Paixão Por Inconveniência. escrita por ChaosStreet


Capítulo 1
Ok Ok, pode apagar as luzes.


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura.



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Odeio esse apartamento! Odeio esta música! Odeio meu vizinho! - Praguejei, estourando os botões do controle remoto.

Era sábado a noite e eu estava empoleirado na minha poltrona de couro vermelho-sangue enquanto ouvia o noticiário avisar de mais mortes, sequestros e quedas na bolsa de valores. Não tinha muita coisa para se fazer a mais, quando se é um cara de vinte e poucos anos, estranho e sem vontade de ir para balada. Ao contrário, preferia mil vezes ficar em casa metido em um moletom, assistindo Discovery Channel e comendo batatas-fritas.

Minha vida se resumia a uma única e terna palavra: um saco. Tá legal, são duas, mas isso não vem ao caso. Quer dizer, eu não tinha muita coisa para fazer, só trabalhar o dia todo, chegar em casa 20:00hs da noite e ir assistir ao jornal nacional enquanto comia pipocas ou qualquer coisa comestível que tenha sobrado no armário.

Minha vida social é outra coisa que foi para o ralo no exato momento em que decidi que eu, Sasuke Uchiha, sou um ser intelectual e aparentemente superior aos idiotas com quem eu dividia a cafeteria no escritório. A cafeteria era uma merda, só para acrescentar.

Enfim, minha vida poderia ser apenas isso se não fosse por uma única coisa. Eu morava sozinho em um apartamento meia-boca no centro de Tóquio e tinha um vizinho que ficava ouvindo Dona Gigi até altas horas da noite. Ele era rico, seu apartamento ocupando quase o andar inteiro. Até agora me pergunto o que raios um cara cheio do cascalho veio fazer nesse cafundó de judas. Era puro e simplesmente odioso. O hobby dele é colocar aquela música infernal no volume máximo e o meu é cutucar a sua janela com o cabo da vassoura. Como isso não funciona, entretanto, estou pensando em comprar uma bazuca e explodir aquela merda toda de uma vez e alegar legítima defesa.

Mas, milagrosamente, hoje parecia que o galo ia se transformar em burro.

Olhei o relógio e já eram 23:00hs. Nada de música. Nada de Dona Gigi. Só o doce e melodioso som do silêncio. Mas se por um segundo pensei ter me livrado da poluição sonora pelo menos aquela noite, estava terrivelmente enganado. Mudava os canais da Tv no controle remoto quando os sons de Funk se revelaram. Quase estilhaçei o objeto em minhas mãos quando o maldito começou a aumentar o volume e a voz forçada do cantor se propagou pela minha sala. A mulher do noticiário não era nada mais que uma muda em relação á Dona Gigi.


Fechei os olhos e respirei fundo. Depositei o controle remoto de volta ao criado-mudo vagarozamente, tentando fazer a mente ficar vazia. Pensei no silêncio, em paz, e aos poucos, Dona Gigi foi sumindo da minha mente, e finalmente....

BUM! PUXA, TU É FEIA!

Aquele filho de uma senhora que rodava bolsinha na rua estava cantando a música. O som tão alto que faziam os vidros da janelas tremerem. A parede começou a fazer estranhos barulhos mudos. Ah é, ele está dançando também. Abri os olhos, a raiva devia estar tão presente neles que podiam lembrar olhos de vampiro. Daqueles vermelhos injetados, sedentos por sangue. A música já era suficientemente irritante, agora aquele merda estava cantando, dançando e AINDA ERA DESAFINADO?



Desculpa, ética. Mas é impossivel continuar aturando essa mesma coisa todos os dias. Levantei da poltrona ás pressas, apanhei as chaves em cima da televisão e saí em disparada pela porta. O corredor estava vazio, só eu e ele, duas portas intocadas. Uma calma e a outra extremamente infernal. Fiquei de frente para a mesma, ainda me decidindo se batia e mandava ele calar a boca ou se batia e e esmurrava sua cara.

PUXA, TU É FEIA!

Cerrei os punhos, e senti uma veia saltar da testa. Soquei a porta com toda a força, me preparando para largar o meu punho na cara daquele maldito. Alguns segundos e a porta se abriu, revelando o som - agora mais alto por falta de barreira da porta - e um homem de expressão surpresa e olhos estupidamente azuis.

