Manchas escrita por Juliiet


Capítulo 25
Capítulo 24


Notas iniciais do capítulo

Como prometido, aqui está o capítulo :)))
Dedico ele à Marina, pela recomendação lindaa que ela fez pra história *.*
Leiam as notas finais, por favor!
Boa leitura.



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   A semana foi estranha e tranquila ao mesmo tempo. Sem a detenção, eu tinha mais tempo livre e, com a semana de provas se aproximando, Gabe e eu usamos esse tempo para estudar no meu – nosso? – pequeno chalé no meio daquele matagal que as pessoas ainda insistiam em chamar de bosque. Era mais calmo e silencioso lá, o melhor lugar para se concentrar.

   A parte estranha era que – como era de se esperar – todo mundo ficou sabendo que o Chermont tinha sido suspenso de suas atividades como monitor, mas ninguém sabia por que. Meio como da vez em que eu fui sentenciada a um mês de detenção sem que ninguém soubesse o motivo. E, de algum modo, Chermont convenceu seu irmão a fechar o bico sobre toda aquela história do nosso namoro. Nossa, só pensar nisso era esquisito.

   Eu estava tentando prestar atenção na aula de História naquela sexta feira chuvosa, mas tudo em que meu cérebro parecia concentrado era na fome desmedida que eu estava sentindo. Eu acordei tarde depois de estudar boa parte da noite e acabei perdendo o café da manhã, e ainda faltavam dois períodos até o almoço. Tombei a cabeça na mesa, fechando os olhos e imaginando uma linda e gordurosa fatia de pizza.

   – Agora eu vou entregar umas fichas de exercício para vocês revisarem a matéria da prova de semana que vem – o professor disse, provavelmente remexendo nos seus papéis bagunçados na mesa. – Ah, esses aqui são os do terceiro ano, esqueci o de vocês na sala dos professores...Srta. Vaughan?

   Praguejando mentalmente, levantei a cabeça.

   – A senhorita pode fazer o favor de ir buscar as fichas na sala dos professores? – perguntou ele com aquele tom de “você não tem escolha” que os professores adoravam usar comigo.

   – Claro – respondi com todo o sarcasmo que consegui reunir, mas levantei para ir mesmo assim. Meu horário livre já era todo usado para estudar, eu não queria voltar pra detenção.

   Logo que cheguei aqui, eu não me importei muito com as aulas e os estudos. Eu não me importava com isso nas outras escolas e achei que aqui seria a mesma coisa. E realmente não sei o que aconteceu, mas quando a febre de tensão pré semana de prova começou, eu me vi contagiada por ela também. Até Gabe que normalmente parecia calmo e tranquilo sobre tudo, estava estressado com isso. Então foi natural para mim. Antes que eu percebesse, estava prestando mais atenção nas aulas e folheando meus livros-texto no quarto, antes de dormir. Eu estava um pouco atrás nas aulas em relação aos outros estudantes, então precisava me esforçar mais ainda. E, quer saber? Era bom ter algo para ocupar a mente e um objetivo a cumprir. Deixava-me cansada demais para pensar em coisas inutéis.

   Andei pelo corredor vazio e desci as escadas para ir à sala dos professores, porém, assim que pisei no último degrau, alguém agarrou meu braço e me puxou para um canto meio isolado ali do lado da escada. Era onde ficava uma das grandes janelas do corredor, mas elas eram para fora e, com a escada ali do lado, ficava um espaço pequeno e escondido, perfeito para encontros clandestinos.

   E por isso eu fiquei meio desconfiada ao olhar para o Chermont.

   – O que diabos você quer? – perguntei, soltando-me dele.

   – Falar com você – respondeu, olhando para os lados para ver se não tinha mesmo ninguém ali perto. – É importante.

   Rolei os olhos e comecei a bater o pé impacientemente no chão.

   – Você tem noção de que nós não estamos namorando de verdade, não é? – perguntei debochadamente. – Oh, querido, não diga que você deixou essa fantasia subir à sua cabeça?

   Ele riu sem humor.

   – Você é hilária – disse e se encostou na parede de pedra. – Agora é sério. As coisas se complicaram um pouco.

