Undead Revolution escrita por caarol


Capítulo 7
Antes Mal Acompanhado do que Só


Notas iniciais do capítulo

Finalmente mais um capítulo!
Peço mil perdões pela demora, este final de ano está bem complicado. E já peço desculpas adiantadas pelos atrasos dos próximos capítulos, não sei se conseguirei postá-los tão rapidamente.
De qualquer forma, espero que continuem acompanhando.
Boa leitura!



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Localização: Rota 52

3 dias após o Surto.


– Mas será que alguém vai mesmo passar por aqui? – O rapaz moreno perguntou, enquanto abria um pacote de bolachas de chocolate. - A estrada está bem deserta.

– Alguma hora irá passar algum carro por aqui, daí é só aproveitar a oportunidade! – Respondeu o outro, sorridente.

O moreno deu de ombros e ofereceu uma bolacha ao amigo otimista. Entre mordidas nos biscoitos, repassavam o plano que o loiro formulara durante as horas de caminhada.

O sol aparentava que, em poucas horas, não se faria mais presente - os dois rapazes concluíram, então, que necessitavam de abrigo e proteção o mais rápido possível. E se, caso algum veículo estivesse cruzando a Rota 52 enquanto os dois ainda andavam por ali, precisariam executar o plano com maestria para obter sucesso com a suposta ocasião única.

– É bom a gente ficar de olho, cara. – Disse o loiro, vestindo novamente sua camiseta, com um gemido de dor pelas queimaduras em seus ombros. – A qualquer momento alguém pode estar passando...





A música alegre vinda das caixas de som era acompanhada por dois pares de lábios femininos que murmuravam as letras conhecidas em conjunto. Germany e Red moviam seus ombros e seus pescoços em uma dança sutil, enquanto se divertiam embaladas pela melodia cativante. Vez e outra elas se entreolhavam entre sorrisos e cantavam, juntas, o refrão da música.

Road apenas acompanhava a batida com seus dedões, que batucavam silenciosamente no volante enquanto o rapaz dirigia despreocupado. Um cigarro aceso pendia em sua boca, a fumaça sutil sendo sugada involuntariamente pela fresta da janela aberta.

A ruiva estava novamente no banco do passageiro, com os pés pequenos cruzados e descalços repousando no painel acima do porta-luvas, as unhas tingidas de esmalte preto agora clareadas pela luz alaranjada do sol. A morena, ainda cantando no banco traseiro, observava a paisagem que passava por eles com olhos sonolentos.

O pôr-do-sol, que começava a se revelar no horizonte, tingia o interior da Ford Ranger com um laranja brilhante. A vegetação já amarronzada agora se revelava em tons de dourado, e as sombras das poucas árvores de baixo porte começavam a se alongar pelo solo ressecado. Apesar do cenário melancólico que a Rota 52 adquirira, os passageiros da grande caminhonete pareciam contentes.

Germany sentiu-se bem com os dois irmãos, estava protegida e em boa companhia. A cada minuto se recordava da precária situação na qual se encontravam, dos perigos iminentes que evidentemente encontrariam pelo caminho e da coragem que os eventos futuros exigiriam – mas suspirava, conformada. Não estava sozinha e sabia que, se procurasse arduamente, encontraria a bravura necessária para se juntar aos dois audaciosos irmãos na luta contra os mortos-vivos.

Red bocejou exageradamente, espreguiçando os braços finos e desnudos, e cerrou os olhos por alguns instantes. Estavam viajando direto já havia horas e a noite logo se faria presente. Sabia que, com a escuridão, os perigos duplicavam de gravidade. Pretendiam encontrar um abrigo na cidade próxima - mas esta ainda estava a quilômetros de distância. Um cansaço vigoroso se instalou na garota. Ajeitou-se no banco para uma posição mais confortável e pôde ouvir uma música mais calma e de volume mais baixo se instalando dentro da caminhonete, contribuindo para seu torpor.

– Já já a gente troca de lugar e eu dirijo, tá maninho? – Disse ela, a voz sonolenta e monótona.

– Daqui a umas três horas, você quer dizer. – Respondeu Road, desgostoso. – Sorte sua que eu tomei um café, ainda aguento um tempo aqui.

– Se precisar eu dirijo, Road. – Germany se manifestou no branco traseiro, inclinando seu tronco em direção ao banco do rapaz à sua frente.

