, o rapaz pulava, desviava e seguia os caminhos mais inusitados, confundindo o animal e fazendo-o várias vezes bater em uma pedra ou cair em algum buraco.

Eles chegaram a uma espécie de vala cheia de troncos fincados na vertical e ambos foram pulando o mais rápido que podiam. A fera acabou indo ao encalço deles e quando os dois chegaram do outro lado, ele deu poucos pulos e acabou os alcançando. Como estava bem alerta e prevenido, Cascão conseguiu escapar e seguir em frente, mas a sua adversária tinha sido pega pelo animal, que a segurava com uma das patas.

“Droga, eu não posso deixar ela assim!”

- O que ele está fazendo?
- Ele vai ajudá-la, majestade.
- E o desafio? Ele não pode perder o desafio!
- E não vai perder. Só que ele também não pode deixá-la morrer assim. Isso não é jeito de ganhar!

Fidélius acabou concordando. Apesar do seu desespero em vencer aquela prova, ele não podia deixar seus princípios de lado.

- Ei, seu casado de pele mal feito! Aqui! – ele chamou jogando uma pedra em cima do grande felino. A fera deu um rugido de raiva e acabou largando a gata e correndo atrás dele.

No último segundo, ele desviou e o animal caiu em um grande buraco, de onde não poderia sair.

- Vamos, sua inútil! Não fique aí parada!

Assim que conseguiu se recompor, ela levantou-se rapidamente e acabou tomando a dianteira. Aquilo não era honroso, já que aquele humano tinha salvado sua vida, mas era preciso vencer a prova de qualquer jeito. Sem se alterar, Cascão deu logo um jeito de voltar a prova, pensando em uma forma de ultrapassar sua adversária.

Uma idéia veio a sua mente quando ele viu que estavam chegando a um declive bem acentuado. Descer aquilo correndo seria perigoso, mas e se ele pudesse deslizar? Pensando nisso, ele conseguiu pegar um pequeno tronco que não era muito pesado e subindo nele, foi descendo pela ladeira procurando se equilibrar. Lord Teigr quase teve um infarto quando viu o humano passando pela sua campeã e ficou gritando feito louco, arrancando vários tufos do seu pelo com as mãos.

Magali torcia e gritava enquanto Fidélius tentava não desmaiar. Aquele humano era louco por acaso? Na velocidade em que ele ia, poderia acabar se matando!

- Vai, Cascão, vai!
- Corre, véi! Dá moleza não!
- Gsuis me abana! O Casca-Boy tá arrazando!

Quando ele viu que estava chegando ao fim, deu um belo salto e conseguiu pousar em segurança graças aos amortecedores dos seus tênis. A sua adversária estava vindo logo atrás e ele não perdeu tempo.

“Hum... ele é bom, mas acho que já peguei o jeito!” se aquilo estava dando certo com ele, então daria certo com ela também e a moça se pôs a imitá-lo, deixando todos com medo e Teigr vibrando de alegria.

Aquilo era preocupante. A vantagem do Cascão era sua forma de percorrer os obstáculos. Se a gata conseguisse aprender seu método, conseguiria ganhar com certeza já que tinha a vantagem da força e agilidade.

Apesar de tudo, Magali não parecia muito preocupada. Sua arma secreta ia entrar em ação a qualquer momento.

De repente, a campeã de Teigr levou as mãos ao nariz e acabou tropeçando. Que cheiro horrível era aquele? Parecia cheiro de coisa podre! Ela tentava correr o máximo que podia, mas aquele cheiro não a deixava chegar muito perto do oponente e não havia como cortar caminho ou tomar outra direção sem que isso prejudicasse seu desempenho. De onde aquele cheiro estava vindo?

- O que está acontecendo? Por acaso seu amigo está jogando algum gás venenoso na minha campeã? Se for, é trapaça!
- Gás venenoso? Eu heim! De onde tirou isso? Tem gás venenoso não, é o cheiro dele mesmo.
- Como alguém pode feder tanto? Ele é um humano ou um gambá?

Ela deu uma risada com o espanto dele.

- O Cascão sempre foi assim! Toda vez que ele corre muito, começa a cheira mal. Vai ver ele andou ficando uns dias sem tomar banho, sei lá.

Aquilo era absurdo demais para ser verdade. Como alguém podia passar dias sem tomar banho? Os gatos eram muito asseados e não suportavam sujeira.

- Isso é algum truque sujo? Por que ele resolveu deixar de tomar banho justo perto dos desafios?
- Ué, por acaso os campeões são obrigados a tomarem banho antes das provas? Pelo que eu sei não, né?

Ele calou-se, furioso e Fidélius se esforçava para conter o riso. Estava claro que eles tinham feito aquilo de propósito. Os humanos não eram nem um pouco burros, afinal de contas.

“Bando de idiotas... ainda tenho um último truque na manga!”

A gata corria tentando chegar perto o suficiente. Por mais que aquilo lhe causasse repulsa, não havia outra alternativa. Com aquele cheiro ela não ia conseguir vencer seu oponente.

Sem que ninguém visse, ela tirou do bolso pequenos espinhos que tinham sido mergulhados no sumo de uma planta venenosa. Aquilo não ia matar o rapaz, apenas atrapalhar seus movimentos o suficiente para que ela pudesse ultrapassá-lo. Bastavam alguns espinhos e pronto. Ele não ia nem sentir nada. Mas algo dentro dela pareceu se revirar com aquilo.