   – Complicaram? – ecoei, encostando-me na outra parede em frente a ele, tentando me afastar o máximo que conseguia, embora o espaço entre nós fosse pequeno.

   Ele fechou os olhos e respirou fundo, depois os abriu, me olhou e disse:

   – Mamãe quer que você vá passar esse final de semana lá em casa.

   Tempo para absorver a frase.

   – O QUÊ?!

   – Shiu! Fala mais baixo! – censurou ele, se aproximando e colocando a mão na minha boca. – Não é você que queria manter nosso namoro em segredo?

   Um ofego de surpresa – que não veio nem de mim e nem dele, claro – nos fez pular de susto. Olhamos para o lado e nos deparamos com uma menina baixinha e de cabelos pretos nos encarando, parada no meio da escada – o único lugar de onde dava para nos ver perfeitamente.

   Que merda.

   – Maya, isso não é o que você está pensando – Paulo começou, mais uma vez, com a triste frase clichê.

   Ele não tinha outra no repertório?

   E para piorar tudo, eu tinha acabado de reconhecer a garota, depois que Paulo disse o nome dela. Era a Maya Sabe-se Lá Qual Seu Sobrenome, que estava na turma de História comigo e...era amiga de Luma e Willa.

   Simplesmente perfeito.

   – Ahn...não, Paulo, eu não estou pensando nada, sério... – ela começou, começando a ficar meio corada. – Eu só vim até aqui porque o professor pediu para ver porque a Vaughan estava demorando tanto... – aí ela olhou para mim, ainda parecendo envergonhada. – Eu vou dizer que você já está indo, ok? Bom, eu já vou. Desculpem ter interrompido...

   E então a garota saiu correndo escada acima.

   – Ótimo – soltei. – Perfeito.

   Paulo passou a mão pelo cabelo e depois a deixou sobre os olhos.

   – Calma, talvez ela não fale nada pra ninguém...

   – É, e talvez, quando eu atirar você dessa janela, você voe.

   – Julieta, presta atenção – ele disse devagar, ignorando minha ameaça. – Não vamos nos preocupar com o que ainda não aconteceu. Eu vou tentar falar com ela no intervalo...

   – Até lá todo mundo já vai estar sabendo – interrompi.

   – ...e tentar fazer ela ficar calada por um tempo – continuou ele, como se eu não tivesse dito nada. – Agora o que eu preciso é que você diga que vai pra minha casa nesse final de semana.

   – Mas eu não vou – eu nem podia começar a pensar no quanto aquilo era absurdo.

   – Você tem que ir – ele insistiu, parecendo realmente preocupado. – Minha mãe resolveu que quer conhecer você melhor e quer que eu a apresente formalmente para toda a família.

   – Mas nós temos provas semana que vem! – eu tentei encontrar uma desculpa. – Eu preciso estudar!

   Ele se aproximou e me segurou pelos ombros, olhando fundo nos meus olhos.

   – Julieta, isso é importante para ela. – disse. – Eu não quero decepcioná-la. Você precisa ir.

   Ok, bom senso, cadê você? Com aqueles olhos verdes úmidos e aquela vontade tão bonita de agradar a mãe e ser um bom filho, o garoto ia simplesmente me convencer a fazer uma loucura.

   Certo, não tinha como ser tão ruim, não é? Quer dizer, o que poderia acontecer?

   – Tá bom, eu vou – suspirei e o empurrei. – Agora eu tenho que ir pegar umas fichas na sala dos professores. Tchau – e saí de lá o mais rápido que pude, sem olhar de novo para os olhos daquele garoto.

   Eles estavam me afetando. Muito.

   Peguei as fichas e corri de volta para a sala, onde escutei um sermão do professor por demorar tanto. Mas desliguei minha mente e, em vez disso, me concentrei em lançar um olhar bem ameaçador para Maya, que, talvez por ser quase uma anã, estava sentada numa carteira bem na frente.

   Ela parecia meio intimidada, mas eu não sabia dizer bem, talvez os olhos dela fossem apenas muito grandes para o rosto.

