Premonição 2: A Morte lhe Cai Bem escrita por Lerd


Capítulo 7
Prazer


Notas iniciais do capítulo

Mais um capítulo, esse fazendo jus a classificação +16 da fic, haha. Espero que gostem.



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Mia e Kaleb chegaram à cidade às nove da manhã do dia seguinte, horas antes do funeral de Liam. A garota foi direto para seu apartamento, exausta. Tentou dormir durante toda a tarde, porém sem sucesso. Alguns pesadelos iam e vinham em sua mente, não a deixando ter um bom descanso. Algumas vezes ela ficava projetando em sua cabeça cada um dos acidentes que levaram à morte de Ewelyn, Cicciliona, Liam e Cub. Era aterrorizante, para dizer o mínimo.

A garota já tinha um plano em mente. Três mortes e um acidente quase fatal não poderiam ser coincidências. Os sobreviventes restantes tinham de acreditar nela. Mas será que vão? Eu acreditaria nessa história se alguém me contasse? Provavelmente não no início, mas depois de tantas mortes... Afinal de contas, três pessoas morrerem em circunstâncias estranhíssimas. Era coincidência demais para se duvidar.

Restava torcer para que os outros tivessem a mesma linha de raciocínio dela. Afinal de contas, a vida de todos nós depende disso.

x-x-x-x-x

Theo estava sentado em frente a um advogado, no escritório da mansão dos Staller. O homem viera trazer e ler para o rapaz o testamento da grande dama, já que ela nomeara o rapaz como seu guardião, para que ele assegurasse que a decisão tomada por ela em vida seria respeitada. Era claro que legalmente isso aconteceria, mas havia um fator surpresa que necessitava do auxílio de Theo. Uma tarefa na qual um advogado provavelmente falharia.

— Bom, a Srta. Staller fez esse testamento a pouco tempo, se lhe interessa saber. Depois do incidente no Maiden’s Garden, se não me falha a memória. E devo dizer que ele me surpreendeu um pouco...

Do outro lado da mesa o rapaz parecia nervoso, tremendo e suando. O advogado da grande dama continuou:

— A Cicciliona sempre foi conhecida por sua excentricidade, mas eu realmente não esperava por nada assim.

Theo estava impaciente:

— Quer parar de fazer suspense? Me conta logo o que ela escreveu aí.

O advogado surpreendeu-se com a atitude ríspida do homem, se abalando levemente.

— Tudo bem. – Ele assentiu com a cabeça, continuando: — A Cicciliona deixou a mansão e todas as suas ações para os funcionários daqui. O jardineiro, a governanta, a cozinheira... E você também, Theo. Mas...

O rapaz sentiu o coração bater mais forte com o começo da frase. O suor escorria pela sua testa, enquanto ele tentava inutilmente ajeitar seu penteado com as mãos.

— Ela deixou toda a fortuna dos Staller que está depositada em sua conta bancária para um rapaz chamado... – E o advogado então consultou um papel em sua mão para lembrar-se do nome. — Kaleb. Kaleb Kleiner. O senhor por acaso o conhece?

O indiano valentão que atacou o Tony! Mas... Como?

— Como?! — Ele repetiu o pensamento em voz alta.

— É o que está escrito aqui. Kaleb Kleiner.

— Você tem certeza do que está dizendo? Eu sei quem é este sujeito, mas ele e a Cicciliona nunca trocaram uma única palavra. — Theo afirmou.

O advogado abaixou o olhar, observando o rapaz de maneira suspeita.

— Se você não acredita pode ler aqui, foi a própria Cicciliona quem escreveu esse documento. É um manuscrito. — E então ele estendeu o papel para que o outro homem o averiguasse.

Theo pegou o papel e verificou a veracidade do que havia sido dito pelo advogado. Cicciliona realmente deixara toda a fortuna dos Staller para o Ganesha. Mas a pergunta que não saía da cabeça do assistente da grande dama era: por quê? Theo nem imaginava que ambos se conhecessem, menos ainda que tivessem algum laço afetivo que abrisse qualquer possibilidade de o rapaz herdar todo o patrimônio da família. E isso era deveras surpreendente, já que era o dever de Theo conhecer cada pessoa da vida de Cicciliona. Afinal ele era seu assistente. Devia lembrar-se de pessoas da vida dela que nem ela mesmo se lembrava.

