Manchas escrita por Juliiet


Capítulo 8
Capítulo 7


Notas iniciais do capítulo

Se ainda tiver algum leitor aqui, desculpe por ter sumido e ter ficado tanto tempo sem postar. Andei tendo uns problemas, mas isso não vai mais acontecer, odeio atrasar minhas histórias. Bom, era isso. Boa leitura :)



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   - Por favor, eu imploro – Luma disse com uma voz de cortar o coração, agarrando-se ao meu casaco. – Faz o Paulo ir embora, eu não quero vê-lo. Nem a ninguém. Por favor, me ajuda.

   Eu não sabia mais o que fazer, a garota estava quase se ajoelhando na minha frente e o maldito do Chermont continuava esbravejando e esmurrando a porta como se não existisse amanhã. Sério, esse menino precisa mesmo de um psiquiatra, acho que o poder lhe subiu a cabeça. Ou isso ou essa escola é do capeta e permite que os monitores abusem do poder desse jeito e tratem nós, os mortais, como bem quiserem. Mas eu não ia deixar as coisas ficarem assim. Posso não ser amiga da Luma, nem gostar dela, mas não vou deixar que um aquele idiota, a personificação do mal, fique por aí aterrorizando as meninas.

   - Fique calma – eu disse, dando batidinhas desajeitadas no ombro da Luma. – Vai ficar tudo bem, ok? Eu vou dar um sumiço nesse moleque maldito e ninguém vai saber que você está aqui, certo?

   - S-sim – gaguejou, finalmente me soltando e caindo sentada na tampa do vaso sanitário, depois olhou para mim com os olhos brilhando de lágrimas. – Você vai me ajudar? Promete?

   Patético.

   - Claro que sim – respondi com o tom de voz mais animado que consegui, que realmente não convenceria ninguém, mas, aparentemente, o atual estado mental da cidadã de cabelo rosa-chiclete não era lá muito estável.

   Ou isso ou a tintura afetou os neurônios da pobrezinha.

   O que importa é que ela fez que sim com a cabeça e se trancou no cubículo. Eu respirei fundo três vezes, com a voz daquele ogro do Paulo já me dando uma dor de cabeça. O menino estava querendo fazer o quê? Obrigar a Luma a sair ou derrubar o colégio?

   Peguei meus livros, ergui o nariz, coloquei minha expressão mais nojenta, metida e desprezível na cara e abri a porta antes que tudo aquilo desabasse e eu ficasse presa nos escombros.

   - Você tá querendo o quê, garoto?! – gritei antes mesmo que ele pudesse fazer alguma coisa. – Tá usando drogas?! Que eu saiba isso aqui é uma escola, não um campo de futebol! Vai gritar assim no inferno, cria do satã!

   Uma pequena multidão havia se aglomerado na porta do banheiro feminino para presenciar a pequena batalha que estava prestes a acontecer. Lá estava eu, com um monte de livros e a apostila assassina nas mãos, olhando furiosa para um Paulo ainda mais furioso. Ele estava todo vermelho, os lábios cheios estavam contraídos e eu podia ver uma veia saltando no pescoço dele. Podia também perceber uma fina camada de suor cobrindo aquela linda pele dourada dele. Eu mereço mesmo.

   - Você acha que pode tudo, não é? – recomecei, sem dar tempo para ele falar nada. –   Mas deixa eu te contar uma coisa. Você não pode sair por aí aterrorizando as garotas nem as ameaçando! Esse é o banheiro feminino! Ameace entrar nele de novo e eu juro que corto fora a parte da sua anatomia que te define como homem. Se é que você tem, não é?

   A multidão de olhos arregalados eu já tinha, só faltava mesmo começarem os ohs e ahs.

   - E você pensa que é quem, garotinha – Paulo rebateu, com os olhos queimando de fúria, me fazendo logo pensar naquela frase “se um olhar matasse...” – para falar comigo desse jeito? Nessa escola, você não é nada e eu posso fazer o que eu quiser. Pense muito bem antes de usar esse tom comigo de novo!