Ah é, esqueci de avisar. Eu nunca tinha visto o meu vizinho. Era estranho porque na minha cabeça, ele era um gorducho que malhava escutando funk. Enfim, de alguma forma nós nunca nos encontrávamos. Eu saía pela manhã e chegava á noite muito cansado para bater na porta dele e pedir açucar. Eu geralmente esquecia de fazer supermercado, mas sempre tinha um estoque de batata frita e ramém no ármario (que apareciam do nada), então eu não me preocupava com coisas triviais como fazer compras.

De tão estupefato por este fato, não tive coragem de plantar-lhe um olho roxo, e apenas me limitei á franzir o cenho e jogar um olhar com um quê de desaprovação para dentro do apartamento. A música escapando com mais força de algum lugar dentro daquele espaço. Ele ficou me encarando, confuso. Eu o encarei, forçando ainda mais o olhar.

O,k. Anota no bloco: Ele é burro.


– Posso ajudar? - O cara-de-pau perguntou.


Ah, sim. Muito. Você poderia começar jogando esse seu CD pela janela.

– Sim. Você poderia, por favor, abaixar o volume deste aparelho?Eu estou inultilmente tentando dormir. - Falei, abrindo um sorriso amarelo. Mas na verdade queria soltar: Sim! Você poderia, por favor, tirar essa música infernal, antes que eu destrua ela e você!

Ele vesgou os olhos azuis para o lado, fitando o aparelho de som atravéz da visão periférica e os voltou para mim, em seguida.


– Não! - Soou ridiculamente ofendido.

Eu acho que já posso socá-lo agora, não é?


– Posso saber por quê? - Meu tom de voz se tornou ameaçador. Mas só um pouquinho.

Não sei se foi coisa da minha cabeça, mas vi os olhos dele brilharem antes que começasse a falar:

– Porque eu não quero. Vai fazer o que?

Finquei as unhas na calça jeans, tentando manter a educação. Ele estava certo. Não adiantou falar com o síndico. Ele não deu a mínima para os meus protestos. E não é como se o prédio todo não escutasse Dona Gigi, mas aquele velho filho da mãe parecia cúmplice do viciado em funk. Tanto que me acusou de difamador e me mandou procurar a minha turma!

– Bem, se pedir por favor não adiantou, vamos para o próximo método. - Estralei os dedos das mãos e o vi arregalar os olhos, antes que eu enterrasse o meu punho em sua fuça. Ele voou para trás com o golpe, mas não caiu. Ergueu os olhos azuis, agora cintilando, e eu soube que dali não haveria mais volta. Ele veio correndo, com a cabeça inclinada e punhas fechados. Se jogou sobre mim com as mãos ao redor do meu corpo e nós dois fomos ao chão. O corredor pareceu, de repente, mais estreito do que eu me lembrava. Joguei minhas pernas entre as suas e impulsionei o tronco, tentando me libertar de sua prisão. Mas ele era estranhamente mais forte, e continuou predendo meus pulsos contra o chão.

Encarei-o por baixo, sem perder a pose de durão.


– Você tem olhos arrogantes. - Disse, um estranho sorriso de escárnio nos lábios.

Não respondi. Sem perceber ele havia afrouxado o aperto nos pulsos e suas pernas estavam estendidas de qualquer jeito sobre as minhas. Minha chance, pensei. Zero pra ele! Chutei sua canela, e pego de surpresa, soltou um gemido de dor. Aproveitei a deixa e o empurrei para o lado com uma cotovelada forte, que o fez cair para trás. Disparei ao seu apartamento, procurando a origem de Dona Gigi, para que eu pudesse destruí-la. Bem, o que posso dizer? Eu podia ficar o restante da noite tentando imaginar da onde ele tirara aquela coisa que ele chamava de casa. E isso é um elogio, porque o apartamento mais parecia um playground do que uma moradia.

Balançei a cabeça, voltando ao que realmente interessava. A música. Ela vinha de um home theater de última geração. Deveria custar o preço da minha alma, pensei, me perguntando o quão rico era aquela pessoa.

Ele chegou bem no momento em que eu arrancava o CD do aparelho, pronto para atirá-lo pela janela.



– Não faça isso! - Gritou o meu vizinho.


Sorri, bastante satisfeito. Porém, quando estava prestes a jogar o maldito janela afora, ela se fechou automaticamente. Isso mesmo que você leu, a janela se trancou do nada. Ouvi um clique de tranco do outro lado do apartamento, outro clique na janelas e, por fim, um revestimento de metal desceu por elas, como grades de prisão. Dois segundos depois, o apartamento ficou em total breu, as luzes se apagaram e ficamos no escuro.