— Senhor, eu posso lhe assegurar de que a Cicciliona não conhecia esse rapaz. Na verdade nem eu mesmo o conhecia até semanas atrás quando aconteceu o acidente no desfile de moda do Tony.

O homem na frente de Theo assentiu com a cabeça, dizendo:

— Eu entendo o que você está querendo dizer. Mas... Bom, eu também posso lhe assegurar de que Cicciliona escreveu isso em sua plenitude das faculdades mentais. Mas se o que lhe passa pela cabeça é que possa ter havido algum tipo de fraude aqui, nós podemos levar esse testamento à um perito.

Theo calou-se, engolindo em seco. Não, não há necessidade.

— Tudo bem. — Ele assentiu. — O que diz aí que eu devo fazer?

— Bom... – E o advogado voltou a checar os papeis para ter certeza do que dizia. — A Cicciliona desejava que você convencesse o tal Kaleb Kleiner a aceitar o dinheiro. Além disso, ela deixou essa carta para ser entregue a ele, por você. E, é claro, por se tratar de uma correspondência, você está proibido de abri-la.

O homem entregou para Theo um pequeno envelope cor de rosa fechado com cera branca. O material do envelope era um pouco transparente, de modo que rapaz conseguiu vislumbrar um papel amarelado e algumas letras cursivas. Ele disse:

— Eu acho que posso me encontrar com o Kaleb ainda hoje. Eu prometo fazer de tudo para convencê-lo a ficar com esse dinheiro.

Como se fosse uma tarefa difícil, pensou. Quem iria recusar milhões de dólares?

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Mia chegou sozinha no local do funeral de Liam. O lugar estava bastante movimentado, mas isso não surpreendeu a jornalista. O amigo era o tipo de pessoa que conquistava amigos aonde quer que fosse. Havia diversos orientais presentes, e a garota presumiu que fossem todos parentes dele.

Mas então, ao longe, ela viu Theo sentado em uma cadeira, com a cabeça baixa e os olhos vermelhos. Timidamente se aproximou, ansiosa por algum motivo que não conseguia explicar. Arriscou:

— Theo...?

O rapaz ergueu a cabeça para ver quem o chamara, mas logo abaixou ao ver que era Mia. A jornalista tremia quando disse:

— Eu sinto muito pela sua perda...

Mas antes que pudesse continuar, Theo perguntou à queima roupa:

— Por que você não previu isso?

— Como?

— Você previu o acidente no desfile! — Ele disse de maneira exaltada. — Por que você não previu a morte do Liam?

Mia meneou a cabeça negativamente, frustrada com aquilo.

— Olha o que você tá falando, Theo. Eu não sou uma médium! Eu não sou capaz de prever o futuro!

O rapaz nada respondeu. Apenas abaixou a cabeça novamente, penteando o cabelo para trás com as mãos. Depois de alguns segundos voltou a erguer o rosto, dizendo:

— Ele era meu ex-namorado, você sabia? — E Mia meneou a cabeça negativamente. — A gente brigava tanto! – E Theo riu, como a recordar-se de bons momentos. — E de repente um dia ele me assustou, falando em união estável e filhos e... Bom, eu não consegui lidar com tanta pressão. Eu não estava pronto pra algo mais sério, entende? Pra mim nós ainda tínhamos a vida inteira pela frente. Tudo parecia tão precoce, tão...

Theo engasgou com as palavras e as lágrimas subitamente voltaram a cair. Ele então abaixou a cabeça, constrangindo, mas deixando que o choro saísse livremente. Quando voltou a ergueu o rosto, ele estava vermelho e inchado. Mia não sabia o que fazer, ouvindo-o com uma expressão melancólica. O rapaz então retirou uma pequena caixinha de veludo azul marinho do bolso do paletó, dizendo:

— Nós nos vimos há alguns dias, e eu estava decidido a tentar reconquistá-lo. Eu iria pedir o Liam em casamento nos próximos dias. Eu até marquei a reserva no restaurante preferido dele e aluguei uma limusine. Se eu soubesse que não teria tempo de sobra eu teria feito antes e... E...