   Eu soltei uma gargalhada sem humor e disse:

   - Vem cá, e a vergonha na cara, cadê?

   - Fugiu com o seu bom senso, menina.

   - Impossível. Nunca tive bom senso. Já você devia recuperar logo a vergonha e, quem sabe, passar um óleo nessa cara de pau, que tá precisando! E não me chame de menina!

   Paulo respirou fundo e fechou os olhos por um segundo, mas isso não pareceu acalmá-lo nem um pouco. Ele ainda continuava com o olhar em chamas quando o fixou em mim. Mas eu também estava com o sangue borbulhando nas veias e louca por uma boa briga.

   - Que foi? – perguntei, com fingida inocência. – Vai dar uma de Darth Vader e me asfixiar com a força do pensamento? Perde seu tempo, querido, se eu tivesse medo de caretas, teria fugido daqui quando o vi pela primeira vez.

   - Julieta - ele disse, com os dentes cerrados. – É melhor você parar agora.

   - Ótimo, não tenho tempo para ficar gastando com você mesmo. E não precisa invadir o banheiro feminino, seu troglodita. A sua amiga biscate, como é mesmo o nome dela? Ah, Luma. Ela não está aí.

   - O quê? Você que tá usando drogas, não é? O que a Luma tem a ver com isso? E dessa vez você não escapa, vai ficar de detenção por ter ofendido uma aluna desta instituição!

   Espera um pouco aí. O quê?!

   - Você não estava procurando a Luma? – perguntei, completamente confusa.

   - É claro que não! – gritou comigo como se eu fosse uma retardada mental, o cachorro!  – Eu estou atrás de você, sua maluca! Por que eu gritaria assim com a Luma?

   Mas que palhaçada era aquela?!

   - É, não é? Por quê? – repeti, já no limite da irritação. Esses dois estão brincando comigo? – Por que gritar com aquela retardada do cabelo de sorvete de morango estragado se pode gritar com a aluna nova que não fez nada de errado? Isso é perseguição, ok? Vou te denunciar!

   - Você vai é calar a boca antes que eu faça isso por você! – gritou ele, provavelmente já cansado daquele showzinho que estávamos dando. Pegou-me pelo braço (já estou cheia de hematomas, vou no IML!) e começou a me arrastar sabe Deus para onde. – E só se eu não te conhecesse acreditaria nesse papo de “aluna nova que não faz nada de errado”. Começa a Terceira Guerra Mundial no colégio e ainda quer passar por santinha? Depois eu não tenho vergonha na cara!

   Estava tentando fazê-lo me soltar sem largar os malditos livros quando ouvi uma risada maliciosa. Olhei para trás e vi a cachorra da Luma saindo do banheiro com aquela cara de prostituta barata, sorrindo e me mandando um tchauzinho com a mão.

   - Ah, vagabunda, você tá marcada pra morrer – murmurei, ainda sendo arrastada pelo neandertal do Chermont. Onde é que fica a delegacia da mulher mais próxima, por favor?

   Paulo me levou até uma sala vazia, me jogou lá dentro como se eu fosse um saco de lixo, entrou e trancou a porta atrás de si. Depois se aproximou de mim com aquele olhar assassino que, confesso, me fez gelar, arrancou os livros das minhas mãos e os jogou no chão com violência. Pronto, eu estava ferrada. O menino era esquizofrênico.

   - Escuta bem, garota, que isso é sério – ele foi dizendo e dando passos na minha direção enquanto eu dava passos para trás, até que meu quadril bateu numa mesa e eu vi que não tinha mais saída. Ele colocou uma mão no meu ombro e com a outra segurou meu queixo com força e me obrigou a encará-lo. – Se eu souber que você andou metida com o Kimak de novo, as coisas vão ficar muito feias pro seu lado.

   Indignada com o absurdo daquele abuso de poder, do machismo e do arzinho de superioridade daquele garoto, decidi que era hora de dar um basta naquilo. Não iria mais aguentar merda nenhuma daquele porco!