Eles estavam chegando perto da linha de chegada e a gata sabia que tinha que se apressar. Mas por que ela não conseguia fazer aquilo? Não, aquilo era trapaça, era errado! E ele tinha salvo sua vida! Sem sua ajuda, aquela fera teria lhe devorado e no fim Lord Teigr acabaria exterminando sua família do mesmo jeito. Seria justo ela deixar seus princípios de lado para que aquele homem horrível pudesse subir ao trono? Será que não havia outra alternativa?

“Droga! Quer saber? Se eu tiver que vencer, será jogando limpo!” ela jogou os espinhos fora e continuou correndo o máximo que pode, quase o alcançando.

- Sua imbecil! Por que não está fazendo o que eu mandei? Use os espinhos agora! – aquilo saiu sem querer. Seu maior ponto fraco era falar demais quando estava nervoso. Era como se sua boca adquirisse vontade própria.
- Espinhos? Você estava planejando trapacear? Seu gato de beco sem vergonha!
- Olha lá como fala comigo!
- Falo como eu quiser! E cale a boca que eu quero acompanhar o desafio!

Eles voltaram a se sentar e a prestar atenção aos dois campeões que corriam pela pista.

Cascão procurava percorrer os obstáculos da melhor forma possível, aproveitando a vantagem que seu cheiro estava lhe dando. A linha de chegada estava a poucos metros e ele viu que o resultado ia ser apertado. Em seu caminho havia uma pedra e ao invés de desviar, ele procurou subir nela, usando-a como uma plataforma para dar um salto. Aquilo exigiu o máximo de forças da sua perna.

À medida que ele voava no ar, ela seguia em terra logo atrás. Poucos centímetros os separavam.

Dentro da sala dos campeões, a turma estava em silêncio. Uns cobriram os olhos, outros roíam as unhas e Denise mal conseguia se agüentar em suas pernas. Se não fosse o receio de perder uma filmagem histórica, ela teria desmaiado.

Fidélius olhava tudo vidrado, seus olhos nem piscavam e Magali tinha ficado paralisada. Até Teigr ficou quieto, acompanhando tudo com os punhos cerrados por causa do nervosismo. Finalmente alguém atravessou a linha de chegada. O desafio estava acabado e já tinha seu campeão.

- Vivaaa!!!!!!!!! O Cascão venceu! Ele venceu!! Uhuuu!!!! Ele venceu, majestade!

A grande arena quase veio abaixo. Todos gritavam, vibravam e aplaudiam o novo campeão, que tinha caído no chão exausto.

- Você correu bem. – ela falou com ele, pela primeira vez.
- Você também, caraca! Mais um pouco e tinha me alcançado!
- Obrigada por ter salvo a minha vida.
- De nada.

Ela chegou mais perto dele, ajudou-o a levantar e lhe deu uma lambida no rosto como agradecimento. A turma toda tinha invadido a arena para saudar o novo campeão.

- Você mandou muito bem!
- Demais!
- Grande Cascão!
- É isso aí, Casca-Boy! Você arrasou!

Fidelius estava largado no trono, ainda sem acreditar no que tinha acontecido. Um criado usava um pano para abaná-lo. Céus! Seus nervos estavam em frangalhos. Depois daquilo ele ia querer umas boas férias! Sem trabalho, sem problemas reais, só um bom descanso! E, claro, aquela comida para gatos que os humanos faziam e que era deliciosa! Pensando bem, um povo capaz de fazer aqueles manjares para os gatos não devia ser de todo ruim.

- Magali! nós ganhamos, ganhamos! – Felicius tinha saltado até o camarote do pai para abraçar a namorada. – Ganhamos, meu pai!
- Coitado, eu acho que ele vai precisar de um bom descanso!
- Então vamos lá comemorar com os nossos amigos! Sobe aí!

Ela subiu em suas costas e ele a levou até a arena, onde a turma pulava e comemorava, contagiando a platéia com o seu entusiasmo. Fidélius via a comemoração deles e não pode deixar de ficar comovido ao ver como aqueles humanos tomaram partido da sua luta como se fosse a luta deles.

Teigr assistia a tudo, espumando de raiva. Será que os humanos tinham sempre que vencer os desafios naquele reino? Aquilo só podia ser uma piada de mal gosto!

Primeiro aquela pirralha venceu os desafios das garras de gato, apesar de...

De repente, um sorriso sinistro surgiu em seus lábios. Um pequeno detalhe lhe veio à mente. Era algo que até então ele nunca tinha pensado antes, mas analisando bem, fazia sentido. Não, aquilo não tinha acabado ainda!

- Parem tudo! Esses desafios não valeram! Isso foi uma farsa! – ele gritava freneticamente até conseguir chamar a atenção de todos.

Fidélius levantou do trono com um salto.

- Do que está falando, seu idiota? Meus campeões venceram dignamente!
- Não venceram não! Para começar, eles não deviam nem ter competido!
- Do que você está falando?

Na arena, os jovens prestavam atenção à conversa. O que tinha dado naquele cara?

- A louca! Agora ele tá dando chilique?
- Aposto que ele está tramando alguma coisa! Esse meu tio não presta mesmo!
- Eu não agüento esse povo chato que não sabe perder! – Mônica falou, também irritada com a atitude infantil daquele gato.

- Pare de enrolar e diga logo qual é o problema, embora eu saiba que não haja nenhum. Por que meus campeões não deveriam ter feito essas provas?
- Porque eles são criminosos, é isso! E de acordo com as regras, criminosos são proibidos de participarem em provas reais como essas.

Silêncio total. Eles? Criminosos? De onde aquele maluco teria tirado aquela idéia? Aquilo não fazia nenhum sentido para ninguém, mas na mente doentia de Lord Teigr, tudo estava muito claro.


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