Theo começou a chorar com vontade, perdendo toda a vergonha por estar demonstrando seus sentimentos. Mia ficou desconfortável no início, sem saber como reagir. Tentou tocar os cabelos do rapaz por duas vezes, mas vacilou. Olhou ao seu redor e viu todas as pessoas presentes com expressões plácidas e calmas. O rapaz à sua frente, porém, chorava copiosamente, parecendo sentir a dor mais forte do mundo. Ela então se abaixou na direção dele e o abraçou com vontade. Ele não demonstrou aspereza ou resistência, pelo contrário, aceitou de braços abertos o conforto dos braços de Mia.

x-x-x-x-x

Maria chegou ao local de maneira acanhada, esfregando os braços. Usava um vestido preto discreto e uma tiara da mesma cor nos cabelos, que estavam soltos. Olhou para todos os lados, observando quem estava presente, e só conseguiu ver olhares de acusação, embora ninguém olhasse diretamente para ela. Controle-se, Maria. Isso é coisa da sua cabeça. A polícia já deu a versão oficial dos fatos, foi uma overdose acidental de analgésicos. Ninguém está te acusando.

Apesar de saber que racionalmente aquilo fazia sentido, algo dentro da latina a impedia de ficar calma. Remorso, foi a palavra que veio à sua cabeça. Será...?

Ainda preocupada, seguiu até um canto, procurando se manter afastada de todos. Mas então uma mulher oriental de meia idade aproximou-se dela de modo tímido, claramente tentando iniciar uma conversa.

— Você é a Maria? — Ela disse com um sotaque japonês claro em sua voz. Essa é a mãe dele, Maria. A mãe do homem que você assassinou.

— Sra. Hayata?

A mulher assentiu com a cabeça de maneira solene. Continuou:

— Os policiais me disseram que você estava com meu filho, com o meu Liam, nos últimos momentos dele. Isso é verdade?

Maria tremeu. Sentiu as pernas ficarem bambas e um incontrolável mal estar. Sua barriga embrulhava, e ela imaginou que poderia vomitar a qualquer momento.

— É sim, senhora. Eu estava com ele.

— Como foi? — A mulher perguntou no mesmo instante. — Diga-me, minha querida. Ele sofreu muito? Foi doloroso?

Maria estava confusa com aquelas perguntas, mas também bastante aliviada.

— Eu creio que não. — Ela respondeu, tentando falar o mínimo possível. — O coração dele simplesmente parou de bater, e foi só. A morte mais calma de todas.

Aquilo pareceu ser o suficiente para aquietar o coração daquela pobre mãe. A oriental agradeceu a informação e saiu, sem derramar uma lágrima de seus olhos. Para Maria a reação parecera insensível. Ela tinha sangue latino, as emoções sempre à flor da pele. Era deveras difícil compreender a demonstração de afeto entre os japoneses, sempre tão lógicos e formais. Olha quem está falando de insensibilidade. Você mesma matou o rapaz, Maria. Apesar de ter consciência daquilo, a modelo tinha plena certeza de que não se arrependia do que fizera. Involuntariamente ela abriu um pequeno sorriso em seus lábios. Quando se deu conta disso, fechou a cara. Você está sofrendo, Maria. Não se esqueça disso.

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Do lado de fora da capela onde Liam estava sendo velado, o grupo de sobreviventes foi naturalmente sendo formado, como se alguma ligação invisível trouxesse todos ali ao mesmo tempo. Os únicos que faltavam ali eram Kaleb e Tony, e Mia ficou feliz ao ver o primeiro deles chegando de maneira tímida e acanhada, usando um terno surrado e uma gravata com um nó frouxo.

Mas então a visão de Tony se aproximando fez a garota entrar em pânico. Kaleb iria ficar cara a cara com o homem pela primeira vez desde o acidente no Maiden’s Garden. Oh, não.

O estilista mostrou-se desconfortável quando notou a presença do indiano. Cochichou algo para Gretel e estava prestes a sair do local, mas foi interceptado por Kaleb, que disse de maneira firme:

— Pode ficar. Eu não sou canalha a ponto de causar uma cofusão numa ocasião como essa. Ao contrário de você, eu conheço o significado da palavra respeito.

Ninguém disse qualquer palavra, nem mesmo Tony. Foi Mia quem sentiu a necessidade de quebrar o silêncio, sabendo que os outros sobreviventes esperavam alguma reação da parte dela.

— Eu tenho algo a dizer a todos vocês. — Ela falou da maneira menos solene que conseguiu, tentando ao máximo não criar suspense. — Pode parecer loucura no início, eu sei, mas eu preciso que vocês me deem algum crédito. Pensem na quantidade de pessoas que já morreram após o desastre no desfile. O meu amigo Cub, a Cicciliona e agora o Liam. Vocês não acham muita coincidência?

