Os dias se passavam lentamente, se arrastando, como se zombassem de mim pelo fato de querer sair logo daquele lugar que eu deveria chamar de casa. Faltavam três dias para a virada de ano, três dias para voltar para minha verdadeira casa, Hogwarts. Três dias de puro fingimento e falsidade, dias em que eu desaparecia com Scorpius e voltava apenas à noite, quando todos estavam ocupados demais para perceberem minha presença.

Nas raras vezes em que, por um descuido meu, eu encontrava alguém de minha família, era a mesma coisa: perguntavam como eu estava, por que não aparecia mais nas refeições e se Rose havia me incomodado. Falando nela, eu não a vejo desde o natal, ela conseguiu sumir mais rápido que eu, e eu não sabia se devia agradecer ou me preocupar com isso. Onde ela estava e o que estaria fazendo?

Uma parte de mim dizia que eu estava paranoica enquanto a outra, bem maior que a primeira, se revirava atrás de respostas para essas perguntas. Ela não me deixaria vencer tão facilmente, ou deixaria?

- No que está pensando? – Scorpius me tirou de meus devaneios, ele brincava com uma mecha de meus cabelos enquanto eu estava apoiada em seu peito e ele se escorava na grande árvore que havia na campina, o lugar para onde fugíamos sempre que possível. O tempo, apesar de frio, já havia melhorado desde o natal e não nevava mais, o que facilitava a ideia de nos sentarmos na grama sem nos molharmos completamente.

- Que daqui a três dias poderemos voltar para casa – murmurei, me apertando ainda mais contra ele, que possuía um braço protetor me envolvendo.

- Eu estava pensando... – ele fez uma pausa, respirando fundo – Talvez pudéssemos sair daqui antes.

- Como? – perguntei confusa – Não podemos voltar para Hogwarts e não temos onde ficar.

- Meus pais voltaram de viagem – falou – Minha mãe mandou uma coruja me convidando a passar o Ano Novo com eles.

- Oh – deixei escapar, sem saber qual deveria ser minha reação. Ele iria embora – E você vai?

- Se você quiser... – ele deu de ombros - Acho que eles não podem ser tão piores que os seus.

- Espere, você está me chamando para ir junto? – pisquei atordoada e me separei dele, para poder encara-lo.

- Eu não a deixaria aqui, Lily Luna – ele falou sério – Nunca me perdoaria se o fizesse.

- Conhecer sua família? – perguntei, momentaneamente incapaz de compreender o que ele havia dito.

- Nada mais justo, não? Eu conheci a sua – ele sorriu, divertido – Ou está com medo?

- Você é um Malfoy, seus pais são os Malfoys – constatei, ainda atordoada.

- E você é uma Potter, seus pais são Potters, seus irmãos também e o resto de sua família é Weasley – ele completou, ainda divertido – Qual o problema?

- Esse é o problema, eu sou uma Potter, eles vão me odiar! – arregalei os olhos, em pânico.

- Eles não são tão ruins assim – Scorpius tentou me acalmar, mas parecia se divertir com meu medo.

- Ah, claro que não! – ri sem humor – Seu avô o fez matar uma pessoa inocente, que você nem ao menos conhecia, imagine o que ele faria com uma Potter?

O sorriso de Scorpius sumiu repentinamente e sua expressão se tornou fria e dolorida. Eu arregalei ainda mais meus olhos ao perceber o que eu havia falado, eu não devia ter mencionado aquilo.

- Scorpius, me desculpe...

- Não, você está certa – ele me interrompeu, rude – Não sei o que eu estava pensando quando te contei isso.

- Não! – senti meus olhos se encherem de lágrimas – Por favor, não diga que se arrepende – me coloquei a sua frente, pegando seu rosto com minhas mãos e o obrigando a me olhar – Me desculpe, por favor, eu só estava com medo. Medo do que eles pensariam de mim e que eles te convencessem a me deixar, por eu não ser boa o suficiente. Eu não conseguiria viver sem você, Scorpius.

Ele piscou um pouco, o olhar frio se derretendo e dando lugar ao entendimento.

- Eu nunca a deixaria por causa deles, pensei que soubesse disso – falou confuso.

- E eu sei, mas isso não significa que eu deixe de ter medo, eles são sua família, Scorpius – respondi – E apesar de tudo, sei que você se importa com o que eles pensam.

Ele me olhou por alguns segundos, me analisando, até que suas mãos foram até as minhas, ainda eu seu rosto, e as levaram até seu peito.