Enruguei a testa, ainda com o CD pendendo no dedo anelar.


– O que significa isso?


– Queda de energia. - Ele disse, apontando para a janela.


Olhei entre as grades para a cidade lá fora, estava apagada. Nenhuma luz além da lunar. Mesmo assim, uma coisa ainda estava em cheque. Por quê diabos surgiram grades da grossura de colunas gregas rente a porta e as janelas?!


Ele me fitou, como se lesse meus pensamentos.



– Sistema de segurança. Última geração.

Nem quis perguntar quanto ele ganhava por mês, só para não ter o orgulho ferido demais.

– Tá, pode desativar. Estou voltando para casa. - Falei, sentindo que já tivera o bastante daquela coisa loira.

Ele riu.


Porque ele riu? POR QUE DIABOS ELE RIU?



– O que foi, palhaço? - Soltei, cruzando os braços.



O sorriso divertido diminuiu até virar um sorriso de puro constrangimento.


– Ele não desativa. Só quando a energia voltar.

EH?

– O que? - Arregalei os olhos.



– É um sistema de segurança, afinal. - Começou a rir, o desgraçado.


– Você deve estar de brincadeira! - Tentei soar o mais rude possivel, mais minhas voz saiu trêmula e minhas pernas bambearam.


Esqueci de dizer, mas sou um cara de vinte e poucos anos com medo do escuro.



– Vou pegar umas velas, fique aqui. - Disse em meio ao breu. Ouvi seus passos se distanciando até sumirem de vez.



Ok, nada de pânico, nada de pânico. Não há nada no escuro, nada vai acontecer á você. Conte até dez. 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7...


BUM!


Alguma coisa soltou um grito lá fora e sobressaltei, sentindo que o medo faria meu corpo travar. Minha cabeça imaginou mil coisas em dois segundos; monstros, fantasmas e o mais arrepiante de todos, o homem do saco. Me apoiei nas grades da janela, tentando recuperar o equilibrio.

Quando eu tinha sete anos, minha mãe me mandava frequentemente fazer as compras semanais. Nesta mesma época, meu irmão, Itachi, insistia em contar-me uma história de terror. Ele dizia que todos os dias, perto da onde vivíamos, rondava um homem velho, corcunda, de olhos vermelhos e um enorme saco nas costas. Esse velho gostava de emboscar criançinhas sozinhas na rua, as enfiava dentro de seu saco e depois as devorava.

Fiquei tão apavorado que nunca mais quis sair de casa. Minha mãe achou que era um medo comum de criança, e realmente poderia ter sido, se não fosse por um dia. Um dia em que decidi jogar bola com uns amigos na rua. Pain, um menino mal-encarado de cabelo laranja chutou a bola longe, e eu tive de ir pegar. Ela ficara presa em um arbusto, e eu estava tendo dificuldades para arrancá-la de lá. Foi neste momento que alguém me cutucou. Olhei para trás de dei de cara com um velho. Um velho de barba grande, mal-feita e, principalmente, um saco nas costas.

Começei a chorar e saí correndo, esquecendo completamente da bola. E falando sempre a mim mesmo que " O homem do saco existia "

Um lampejo de raio passou cortando os céus, seguido de um segundo grito. Ainda mais apavorante.

Ok, pequeno motivo pra pânico!

Senti vontade de gritar, me encolher ao lado da janela e chorar feito uma criançinha chamando pela mamãe, mas não me daria ao luxo de fazer isso. Não com aquela coisa loira presente. Fiquei parado diante da janela, criando imagens mentais e incoerentes de coisas sobrenaturais escondidas no escuro, loucas para me devorar.

Uma luz despontou da cozinha e o vi carregando algumas velas nas mãos. Ele as deixou em uma prateleira do lado da porta, para que iluminassem pequenas, mas todas as partes da sala. Se aproximou de mim falando alguma coisa, mas eu só conseguia ver o homem do saco atrás de si, uma barba enorme e mal feita, dentes afiados como os de um tubarão e um olhar maligno. Carregava o enorme saco nas costas e tinha saliva pingando da boca sedenta. Um arrepio frio passou pela minha espinha e tudo o que fiz foi berrar:

– CUIDADO! O HOMEM DO SACO, ATRÁS DE VOCÊ! - Apontei, chacoalhando os braços, desesperado.

Ele pulou no lugar, assustado. Olhou para trás, balançou a cabeça, parecendo confuso e voltou-se para mim. Só aí percebi minhas mãos tremendo, ainda erguidas na direção de uma imagem que havia desaparescido, com os olhos arregalados e o rosto quente. Céus, eu devia estar tão vermelho. Mentalmente rezei para que o escuro não permitisse que ele visse o enrusbecer das minhas bochechas.

