Encrenca Shaolin escrita por Metal_Will


Capítulo 38
Capítulo 38




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Capítulo 38 - A energia que vem de dentro

 Professor Márcio parecia uma pessoa bastante amigável. Sem deixar de sorrir ele deixou suas coisas sobre a mesa, apagou a lousa (embora ela já estivesse apagada, mas não totalmente limpa), pegou um pouco de giz e iniciou sua explicação.

- Bem, vamos revisar o conteúdo, ok? - disse ele - Quantidade de calor...certo...a gente pode entender que calor é a passagem de energia térmica de um corpo para o outro e...

- Não vai anotar, Amanda? - disse André para sua colega de turma de reforço.

- Oh, claro - disse ela - Estava meio distraída.

- Com o quê? - perguntou o garoto.

- Ainda não sei muito bem, mas esse professor tem uma presença diferente dos outros.

- Como assim?

- É meio difícil de explicar, mas como artista marcial certamente você vai começar a sentir isso.

- Ainda não entendi...

- Por lutar com muitas e muitas pessoas diferentes, nós começamos a ver mais do que a pessoa é por fora. Nós também conseguimos sentir alguma coisa a mais...só que eu não sei explicar mais do que isso.

- Eu, heim?

- Sei que parece esquisito e eu mesma não tenho muita ideia sobre isso no boxe, mas com certeza a Lien deve saber.

- Será? - perguntou André - Agora que você falou...ela sempre comenta coisas como ki, chi, ou coisa parecida.

- É. Bem nessa.

- E você acha que esse professor tem uma coisa desse tipo.

- Pelo pouco que sinto, diria que sim.

- Bem, essa é a teoria. Agora, vamos fazer um exercício no quadro - disse Márcio, sem deixar a aparência simpática por um único instante. Nisso, um dos alunos da frente se vira para pedir algo.

- Ei, alguém aí atrás tem uma borracha pra emprestar? - perguntou ele.

- Opa. Eu tenho uma - disse um rapaz do fundo que, sem muita noção de onde estava, acaba jogando a borracha para a frente. O problema é que ele não era muito bom de mira e a trajetória da borracha iria atingir o pobre professor Márcio. Pelo menos era o que ele achava.

- Putz - tremeu o aluno do fundo ao ver seu erro, mas o professor foi mais rápido, pegando a borracha sem ao menos se virar para trás.

- Opa. Toma cuidado onde atira. Hehe - disse ele, sem perder a simpatia. Todos acharam a cena impressionante, principalmente Amanda.

- André. Você viu aquilo?

- Vi. Legal, heim? Como será que ele fez isso?

- Tá na cara. Ele não é um professor comum.

- Vai ver ele já sofreu ataques parecidos antes. Sabe como é, tem alunos que adoram jogar bolinhas de papel no professor e...

- Não. Não é isso. Deve ter algo mais. Vamos falar com ele no final da aula?

- Você parece bem interessada, heim?

- Bastante. Não vou conseguir me concentrar nos estudos enquanto não souber mais sobre esse professor.

- Então é melhor tirar isso logo a limpo, né? Afinal, você precisa de nota.

- Nós precisamos. Vai, anota aí - disse a garota, voltando-se para o caderno. Mas André também estava curioso e, no final da aula, os dois seguiram para a mesa de Márcio, que parecia bastante disposto a atendê-los.

- Sim? Posso ajudá-los?

- Err...bom, professor, meu nome é Amanda e esse é o André.

- Prazer - disse ele sorrindo. André contribuiu o cumprimento, mas Amanda continuava séria.

- Não é sobre a matéria que, aliás, o senhor explicou muito bem, mas...é sobre uma outra coisa.

- Outra coisa? O que seria?

- O senhor, por acaso, tem algum conhecimento em artes marciais?

 A aparência de Marcelo tornou-se um pouco mais séria. Mas Amanda prosseguia.

- Parece estranho, mas eu sou praticante de boxe e ele é um iniciante em kung-fu. Aquela hora que o senhor pegou a borracha foi muito incomum para alguém sem treinamento. O senhor faz alguma arte marcial, não faz?

- Bom, na verdade não é bem uma arte marcial...

- O que quer dizer? - perguntou André.

- Na verdade, é mais uma filosofia de vida.

- Filosofia de vida? - estranhou Amanda - Como pode?

- Bem, eu vivi uns seis anos da minha infância no Tibet. Meus pais eram antropólogos estudiosos da região e eu acabei aprendendo alguns hábitos deles.