Nenhum deles se manifestou.

— Continua. – Gretel disse de maneira educada. Ao seu lado estava Damien de mãos dadas e em silêncio.

— Tudo bem. Algum de vocês chegou a ficar sabendo sobre o caso do voo 180? Aconteceu há muitos anos atrás.

— Esse caso é antigo, não é? Noventa e nove, se não me falha a memória. – Tony arriscou, coçando o queixo.

— Exatamente. — Mia concordou. — Na ocasião, caso algum de vocês não saiba, um garoto teve um ataque de pânico durante a decolagem de um voo em direção a Paris, e disse que o avião iria cair. Ele surtou e conseguiu sair do avião junto de alguns amigos e uma professora. Foi então que o mais estranho aconteceu: o avião realmente explodiu da mesma maneira como o rapaz tinha visto em sua premonição.

Gretel soltou um gritinho, e Maria tapou a boca. Elas e Damien reagiram como se estivessem ouvindo a história pela primeira vez. Theo, Tony e Kaleb, por sua vez, pareceram não se afetar por aquilo.

— O mais estranho aconteceu depois... – Mia começou, mas foi rapidamente interrompida:

— Os sobreviventes começaram a morrer um a um. – Kaleb completou, ansioso.

— Assim como nós. – Maria sussurrou, incerta do que estava dizendo.

Maria concordou com ambos, acenando positivamente:

— Mais do que isso. Eles morreram na exata ordem em que deveriam ter morrido se tivessem ficado dentro daquele voo.

Nenhum dos outros sobreviventes disse qualquer coisa nos segundos seguintes. Quem interrompeu o momento foi Tony, que meneou a cabeça negativamente, com um sorriso debochado nos lábios. Ele disse:

— Fala sério que vocês estão comprando essa história?

— Pensa bem, Tony. Tudo se encaixa. A visão da Mia e as mortes que se seguiram... Não pode ser só uma coincidência. – Kaleb disse, um pouco exaltado.

Gretel parecia apavorada. Apertou a mão de Damien com força e disse:

— Então quer dizer que... Nós corremos perigo?

Mia concordo com um aceno de cabeça, olhando diretamente nos olhos do garotinho. Ele deve estar apavorado, coitado. Oh, Damien...

Os pensamentos da loira foram interrompidos por Maria, que parecia interessada no assunto:

— Você disse que eles morreram na exata ordem em que morreriam se estivessem no voo, correto? — E diante do aceno de Mia, continuou: — Então... Como era a ordem na sua visão, Mia?

Mia pensou durante alguns segundos. Deveria contar a eles? Isso só vai deixá-los mais paranoicos. Mas então percebeu que o sorriso debochado continuava no rosto de Tony. Se ela não falasse, era possível que nenhum deles a levassem a sério.

— Bom, a primeira a morrer era você, Maria. — Ela respondeu de maneira direta.

— Então a ordem é falha, a Maria está viva. – Theo retrucou.

— Mas ela quase morreu, não é? Quer dizer... – E Mia calou-se, sentindo ter ofendido Maria ao mencionar suas cicatrizes. A latina pareceu ignorar aquele comentário, limitando-se a olhar de maneira fixa para um ponto qualquer.

— Continua, querida. – Gretel pediu de maneira doce.

Mia concordou com um aceno e continuou:

— Depois, na minha visão, morria o Cub, seguido da Cicciliona. E em seguida o Liam. Exatamente como aconteceu.

O sorriso debochado não estava mais no rosto de Tony, tendo sido substituído por uma expressão presunçosa, como se ele estivesse prestes a colocar a história dela em xeque. Ele tossiu duas vezes e então disse:

— E quem é o próximo?

A garota nada disse, abaixando a cabeça. Tony entendeu imediatamente o que ela queria dizer com aquilo.

— Por que diabos sou eu?!

Mia não respondeu. Gretel colocou a mão na boca, chocada. Dessa foi Damien quem apertou a mão dela com força, inconscientemente procurando lhe acalmar.

— E depois? — Maria perguntou. — Conta a lista completa, Mia.

Mia engoliu em seco. Oh, meu pobre garotinho...

— Depois do Tony vem o... Damien.

