Fui pra casa ainda pensando em Annabeth. Sabia que tinha algo de errado com ela, algo que ela tentava esconder, mas o que poderia ser?

Eu precisava descobrir. 

Tirei minha camisa e joguei em algum canto do quarto. Olhei para a janela de Annabeth, estava fechada. Aquilo ficou batucando na minha mente por um bom tempo.

Pensei em como reagi quando ela disse que ia sair com alguém. O cara me parecia familiar, mas não lembro de onde. De qualquer forma, eu me senti incomodado, quase com raiva.

 E tinha também aquilo no carro. Eu estava tão confiante que ela ia me beijar e... nada. 

Eu nunca tinha levado um fora na vida, ai chega essa garota e me dá dois foras em menos de uma semana. 

Já estava ficando estressado. Annabeth não saia da minha cabeça e isso me deixava estressado. Peguei meu celular e disquei um número.

 - Alô. - a voz fina e irritante da Rachel surgiu do outro lado. 

- Oi amor, o que está fazendo? - perguntei tentando soar interessado. 

- Ah, oi amor, estou em casa sozinha, quer vir pra cá? - perguntou com a voz mansa

.- Certo, estou chegando ai. - disse e desliguei. 

Eu sabia que Rachel passava o dia sozinha. Ela vinha de uma família rica e seus pais passavam o dia fora trabalhando. 

Tomei um banho e vesti jeans e camiseta. Peguei as chaves do carro e desci as escadas assobiando. Minha mãe veio da cozinha e botou as mãos na cintura. 

- Vai sair de novo? - perguntou. 

- Yeah, ver Rachel. - disse e ela levantou uma sobrancelha.

- E com quem você estava antes? - ela indagou franzindo as sobrancelhas.

-Annabeth. - disse simplesmente. Minha mãe me olhou confusa.

- A menina que veio morar com Suzan? - perguntou. Assenti. 

- Ela parece ser um amor de menina. - ela comentou. Bufei.

- Ela é. - concordei. - Mas também é  muito irritante.

Minha mãe deu uma risadinha e voltou pra cozinha. Sai de casa e dirigi até o apartamento da Rachel.

Certo, apartamento era um eufemismo. O prédio inteiro era da família dela e ela morava num andar inteiro.

Peguei um elevador até o último andar e bati na porta dela.

Logo Rachel apareceu vestida com um vestido branco curto. Ela sorriu e me mandou entrar. 

- Estava com saudades, pesadelo ruivo. - falei abraçando-a de costas e beijando seu pescoço.

 - Venha. - ela falou pegando a minha mão e me levando em direção ao seu quarto.

 Entramos em seu quarto e deitamos na cama de dossel no meio do quarto. 

Rachel invadiu minha boca sem pudor. Minha mão traçava seu corpo já conhecido. Parei de beijá-la somente para tirar seu vestido e minha camisa. Toquei seus seios e ela gemeu contra minha boca.

 -  Eu te amo Percy. - ela disse e eu a apertei com mais força. Ignorei-a e voltei a beijá-la, meus pensamentos ficando cada vez mais incoerentes e o desejo tomando conta. 

Estava deitado na cama de Rachel, que dormia no meu peito.

Respirei fundo. Tentei não pensar em nada do que acontecera aqui momentos antes. Novamente Annabeth voltou a minha mente, seu sorriso tímido e desinibido ao mesmo tempo, seus olhos cinzas e seus cabelos loiros cacheados, tão diferente de Rachel.

Balancei a cabeça furtivamente pra tirar ela da minha mente. Não adiantou nada, mas acordou Rachel. 

Ela sentou-se sonolenta e se cobriu com o lençol de sua cama.

 - Você está bem? - ela falou pegando seu vestido ao lado da cama.

 - Estou e você? - perguntei olhando para o teto do quarto.

 - Estou bem. - ela falou e olhou para a palma da mão. - Você não me ama.

- O que? - perguntei confuso com a mudança de assunto. - Porque isso agora, Rach?

- Você está com as sobrancelhas franzidas e o olhar desfocado, no que está pensando? - ela perguntou deitando no meu peito. 

Hesitei por um momento. Por mais fútil, arrogante e patricinha que Rachel costuma ser, ela tinha seus momentos sensíveis como todo ser humano. Mas eles são bastante raros e quando acontecem, geralmente exigem toda a minha atenção. 