– Er... Sabe como é, deve ser efeito da luz. - Em vão, tentei explicar, gesticulando desajeitadamente para a luz da lua.

Ele soltou um gargalhada gostosa, daquelas de roncar feito porco. Queria chutar a mim mesmo, sem saber onde esconder a cara. Tudo bem, tudo bem, não era eu quem escutava Dona Gigi, pensei, tentando aliviar minha própria barra.

– Sei, claro. - Puro sarcasmo brotava de seus lábios.

Franzi o cenho, mais que aborrecido.

– Vai á merda!

– Calma, desculpe. - Sentou-se ao meu lado, quase como se quissesse ter uma conversa civilizada pela primeira vez.

– Hunf! - Esse fui eu aceitando seu pedido de desculpas.


– Mas quem diria, Sasuke Uchiha com medo do escuro! - Riu-se - E do homem do saco!

Estava prestes á mandá-lo para a puta que o pariu, quando algo me ocorreu.

– Como sabe meu nome?


Ele se agitou ao meu lado, desconfortavelmente. Pude jurar que o vi enrusbecer sob o escuro.

– Ah, eu só..sei?!

Não parecia muito convicente.


– Ah, por favor. - Meu tom era puro desdém.


– Talvez eu só...


Antes que ele pudesse terminar, começei a sentir um cheiro forte de queimado. E pelo visto, ele também, porque parou de falar e fungou, tossindo logo em seguida. Instantaneamente fiquei com um medo de deixar os dedos das mãos tremendo como se estivessem com defeito. O breu virou um parque de terror, mas logo vi algo que irrompia as barreiras da escuridão. Nós nos olhamos. Faltava uma vela na fileira que ele havia deixado á prateleira.


– FOGO! - Gritou o idiota, correndo para o cozinha atrás de alguma coisa que pudesse apagar as chamas, eu esperava.

Elas estavam quase alcançando os movéis quando decidi puxar a toalha de mesa da escrivania e estapear o fogarel com ela. Puxei a camiseta até as narinas tentando abater o fogo como podia, sem me queimar. Depois de sacudir a toalha umas trezentas vezes sobre as chamas, elas finalmente pareceram diminuir. Porém, a fumaça estava forte, e quase não parei de tossir enquanto me perguntava onde demonios estava aquela coisa loira.


Como meu azar era tanto que se recusava á acabar, dei uma última investida forte contra as chamas a fim de apagá-las de vez. Mas aconteceu o contrário, a toalha bateu na prateleira onde estavam as outras velas e cinco delas caíram. E nenhuma apagou na queda! O chão cuspiu chamas, subindo pelas paredes como trepadeiras super mutantes. Me despesperei, batendo a toalha com mais força. Mas só fiz piorar a situação, ela se partiu em dois e queimou junto com a bola de chamas que se formou no chão. Daí, eu fiquei completamente em pânico e começei a correr em circulos.


– AHHHHHHHHHHHH! SOCORRO! ALGUÉM! ÁGUA! - Gritei.

Ouvindo meu socorro, o cara finalmente resolveu aparecer. Ele irrompeu a sala com um balde d'agua em mãos e um sorriso heróico nos lábios. Parei de correr em círculos e sorri, como se as coisas estivessem realmente resolvidas. Com uma pose de Superman, a coisa loira jogou toda a água na minha cara. Senti minhas roupas grudarem no corpo e permanesci de olhos fechados, cerrados com força, tentando evitar cometer homicidio.

Não ouvi mais crepitar de chamas , então deduzi que o fogo tinha sido apagado. Junto comigo, claro. A minha vontade era de jogar ele no chão e pisar em cima, até sobrar o suficiente para servir de tapete na minha sala. Abri os olhos, cheio de raiva. Ele sobressaltou para trás, ainda segurando o balde vazio em uma das mãos. Eu vou matá-lo! Vou matá-lo, esse projeto de ser humano me paga!


– Vem cá, o que você pretendeu jogando água em mim, seu filho da mãe? - Rosnei, socando o ar com raiva.

– Bem, tinha o extintor de incêndio também, mas imaginei que você preferia água. - Ele riu, coçando a nuca, como se estivesse escolhendo uma coisa trivial, como cobertura de chocolate ou de morango.