A garota percebeu que no exato mesmo momento em que disse o nome do menino, os olhos de Gretel se encheram de lágrimas. A dama de ferre tremeu levemente, sem coragem de olhar nos olhos de Damien. Ele, porém, continuava com a mesma expressão de tristeza em seu rosto.

— Depois a Gretel. — Mia continuou. — Em seguida o Theo, depois o Kaleb e por último eu mesma.

— Que conveniente... – Theo murmurou de maneira um pouco alta. Todos os olhares se voltaram para ele, que fingiu não perceber.

O silêncio então voltou a reinar.

— E o que você propõe Mia? Que fiquemos sentados esperando a morte? — Theo arriscou.

— Não. — A jornalista respondeu de maneira categórica. — Existe uma maneira de deter a lista. Uma maneira que sem querer a Maria já executou.

A latina arregalou os olhos. A morte do Liam?, pensou, assustada. Mas Mia já continuava:

— Eu tenho quase certeza de que se alguém salvar-se sozinho de um acidente, essa pessoa está fora da lista. Caso a morte de uma pessoa seja interferida por outra, esse é pulado, indo pro fim da lista. Mas se você se salvar sozinho, você recupera sua vida.

— Isso é besteira! – Tony exclamou no mesmo segundo. — Eu nunca ouvi tanta bobagem em toda a minha vida.

Kaleb não conseguiu ficar quieto. Disse:

— Olha, você não precisa acreditar se não quiser. Mas é a vida da sua esposa que está em jogo, seu babaca.

Tony enfureceu-se com aquela frase, especialmente pelo xingamento no final dela. Fez menção de erguer o braço para bater em Kaleb, mas foi segurado por Theo e Gretel, que soltou a mão de Damien. O indiano manteve-se imóvel, sentindo-se satisfeito por ter conseguido tirar o homem do sério.

— Bom, eu acho que a reunião acabou gente. – Maria disse. Ela então deu meia volta e se afastou, sem despedir-se.

— Espera... – Mia tentou chamá-la, mas a latina não parecia interessada. Ainda de costas, disse:

— Você não disse que eu já estou salva? Então eu não tenho nada a fazer aqui. — E caminhou para longe, com um barulho ritmado de seus saltos batendo no chão.

Theo a seguiu, sem dizer uma palavra. Mia deu dois passos e entrou na frente dele, dizendo:

— Toma cuidado, Theo. Mesmo que você não acredite.

O rapaz nada disse.

x-x-x-x-x

Na mansão dos DuBois, Gretel e Damien faziam uma revolução. Cada pedaço perigoso do casarão era devidamente modificado. Papelão era colocado na quina de cada mesa ou cadeira pontiaguda; facas eram colocadas em um local inacessível; até mesmo a energia elétrica fora desligada, para evitar possíveis choques no processo.

— Que merda é essa, Gretel? — Tony exclamou, ao ver a mulher e o garoto na cozinha.

A mulher pediu que Damien se retirasse do recinto antes de começar uma discussão com o marido. O menino concordou com um aceno e se afastou. Quando Gretel ouviu os passos dele subindo a escada, disse:

— Eu estou tentando te salvar, Tony!

O homem não conseguiu conter um riso debochado.

— Você acreditou mesmo naquela história que a loirinha contou, Gretel? Aquela garota é doente, ela está apenas querendo atenção. Ela quer achar padrões de comportamento onde não existem. Existe um nome pra isso, você sabia? Pode procurar no Google. Os psicólogos chamam isso de culpa de sobrevivente.

Gretel meneou a cabeça negativamente, decepcionada.

— E como você explica a morte do Cub, da Cicciliona e do Liam, hein? Esse é um padrão que está se mostrando bem consistente.

— Você quer mesmo que eu rebata cada uma delas? — Ele perguntou, e a mulher concordou, desafiando-o: — Milhares de pessoas morrem todos os dias em acidentes de moto. Mais comum que isso, só um ataque cardíaco. A Cicciliona todos nós sabíamos que teria esse destino qualquer dia. A quantidade de procedimentos estéticos que ela realizava não era normal. E se o Liam era um drogado... Bom, eu me culpo por não ter percebido isso antes. Overdose de analgésicos é realmente algo que me pegou de surpresa.