- Eu te amo, Lily Luna – ele sorriu com sinceridade – E nada do que eles fizerem vão me fazer esquecer isso.

- Mesmo depois de estar toda desfigurada por várias maldições desconhecidas e assustadoras? – perguntei infantilmente, meus olhos arregalados.

- Ora, nós somos bruxos ou o que? – ele falou, um brilho divertido em seu olhar – Tenho certeza que podemos consertar isso.

- Scorpius! – exclamei incrédula.

- Ok, eu prometo que vou continuar te amando mesmo depois de você estar toda desfigurada por várias maldições desconhecidas e assustadoras – ele repetiu minhas palavras com seriedade e depois revirou os olhos, rindo.

- Agora ficou melhor – falei, sorrindo que nem uma idiota – Eu também te amo, Scorpius Malfoy.

-*-

Coloquei a ultima blusa na mala e bufei, me jogando na cama. Por que não poderíamos usar magia fora da escola? Ou por que não havia ninguém maior de idade por perto para que eu pudesse usar magia sem ser pega?

- Você vai mesmo fazer isso? – Fred me perguntou, sentado na cadeira a minha frente.

- Se eu pudesse o levava junto – comentei, fazendo uma careta, não havia pensado nisso antes, Fred ficaria sozinho nesse inferno.

- Aqui não é tão ruim assim... – ele murmurou, mas desistiu quando eu o encarei incrédula – Ok, mas eu já me acostumei.

- Estou me sentindo culpada agora, isso não é justo contigo...

- Se ele quiser, pode ir junto – Scorpius entrou no quarto, dando de ombros e se sentando ao meu lado da cama.

- Como? – Fred arregalou os olhos – Um Weasley na Mansão dos Malfoys?

- Finalmente alguém me entende! – levei os braços ao alto, exagerando. Scorpius revirou os olhos, me ignorando – Mas pensando melhor, seria bom que você fosse, assim a fúria dos Malfoys não cairá somente sobre mim.

- Você poderia ser um pouquinho mais dramática? – Scorpius perguntou ironicamente, se virando para mim – Eu não estou te levando para sua morte ou algo do tipo, são apenas meus pais!

- E seus avós – completei, emburrada – Não tenho culpa se eles são assustadores.

- Onde está sua coragem, Lily? – Fred me perguntou divertido, rindo da nossa discussão.

- Desculpe, mas que eu saiba, coragem é uma das qualidades da Grifinória – falei, cruzando os braços.

- E desde quando covardia é uma das da Sonserina? – Scorpius perguntou, arqueando uma das sobrancelhas.

- Não é covardia! – grunhi, o olhando ameaçadoramente – É cautela.

Scorpius revirou os olhos enquanto meu primo gargalhava.

- Idiotas – murmurei, ainda de braços cruzados – Mas se você é tão corajoso assim, ó poderoso Grifinório – me virei para Fred – Então você vai com a gente, e isso não está aberto a votação.

- Mas...

- Acho melhor você arrumar suas malas, depois voltaremos a Hogwarts – o interrompi – E já que estão tão amiguinhos, Scorpius pode te ajudar, eu vou esperar lá fora.

Lancei um olhar cortante para os dois e pegando minha mala, sai do quarto.

- Ela ficou com raiva? – escutei Scorpius perguntar, confuso.

- Nunca subestime a filha de Gina Potter, ruivos são temperamentais – Fred comentou, como se entendesse de algo.

- Desde a ultima vez que eu conferi, você também é ruivo – Scorpius comentou, sarcástico.

- Só por parte de pai – meu primo respondeu e eu não pude deixar de soltar uma risada baixa enquanto descia as escadas.

-*-

Bufei pela milésima vez enquanto sentava em minha mala. Onde estavam aqueles dois? Já fazia quase vinte minutos desde quando os deixei e até agora nenhum dos dois haviam aparecido.

Olhei para o céu que já escurecia e suspirei pesadamente. Havia deixado um bilhete para minha vó avisando que eu e Fred iriamos passar o Ano Novo com os Malfoys, não queria falar com ela e correr o risco de alguém ouvir, como meus pais, e me impedir.

Escutei o barulho de paços se aproximando e me levantei da mala, me virando para trás.

 - Até que enfim, pensei que sairíamos apenas depois do An... – porém, antes que eu pudesse completar meu comentário sarcástico, um feixe de luz me atingiu e me senti caindo no chão, a consciência sumindo aos poucos.