   Depois que o professor terminou de brigar comigo, voltei para a minha carteira no fundão e tentei lembrar da minha fome.

   Mas até ela tinha desaparecido.

   Eu tinha a impressão de que tinha acabado fazer uma grande besteira.

...

   As aulas haviam acabado há uma hora e, até esse momento, parecia que ninguém estava sabendo que Chermont e eu estávamos namorando. Se Paulo conseguiu falar com Maya ou se o silêncio dela foi obra do meu olhar super intimidador, eu nunca saberia. Mas, aparentemente, a garota ficou calada.

   Antes de saber que teria que passar o final de semana na casa do Chermont, eu tinha combinado de passá-lo na casa do Gabe, como sempre. Íamos revisar algumas matérias juntos e ele ia me ajudar com Matemática, que era, de longe, minha pior matéria. Mas eu não tive coragem de falar com ele pessoalmente que não poderia ir. Do jeito que as coisas foram no fatídico dia da família, ao que parecia meu rosto era um outdoor com todos os meus pensamentos brilhando em neon. Então mandei uma mensagem dizendo que meu pai havia mandado me buscar na escola para passar o final de semana em casa. Ele acreditou e me mandou uma mensagem de volta dizendo que ia ser solitário sem mim e me desejando boa sorte.

   Sim, eu era uma vadia por mentir para ele. Eu tinha consciência disso.

   Pela primeira vez eu agradecia pela chuva forte que caía, porque fez o céu escurecer mais rápido e, com roupas pesadas, capa de chuva e sombrinha, eu estava meio irreconhecível à distância, se Gabe por acaso estivesse numa janela, olhando a garota que estava entrando no carro do Chermont com uma mochila.

   É, eu estava realmente indo para a casa do Chermont.

   Um raio realmente seria bem vindo se quisesse cair na minha cabeça naquele momento.

   – Por que a esquisita vai na frente? – perguntou Victor, emburrado, entrando no banco de trás.

   – Porque os animais tem que ir no banco de trás – eu respondi antes que Paulo dissesse qualquer coisa.

   Aquele garoto era um pesadelo! Como o Chermont conseguia conviver com ele? Até sua irmãzinha capeta era menos intragável. Eu não sei se aguentaria o moleque preso num carro comigo até chegarmos à casa deles.

   – Vocês dois – Paulo falou, calando Victor, que tinha começado a retrucar. – Sem discussões dentro do meu carro. Victor, se você tem um problema com a Julieta, sabe muito bem que pode pegar o trem.

   O Chermont mais novo cruzou os braços no peito e se jogou contra o banco como um menininho mimado.

   – Está chovendo demais – respondeu ele, irritado. – Agora que você tem uma namoradinha, tanto faz se seu irmão, sangue do seu sangue, pegar uma gripe, né?

   Drama queen.

   – Não exagera, Victor... – Paulo disse, balançando a cabeça em negação enquanto dava a partida no carro e nos tirava de lá.

   Seguimos em silêncio e eu estava muito desconfortável, sentindo o olhar do garoto ao meu lado desviar da estrada algumas vezes e parar em mim. Mas eu abracei minhas pernas e fiquei brincando de competição de gotas no vidro da janela. Victor estava largado lá atrás, mexendo no celular e, na rádio, estava tocando uma música do The Cranberries chamada Linger.

   Eu mexia os lábios com a letra da música, cantando silenciosamente, com a bochecha apoiada no joelho.

   Ponto para o Chermont, ele não reclamou por eu estar com os pés no banco.

   A viagem não demorou muito, mas o tempo estava tão melancólico que eu acabei ficando sonolenta e lutei para não adormecer. Eles moravam na mesma cidade em que fui com Gabe fazer compras e ir ao cinema, onde encontramos a mãe do cara que, para todos os efeitos, era meu namorado.

   E ela tinha me visto com outro no cinema naquele dia. Oh, droga.

   E eu ainda tinha sido super grosseira com ela, fugindo daquele jeito.

   Eu nem tinha me lembrado disso até aquele momento. Como eu consigo me meter nessas situações? São tão trágicas que chega a ser ridículo.