A dama de ferro tinha uma expressão de decepção tremenda em seu rosto. Disse:

— Você é desprezível, Tony. – E então abandonou o recinto sem olhar para trás, subindo as escadas em passos rápidos.

— A cada dia os adjetivos ficam mais bonitos, querida. — Ele falou em voz alta, para que ela ouvisse. E então abaixou o tom: Agora com licença que eu estou saindo. Boa sorte tentando deixar a casa menos perigosa para mim.

E caminhou em direção a porta, sem que a mulher fizesse o menor esforço para impedi-lo.

x-x-x-x-x

Damien estava sentado na cama de seu quarto na mansão dos DuBois, mexendo com um boneco de ação qualquer. Gretel entrou calmamente no recinto, batendo duas vezes na porta. Diante do aceno de cabeça do menino, sentou-se ao lado dele e começou a fazer carinho em seus cabelos. Perguntou:

— O que aconteceu, meu querido? Você parece abatido.

O menino sorriu de canto de rosto, tentando demonstrar força.

— Não é nada de mais não. É só que eu estava pensando em tudo. Em como a mamãe morreu e em como nós também vamos morrer.

— Ei! — Gretel começou, sentindo-se ofendida. — Pode parar com isso, Damien. Nós não vamos morrer. Eu peço desculpas por fazê-lo ouvir tudo o que a Mia disse no funeral do Liam, eu sei que você ficou impressionado. Mas você não corre perigo, meu amor. Não enquanto eu estiver por perto.

— Você promete? — Ele perguntou, mesmo sabendo que a resposta que viria estava fora do alcance da mulher.

— Eu prometo. — Ela garantiu mesmo assim.

E os dois se abraçaram por vários segundos. Foi Damien quem se afastou primeiro, perguntando:

— Sabe do que eu sinto falta, tia Gretel?

— Do quê? — A dama de ferro perguntou de maneira interessada.

— Dos meus brinquedos. Desde que a mamãe morreu, ninguém me deixou voltar lá pra casa. Tem muita coisa minha lá que eu gostaria de volta.

Gretel ficou em silêncio por algum tempo, pensando a respeito daquilo.

— Oh, Damien! Do que você precisa? É só me dizer. Qualquer coisa que quiser eu compro pra você, meu querido.

— Mas eu não queria nada comprado, tia. Eu queria as minhas coisas... Se eu pudesse voltar pra minha casa pelo menos por um dia... Oh, por favor!

— Eu não tenho certeza, Damien... Pode não ser bom... — Ela disse de maneira incerta.

O garoto então abaixou a cabeça, triste. Ele então retirou os aparelhos de audição, como forma de protesto. Ele sempre fazia aquilo quando se sentia frustrado ou magoado. Por mais que Gretel soubesse que aquela atitude era uma espécie de birra e chantagem emocional, ela também tinha noção de que era uma forma dele bloquear os sentimentos negativos. Por causa disso, a mulher se aproximou dele e falou, movendo lentamente os lábios para que ela os lesse:

— Tudo bem meu querido, eu levo você até sua casa. Mas você precisa me prometer que nunca mais vai tirar os aparelhos. Tudo bem? A Dra. Miura falou que é essencial que você os use o dia todo, ou pode acabar voltando pro silêncio. É isso que você quer?

O menino colocou os aparelhos de surdez com rapidez, dizendo:

— Oh, não, isso jamais! A mamãe ficaria muito triste se me visse voltando pro silêncio. Ela me amava muito, sabia?

— Claro que sabia, meu querido. — Gretel concordou. — A sua mãe só falava de você no ateliê. Mesmo indo lá poucas vezes, eu já te conhecia, de tanto que sua mãe falou sobre você nessas ocasiões.

— Jura que mamãe falava muito sobre mim? — Ele perguntou, com os olhos brilhando.

Gretel nada disse, apenas sorriu em silêncio. Dentro dela, um sentimento misto de inveja e pena a consumia. Tinha inveja de Ewelyn, era claro. Ela queria que aquele amor que o garotinho sentia pela falecida mãe, fosse dela. Era uma atitude egoísta, mas Gretel não conseguia deixar de pensar que era injusto que Mike tivesse sido levado tão cedo, deixando-a com tanto amor para dar e receber. Damien necessitava preencher esse mesmo espaço, assim como ela necessitava preencher o dela.

— Agora que tal um milk-shake, hein?

O garoto sorriu com aquela fala.