– Fique tranquila, Ger. Amanhã você pode dirigir. – Ele sorriu pelo espelho retrovisor.

Com um aceno positivo, a garota sorriu em resposta e recostou-se novamente, também procurando se aninhar no banco para um cochilo.

O ruivo lançou o pequeno restante de seu cigarro para fora da janela com um peteleco. Apesar da música, conseguia escutar o ressonar ruidoso de sua irmã a seu lado. Germany provavelmente já estava dormindo também. O rapaz sentia o mesmo cansaço incômodo, mas a cafeína que corria em seu organismo o mantinha suficientemente desperto para continuar no volante da caminhonete por mais algum tempo.

Deu-se o luxo de observar por soslaios a paisagem ao redor. Agora, as margens da Rota 52 não se resumiam apenas em gramados infindáveis, tingidos pelo pôr-do-sol, com um ou outro bovino pastando sossegadamente. Pequenas árvores se faziam mais presentes, formando alguns aglomerados aqui e acolá pela beira da estrada e alguns pássaros revoaram por entre as nuvens, se preparando para o repouso. Voltando seu olhar para frente, o rapaz pôde ver uma placa de sinalização finalmente surgir na beira da estrada. Concluiu que sabia para onde estavam seguindo – pelo menos não estavam perdidos.

Um conjunto de árvores mais à frente adentrou seu campo de visão. Pareciam relativamente mais altas do que as restantes e suas copas ainda estavam parcialmente esverdeadas. Era um número grande de indivíduos que quase invadia o asfalto com suas raízes e troncos esguios. Desviando sua visão para a extrema direita, podia observar, ao fundo, mais conjuntos arbóreos.

Road estava prestes a pegar mais um cigarro quando uma mancha no asfalto metros à frente chamou sua atenção. Estava posicionada ao lado do conjunto de árvores da beira da estrada que acabara de observar. Levantou uma sobrancelha e acelerou sutilmente o veículo. Ao se aproximar mais da mancha, arregalou os olhos.

– Red, acorda.

Red gemeu em descontento e se remexeu novamente no banco. Seu irmão cutucou o braço da garota até acordá-la totalmente.

– O que você quer? – Perguntou ela, amargamente e entre bocejos.

– Olha lá.

O ruivo apontou com sua cabeça para a figura no asfalto, agora mais próxima do veículo. A silhueta, antes irreconhecível, começava a tomar uma forma galgaz aos olhos dos dois. A garota inclinou seu tronco para frente, apoiando suas mãos no porta-luvas e estreitando os olhos para ter uma visão melhor do que era aquilo na Rota 52. Seu irmão apenas esperava a reação dela.

– É uma pessoa! – Esganiçou ela, voltando a encostar-se no banco, assustada.

Germany acordou sobressaltada com o grito da ruiva. Esfregou os olhos sonolentos e procurou focalizar sua visão para o que pareciam tão assustados.

– O quê... aconteceu? – Perguntou a morena, inclinando-se para frente e posicionando sua cabeça entre os bancos dos dois irmãos.

– Tem uma pessoa caída no asfalto! – Disse Red, olhando para a outra garota, os olhos verdes brilhando assustados.

– Será que a pessoa... tá viva? – Road perguntou para as duas, reduzindo a velocidade da caminhonete.

– Você vai parar pra ver?! – Red olhou indignada para seu irmão.

– Qual o problema? Se for um morto-vivo, são três contra um. – Ele sorriu, divertido. – Se for alguém... só morto, a gente deixa aí.

– E se estiver vivo, a gente vê se pode ajudar... não é? – Germany se manifestou, recebendo dois pares de olhos verdes receosos como resposta.

No instante seguinte, a Ford Ranger estava estacionada próxima ao corpo deitado no piche morno. Os três jovens espicharam seus pescoços para fora da janela do veículo para observar o indivíduo a uns dois metros à direita da caminhonete.

Era um rapaz. Estava deitado de bruços, um de seus braços estirado ao lado de seu tronco esguio e com a palma de sua mão voltada para cima. Suas pernas, cobertas por uma bermuda jeans empoeirada, estavam ligeiramente dobradas e os pés, calçados em um grande tênis branco, repousando desalinhados no chão. Tinha seu rosto pálido e anguloso voltado para o veículo. Princípios de olheiras marcavam o contorno de seus olhos fechados, os lábios ressecados entreabertos estavam prestes a tocar o asfalto e uma vermelhidão repousava acima do nariz comprido. A cabeleira loira e curta tinha alguns fios grudados na testa molhada de suor. Uma pequena mochila se encontrava jogada próxima ao corpo dele.

