Undead Revolution escrita por caarol


Capítulo 11
Provisões




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Localização: Cidade de Coparo Hills

4 dias após o Surto.


– Cara. – Hollywood se manifestou após longos minutos sem trocar uma palavra sequer com Molotov. Antes, os únicos ruídos na caçamba da caminhonete eram o ofegar acelerado dos dois se misturando ao vento que contornava o veículo, numa sinfonia agonizante.

– Oi. – Murmurou Molotov, sentado com as costas no vidro traseiro, ao lado do loiro.

– Promete que não vai rir?

– Depende.

– Tô tremendo até agora.

– Eu também.

Os dois encaravam a estrada deixada para trás pela caminhonete com olhos arregalados e todos os músculos do corpo tensionados. Haviam repousado as armas de fogo ao lado de suas pernas, já que não teriam mais necessidade delas no momento - mais nenhum zumbi seguia a Ford Ranger. Todos estes haviam ficado para trás, alguns caídos devido aos tiros, uns sangrando com as balas passadas de raspão, outros apenas desistindo de perseguir o veículo, grunhindo com fúria em direção aos sobreviventes como se rogassem pragas malignas por terem perdido o banquete em potencial. De qualquer forma, os dois rapazes se encontravam em pura tensão pela fuga quase mal sucedida.

Apesar das ruas continuarem desertas, eles sabiam que os mortos poderiam aparecer subitamente de qualquer lugar. Estes ainda estavam em Coparo Hills, escondidos à espreita, esperando alguma vítima ingênua ser imprudente o suficiente para aproveitarem a oportunidade de saciarem sua sede e aumentarem seu exército macabro. Àquela altura, os jovens concluíram que, se houvesse alguma pessoa ainda viva por ali, ela estaria condenada em pouquíssimo tempo. A possibilidade deles estarem condenados também não lhes pareceu muito remota.

– Você sabe pra onde a gente está indo? – Perguntou Molotov, com os olhos ainda grudados no asfalto.

– Não sei... provavelmente pegar comida. Qualquer lugar longe daquela merda de loja já é o suficiente. – Respondeu Hollywood, soltando um muxoxo. - Sabe, cheguei a pensar ontem que essa história de sair por aí baleando zumbis seria uma coisa até... divertida.

– Pois é, eu também.

– Mas sabe o que eu descobri?

– Hm?

– É uma merda. Assustador pra caralho. Pareço um maricas falando, mas é verdade.

– Concordo com você. – Suspirou Molotov, encostando a cabeça no vidro e fechando os olhos. – Não dá pra pensar que estamos num videogame idiota. As coisas são bem mais assustadoras ao vivo.

– Mas acho que a gente só precisa de um tempo pra acostumar, sabe? Afinal, não vamos ter muito mais o que fazer nas nossas vidas. – Hollywood finalmente desviou os olhos da traseira da caminhonete e fitou o moreno de soslaio. – E além disso, não somos tão palermas quanto a maioria dos sobreviventes, que se desesperam logo no começo e morrem facilmente. A gente tem armas, munição, um veículo... falta um plano concreto, um objetivo, e então seremos um grupo bem sucedido no meio desses cretinos.

– Você fala isso com uma naturalidade assombrosa. – Molotov olhou para o outro. – Te admiro, cara.

Os dois trocaram sorrisos e se saudaram com um encontro de punhos.

– Ei, vocês! – A voz estridente de Red, tentando se fazer ouvir em meio ao vento passando pela janela aberta de seu assento, interrompeu a conversa dos rapazes. – Vamos parar naquele mercado ali na frente, ó! Fiquem atentos!

Com acenos de cabeça, o loiro e o moreno voltaram a brandir suas armas, ainda ligeiramente trêmulos e relutantes, mas tentando reunir forças para serem corajosos e estarem preparados para enfrentarem mais possíveis hordas zumbis.

Dentro do veículo, a ruiva se remexia constantemente em seu banco, ainda nervosa devido à fuga de instantes atrás. Germany e Sam não se encontravam em situação muito diferente, cada um calado e encolhido em seu assento, os semblantes afligidos por pensamentos e memórias agonizantes. A ansiedade de Road, porém, só era denunciada graças à enorme quantidade de cigarros que colocara em seus lábios nos últimos minutos.

O que a olhos alheios parecia apenas a ampla compulsão de um fumante inveterado, para Red era a mais alta confirmação do quão angustiado estava o ruivo. Tentando confortá-lo, repousou uma das mãos pequenas no ombro retesado dele, em um sutil sinal de acalento. Temeu ser ignorada por ele, mas acabou recendo um sorriso que há tempos não se depositava no rosto de Road. Era um sorriso triste, mas um sorriso. A garota concluiu que já era muita coisa para alguém tão carrancudo como ele, então retribuiu o gesto.