   - Escuta você! – gritei, livrando-me da sua mão em meu queixo. – Eu sou dona do meu nariz e faço o que eu quero, com quem quero e quando quero. E o Gabe é mil vezes melhor companhia do que você. Sério, o que se passa na sua cabecinha estreita? Por que você me marcou? O que está querendo de mim?

   Ele me largou e se afastou, apertando os punhos com força, um gesto que eu reconhecia como frustração. Depois me olhou com uma expressão atormentada e disse:

   - Não sei. Juro que não sei.

   Fiquei quieta, com a respiração acelerada como se tivesse corrido uma maratona. Não sabia como interpretar aquilo. Mas isso era tudo culpa minha mesmo, quem manda tentar fazer o bem, ajudar os outros? A vadia da Luma devia saber que o Paulo estava atrás de mim, aproveitou que nos encontramos no banheiro e fez todo aquele teatrinho.  Bandida!

   - Não importa o que você pensa de mim, Julieta - Paulo disse, aproximando-se de novo, mas não tão ameaçadoramente como da primeira vez. - Gabriel Kimak é o pior tipo de delinquente e eu não quero você perto dele. É perigoso. Por favor, me escute dessa vez.

   - Você não manda na minha vida, não tem o direito de escolher minhas amizades.

   - Tentei fazer isso do modo fácil, mas não existe modo fácil com você, não é?

   - Se para você, modo fácil é quase colocar o banheiro feminino abaixo, depois gritar comigo como se nós estivéssemos no meio de uma feira - eu propositalmente esqueci de mencionar que o barraco quem começou fui eu, não se pode ser perfeita, sinto muito - e depois me arrastar por aí como se eu fosse um trapo velho, só para chegar aqui e querer escolher as pessoas com quem devo ou não interagir...é, se esse é o modo fácil, não existe comigo.

   - Estou fazendo isso pelo seu bem, garota!

   - E eu pedi para você se preocupar comigo? Não lembro! A única coisa que eu quero de você é que fique longe!

   - Pois isso não vai acontecer!

   - Só porque você quer!

   - Exatamente!

   Estávamos os dois aos berros, parecendo dois foragidos do hospício. Não me surpreenderia muito se alguém aparecesse ali perguntando quem estava torturando a gente, só para se ter uma ideia do nível que Paulo e eu havíamos alcançado. Estávamos ambos com a respiração irregular, os rostos vermelhos e as expressões fechadas.   Realmente senti que estava no meio de uma guerra.

   - Então é isso - eu disse, baixando o tom de voz, mas aumentando o nível de sarcasmo. - Você finalmente admitiu que é um déspota maldito ou eu entendi mal? Vai fazer as coisas do jeito que quer e os outros podem se ferrar, é isso? Que coisa divertida! E qual vai ser sua próxima exigência? Que eu faça seu dever de casa? Que eu lave sua roupa? O quê?

   - Você ainda vai me agradecer por te manter longe das mãos daquele marginal.

   - Você não é meu pai, sabia?

   - Agradeço a Deus pelas pequenas bênçãos.

   - Engraçadinho. Me conta, quando foi que você fugiu do circo?

   - Julieta, não quero mais brigar - ele disse com um suspiro, levantando a mão para tocar meu rosto, apenas para me fazer empurrá-lo. Ele suspirou de novo, mas não insistiu em me tocar. - Você é uma menina muito vulnerável, precisa de proteção.

   Ri. Muito. E dessa vez não foi uma risada sem humor, não. Eu estava realmente achando muita graça naquela situação. Vulnerável e eu? Numa mesma frase? Han?   Paulo só me olhava como se eu tivesse perdido o último resquício de sanidade mental e esperava minha crise de riso passar.

   - Eu já sei o que está acontecendo - disse, depois de respirar fundo algumas vezes para tentar controlar o riso. - É você e essa sua Síndrome do Cavalheiro Inglês do Século XIX que escolheram a garota errada. Isso não vai funcionar comigo, nem precisa se dar ao trabalho de tentar.