– Ele está... morto? – Sussurrou Red, os olhos arregalados para a figura.

– Não parece ter nenhuma mancha de sangue no chão ou nas roupas dele. – Respondeu Germany, também em um tom baixo de voz.

– Só tem um jeito de saber. – Road se manifestou, retirando seu cinto de segurança e desligando a caminhonete.

O ruivo abriu a porta do motorista, saindo do veículo, deixando a chave no contato do painel e duas garotas assustadas olhando para ele.

– Você tá louco, Road?! – Red esbravejou, os olhos pregados no irmão que agora contornava a dianteira da Ford Ranger.

Um estalido no banco traseiro chamou a atenção da ruiva, era outra porta do carro que também estava se abrindo. Pôde ver Germany descendo do veículo.

– Ger! Você vai lá também? O que vocês dois têm na cabeça?! – A ruiva gesticulava, as sobrancelhas arqueadas em uma expressão de surpresa.

– Não se preocupa, Red. Ele não deve ser um zumbi. – A morena sorriu e se dirigiu para o rapaz ruivo e o loiro desacordado.

Red bufou, irritada. Retirou seu cinto de segurança e calçou seus sapatos. Balbuciava algumas pragas e falava sozinha, enquanto saia da caminhonete. Fitou o rapaz deitado no chão com receio, formulando todo um plano de fuga caso ele se levantasse e tentasse atacá-los. Repousava seus dedos magros na porta aberta, uma careta de desaprovação se estampando em seu rosto.

Road se aproximou da cabeça do rapaz, com os cotovelos apoiados em seus joelhos e o corpo se equilibrando na ponta dos pés. Examinou rapidamente o corpo à sua frente e não encontrou nenhuma ferida aparente.

– Ei, você. – Murmurou ele, se dirigindo ao indivíduo. Não obteve resposta.

– Deve ter desmaiado de sede, ou por causa do calor. – Disse Germany, parada em pé ao lado de Road. – Ele está bem pálido também.

– Se é que está vivo! – Grunhiu Red para os outros dois.

O ruivo esticou uma de suas mãos para segurar o braço fino do loiro, posicionando seus dedos médio e indicador pouco abaixo do pulso do rapaz. Permaneceu com os dedos ali por alguns segundos e logo os retirou, levantando seu olhar para a morena ao seu lado.

– Tem pulsação.

A garota suspirou aliviada involuntariamente e virou-se para a ruiva atrás de si.

– Ele está vivo, Red, e não está sangrando. Deve só ter passado mal.

Red cruzou os braços e soltou um muxoxo. Sentia-se de mau humor, já que o breve cochilo que tirara não havia ajudado em nada o seu cansaço; e agora estava ali, ao lado de um rapaz magro desfalecido que atrasava sua viagem - por menor que fosse a culpa dele.

O ruivo virou sofregamente o rapaz loiro de barriga para cima, recebendo um gemido sutil e um franzir de cenho em resposta. Germany também se ajoelhou ao lado do corpo.

– Ei, você está bem? – Perguntou ela, complacente. Novamente o loiro não se manifestou.

– Ele devia estar andando por muito tempo pra ficar desse jeito. – Disse Road, ainda encarando o rosto franzido do rapaz. – Sorte dele que nós que o achamos, e não os mortos-vivos.

A morena assentiu com a cabeça. Road se pôs em pé, batendo suas mãos em seus joelhos para tirar a poeira de sua calça jeans – apesar desta já ser levemente surrada. Germany inclinou-se um pouco mais em direção ao moço deitado.

– Eu acho que ele precisa de água. – Disse ela.

– Red, pega água na caçamba. – Ordenou Road, se virando para a ruiva.

Suspirando irritada, Red deu as costas para os dois e se dirigiu para a caçamba da caminhonete. “Sorte dele ser bonitinho, senão não ia ter água nenhuma”, pensou ela. Desviou os olhos rapidamente para as árvores próximas deles enquanto caminhava para a traseira do veículo. Tinham um aspecto fantasmagórico, graças aos tons alaranjados e às sombras compridas dos galhos pontiagudos e retorcidos. Um leve farfalhar de folhas a sobressaltou sutilmente, provocando arrepios em sua espinha. Correu para as sacolas de mantimentos e começou a procurar por alguma garrafa de água.

