Eles estão aqui escrita por Lyn


Capítulo 1
Reflexo


Notas iniciais do capítulo

Agradeço, como sempre, a minha principal incentivadora e melhor amiga CountessDracula (Fran Tepes), por toda a paciência, apoio e incentivo, sempre presentes e principais motivadores. Também agradeço a minha escudeira Jen_Monteiro, por todos os puxões de orelha e pela linda capa da fic.
Obrigada também a todos aqueles que contribuíram para a produção do filme Poltergeist, que moldou meu apreço pelo gênero terror ainda na infância.



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O pânico estava estampado em sua face angelical e enquanto ela corria esbaforida, seus longuíssimos cabelos loiros açoitavam seu próprio rosto. Não sabia ao certo onde suas pequenas e doloridas pernas a estavam levando. Precisava simplesmente se afastar o quanto pudesse daquelas garras, daquela neblina, do intenso frio.

E principalmente daquela voz.

A gutural voz que gargalhava, chamando-a de dentro dos espelhos daquele prédio. Ela ainda podia sentir em sua pálida pele o aperto das mãos que saíram de dentro do espelho em seu quarto e agarraram as suas, elevando-a do chão. Até ali, já vivenciara experiências absurdamente assustadoras para uma criança de sua idade e mesmo para um ancião, mas ver seu reflexo desfigurado, como se o rosto do fantasma que a buscava falasse através do seu, fora algo que a teria feito entrar em choque. Porém, ela sabia que esse tipo de reação apenas os fortaleceria.

Depois de todo aquele tempo, eles haviam-na encontrado outra vez. Carol Anne Freeling mal conseguira acreditar em seus olhos nas primeiras vezes em que se deparara com o espírito do reverendo Kane nos espelhos que a rodeavam ali na casa dos tios, em Chicago. Todos aqueles episódios sobrenaturais pareciam tão distantes, enterrados nas terras ensolaradas onde costumava viver com os pais. Ali, seguindo adiante em uma escola mecanicista e fria para superdotados, Carol Anne fora arrastada novamente para aquele pandemônio. Contudo, genuinamente pensara que ignorando o agourento espírito do reverendo Kane, aquelas criaturas do outro mundo a deixariam em paz. Era lamentável que as pessoas a sua volta não compreendessem essa estratégia e dificultassem as coisas para a pequena menina, deixando Kane cada vez mais forte. Principalmente o desconfiado terapeuta da escola, com seu olhar puramente clinico e arrogante, a fizera lembrar-se, falar e reviver coisas que ela não queria. Sabia que aquelas sessões de hipnose poderiam trazer Kane de volta até ela e estivera certa desde o principio.

Corria pela garagem subterrânea do prédio, tentando tirar os próprios cabelos da frente de seu rosto infantil. Desejava mais que qualquer outra coisa que sua mãe estivesse ali. Que a acalentasse em seus braços protetores e não permitisse que a levassem para longe do mundo dos vivos por mais outra vez. Não suportava a idéia de ser arrastada novamente para aquele lugar absurdamente escuro e frio, com vozes sussurrantes que arrepiavam seu corpo, clamando que as guiasse até a luz. Carol Anne não queria seguir em direção àquela luz. Lá parecia ser ainda mais frio, se é que isso era possível.

-Não tenha medo. Não vamos machucá-la.


Carol Anne tropeçou em seus próprios pés, e ainda correndo desorientada pela garagem enorme e opressora tentou ignorar a voz fantasmagórica que ecoava pelo ambiente. Escondeu-se atrás de uma coluna de concreto, tentando descobrir de onde vinha a voz de Kane. Seria mais fácil e quase reconfortante poder fugir de algo concreto, corpóreo... Mortal.

-Nós a amamos. – a aterrorizante voz prosseguiu. – Você é o único anjo que pode nos guiar até a luz.


A garota passou a caminhar de costas, ofegante, verificando se nada a seguia. Somente a idéia de ser levada por Kane mais uma vez... Somente a idéia de ficar presa com aquelas coisas em um lugar que cheirava a morte... Ela não conseguia sequer pensar sobre isso. Tentou afastar as lembranças, não precisava sentir-se ainda mais amedrontada.