Fiquei com vontade de meter dois tiros em sua cabeça, mas tudo o que fiz foi dizer:

– Que merda de sistema de segurança de uma última geração é esse? Só serve para te trancar em casa quando não tem energia?

– Claro que não! - O idiota se fez fez de ofendido - Ele me faz panquecas!


Uma veia saltou da minha testa, e me limitei á ignora-lo. Voltei á passos firmes até o canto da janela, desejando estar na minha poltrona de couro vermelho-sangue, da onde eu nunca deveria ter saído. O meu relógio marcou meia-noite quando ele veio para o meu lado, de cabeça baixa e rabo entre as pernas. Se ele fosse um gatinho fofinho, teria abaixado as orelhas.

Mas ele não era um gatinho fofinho. Era só um idiota loiro que tinha me encharcado. E eu nem gosto de gatos.

– Atchim! - Soltei um espirro baixo, mas alto o bastante para ele ouvir.


Agindo como a minha mãe, enrugou a testa e franziu as sombrancelhas.

– Você vai pegar um resfriado. Melhor tirar essas roupas. - Não pude ver seus olhos, mas o tom de voz parecia preocupado.


– Não ligo. - Desviei o olhar - Atchim!


– Mas eu ligo, vou me sentir culpado se você ficar doente. - Disse ele.

– Tomara que você morra de arrependimento! - Fiz birra, sentindo a vinda de outro espirro.

Ele riu, e sem saber porque, me senti bem com aquela situação. O QUE É ISSO?


Então percebi que, com toda aquela agitação por causa do fogo, eu tinha esquecido completamente que continuavámos no escuro. Droga! Porque eu tinha de ter aquele maldito medo? E justo em uma hora como essa? Sem minha permissão, meu corpo travou e o espirro ficou parado em algum lugar no caminho, mas não veio. A coisa loira voltou a puxar minhas mãos para que eu levantasse, entretanto, continuei sentado de olhos arregalados e um espirro preso que poderia causar a minha morte.



Vendo meu estado, ele se agachou diante de mim, aproximando o rosto do meu até nossos narizes se tocarem. O susto foi maior do que ter breu á minha volta, e sobressaltei, sentindo as bochechas esquentarem. Não sei o que deu naquela besta quadrada para pensar que tinhamos tanta intimidade, mas não falei nada, porque simplesmente só conseguia espirrar.

– Vamos tirar essas roupas. - Disse, me puxando para algum lugar da casa. - Ah, esqueci de dizer. Meu nome é Naruto Uzumaki.

Eu já tinha ouvido aquele nome em algum lugar, mas por mais que procurasse na memória, não conseguia lembrar.



Aos tropeços, chegamos no que parecia ser o seu quarto. Pela visão periférica, só consegui distiguir o ármario, que ocupava grande parte do quarto, e uma cama de casal. Além do monte de lixo que devia estar no chão, porque tenho certeza que aquela coisa gelatinosa em que pisei ao entrar nos aposentos do loiro, não era o chão.

Ele remexeu nos cabides do ámario e me jogou algumas roupas, que consegui agarrar por pura sorte. Ou agilidade mesmo, eu tenho os olhos da mulher gato. Ok, ok, estou ficando maluco. Nós saímos do quarto, e ele disse que eu não deveria me trocar no banheiro, porque poderia ser perigoso. Então, em dois segundos, estavámos de volta a sala. Andei alguns poucos passos até parar quase de frente para a janela. Ele estava parado na entrada do corredor, com um brilho estranho no olhar. Eu o olhei, esperando que o maldito fizesse o mais sensato e virasse de costas, mas ele continuou me olhando como um debilóide.


– O que foi? Você não vai virar de costas não? - Soltei, antes de finalmente perceber que ambos somos homens. - Eu... quero dizer, não gosto de me trocar na frente dos outros. - Tentei explicar.

Mas ele continuou em silêncio, com o olhar fixo em mim, um olhar do qual eu estava começando a ter medo. Acho que ele notou isso, porque de repente tombou a cabeça para o lado como se tivesse acabado de acordar de um sonho e se virou.


– Desculpe!

Se tinha uma coisa mais constrangedora do que isso, eu não sabia, mas para mim, aquilo era simplesmente insuportável. Mil coisas passaram em minha mente enquanto eu trocava o moletom molhado por uma camiseta larga, laranja gritante. Mais que raio de mal gosto é esse?, pensei.


Passei as calças do moletom pelas pernas, pensando incoscientemente em como cheguei aquela situação extremamente vergonhosa.