Isso, meu querido. Aos poucos eu vou conseguir conquistar o seu amor.

x-x-x-x-x

Tony parou o Porsche em frente a um luxuoso motel. Retirou o celular do bolso e olhou as horas, percebendo que chegara no horário combinado. Procurou o número que havia anotado no aparelho e discou. Quando a mulher do outro lado da linha atendeu, ele disse:

— Axelle? Já subiu?

A garota confirmou com uma única palavra, e o homem sorriu maliciosamente. Dirigiu com o carro até a garagem e depois subiu as escadas em direção à recepção. Cumprimentou o recepcionista de maneira desinteressada e indicou o quarto ao qual estava se dirigindo. O homem já o conhecia, de modo que não fez objeções.

O estilista pegou o elevador e chegou em segundos ao andar. Caminhou lentamente por um corredor de carpete vermelho e parou diante da porta de madeira escura. Bateu duas vezes e entrou, dando de cara com uma mulher estonteante o esperando em cima da cama, apenas de lingerie. Ela usava um corpete vermelho com uma cinta liga, realçando as curvas do seu corpo branco e delicado.

— Você demorou, Tony. — Ela disse, e sua voz saiu como um miado. Aquilo era música para os ouvidos de Tony. — Eu já estava me divertindo sozinha...

O homem ignorou a segunda parte da fala dela, afrouxando a gravata e desabafando:

— Foi culpa da chata da minha mulher, como sempre. Como eu ainda aguento esse maldito casamento? – Ele disse, retirando o sapato e a camisa branca. Axelle sorriu maliciosamente ao vê-lo seminu, sem prestar atenção no que o homem dizia. Ela então se aproximou dele e começou a passar a mão por seu peito, fazendo carinho com os dedos nos pelos que havia ali e sentindo a maciez da pele dele. O peito de Tony era quente.

Tony abriu um sorriso malicioso e grunhiu com um animal feroz, sentindo-se extremamente excitado. Sem pensar duas vezes, tirou as calças de maneira desajeitada, fazendo o mesmo com sua cueca.

— Tony... — Axelle murmurou quando ele começou a beijar seu pescoço.

As coisas aconteceram de maneira rápida, e em minutos o casal fazia movimentos ritmados de vai e vem em cima da cama, fazendo o lustre do teto pender de maneira brusca. Nenhum dos dois percebeu aquilo, embriagados pelo prazer do sexo.

Num acordo sem palavras, Tony levantou-se, sentando-se em uma poltrona vermelha em frente à cama. Axelle imediatamente ajoelhou-se na frente dele, colocando delicadamente o pênis do homem em sua boca.

— Isso... — Tony disse, gemendo e batendo os pés no chão.

O movimento dele fez o lustre pender mais uma vez.

— Eu estou quase, vai...

Tony bateu os pés no chão com força ao ter o orgasmo, fazendo o lustre cair em cima da cabeça de Axelle. A mulher assustou-se com a pancada, e como reflexo mordeu com força o pênis do homem. Tony urrou de dor. Instintivamente ele empurrou a prostituta, fazendo-a cair para o lado. A boca ensanguentada da mulher foi o suficiente para fazer o estilista ficar branco.

— Puta que pariu...

O homem olhou para a sua virilha e viu apenas sangue. Seus olhos vagaram pelo chão, até que ele encontrou o que procurava. Axelle havia arrancado seu pênis de maneira acidental.

Tony gritou o mais alto que pôde. Deu dois passos para trás e então escorregou na poça de sangue que se formara embaixo de si. Desequilibrou-se e, como um pacote flácido, caiu da janela. Os quatro andares que separavam o estilista do chão foram facilmente ultrapassados, e o homem caiu na borda da piscina do motel, fazendo seu corpo arrebentado afundar na água outrora transparente.

x-x-x-x-x

A campainha da casa de Maria tocava de maneira repetida e insistente. Ela xingou mentalmente e em espanhol quem quer que estivesse apertando o botão, gritando:

— Já vai!

Maria largou o prato molhado na pia da cozinha e enxugou as mãos em um pano de prato qualquer. Correu para ver quem era com o coração batendo mais forte. Quando abriu a porta e viu quem estava ali, congelou.

— Maria Delgado? — O policial perguntou de maneira retórica. — A senhora está presa pelo assassinato de Liam Kasuke Hayata.


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Notas finais do capítulo

Enjoy!



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