- Não é nada meu amor. - falei segurando sua cintura.

 - Promete que nunca vai me abandonar? - ela perguntou. Engoli em seco. 

- Sim. - falei. 

Ela me beijou tão apaixonadamente que eu quase me arrependi da mentira. 

POV ANNABETH

Estava jogada no chão com as pernas pra cima da cama relendo pela milionésima vez Harry Potter e a ordem da fênix quando meu celular toca. Praticamente dei uma cambalhota, um mortal e voei até o outro lado do quarto onde o celular tocava escandalosamente.

 - Alô. - falei sem ver o número.

 - Huh, Annabeth? - uma voz rouca soou do outro lado.

 - Erick? - indaguei olhando no visor do celular. Era o número dele. 

- Sou eu. Liguei pra perguntar se você gostaria de almoçar comigo amanhã? - ele perguntou.

Vibrei por dentro. O cara era um gato, lindo, britânico, educado, fã de Harry Potter e estava me convidando para almoçar. Ah como eu amo Nova York. 

- Claro. - falei. - Eu adoraria.

Ele me passou o endereço de um restaurante. 

- Certo, nos vemos amanhã. - falei.

 - Boa noite, Annabeth. - ele disse e desligou. 

- Espere mais um pouco e se apaixone por ele, Annabeth. - falei em voz baixa.

Resolvi tomar um banho. Joguei minhas roupas num canto e me observei no espelho. Eu parecia mais pálida ou talvez fosse a luz fluorescente do banheiro, mas de qualquer forma isso fazia minhas marcas aparecerem claramente sobre a pele pálida. 

Havia umas poucas na minha barriga, outras no início da coxa, mas o que mais se destacava era meu pulso. Marcas já completamente cicatrizadas e quase desaparecendo e outras tão recentes que não dera tempo da pele se restaurar.

 Respirei fundo e me joguei debaixo do chuveiro. Quando acabei, fui até o closet e procurei a maior camisa que encontrei. Por uma ironia do destino, era uma camisa do papai. Vesti-a lembrando do dia que eu fizera ele comprar. 

Estavámos passando as férias na casa da Tia Suzan. Tínhamos ido ao Central Park e papai estava me carregando no ombro, com uma mão ele me segurava para não cair e com a outra segurava a mão da minha mãe. 

- Annabeth, toma logo esse sorvete. - minha mãe disse.

- Deixa ela, Atena. - meu pai disse me sacudindo. Minha mãe revirou os olhos.

- Se ela derrubar em você, não vai reclamar. - ela disse sorrindo.

 Como se ela tivesse previsto que isso ia acontecer, uma criança passou de bicicleta perdendo o controle e quase atropelando meu pai que deu um pulo pro lado, fazendo meu sorvete cair na sua camisa. 

- Eu falei. - ela disse rindo. - Vamos comprar outra ali.

Papai me desceu de seus ombros para olhar algumas camisetas. Encontrei uma do tamanho dele e levei pra ele.

 - Aqui papai. - falei e lhe entreguei uma camisa preta escrita I love New York. Ele olhou e riu. 

- É perfeita Annie. - ele disse e bagunçou os meus cabelos. 

O peso dessa lembrança quase me faz cair de joelhos, sem que percebesse lágrimas rolavam por minhas bochechas.

De repente eu precisava daquilo de novo. Precisava sentir a lâmina afiada romper minha pele como precisava de oxigênio para sobreviver.

 Voltei até o banheiro pegando a lâmina no armário da pia e posicionei meu pulso. Pressionei a lâmina contra meu pulso até o primeiro filete de sangue sair, minhas lágrimas se juntando ao sangue. 

Eu sabia que eu devia parar, mas eu não queria.

Fiz outro corte embaixo do primeiro e observei o sangue escorrer. O ar ao meu redor parecia denso, o cheiro enferrujado do sangue entrou pela minha narina e se alojou no meu cerébro como um lembrete. 

Fraca.

Me senti claustrofóbica, limpei o sangue do braço, guardei a navalha e corri para a sacada, ficando sem ar. 

Respirei ofegante e comecei a chorar de verdade. Me agarrei na sacada, pensando em pular dali.

Eu é quem devia ter morrido, não eles!