– Ali na frente! – A voz trêmula de Sam se fez ouvir dentro do veículo, e sua pequena mão apontou para uma construção solitária a alguns metros à frente.

– Que bom que não fica ao lado de muitas outras lojas. – Disse Red, fitando o pequeno prédio. – É garantia de não termos outra... surpresa.

Sam engoliu em seco. Germany se remexeu em seu assento, incomodada.

– É um bom lugar pra reabastecer de coisas, garoto? – Perguntou Road, olhando para o menino pelo retrovisor.

– Sim, é meio pequeno, mas tem bastante coisa! Tem produtos pra casa também, pra higiene e tudo mais. – Respondeu Sam, retribuindo o olhar.

– Higiene. Banho. Ah, Deus, como eu preciso de um banho! – Lamuriou Red, despencando os ombros e suspirando.

– Somos duas. – Manifestou-se Germany. - A gente bem que podia procurar algum lugar pra se hospedar por algum tempo, pra dormirmos em camas de verdade e podermos tomar banhos dignos.

– Vocês não acham mesmo que vão poder lavar seus lindos cabelos todos os dias, não é? – O tom de deboche era evidente na voz grossa do ruivo. – Podemos até parar em algum lugar, mas não vão se acostumando. Banho é uma das últimas coisas as quais devemos nos preocupar.

Red grunhiu em descontento e Germany suspirou.

– Eu ofereceria minha casa para irmos, mas... não sei se minha família ainda está lá. – Disse Sam, com a voz embargada.

– Obrigada, Sam. Você está nos ajudando bastante. – A morena sorriu complacente e acariciou os cabelos do menino. Este deu de ombros e respondeu com um meio sorriso.

– Tem razão. Você até merece um prêmio, garoto. – Disse Road, enquanto expirava a fumaça do cigarro. – Quando tivermos tempo, vou te ensinar a dirigir essa belezinha aqui.

– Tá louco, Road? O menino não tá nem na puberdade ainda! – Retrucou Red, franzindo o cenho para o irmão.

– Dá um desconto pro garoto, mana. Ele merece saber fazer alguma coisa que seja útil nesses tempos que estamos.

Os olhos antes marejados de Sam agora brilhavam de excitação.

– Além disso, você pegou sua licença nem faz muito tempo, Red. Tenho certeza que ele vai dirigir melhor do que você.

– Não sei do que você está falando. – A ruiva soltou um muxoxo e desviou os olhos para a janela.

– Você já pode mesmo dirigir, Red? – Perguntou Sam.

Road subitamente começou a gargalhar, assustando aos outros passageiros. Era a primeira vez que o ruivo ria daquela maneira, genuinamente se divertindo, então Germany e Sam se entreolharam, surpresos.

– Ele deve pensar que você tem uns quinze anos, mana. – Disse ele, entre risos. – Não é pra menos, com essa sua cara de fedelha.

– Sim, eu já posso dirigir, Sam. – Respondeu a ruiva, com um ranger de dentes. – Fiz vinte anos há alguns meses atrás.

– Vinte? – Perguntou o menino. – Você parece mais nova!

– Deve ser por causa dessa franja estúpida. Mas obrigada mesmo assim, querido. – A ruiva sorriu para o menino. – Além do mais, não sou a única. A Ger também deve ter a minha idade.

– Vinte e três. – Disse a morena, timidamente.

– O quê?

– Tenho vinte e três anos, Red.

A ruiva escancarou os lábios e ergueu as sobrancelhas. Road e Sam se puseram a rir e Germany sorriu para a ruiva.

– Caramba, como assim? Você não pode ser mais velha do que eu! – Reclamou Red, ainda fitando a morena.

– Porque não?

– Porque... isso faz de mim a pirralha! Tem noção do quanto esse idiota vai me aporrinhar por causa disso? – Proferiu a garota, apontando para o irmão que continuava a gargalhar abertamente.

– Do jeito que você fala, é como se a diferença de idade fosse gigante. – Disse Germany, entre risos.

– E eu sou o mais novo, de qualquer forma! – Manifestou Sam, ligeiramente emburrado com o fato.

– Não importa, Sam. Dos mais velhos, eu sou a mais nova! Isso faz de mim... a mascote. – A ruiva suspirou, dramática.

– Ou pior. – Disse Road, sorrindo para irmã. – A isca.