-Nunca a machucaríamos. Nunca!


Carol Anne quis gritar para que fossem embora, mas não conseguia encontrar a própria voz. Continuou afastando-se, dando passos cautelosos de costas, o pânico estampado em sua face pueril. Só precisava se afastar. Mas a voz do reverendo Kane parecia vir de todos os lugares.

-Não fuja de mim.


O pijama vermelho parecia sufocá-la de alguma forma, mas talvez fosse apenas a pulsação em sua garganta. Uma pontada aguda na lateral de seu corpo a incomodava, mas ela conseguiu ignorá-la eximiamente quando Kane se pronunciou por mais uma vez:

-Precisamos de você, Carol Anne. Guie-nos até a luz.


Ela voltou a correr o maximo que ainda conseguia, aterrorizada e quase sem forças. Não podia permitir que a apanhassem. Tinha uma vantagem inegável, ali naquela garagem de puro concreto, Kane não podia alcançá-la, tinha que ter isso em mente. Ali não havia nenhum espelho, afinal. Por um momento ela se acalmou, prestando atenção as batidas aceleradas de seu amedrontado coração.

-Caroool... – Kane cantarolou, para então chamá-la firme e raivosamente. - Carol Anne!

Ele não podia alcançá-la, por isso estava tão zangado. Era apenas isso. Ela estava a salvo e isso o enfurecia. Em meio a seus pensamentos reconfortantes, ainda caminhando lentamente de costas, Carol Anne se deu conta de que algo molhava seus pés. Parou por reflexo, e quando mirou a poça d’água onde estava parada, um par de mãos apodrecidas saiu de dentro da água, agarrando-a pelos tornozelos.

-SOCORRO! – ela finalmente encontrou sua voz, em profundo desespero, sendo puxada para dentro da água, que parecia ter se transformado em um pequeno lago ou portal. – ME SOLTE! SOCORRO!

Carol Anne se agarrou a borda, cravando as unhas no chão de concreto, enquanto o par de mãos continuava a puxá-la pelos tornozelos. Estava mergulhada em água até as axilas e afundava cada vez mais. Lutou com todas as forças, as mãos molhadas escorregando da borda.

-DONNA! SOCORRO, DEPRESSA! SOCORRO, POR FAVOR! – ela berrou em desespero, lágrimas escorrendo por suas bochechas, enquanto mais pares de mãos apodrecidas surgiam a sua volta, puxando-a pelos ombros e cabelos.

Mas Donna não chegou a tempo. Ninguém conseguiria salvá-la. Carol Anne foi tragada por uma escuridão sufocante e a esperança abandonou seu ser. A risada do reverendo Kane ecoava em sua mente, crescente como os trovões que antecedem uma tempestade.

Foi extremamente chocante quando, contrariando todas as suas expectativas, Carol Anne caiu de borco sobre uma superfície macia e imaculadamente branca que amortecera sua queda. Suas mãos afundaram na neve quando ela ergueu-se, aparvalhada, olhando a sua volta. Que lugar era aquele? Tudo parecia extremamente branco e gelado, mas havia uma lua acima de sua cabeça. E se havia uma lua, também havia um céu. Não poderia estar do outro lado. Poderia?

Havia arbustos soterrados pela neve e uma grande construção, que se assemelhava a uma mansão antiga, mas bem cuidada. Um vento frio fazia com que o queixo de Carol Anne tremesse, assim como todo seu corpo, que parecia em convulsão. Seu pijama vermelho completamente ensopado, na mesma medida em que seus cabelos, não ajudava para que ela se aquecesse.

“Overlook Hotel” – dizia uma placa quase totalmente escondida pela nevasca.

Carol Anne não pensou duas vezes, e guiada por um ontológico instinto de sobrevivência, correu em direção a enorme porta da construção, com o que restava de suas forças. Puxando a maçaneta sem cerimônias, adentrou o local, sendo recebida por uma acolhedora lufada de ar quente.


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