Recapitulando: Era Sábado, eu estava assistindo o jornal nacional na minha poltrona de couro vermelho-sangue. Já mencionei isso, certo? Certo. O meu vizinho, a quem eu nunca tinha visto, escutava Dona Gigi todos os dias até altas horas da noite, o que qualquer pessoa normal consideraria um crime público, mas o meu síndico era cretino o bastante para não dar a mínima para isso. Minha digna pessoa, então, resolveu fazer a burrada sem tamanho de bater na porta do apartamento ao lado. Mas contrariando todas as minhas "expectativas", dei de cara com um homem loiro de olhos azuis, jeito de idiota e 0% de gordura. Me engalfinhei com ele no corredor, tentei jogar o CD (ocasionador de toda aquela merda) pela janela, mas a cidade deu blackout e fiquei preso com ele entre janelas e portas trancadas á sete chaves. Metade da sala ficou em chamas por causa de velas, e levei um balde d'água na cara. E agora estava me despindo de costas para ele, correndo o risco de descobrir que ele era um maníaco louco para me molestar.


– Já? - A voz dele veio de algum lugar atrás de mim. Perto, muito perto.

– Não! - Quase gritei, tentando esconder meu súbito medo.

Me enfiei de qualquer jeito nas calças secas de moletom e me virei, pronto para qualquer ataque surpresa. Mas ele continuava lá, de costas, olhando para algum ponto da parede. Não sei porque, mas estremeci.


Devia ser o frio.


– Terminei. - Murmurei, com as roupas molhadas em mãos.

– Ok. - Disse, voltando-se para mim, com o mesmo sorriso babaca e feliz no rosto.

Desviei o olhar, jogando-lhe as roupas. Ele as agarrou, sumindo pela porta da cozinha.

O que é isso? Algum tipo de bruxaria?! , me perguntei, sentindo algo pular dentro do peito. Se era o coração, eu não sei. Mas preferi pensar que os meus pulmões estavam tendo uma convulsão. Se isso é possivel. Daí eu morreria de uma vez e deixava o meu seguro para os gatos do meu tio Spencer. Ele é irlandês, e me odeia.

Porém, isso não aconteceu. Eu ainda estava vivo, e Naruto vinha voltando da cozinha com as mãos vazias e uma toalha de banho jogada no ombro direito. Uma toalha na qual eu prendi meus olhos como se não acreditasse neles. Ele se sentou ao meu lado, apararentemente sem perceber que estava com o pedaço de pano felpudo, mas não era exatamente na toalha em si em que meus olhos estavam grudados, e sim no monograma bordado nela.

W.U.C.

Chiquinho da silva! Gritei em minha mente, lembrando finalmente da onde eu havia visto o nome do Uzumaki. Isso explicava o home theater, o sistema de segurança de última geração e aquele apartamento enorme, tão espaçoso que pegava todo o restante do andar inteiro. Por isso só havia eu e ele.


Eu estava preso com ninguém mais ninguém menos que o herdeiro mais rico de toda a Tóquio. O pai dele era os master's dos master's das empresas de imovéis da cidade. Ele era o rei da cocada preta, melhor dizendo. E Naruto era a porra do herdeiro de todo aquele rio de dinheiro, pedras preciosas e barras de ouro! Como eu esquecera de uma coisa tão importante?

– Sasuke? - Disse ele, visivelmente preocupado.


Eu o fitei.


– Dã..dãm. - Isso foi o que eu consegui dizer.


Ele arregalou os olhos, quando finalmente apontei para as letras bordadas na toalha em seus ombros. Jogou-a longe, mas sabia que era tarde demais para dizer: Ah! Isso?! Eu sou um clone de Uzumaki Naruto, então não ligue para uma coisa como essa!

Preciso ir a um analista urgente.

– Você lembrou? - Sorriu, sem graça.

Assenti.

– É, estou surpreso e... - Uma coisa que eu havia esquecido momentanemente voltou com força total. - Espera! Você ainda não me explicou como sabia meu nome.

Dessa vez vi claramente ele corar como uma pimenta.

Era...fofo.

Puta merda, pensei, desejando que um meteoro caisse do céu e me enterrasse no chão. Era besteira pensar em suicidio, as janelas estavam lacradas.

– O.k. Não tem maneira fácil de dizer isso, mas eu vou dizer. - Ele respirou fundo, como se estivesse prestes á salvar a humanidade. - Vou dizer clara, veemente, fortemente, copiosamente..

Perdi a paciência.

– FALA LOGO!

– EU TE AMO!

Por puro instindo ou calor do momento, larguei um tapa na cara dele.

EEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEH?

Ele colocou as mãos na face, chocado. Nennhum de nós dois falou nada por um tempo que julguei ser uma eternidade, mas que na verdade não passou de alguns segundos.

– Você deve me odiar. - Disse ele, abaixando os olhos.


Eu não sabia como reagir, mas o que senti quando o vi triste, foi algo desconhecido. Parecido com uma mistura de angústia, impotência e vergonha. Mas o mais estranho de tudo, é que havia uma coisa cutucando a minha mente. Uma coisa assustadora demais para mim simplesmente admitir, que estava feliz com aquilo.


EU MAL CONHECIA O CIDADÃO!

– Er... bicicleta?! - Falei, viajando na maionese.


Tenho certeza que ele perdeu todo o seu amor por mim, naquele exato momento. Porém, me surpreendendo pela trigésima vez aquela noite, Naruto começou a rir.


Me senti um completo e redondo idiota.


– Para de rir! - Falei.


O filho da mãe explodia em gargalhadas altas, todas ás minhas custas.

– Eu disse para parar! - Eu disse, e de supetão, tasquei um beijo na coisa loira.

Não me peçam para explicar isso, porque não eu não tenho a mínima idéia da onde tirei valentia para fazer isso. Do nada, enquanto ele rolava de rir, fiquei tão irritado que lembrei de um programa de Tv. Um programa onde o mocinho beijava a mocinha para calar a boca dela.



Daí, eu beijei o babacão. E ele ficou tão bestificado, que só ficava me olhando como se eu fosse alguma espécie de atração de circo.

– O...que foi isso? - Finalmente falou, os olhos do tamanho de luas cheias.

– Um beijo! - Fechei os olhos, querendo que um buraco se abrisse sob mim e me engolisse para a escuridão.

Uns minutos de silêncio, e experimentei reabri-los. Mas me arrependi disso. Naruto tinha uma expressão assustadora no rosto. Uma expressão maliciosa, um sorriso malicioso e olhos maliciosos. Percebi imediatamente o que ele queria, pena que imediatamente foi tarde demais.


Ele saltou, repetindo: saltou sobre mim. Nós fomos ao chão, e de olhos cerrados, começei a espernear sob ele. Eu tinha razão! Ele é um maníaco, serial killer. Ele ia me estuprar!

– Eu te amo, Sasuke. - Sussurrou, a boca perigosamente perto da minha.

Então o maldito me beijou. E eu não fiz nada! Só correspondi, reagindo como uma menininha. Uma puta. Só que trabalhando de graça. A boca dele tinha gosto de bolo de sorvete. Daqueles que a gente só via em festa de rico. E as mãos era maiores que as minhas, eu conclui, quando ele as entrelaçou juntas sobre o chão. Ficar ali com ele era bom. Eu me odeio por isso.


Uma claridade forte invadiu o ambiente, e ouvi o barulho de trancas em todos os lugares. Ele pareceu não prestar atenção, e escorregou a mão para dentro da minha camiseta. Sobressaltei, me afastando quase que automaticamente. A energia voltara.

– Ô Ô Ô Ô, pera um pouco! - Me arrastei para longe, tentando me acostumar com a súbita luz. - Nada de atrevimento. Saí de perto! Ou vou te jogar pela janela! - Com essa ameaça, lembrei de uma coisa muito importante. Eu ficara ali metade da noite, apagando incêndios, passando vergonha e me agarrando com o meu vizinho, e nem tocara no assunto que me levou á estar lá.

– POR QUE RAIOS VOCÊ ESCUTA AQUELA MERDA DE MÚSICA TODOS OS DIAS? - Berrei, levantando do chão, espumando de raiva.

– Eu...

Virei uma mulher histérica.

– Cala a boca, porque agora eu vou falar. - Eu disse, lembrando de todas as noites que tive de aguentar com aquela poluição sonora rachando os vidros da minha janela. - Sabe o quão irritante é essa coisa? - Apontei para o CD, jogado em cima do sofá. - Eu fico dias cutucando a sua estúpida janela, e reclamando com o cretino do síndico, mas tudo para continuar ouvindo esse seu funk horroroso! - Dei ênfase ao horroroso, só para ver se ele se tocava.


– Pff - Ele ameaçou rir.

– Se você rir, seu ordinário, eu vou te matar! - Rosnei.


Ele se limitou a fazer um gesto de zíper sobre a boca, esperou alguns segundos e voltou a falar, mansamente.