Por toda a extensão da estrada por onde passavam havia carros parados, abandonados, uns em perfeito estado e outros totalmente destruídos ou capotados. Um deles, mais ao horizonte, parecia arder em chamas. Não era exatamente uma quantidade gritante de veículos, mas um número suficiente para os jovens concluírem que ali houvera um massacre recente, resultando no abandono dos mesmos pelos donos aterrorizados ou depredados pelos zumbis que tentaram agarrar os passageiros inutilmente escondidos.

Manchas de sangue no asfalto, todas já ressecadas pelo sol a pino, completavam o cenário brutal daquela porção dos subúrbios afastados de Coparo Hills. Não havia sinal de nenhum vivo ou morto pelas ruas ou dentro dos carros, mas os passageiros da Ford Ranger permaneceram atentos ao máximo para qualquer movimentação suspeita.

– Tem certeza que é seguro pararmos agora? – Perguntou Germany, aos sussurros.

– Não temos outra opção. – Rebateu Road.

– Os outros mercados ficam mais no centro e lá deve estar cheio... deles. – Concordou Sam, engolindo em seco.

A caminhonete estacionou ao meio fio à frente de um mercado 7-Eleven. O estabelecimento estava aberto, com duas janelas quebradas e aparentava ligeiramente bagunçado e revirado, como se já tivesse sido visitado por sobreviventes desesperados por mantimentos. No entanto, as prateleiras pareciam relativamente cheias, assim como as geladeiras com bebidas; logo, os jovens decidiram que o explorariam de qualquer maneira.

O mercado era realmente separado do restante das casas e lojas, sendo a construção mais próxima dali um pequeno posto de gasolina a algumas dezenas de metros de distância. No entanto, Molotov e Hollywood saltaram da caçamba já com as armas em mãos, atentos para qualquer agitação nas redondezas ou no cemitério de carros. O 7-Eleven aparentava vazio, sem ruído qualquer proveniente dele, mas resolveram não arriscar a entrarem de supetão.

Ficou decidido que Road e mais algum dos jovens avançariam rapidamente para o posto de gasolina para abastecerem a Ranger e logo voltariam para apanhar o restante, que estaria equipado com mais mantimentos. Hollywood e Sam retrucaram de início, ressabiados de se separarem de tal maneira depois do atentado na The Sportsman’s Guide e do que ocorrera naquele local, mas logo foram parcialmente convencidos de que, daquela maneira, poderiam deixar a amaldiçoada Coparo Hills mais rapidamente.

– Eu também não acho que seja uma ideia tão inteligente. – Disse Red, cruzando os braços e franzindo o cenho para o irmão.

– Quanto mais ficarmos aqui parados, pior. – Proferiu Molotov.

–Vão logo pegar tudo o que precisamos, então, enquanto alguém vai comigo para o posto. – Declarou Road.

– Eu posso ir. – Manifestou-se Germany. – O Sam também vem com a gente.

– Por quê? Eu quero ajudar a pegar comida! – Retrucou o menino, erguendo os olhos para a morena.

– É perigoso, garoto. – Disse Hollywood. – E além do mais, acho que nem vamos conseguir tantas coisas aí dentro, mesmo.

– Ótimo. Holly, Molotov, vocês vem comigo. Vamos logo, estou ficando agoniada! – Red bufou, desviando os olhos para seu redor a todo instante.

– Ah, me lembrei! – Sam elevou a voz, chamando a atenção de todos para si.

O menino correu para os bancos traseiros da caminhonete e pegou algo no chão dos assentos. Voltou para a pequena roda de jovens com uma mochila em mãos, na qual começou a remexer com afinco.

– Aqui, achei isso naquela loja lá! – Ele mostrou dois walkie-talkies grandes e amarelos. – Pode ser de ajuda se a gente for se separar!

– Bom trabalho, Sam! – Parabenizou Red, batendo palminhas e pegando um dos aparelhos para si. – Fica mais fácil se comunicar com um destes.

O garoto ficou com o outro walkie-talkie para si, segurando-o com orgulho e um rubor no rosto. Enquanto repassavam o plano para os próximos quinze minutos, foi a vez de Germany correr de volta para a Ranger e pegar uma mala grande de camping e um machado. Voltou logo para o grupo, que agora a encarava com curiosidade.

– Um machado, Ger? – Perguntou Road, erguendo uma sobrancelha.

– Deve ser bem efetivo. – Disse ela, com um sorriso no rosto.

– Pode passar para cá! – Proferiu Hollywood, entregando a espingarda que carregava para o ruivo e pegando o machado para si.