- Oriente, heim? - disse André - Então o senhor teve contato com artes marciais.

- Admito que aprendi uma coisinha ou outra, mas o que mais me interessou....foi o desenvolvimento do espírito.

- Desenvolvimento do espírito? - perguntou Amanda - Então...é algo como o ki mesmo...

- Alguns chamam de ki, outros apenas de espírito, outros de aura. Enfim, é uma energia interna que todo ser vivo carrega. Os orientais estudaram muito sobre ela, de forma bastante prática devo dizer. Foi lá que aprendi a concentrar minha energia espiritual para transformá-la em energia física pura.

- Isso é mesmo possível? - disse André interessado.

- A energia sempre foi um assunto que me interessou...talvez isso tenha me levado a estudar física - disse Márcio - Sabe, nós conseguimos tirar números da energia cinética, do calor e da energia luminosa, mas...nunca ninguém consegue explicar, afinal, o que é a energia. Sabemos que podemos transformá-la em trabalho, mas o que é essa coisa que podemos transformar em trabalho?

- Nunca parei pra pensar nisso - disse André - Se eu não tivesse tantas contas para fazer, talvez até tentasse.

- Infelizmente, o ensino de física de hoje nos obriga a focar mais na matemática do que nas questões filosóficas que surgem dela. Mas é um assunto que eu sempre gostei de estudar, principalmente depois que voltei do Tibet e comecei a treinar por minha própria conta. Levantava todos os dias de manhã, meditava e tentava a todo custo concentrar minha energia interior para transformá-la em energia exterior. Se você parar pra pensar, tudo é energia.

- Tudo é energia? - estranhou André.

- Einstein ficou famoso pela fórmula "energia igual massa vezes velocidade da luz ao quadrado".

- Hã? - estranhou André.

- E = mc2. Já deve ter visto isso em algum lugar.

- Oh, sim - compreendeu ele.

- Significa que massa e energia equivalem uma a outra. No entanto, a energia espiritual interna é energia pura, basta transformá-la em alguma outra forma de energia, o que é bem mais fácil do que fazer massa virar energia.

- Mesmo?

- Bem, talvez nem tão fácil assim, caso contrário todos poderiam usar seu próprio espírito para usar de energia elétrica na própria casa. Na verdade, é preciso treinar o espírito para esse propósito. A maioria das pessoas treina seu espírito para o conhecimento de verdades transcendentes, como os religiosos. Outros, como os artistas marciais, treinam seu espírito para ajudá-los em seu combate. Imagino que você seja do segundo tipo, não?

- Treinar meu espírito...ajudaria no combate? - perguntou André.

- Claro que ajudaria - disse Amanda - É importante que todo artista marcial treine não só o corpo, como também a mente.

- Muito bem - parabenizou Márcio - Você parece ser uma mocinha de talento.

- Ainda estou em treino - disse ela - No entanto, sou a líder do grupo disciplinar da escola. Meu trabalho é lutar pela paz no colégio.

- É uma ótima tarefa - disse Márcio - Continue treinando bastante. E você?

- Ainda sou bem iniciante - disse André - Mas espero me tornar tão forte quanto a Amanda e o senhor!

- Quanto eu? Mas eu não sou exatamente um artista marcial - disse ele.

- Mas...imagino que tenha muito a nos ensinar - disse André. Amanda também concordou. Márcio apenas sorriu e coçou a cabeça.

- Apenas meditem e tentem parar de se ver apenas como um ego isolado. Vocês fazem parte de um todo chamado Universo.

- Um todo..chamado Universo? - perguntou André.

- Esse é o ponto inicial - disse Márcio - Todo o resto vem a partir daí. Concentração e meditação, meus alunos. E lembrem-se de estudar física. Até mais.

 O professor fez uma reverência e saiu da sala, com toda a calma do mundo. Amanda ainda não se deu por satisfeita.

- Sabe, André.

- O que foi?

- Ainda quero saber mais sobre ele - disse ela - Tenho certeza que ele tem muito a ensinar, muito mais além de física.

- Mas por enquanto...precisamos passar na matéria. E eu ainda tenho que treinar. Ai, caramba, essa vida de artista marcial e estudante é mais difícil do que eu pensei!

  André se despediu de Amanda e saiu correndo para seu treino. No meio do caminho, ele começa a refletir sobre o que Márcio disse.

"Ser um todo com o Universo", pensou ele, "Papo meio zen, mas será que dá certo? Vou meditar sobre isso..."


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