Road se afastou lentamente de Germany e do loiro, sacando um cigarro de seu bolso e o acendendo despreocupadamente. De costas para os dois e para a caminhonete, desviava seu olhar para o horizonte enquanto soltava baforadas de fumaça. Red ainda procurava a água e Germany se colocava em pé, ainda fitando o rapaz a seus pés. A morena levantou seu olhar rapidamente para as árvores à sua frente e logo se virou para a caminhonete.

– O que a gente faz agora? – Perguntou ela, se dirigindo para a ruiva.

– Eu tenho um palpite.

O sussurro estranho se fez ouvir atrás da morena. Paralisada, os olhos arregalados, Germany sentiu um braço magro envolver rapidamente sua cintura e uma mão igualmente fina, porém forte, tapar sua boca e puxar seu corpo para trás. Desviou seus olhos azuis assustados e pode ver brevemente uma bermuda jeans e um tênis branco atrás de si.

– Me desculpa por isso...

Outro sussurro, desta vez confundindo ainda mais a garota, que levantou uma sobrancelha. “Desculpa?”. Pôde ouvir algumas folhas secas sendo amassadas atrás de si, e um vulto à sua esquerda chamou sua atenção. Havia mais alguém ali.

Pôs-se a gritar e a se debater, dificultando o aperto de seu agressor. Road e Red se viraram no mesmo instante ao escutar a queixa abafada de Germany. Ambos arregalaram os olhos, trocando olhares com a morena, e logo percebendo a presença de mais um elemento. Os cinco permaneceram calados por alguns instantes, Germany tentando se livrar dos braços finos do rapaz loiro, antes desmaiado, que fazia caretas com o esforço de segurar a garota.

Road encarava o loiro, boquiaberto, o cigarro jazendo no chão e as mãos pendendo inertes ao lado do corpo. Como aquele rapaz, há poucos segundos atrás quase morto, estava de pé, segurando a morena? Desviou rapidamente o olhar para sua irmã e pôde ver que ela fitava a figura à sua frente.

Era outro rapaz, de faixa etária igual a de todos ali presentes. Era mais alto do que o loiro e tinha cabelos igualmente curtos e desalinhados, porém de um castanho intenso. Fitava cada um dos três passageiros da caminhonete com um sorriso torto em seu rosto, mas o brilho em seu olhar não demonstrava diversão ou malícia – pelo contrário, ele estava tão ressabiado quanto eles. Uma vermelhidão semelhante à do loiro também repousava em seu rosto fino, denunciando as horas de sol às quais ambos haviam sido expostos.

Porém, o que mais chamava a atenção dos irmãos no rapaz era a garrafa transparente que ele segurava. Esta exibia um pano branco em seu interior, com uma extremidade pendendo para fora do gargalo, e um líquido incolor embebendo o tecido. Em sua outra mão estava um isqueiro Zippo prateado, com a tampa aberta, e o dedão do moreno repousava no pequeno botão que liberava as chamas do objeto. Red engoliu em seco.

– Argh, me solta! – Esbravejou Germany, arranhando os antebraços do loiro.

– Para... de se... mexer! – Arfava o rapaz, ainda contendo milagrosamente a garota em seus braços.

– Quem são vocês? – Perguntou Red com um murmúrio rouco.

– É uma emboscada, mana. – Disse Road à ruiva, seus olhos ainda repousando no rapaz moreno.

– Acreditem, não queremos machucar vocês. – A voz do moreno soava estranhamente calma, porém descompassada. – Mas precisamos fazer isso.

– Isso o quê? – Red desafinou, arregalando os olhos.

O moreno desviou seu olhar para a caminhonete.

– Vocês só podem estar de brincadeira! – Debochou Road, quebrando o silêncio momentâneo com uma risada de escárnio. – Vocês acham mesmo que vão conseguir roubar nossa caminhonete?!

O outro rapaz estreitou os olhos com o desafio evidente, o punho se fechando mais forte ao redor da garrafa transparente. Germany finalmente se livrou dos braços do loiro e o empurrou com raiva, fazendo-o quase perder o equilíbrio.

– Vocês são malucos?! – Vociferou ela para o rapaz que antes a segurava, este agora com uma expressão surpresa e levemente temerosa em seu rosto. – Quem diabos vocês pensam que são?