– Pensei que você tivesse quase desmaiado de medo na hora que a gente enfrentou os zumbis da caçamba. – Disse Molotov, cruzando os braços.

– Águas passadas, amigo. – Sorriu o loiro.

– Aqui tem munição. – Disse Germany, abrindo a mala e retirando diversos cartuchos com balas. Passou vários para os três que ficariam no mercado. – Tem alguns revólveres também.

Hollywood e Red apanharam uma arma cada um, o rapaz o engatando na calça jeans e a menina inserindo o cartucho no seu revólver com certa dificuldade. O facão fora encapado por uma espécie de coldre e passado para Molotov, que o posicionou transversalmente às suas costas.

– Muito bem, então. Em vinte minutos, no máximo, estaremos de volta. - Declarou Road.

Hollywood, Red e Molotov assentiram. Cada um estava com uma sacola ou uma pequena mala presa à roupa para guardaram o que coletassem. Partiram lentamente em direção ao 7-Eleven, as armas empunhadas com uma fraca determinação. Germany, Sam e Road rumaram novamente para a caminhonete, logo tomando seus lugares e se afastando dali, para se aproximarem do posto de gasolina mais à frente.




Localização: Mercado 7-Eleven

4 dias após o Surto.


O moreno fez um sinal para Hollywood e Red o acompanharem, mas a ruiva ficou ligeiramente para trás. Dos três, era a mais receosa. Desviava os olhos constantemente para todos os lados, com as mãos trêmulas e gotas de suor grudando a franja alaranjada em sua testa. Chacoalhou a cabeça levemente e se empertigou. “Chega de frescuras, garota!”, pensou para si mesma, rumando rapidamente em direção aos rapazes e se posicionando ao lado deles.

– Red, venha atrás de mim. – Sussurrou Hollywood. – Mol, dê cobertura pra gente.

O moreno assentiu e empunhou a espingarda, virando-se de costas para a porta do estabelecimento e analisando a estrada à frente. Desviou os olhos para a direita e pôde ver a Ford Ranger se afastando gradativamente.

O loiro entrou pé ante pé no mercado, seguido da garota. Estava bem iluminado lá dentro e realmente muito bagunçado, mas aparentemente sem qualquer zumbi ou sobrevivente. Incrivelmente, também não havia nenhuma marca de sangue ou sinais de ter ocorrido algum tipo de confronto ali. Hollywood fez sinais com as mãos para a ruiva seguir para a direita enquanto ele iria pela extrema esquerda da loja, para uma checagem geral do lugar. Ela concordou rapidamente com a cabeça e se separou do rapaz. Após alguns segundos, foi a primeira a quebrar o silêncio.

– Nada aqui. – Disse ela, vasculhando o chão com os olhos.

– Nada também. – Rebateu o loiro, desviando o olhar para trás do balcão dos caixas. – Está limpo aqui dentro, Molotov.

– Por fora também. – Respondeu o moreno, abaixando a espingarda. – Vamos pegar as coisas, então.

Enchiam sacolas com tudo de útil que encontravam, além do que mais os apetecia gastronomicamente. Os alimentos dali, na grande maioria, eram enlatados e tipicamente junk food – salgadinhos, doces, lanches prontos, bolachas -, com uma ou outra coisa mais natural, mas nada que realmente compusesse uma verdadeira refeição. No entanto, os jovens apanhavam embalagens da mesma maneira, variando em marcas, sabores e opções. Red levava uma grande sacola térmica que logo foi preenchida com garrafas d'água, refrigerantes, cerveja e isotônicos. Hollywood queria incluir pizza congelada na sacola, mas foi censurado por Molotov, pelo motivo de não terem como assarem a maldita pizza na caminhonete.

Enquanto os outros dois continuavam a se abastecer de café em pó, barrinhas de cereal e Pringles, o moreno se prostrou à frente das prateleiras destinadas a outros tipos de produtos; não-comestíveis, mas igualmente úteis para eles. Apanhou uma garrafa de álcool, algumas pequenas toalhas de pano – já pensando em montar mais de seus Coquetéis -, pilhas, uma bússola presa a um chaveiro, um mapa e até um binóculo, largado em cima da pequena estante. Concluiu que o último provavelmente pertencia a alguém que estivesse entrado ali anteriormente e o esquecido, já que o objeto não estava em qualquer tipo de invólucro e parecia o único exemplar presente. Pegou-o do mesmo jeito, sorrindo para si mesmo com a descoberta útil e em bom estado.

– Hollywood. – Chamou Red, subitamente.

– Diga.

– Prefere shampoo para cabelos lisos ou rebeldes?