– Se você parar de gritar e sentar ao meu lado, eu te explico tudo. - Sorriu, parecendo muito feliz.

Eu, burro do jeito que sou, sentei ao seu lado. Só para ser puxado aos braços dele. O cabra era tão forte, que não consegui fazer nada á mais do que xingar ele de todos os palavrões existentes e os inexistentes, antes que ele começasse a sua explicação.


– Tudo começou á uns meses atrás, em uma festa que sua empresa patrocinou. Eu tive curiosidade assim que te vi. Você estava lá, e na primeira vez que te vi, estava com os trajes impecáveis, uma taça de champagne na mão direita e uma cara de tédio que me fez perguntar á mim mesmo o que era assim tão curioso em você. Então você me pergunta, se eu encontrei a resposta para essa pergunta. - Ele hesitou por um instante, e senti o aperto de seus braços ao redor de meu corpo ficar mais forte. - A resposta é não. Continua sendo um mistério para mim, um mistério que eu ainda quero desvendar.

Fiquei olhando para a mesa de jantar, como se houvesse algo de muito interessante nela. Mas meus ouvidos não falhavam, eu estava escutando tudo, com tanta atenção, que eu quis matar á mim mesmo. Não demorou, e ele continuou:


– Logo, não pude deixar de querer saber mais sobre você. Onde vivia, o que fazia, o que gostava, o que odiava. Ás espreitas, comprei este andar inteiro e aqui começei a morar. Dois apartamentos, o seu e o meu; - Eu sabia que ele estava sorrindo. - Mas ainda havia um problema, eu não sabia como chamar sua atenção...


Não acreditei. Escancarei a boca, com os olhos arregalados.


– Você ficava com aquele inferno todos os dias porque queria chamar a minha atenção? - Perguntei, com medo da resposta.

– Sim. - Ele riu. - Eu ficava ali, pertubando o seu sono, esperando o dia em que você bateria na minha porta para reclamar. Mas você era duro na queda, então resolvi apelar hoje. Veja só, funcionou. - Naruto me apertou mais, como se eu fosse um ursinho de pélucia, e beijou o topo da minha cabeça. Senti o rosto esquentar. Merda!

Então, quer dizer que toda a penação pela qual passei era culpa minha?

Eu simplesmente não conseguia acreditar.

– Funk era a coisa mais irritando que eu conseguia pensar, e....

Espera um pouco.

– Ei, não me diga que você subornou a porra do síndico também?

Vi que ele ficou quieto, e não gostei nada disso.

– Sim. Não só o síndico, mas todos desse condominio. Todos sabem que eu sou loucamente apaixonado por você. - Ele levantou um dos braços para coçar a nuca, sem graça.


Eu só conseguia pensar em matá-lo. E beijá-lo também, mas isso era segundo plano. Todos sabiam disso, meu Deus. Eu fiquei todo este tempo sendo motivo de fofoca das matildes? Era por isso que todo mundo ficava cochichando entre si quando eu ia pegar as correspondências no correio?

Céus, isso era constrangedor.


– Eu vou para casa. - Eu disse, por fim.

– Você não vai não! - Ele agarrou meu braço, puxando-me para mais junto de si.

– Vou sim. - Tentei me livrar de seu aperto.

Nós rolamos no chão e eu consegui me arrastar para longe; levantei em dois segundos, disparando para a porta. Mas antes que eu a abrisse, ele jogou seu corpo com tudo sobre o meu, pressando-me á porta. Prendi a respiração, sentindo meu corpo fervilhar em labaredas desconhecidas.


– Fica, por favor. - Beijou minha nuca. - Eu te amo.

E o que eu podia fazer? Com aquilo ele me desarmou, me derrubou e ainda fez o cupido acertar a flecha direto no meu peito. Me apaixonei da forma mais ridícula e fraca possível. E agora só me restava chamá-lo de idiota e me recusar a admitir isso. Porque um Uchiha que se preze, morre negando.

Fim.

Extra:

– Peraê, peraê, peraê! É você que enche meu ámario de ramém e batatas fritas? - Perguntei, tentando relocionar aquele mistério.

– Sim! - Ele gargalhou, pendendo a cabeça para o lado como uma criança. - Eu vi o Sasuke comprando batatas fritas no supermercado de moletom, camiseta do star wars, óculos escuros e pantufas cor-de-rosa. Você parecia com medo, então resolvi presenteá-lo!


Tá legal meteoro, pode cair agora. É sério.


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Notas finais do capítulo

KKKKKK, alguém sacou porque o Sasuke não faz supermercado?