Voltou-se para o rapaz moreno pela primeira vez, os olhos dos dois se encontrando subitamente. Encararam-se por alguns instantes, até que a garota voltou a falar com furor.

– Não acredito que fizeram toda essa encenação pra gente parar e ajudar a ele! – Ela apontou para o loiro, os olhos azuis ainda fitando intensamente o outro rapaz. – Pra ainda por cima quererem nos roubar!

Road se aproximava lentamente da caminhonete. Pretendia pegar a chave do contato, ordenar que as duas entrassem no veículo e dar o fora dali. O loiro, percebendo sua intenção, deu alguns passos determinados em sua direção, apesar de estar claramente hesitante.

– A gente precisa sair dessa estrada. – Disse o moreno, se dirigindo para Germany. – Vocês não tem noção do que estamos passando.

– E vocês não tem noção do que cada um de nós também passou! Vocês não são os únicos nessa merda de apocalipse zumbi!

O tom de voz determinado e colérico de Germany assustou a todos os outros. O loiro já estava completamente arrependido de tê-la segurado. O moreno, por outro lado, podia sentir, bem dentro de si, que gostou de encontrar alguém à altura para argumentar.

– Eu sei o que é isso! – Red subitamente apontou para a garrafa transparente. Todos desviaram seus olhares para ela. – É um... como chama mesmo? Coquetel alguma coisa!

– Molotov? – Perguntou Germany voltando a fitar o moreno, agora visivelmente preocupada com o que ele segurava. O rapaz não pôde evitar sorrir brevemente.

Aproveitando a deixa, Road de súbito se pôs a correr em direção à caminhonete. O rapaz loiro passou a persegui-lo. No mesmo segundo, os outros três também se dirigiram rapidamente para o veículo. O moreno deu ignição ao isqueiro enquanto corria e tentava, sem sucesso, acender a extremidade de tecido de seu Coquetel Molotov. Germany se dirigiu a ele, com o intuito de impedir que ele acendesse a bomba caseira.

Tudo aconteceu muito rapidamente. O loiro se jogou de encontro com Road, impedindo-o de alcançar a caminhonete. Red entrava no carro para pegar algo nos bancos traseiros. Germany agarrou a garrafa das mãos do moreno e a puxou para si. O rapaz, passando a chama sem querer pelo pano branco, ainda agarrava o Coquetel para não perdê-lo para a morena. A súbita combustão do tecido chamou a atenção dos dois jovens, que trocaram olhares assustados inconscientemente.

– Larga! Vai entrar em chamas! – Gritava o moreno.

– Não, você vai jogar isso na gente pra roubar a caminhonete! – Retrucou Germany, alarmada.

– Não sou louco de jogar em vocês, garota!

Com um súbito puxão, arrancou a garrafa em chamas das mãos da morena e a jogou para longe, na estrada. O impacto com o asfalto fez o recipiente estourar instantaneamente, exibindo uma chuva de milhares de cacos de vidro e chamas alaranjadas intensas. Ambos encararam por alguns instantes o fogo que lentamente se acalmava.

– Funciona mesmo. – Murmurou a garota.

– É lógico que funciona! – Disse o rapaz, ofendido.

Um vulto alto agarrou de súbito o moreno, jogando-o no chão com um baque surdo. Germany se virou assustada e pôde ver Road, com os braços cruzados, encarando o rapaz do Coquetel Molotov a seus pés, que esfregava as costas com uma careta de dor. Ao lado da porta do carona, estava Red com o outro rapaz ajoelhado ao seu lado, um semblante assustado e arrependido estampado em seu rosto. A garota tinha o bastão branco e azul de críquete em mãos, que balançava ameaçadoramente para o loiro.

– Como vocês... – Germany fitava os irmãos, boquiaberta.

Os dois abriram o mesmo sorriso em seus rostos.

– Agora. Vocês dois. Pretendiam mesmo roubar a caminhonete? – Perguntou Road, sombrio.

– Não quero ser um idiota, mas foi tudo ideia dele. – O moreno apontou com a cabeça para o loiro, que ergueu os braços em incredulidade pela denúncia.

– Vocês são idiotas. – Disse o ruivo.

Ele agarrou repentinamente a gola da camiseta do moreno e o arrastou para perto do outro rapaz.