– Shampoo? – Hollywood se virou para olhá-la, erguendo uma sobrancelha. A garota se encontrava ao lado de uma prateleira com produtos de beleza e higiene.

– Sim. Estou pegando essas coisas de banheiro, sabe? Sabonete, shampoo, desodorante, escova e pasta de dente, essas coisas. – Disse ela, observando o rótulo de um frasco bojudo. – Nunca se sabe quando teremos a oportunidade de sermos humanos limpos de novo.

– Um banho ia bem. – Balbuciou Molotov, revirando o binóculo em suas mãos.

– Exatamente! – Exclamou a ruiva, suspirando aliviada por mais alguém compartilhar de sua opinião.

– Talvez não seja uma má ideia. – Disse Hollywood, colocando duas sacolas cheias à porta da loja. Virou-se em direção de Red e logo viu duas portas fechadas à extrema direita o lugar. - E essas portas aí do fundo?

– Deve ser algum depósito, ou talvez dois banheiros. – Respondeu o moreno.

– Eu não abri porque não parece ter nada lá dentro... pelo menos eu acho. – Red se afastou gradativamente de onde estava, ainda fitando as portas fechadas, agora visivelmente preocupada.

– Se tivesse, já teria saído para nos pegar, não é? – Caçoou o loiro, sorrindo brevemente.

– Mais dez minutos. – Anunciou Molotov, os olhos pregados em um pequeno relógio pendurado acima do balcão dos caixas. – Vou estrear esse binóculo aqui e dar uma olhada lá fora. Terminem de empacotar tudo que eu já volto, beleza?

A ruiva e o outro rapaz acenaram positivamente com a cabeça, e voltaram e analisar os produtos da loja, discutindo as melhores coisas para levarem, o que poderia ser ou não utilizado e quantos maços de cigarro será que Road iria querer. Molotov apanhou a espingarda, antes deixada encostada à porta da loja, e saiu do 7-Eleven com o binóculo também em mãos.

Os arredores da estrada continuavam desertos, os carros desamparados sendo as únicas presenças dali. Posicionou as lentes do objeto em seus olhos e girou o tronco para a direita, tentando focalizar o posto de gasolina. Logo pôde ver nitidamente a Ford Ranger, bem ampliada pelas duas lunetas do instrumento, estacionada ao lado de uma bomba de combustível; com Road Runner enchendo o tanque, Germany posicionando alguns galões na caçamba e Sam empunhando bravamente o bastão de críquete de Red. O menino aparentava absorto em pensamentos, atento às adjacências do posto e prostrado ao lado do veículo com cautela, e os dois jovens riam abertamente enquanto conversavam. O moreno levantou uma sobrancelha, um aborrecimento inédito atingindo-lhe o peito. Eles pareciam bem. Bem até demais, rindo e sorrindo um para o outro. Abaixou o binóculo com um franzir de cenho no semblante desgostoso.

Caminhou mais à frente, para ter uma visão melhor da estrada. Vasculhou uns dois carros que se encontravam mais próximos e não observou nada de útil dentro deles, tampouco alguém morto ou escondido. Parou no meio do asfalto, de costas para o mercado, fitando o horizonte ensolarado com alguns estabelecimentos bem longínquos dali e aparentemente também desertos. Refletiu, com alívio, que conseguiriam, então, reabastecer os mantimentos e a caminhonete em paz, sem a intromissão de zumbis sanguinários. Foi quando virou para a sua esquerda e sua conclusão caiu por terra assim que os avistou.




Localização: Posto de gasolina nos subúrbios

4 dias após o Surto.


Sam fitava com apreensão os três jovens que se dirigiam à loja, conforme a caminhonete se afastava em direção ao posto.

– Será que eles vão ficar bem? – Perguntou ele, sem tirar os olhos do mercado. Pôde ver Molotov vasculhando a parte exterior do 7-Eleven, enquanto Hollywood e Red entravam cautelosamente no lugar.

– Vão sim, garoto. – Disse Road, lançando um olhar pelo espelho retrovisor e avistando a nuca do menino no banco traseiro.

– Não vamos demorar, já, já voltamos para apanhá-los. – Germany, sentada no banco do passageiro, girou o tronco para olhar o garoto. Este, antes ajoelhado no estofado e voltado para o vidro traseiro, tornou a se sentar corretamente, com um suspiro. A morena continuou a fitá-lo. – Você não se importa se sairmos de Coparo Hills mais tarde, não é?

– N-não... até porque não acho que tem mais motivo pra eu ficar aqui. – Disse o menino, tristonho. – E prefiro ficar com vocês a descobrir se tem mais alguém vivo aqui ou não.