   Aparentemente essa última piadinha transbordou o copo, que já estava cheio. Eu nunca seria capaz de prever a reação do Chermont. Ele voou para cima de mim como se estivesse pronto para me jogar da janela ou me atravessar com uma espada ou...sei lá, nenhuma das opções era realmente agradável. E a próxima coisa de que eu tive consciência era que estava tombada em cima da mesa com um gigante de uns 90 quilos de puro músculo em cima de mim. Não é o tipo de coisa de que uma garota saudável de 16 anos deva reclamar. Exceto que o gigante em questão não era minha pessoa preferida, especialmente nesses últimos minutos. E sou capaz de apostar qualquer coisa como ele também não estava muito satisfeito comigo naquele exato momento. Então é óbvio que tentei me libertar, gritando e esperneando como uma criança, mas isso foi tolo e completamente em vão. De fato, só fez tornar pior o que já era ruim. Paulo usou uma das suas grandes mãos para segurar meus cabelos com força até o ponto dos meus olhos ficarem marejados de lágrimas com a dor.

   - Eu não queria que fosse desse jeito - ele disse, os dentes trincados de raiva. - Mas você não me deixa escolha.

   - Me solta agora! - gritei, as lágrimas escorrendo pelo meu rosto nem eram de dor, uma vez que Paulo percebeu que estava me machucando e afrouxou o aperto. Eram de humilhação mesmo.

   - Não até você me ouvir. Eu mando e desmando nesse colégio e ninguém questiona a minha autoridade. Eu posso fazer o que quiser e eu juro que, se eu ouvir que você está se associando com um tipo como o Kimak, eu te faço ser expulsa da escola.

   - Não me importo!

   - Ótimo. Eu o faço ser expulso da escola, então.

   - Você é um idiota!

   - Que seja, mas você vai fazer do jeito que eu disse. Vai ficar longe dele. Mesmo que você não queira, Julieta, não vou deixar ele chegar perto de você. Não vou permitir que ele te faça mal. Mesmo que você me odeie por isso.

   - Tarde demais, seu vômito de cachorro bêbado. Eu já odeio.

   Paulo suspirou e saiu de cima de mim. Eu continuei lá, parada e assustada, com o rosto molhado de lágrimas e os olhos fixados em algum ponto do teto.

   - Sinto muito - o ouvi dizer - que as coisas precisem ser assim.

   Então ele caminhou para a porta e a abriu, mas antes de sair ainda disse:

   - Espero que você não esqueça o que eu disse. E lembre-se de me encontrar na porta do seu dormitório uma hora antes do jantar. Eu não esqueci aquela detenção.

   Ele saiu e fechou a porta, só então eu me recompus.

   - Sádico - gritei para o vazio.

   Levantei-me e ajeitei meu uniforme e o cabelo. Paulo era tão ingênuo, coitado. Como se umas ameaças assim fossem me impedir de fazer o que eu quisesse. Nem tinha estado tão empolgada com o Gabe depois de nossa conversa no almoço. No geral, tinha gostado de estar com ele, mas não era nada incrível ou coisa assim.

   Mas isso tinha acabado de mudar.

   Antes, porém, de por meu planos em prática, eu tinha aquela maldita reunião com a coordenadora. E depois eu tinha uma vadia para exterminar. Luma não ia durar muito.   Depois eu cuidaria do Paulo e daquela megalomania dele.

   Mesmo assim, eu ainda estava confusa. Apesar das coisas que o Chermont tinha acabado de dizer e fazer, eu não tinha certeza se o odiava ou não.

   Acho que o Kimak estava certo. Eu devo odiá-lo.


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Notas finais do capítulo

Sim, se ainda tiver alguém acompanhando essa história, gostaria de dizer que eu vou postar uma vez por semana por agora, já que minhas provas vão começar e eu vou precisar estudar. Que dia é melhor pra vocês? Beijos e obrigada :)



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