– Ei! Mais respeito cara, eu sou maior que você!

Road lançou um olhar furioso para o outro, que logo se calou, contrariado.

– Fiquem aqui, quietos. Red, pode vir me ajudar?

A garota levantou os olhos, surpresa.

– A caçamba da minha caminhonete tá cheia de vidro. – Road olhou raivoso novamente para o moreno. – E a gente precisa colocar mais combustível.

Com um aceno de cabeça, Red se aproximou do irmão. Desviou o olhar para Germany, que logo entendeu o recado. A morena se aproximou e pegou o bastão de críquete em mãos, se posicionando em frente aos dois rapazes ajoelhados. Os irmãos se dirigiram para a caçamba da caminhonete e logo remexiam nas sacolas e galões de combustível, enquanto a morena ficava de guarda dos dois novos prisioneiros.

– Mas que merda vocês tem na cabeça? – Perguntou Germany aos dois à sua frente, com o cenho franzido e os braços cruzados em seu peito, o bastão pendendo de uma de suas mãos.

– A gente pensou que ia dar certo. – Proferiu o mais magro, com um sorriso amarelo e um dar de ombros. O moreno suspirou.

– Custava terem pedido carona?

– A gente desconfia de tudo e todos, moça, - continuou o loiro, – qualquer um pode ser um zumbi.

– Eu sei disso. E não me chama de moça. Eu tenho nome. – Germany pigarreou brevemente e se interrompeu antes de revelar seu nome. Lembrou-se de seu apelido. – Vocês podem me chamar de Germany.

– Germany? Sério? Seu nome é legal! – O loiro rapidamente se iluminou com um sorriso sincero.

– Não é meu nome de verdade! – Disse a morena, envergonhada. – É um apelido.

– Um codinome! – Gritou Red, do outro lado da caçamba.

– Quem precisa de nomes de verdade em tempos como esses. – Disse o rapaz moreno, levantando o olhar para a garota.

– Exatamente. – Ela esboçou um sorriso para ele. Ele retribuiu o gesto. – Enfim. Porque vocês decidiram roubar alguém ao invés de pedir ajuda? Esses dois – ela apontou para os dois irmãos – chegaram a pensar que eu era um zumbi, mas no fim das contas me acolheram. Sobreviventes têm de ajudar uns aos outros, e não o contrário! Vocês dois se ajudam um ao outro, mas resolvem esquecer a história de se juntar a outros pra nos roubar?! Estamos todos condenados nesse mundo de mortos-vivos se não trabalharmos juntos.

Os dois rapazes nada responderam e apenas desviaram os olhares, envergonhados. Ela suspirou, repousando as mãos em seu quadril. Fitava ora o rapaz loiro, magro e de camiseta larga, ora o moreno, bem afeiçoado e com o isqueiro em mãos.

– Apesar de não querer admitir, sua ideia da bomba incendiária é... interessante. – Disse a garota para o segundo, com certo desdém em sua voz.

O moreno levantou os olhos, com um semblante presunçoso.

– Mas não uma boa arma para usar em pessoas. Guarde pra próxima vez que encontrar zumbis. – Continuou ela, estreitando os olhos.

– A intenção era assustá-los... A gente não pretendia machucar ninguém. – Disse o loiro, engolindo em seco.

– Deixar a gente aqui pra morrer, durante a noite, comidos por zumbis sanguinários é, sim, uma forma de machucar alguém. – Disse Road categoricamente, do outro lado da caminhonete.

– Desculpa, desculpa, desculpa, de verdade! – Respondeu o rapaz, um arrependimento sincero em sua voz. Ele juntou suas mãos em frente ao seu rosto, em súplica.

Germany não pôde evitar sorrir. O rapaz magro era divertido mesmo sem a pretensão de sê-lo. Aparentava corajoso e determinado, mas também tinha um ar infantil e extrovertido. O outro já era visivelmente confiante e parecia não ter medo de se arriscar e de expor seus pensamentos. Parecia ser mais maduro e descontraído, mas provavelmente era tão infante quanto o primeiro. Seus olhos castanhos intensos eram difíceis de serem lidos, e a garota se pegou fitando-os inconscientemente.


– O que a gente vai fazer com eles? – Perguntou Red a seu irmão, entre sussurros. – A gente não pode largá-los aqui!

– Quem disse que não podemos? – Respondeu Road, ainda com os nervos à flor da pele. Ele bombeava o combustível para a caminhonete com violência.