Road e a morena menearam a cabeça, concordando com Sam. O ruivo estacionou a Ranger ao lado das primeiras bombas de combustível e rapidamente saltou do banco do motorista, abrindo a porta dos assentos traseiros e apanhando o Winchester .44. Rodeou o veículo, vasculhando toda a área ao redor, enquanto Germany e Sam também pegavam armas para si. A morena enganchou um revólver no cós do shorts e o menino tratou de empunhar o bastão de críquete da irmã do ruivo.

– Eu vou dar uma volta pelo posto. – Disse Sam, confiante.

– Você fica aqui, mocinho. – Retrucou a garota, erguendo uma sobrancelha para ele. – É perigoso. Deixa que eu ou Road fazemos isso.

– Mas vocês que sabem mexer nessa história de combustível! – Esganiçou o menino. – Posso nos comprar tempo vasculhando tudo enquanto vocês preparam o carro!

– Ele não deixa de ter razão. – Disse Road, passando a tira presa ao rifle pelos ombros e fazendo o mesmo pender em suas costas.

– Não acredito que você está concordando em deixar um menino de dez anos sair por aí sozinho.

– Ele não vai sair por aí. – O ruivo baixou os olhos para o menino. – É só não se afastar da loja de conveniência ali. – Apontou a pequena construção com a cabeça. – Além disso, ele vai continuar em nosso campo de visão e pode gritar se precisar.

Antes que Germany pudesse retrucar, o menino já saía rapidamente em direção às outras bombas, vasculhando todos os cantos possíveis com cautela. A garota suspirou e se dirigiu para a mangueira mais próxima do veículo, no intuito de bombear combustível para a caminhonete.

– Deixa que eu faço. – Road se prostrou ao lado dela, tomando a mangueira de suas mãos e abrindo o compartimento de combustível do carro.

– O que eu faço, então? – Reclamou a morena, cruzando os braços.

– Você pode... sei lá, organizar a caçamba aí atrás, amarrando as coisas com essas cordinhas que tem aí. Não vai ser uma boa tudo sair voando se a gente precisar fugir rápido de novo.

Dando de ombros, Germany subiu na caçamba com certo esforço, recebendo uns risinhos debochados do ruivo, enquanto este encaixava a haste de metal da mangueira no compartimento aberto do veículo.

– Você está bem risonho hoje. – Disse a garota, ácida.

– Deve ser o calor. – Respondeu o rapaz, sorrindo sombrio.

Os dois permaneceram calados por alguns instantes. Ela remexendo em sacolas e malas na caçamba e ele tentando lidar com a bomba de combustível que parecia não funcionar corretamente.

– Vocês realmente me acham tão emburrado assim? – Perguntou, subitamente, se voltando para a bomba com um franzir de cenho. - Essa merda parece quebrada. – Murmurou.

– Imagina, você é um amor de pessoa, Road. – Riu Germany, recebendo um olhar gélido do rapaz. – Mas, sabe, não te julgo.

– Obrigada, Ger, sua opinião é o que faz meus dias passarem mais felizes.

A morena levantou uma sobrancelha para o ruivo, que logo lançou um sorriso malvado para ela.

– É brincadeira. – Disse ele, logo voltando a encarar a bomba de combustível. - Pensei que tivesse mais senso de humor.

– Mas é verdade, seu babaca, não o julgo. – Retrucou ela, amarrando algumas sacolas no canto da caçamba. – Você praticamente se tornou... o líder do grupo, sabe?

– Líder? – Ele olhou para ela por cima do ombro.

– Sim. Você é o mais velho, pelo menos imagino que seja o mais velho, e já tem todo esse jeito...

– Mandão de ser.

– Eu ia dizer filho da puta, mas isso serve.

Os dois riram juntos.

– Além do mais, você tem a Red. Já não basta ter de salvar sua própria pele, ainda tem que zelar pela irmã mais nova... não deve ser nada fácil.

– Acredite... não... é. – Disse ele, chutando a bomba em meio às palavras. – Vai funcionar ou não, sua porcaria?

– Road. – Chamou a morena, deixando para trás o que fazia para se aproximar da beirada da caçamba mais próxima do ruivo. Ele se virou para olhá-la, com uma veia pulsante de nervoso evidente em seu semblante. – Não precisa evitar falar dessas coisas.

– Não estou evitando.

– Lógico que está. Você está tentando contornar o assunto botando a culpa nisso aí.

– Isso precisa funcionar, Ger. Precisamos de combustível. – Bufou ele.

– Eu sei disso, mas só me ouve. Temos tempo. – Ela se sentou no chão da caçamba, bem próxima da borda desta, cruzando as pernas. – Você não precisa se pressionar a ajudar a todos nós. Quer dizer... nós também podemos ajudar. A nos salvar, a salvar Red... e ela também já é bem crescida.

O rapaz fitou a garota por uns instantes e então soltou um longo e pesaroso suspiro. Largou a mangueira da bomba e se aproximou mais da caçamba, cruzando os braços e desviando os olhos para o horizonte.

– Eu sei, Germany. Mas eu me sinto na obrigação disso. Especialmente em relação a Red. – A morena assentiu com a cabeça, complacente. – Eu sou a única família dela, e ela, a minha. Graças aos céus estávamos juntos no dia em que tivemos que fugir... aliás, não quero nem pensar o que seria dela se eu não estivesse por aqui. – Ele suspirou novamente.

– Tirando o fato de ser uma chaminé humana, você é um ótimo irmão e exemplo para ela, Road. – Germany sorriu fracamente.

– Não, não sou. Mas tento ser. – Ele devolveu o sorriso triste. – Só quero protegê-la, Ger... preciso protegê-la. É só pra isso que estou aqui, é só por isso que ainda não enlouqueci ou fiz algo mais imprudente...

Desde o momento em que conheceu Road Runner, aquele era o que ele aparentou mais vulnerável aos olhos da garota. A máscara carrancuda e impassível dele parecia se esvair lentamente conforme ele falava da irmã.

– Não estou discordando. – Disse a garota, após alguns segundos de silêncio. – Só estou dizendo que você também pode contar com o resto de nós para te ajudar.

– Eu sei. Obrigado. – Ele sorriu tristonho. – Sabe, no momento em que vi meus pais daquele... jeito, pensei que ficaria louco ali mesmo. Daí vi minha irmã, aterrorizada, e soube que deveria fazer alguma coisa pra tirar a gente dali antes do pior acontecer.

– Deve ter sido... horrível. – A garota arqueou as sobrancelhas, complacente, lembrando dos seus próprios momentos terríveis no seu primeiro encontro fatídico com mortos-vivos.

– Eu e a Red podemos aparentar bem para duas pessoas que... praticamente foram estraçalhadas pelos próprios pais, mas... acredite, é muito foda tudo isso. – Suspirou ele, passando os dedos pelos batidos cabelos ruivos. Aproximou-se da morena, repousando a cabeça nos braços cruzados, encostados na beirada da caçamba. – Sabe, depois daquele dia, vi minha irmã chorar só mais uma vez por causa deles. Acho que ela enclausurou a tristeza para não parecer fraca, tanto para mim quanto para vocês.

– Guardar isso para si é horrível. – Disse a garota, tentando se lembrar quando fora a última vez que chorara por Dustin... se é que havia derramado lágrimas mais de uma vez por ele. Logo se repreendeu pelo pensamento; a comparação da perda de um namorado de curta data para a dos dois pais lhe pareceu tremendamente mesquinha.

– Isso é de família. Mas sabe o pior?

– O quê?

– Eu sinto falta deles. – Ele sorriu fracamente, um brilho deprimido se depositando nos olhos verdes apagados. – Vinte e sete anos e saudades da mãe. Cômico, se não fosse trágico. – Disse ele, irônico, tentando espantar a melancolia.

– Não tem problema sentir falta dos pais... eu mesma sinto falta dos meus. – Proferiu Germany, complacente. – Estamos numa situação tão surreal, tão violenta... que esses pensamentos, de saudades, amor pela família, parecem coisas tão distantes e até... desnecessárias nessas situações, mas estão tão próximas ao mesmo tempo. Por isso, pode falar pra Red que não tem problema vocês dois ficarem tristes por causa dos pais de vocês.

O rapaz voltou a sorrir, a tristeza parecendo ter ido embora tão rápida quanto veio.

– Obrigada, Ger. Você que é um amor de pessoa. – Disse ele, levantando os olhos para olhá-la e sorrindo.

– Isso foi irônico? – Perguntou ela, estreitando os olhos e se inclinando ligeiramente para frente.

– Não. Você é mesmo uma gracinha, tanto que até te beijaria nesse momento.

A morena arregalou os olhos instantaneamente e encarou o rapaz com confusão, fazendo este rir do semblante dela.

– Mas isso não é hora. Preciso botar combustível nessa belezinha aqui. – Ele passou as mãos pela borda da caçamba, baixando os olhos para o veículo. Assim que voltou a encarar a garota, pôde ver que ela continuava visivelmente incrédula. – E, além disso, foi coisa do momento. Sou homem, sabe, tenho a tendência natural de ficar estúpido perto de garotas bonitas... só que você não faz meu tipo. Sem ofensas.