– Simplesmente não podemos! É igual com a Ger... Ela está com a gente agora e também pensamos que ela ia fazer nos fazer mal.

– Mas ela não tentou nos atacar de verdade. – O ruivo se virou para a irmã. – Esses dois aí são retardados. O do Molotov pretendia por fogo na merda da caminhonete caso a gente não cedesse!

– Talvez a gente precise de gente assim pra combater zumbis, mano! E além do mais, não somos os sobreviventes mais prudentes e muito menos os mais corretos. Nossas armas são uma espingarda roubada e meu bastão de críquete!

O súbito pensamento da irmã soou irritantemente correto para Road. Ele suspirou, aborrecido, e retirou o galão da entrada de combustível. Passou o recipiente para a garota que logo o colocou novamente na caçamba da caminhonete.

– Mais uma gracinha deles, e eles tão f... ferrados. – O ruivo sibilou entre dentes para a irmã, que sorriu feliz em resposta. – E se você tiver querendo ajudar os dois só porque eles são bonitinhos,– ele enfatizou a palavra com uma careta de nojo - eu juro que você vai se arrepender, mana.

A garota mostrou a língua para o irmão e sorriu novamente, radiante. O rapaz apenas revirou os olhos e se dirigiu para a porta do banco do motorista. Red contornou a caçamba da caminhonete e se aproximou de Germany, que ainda conversava com os dois rapazes.

– O bastão de críquete é seu? – O loiro perguntou para Red.

– Sim. O mundo pode estar acabando, mas não vou me separar dele. – Ela respondeu, determinada.

– Críquete é um esporte um tanto... diferente. – O moreno levantou os olhos para ela.

– E qual o problema? – Retrucou a ruiva, franzindo o cenho. – É uma arma muito boa contra zumbis.

– Vocês realmente já enfrentaram mortos-vivos também? – Perguntou o loiro às duas garotas à sua frente, a incredulidade evidente em sua voz.

– Tem gente que nasce pra essas coisas. – Red sorriu para Germany, que retribuiu com uma piscadela.

– Vocês vêm ou não? – Road perguntou, já dentro da caminhonete. – A noite já tá chegando e eu não estou nem um pouco a fim de ficar aqui pra saber como ela vai ser.

O sol já se punha quase totalmente, um misto de raios vermelhos e alaranjados tingiam as nuvens ao seu redor. Sombras disformes se arrastavam ainda mais pelo asfalto, e algumas estrelas despontavam no céu parcialmente escurecido. Em poucos minutos já seria noite e a Rota 52 se tornaria um completo breu.

– A gente precisa chegar à próxima cidade logo. Vocês vão vir com a gente? – Red perguntou aos dois rapazes.

Tantos os dois, quanto Germany, olharam incrédulos para ela.

– Não vai adiantar em nada deixarmos vocês aqui. Mas não quer dizer que estejam perdoados. – Disse a ruiva, cruzando os braços e estreitando os olhos.

– Vocês vão mesmo nos ajudar? – Perguntou o loiro, os olhos brilhando.

– Talvez. – Gritou Road de dentro do veículo.

– Tem bastante espaço na Ranger. – Disse Red, sorrindo.

Os dois rapazes se entreolharam e sorriram um para o outro. O plano deles não havia funcionado, mas o resultado foi melhor do que o esperado.

– Tratem de pegarem logo suas coisas e vamos indo. – Declarou o ruivo.

A mochila do loiro ainda se encontrava jogada no asfalto. Este foi apanhá-la, enquanto seu amigo correu para o aglomerado de árvores no qual estava escondido anteriormente. Saiu de trás de um dos troncos com uma mochila em suas costas. Entregaram as bagagens à Red, que as colocou na caçamba da caminhonete.

– Você. – Disse Germany de súbito, olhando para o loiro. – Você conseguiu nos convencer, até bem demais, que estava passando mal. Não sei se te parabenizo ou se te mando praquele lugar.

O loiro sorriu em resposta. O moreno também não pode evitar esboçar um sorriso. O amigo realmente havia se saído muito bem na encenação há alguns minutos atrás. Repreendeu-se por não ter confiado mais nas capacidades teatrais do outro rapaz.

– Praticamente um ator de Hollywood. – Disse Road, rindo brevemente. Odiou admitir, mas o loiro havia realmente encenado muito bem.

– Pronto, você vai ser o Hollywood! – Red se virou para os outros de súbito, um sorriso estampado no rosto ovalado.

O rapaz a fitou por alguns instantes, confuso. Trocou olhares com Germany, que também sorria, e com o moreno que tinha as sobrancelhas levantadas em surpresa.

– A gente se refere por apelidos, se você não percebeu, e agora você tem o seu! – Continuou ela.

– Hollywood... Legal, gostei! – Ele se empertigou, com um ar triunfante.

– Vocês não sabem os nomes uns dos outros? – O moreno perguntou para Germany. Ela acenou negativamente a cabeça.

– Eu sou a Germany, como falei. A ruiva baixinha é a Red Rock e o emburrado é o Road Runner. – Road lançou um olhar desdenhoso para a morena de dentro da caminhonete. – Nos conhecemos hoje mesmo e há poucas horas atrás eu também já tinha um novo nome. É divertido, até. – Ela sorriu docemente.

– Pra quem se conheceu hoje, a gente já se gosta muito! – A ruiva declarou, sorrindo para Germany.

Red abriu a porta do banco do passageiro e a luz do interior do veículo permitiu uma fraca iluminação do ambiente. A noite já chegava lentamente e logo as únicas luzes que poderiam ser vistas seriam a da tímida lua lá no céu e a do intenso farol da caminhonete.

Hollywood se aproximou da caminhonete e hesitou brevemente em abrir a porta do banco traseiro, lançando um olhar rápido para Road. O ruivo claramente não estava feliz com a presença dos dois novos sobreviventes, mas parecia ter consentido com o fato de todos viajarem juntos. Engolindo em seco, o loiro abriu a porta levemente e lançou outro olhar de soslaio para o motorista. Road acendia um cigarro preguiçosamente e encarava a estrada à sua frente, fingindo escutar o falatório da irmã. Hollywood resolveu, então, adentrar o carro.

– Não sou obrigado a me apresentar de verdade? – Perguntou o moreno, enquanto ele e Germany caminhavam em direção à caminhonete.

– Pelo visto não. – Respondeu ela.

– Posso me apelidar também então?

– Se os dois ali já não tiverem ideias para um codinome, acho que sim. – A garota lançou um olhar para os dois irmãos, sorrindo.

Os dois entraram na Ford Ranger junto com Hollywood. O rapaz loiro se encontrava na janela esquerda, Germany sentou-se no meio e o moreno fechou a porta da direita com um baque.

– Sem gracinhas. – Disse Road, olhando para os três pelo retrovisor. – Vocês dois já estão por um fio.

Os dois assentiram positivamente, acuados. O ruivo deu a partida na caminhonete e eles logo estavam novamente em movimento.

– Bem que você podia vir aqui atrás né, Red? Você é menor do que eu.

A caminhonete era bem espaçosa, mas Germany não se sentia totalmente confortável estando no meio de dois rapazes que acabara de conhecer - e que a momentos atrás a emboscaram e tentaram explodir a todos. Além do fato de suas coxas, expostas pelo shorts jeans, roçarem incomodamente nas pernas dos dois rapazes ao seu lado. Por mais que encolhesse suas pernas, vez e outra elas se encostavam com as bermudas ou joelhos de Hollywood e do moreno. O loiro nem percebia, já que se encontrava absorto em pensamentos enquanto se deliciava com o estofado macio e aconchegante do veículo. O moreno tinha seu olhar voltado para a janela, mas sabia muito bem da aproximação pele com pele.

– Baixinha e folgada. – Disse Road, olhando de relance para a irmã.

– Depois a gente troca, Ger. – Retrucou ela entre dentes, enquanto beliscava o braço do ruivo.

– Ah sim. Você, cara do Coquetel. – Road levantou seus olhos para o espelho retrovisor, tentando adentrar o moreno em seu campo de visão. – Acho que você já sabe como vai se chamar, né.

Germany, Red e Hollywood voltaram seus olhares instantaneamente para o moreno. Ele abriu um sorriso torto, um tanto tímido, e entreolhou os outros três.

– Vocês podem me chamar de Molotov.


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Notas finais do capítulo

Mais um capítulo longo. Eu me empolguei, ahhahahaha
Sem nenhum zumbi nesse, feliz ou infelizmente.
Críticas, comentários, elogios, são todos bem vindos. :)
Até a próxima!