Germany franziu o cenho subitamente e chacoalhou a cabeça, como se para se livrar do susto proporcionado pela frase inesperada. O rapaz ainda sorria e havia se voltado novamente para a bomba de combustível. Sam agora voltava para perto do veículo, balançando o taco de críquete nas mãos e balbuciando algo para os jovens sobre a área ao redor do posto estar livre de zumbis.

– Não me... assusta mais desse jeito. – Disse a garota, tentando se pôr sofregamente em pé.

– Não sou tão feio assim. – Retrucou o rapaz, mecanicamente, enquanto observava os ponteiros da bomba.

– Não, mas você também não é meu tipo.

– Ah, é? E qual seria?

– Qualquer um que ainda tenha pulmões.

O rapaz lançou um olhar estreito para a garota por cima dos ombros, e ela pôs-se a rir enquanto voltava a remexer nas sacolas a seus pés.

– Conheço alguém nas redondezas que ainda tem os pulmões inteiros. – Disse Road, com um tom malicioso. – Além disso, foi o motivo real de eu não ter lascado um beijo em você.

– Muito engraçado. – Debochou a garota, revirando os olhos.

– Posso não gostar dele tanto assim, mas ele não merece ter uma competição de nível tão elevado como o meu. – O rapaz voltou a pegar a mangueira da bomba, que agora parecia funcionar novamente.

– Desculpa aí, senhor frentista.

Os dois riram juntos, enquanto o ruivo acoplava o bico de metal da mangueira no compartimento de combustível, bombeando o mesmo para o veículo, e a garota ajeitava um galão na caçamba, tentando amarrá-lo aos outros. Puderam ver Sam dando a volta na caminhonete e se posicionando não muito longe dela, com um olhar atento e o bastão de críquete empunhado com firmeza.

– Sei que você deve sentir falta do seu namorado lá, mas, sabe, devia dar uma chance pro Molotov. – Disse o ruivo, com naturalidade, recebendo como resposta um par de olhos azuis arregalados. – Não por enquanto, lógico, as coisas estão tensas demais pra sequer pensar em sex-

– Não estou pensando em nada, Road. – Interrompeu a morena, entre dentes, lançando um olhar de censura para ele e apontando Sam com a cabeça. Ela desceu rapidamente da caçamba e se posicionou ao lado do menino. – E mesmo se estivesse, não seria dessa maneira.

– Olhem! – Chamou Sam, recebendo os olhares dos dois jovens. – Molotov tinha saído para a estrada, mas voltou correndo para a loja!

– Merda, alguma coisa deve tar acontecendo. Já está terminando aqui, daí a gente volta para lá. – Disse Road apressadamente, enquanto ainda enchia o tanque do veículo, agora com visível impaciência.

Um bipe sutil chamou a atenção de Sam e Germany. Os dois se entreolharam, e o menino apanhou o walkie-talkie que ficara no bolso da sua calça jeans, percebendo que o ruído vinha dele. Uma pequena luz vermelha piscava ao lado da grossa antena do aparelho, indicando que alguém tentava se comunicar com eles. Voltaram a trocar olhares, agora mais preocupados.

– Aperta esse botão aqui. – Disse a morena, mostrando um pequeno botão preto na extremidade inferior do dispositivo. O menino assim o fez. Logo um chiado começou a ser ouvido e a voz de Red Rock foi transmitia pelo pequenos falantes.

– - Sam! Sam!

– É a Red! – Esganiçou o menino, levantando os olhos arregalados para a garota a seu lado.

– - Venham logo para cá!

– Red, o que tá acontecendo? – Perguntou Germany, se inclinando para a frente e se aproximando do walkie-talkie.

– - Rápido, eles estão chegando! Oh meu Deus...

– Red!

– Ger, olha lá! – Interrompeu o menino, apontando para o horizonte. Dali, era possível ver diversos pontos escuros, uns muito próximos dos outros, se aproximando gradativamente do mercado onde os outros três estavam.

– - Estão vindo! É uma horda, é uma merda duma horda gigantesca!


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Notas finais do capítulo

7-Eleven e Pringles não me pertencem. (:
Mais um capítulo "parado" e longo, para pura desenvoltura dos personagens e da situação... Estou começando a me entendiar comigo mesma ahahahaa
Espero que gostem, de qualquer forma; e desta vez eu garanto: no próximo capítulo nossos queridos sobreviventes vão finalmente entender o real significado do termo "apocalipse zumbi".



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