   Quando chegamos, a chuva havia finalmente parado e Paulo estacionou na frente de uma bonita casa de dois andares. Parecia espaçosa, mas não era gigante. Era bem feita toda em madeira, pedra e vidro. Tinha um bonito jardim na frente onde havia uma grande árvore com um balanço para dois pendurado num dos galhos nus.

   Parecia confortável e aconchegante, mas não deixava de ter estilo. À primeira vista, eu poderia dizer que os moradores daquele lugar eram felizes. Mesmo com as árvores sem folhas e o céu escuro atrás, era exatamente como uma casa deveria ser.

   Victor saiu logo do carro, batendo a porta com força, e entrou na casa na frente, sem falar nada. Ao que parecia, ele ainda estava aborrecido com Paulo por ter sido relegado ao banco de trás.

   Pirralho.

   Peguei minha mochila e desci do carro, batendo a porta com cuidado e não conseguindo me impedir de olhar tudo ao redor.

   – Acho que nem preciso te lembrar que você precisa agir como minha namorada, não é? – Paulo perguntou, chegando perto de mim e passando o braço por meus ombros.

   Minha vontade era afastá-lo imediatamente, mas eu me controlei. Se íamos fazer o papel de pombinhos apaixonados naquele maldito fim de semana, íamos ter que ficar juntos, nos abraçar e nos tocar.

   Deus, ia ser um pesadelo. Onde eu estava com a cabeça quando aceitei vir?

   – Não se preocupe – eu disse com sarcasmo, mas segurei sua mão que estava no meu ombro, fazendo-o me lançar um olhar surpreso. – Eu posso ser encantadora quando quero.

   Ele riu e apertou minha mão de volta.

   – Tenho minhas dúvidas...

Rolei os olhos e o acompanhei em direção à porta da frente.

   – Babaca – murmurei sob o fôlego.

   – Amor, eu adoro quando você me elogia...

   Rindo, entramos na casa. A porta da frente dava para a sala de estar, que era decorada com móveis escuros e de aparência confortável, e paredes claras. Eu pude ver que algumas coisas ali eram antiguidades, como a cristaleira e o carrinho de jardim que era usado como mesinha. Era um lugar que faria qualquer pessoa se sentir bem.

   – Chegamos! – Paulo gritou, jogando as chaves do carro em cima do balcão ao lado da porta.

   – Estou na cozinha, venham aqui, crianças – uma voz masculina soou vinda do corredor à esquerda da sala.

   Paulo apertou minha mão com um pouco mais de força, como se soubesse que eu estava nervosa, e me guiou até a cozinha.

   Quem nos recebeu lá foi um homem alto e meio corpulento, muito loiro e com um sorriso largo no rosto.

   – Então essa é a famosa Julieta? – perguntou, se adiantando para apertar minha mão. Mas aí ele parou e me olhou com atenção, quase curiosidade.

   – Julieta, esse é Roger, meu padrasto – Paulo disse enquanto eu apertava a mão do sujeito. – E sim, Roger, essa é a famosa Julieta. Minha namorada.

   – É possível que eu já a tenha visto antes? – Roger perguntou depois de soltar minha mão. – Seu rosto não me é estranho...

   Dei de ombros.

   – Acho que não – respondi, tentando soar simpática. – Não estou na Werburgh há muito tempo.

   Ele assentiu, mas continuou me olhando como se eu fosse um objeto muito interessante. Aquilo era meio enervante.

   – Bom, sua mãe foi ao supermercado com Mari para comprar confeito de chocolate para o bolo – o cara loiro disse ao Paulo. – E me deixou aqui para tentar decifrar como terminar esse jantar. Por que vocês não vão trocar de roupa e depois descem para me ajudar?

   – Claro – Paulo respondeu, sorrindo. – Vamos, Julieta, é por aqui.

   Eu sorri e acenei para Roger antes do garoto me puxar para fora dali, em direção à escada que levava aos quartos. Fomos até o fim do corredor e ele abriu a porta do quarto para mim, fechando-a quando entramos.

   Era um quarto bem maior do que o que ele tinha na escola, e bem mais bagunçado. A cama de casal estava cheia com roupas e livros, e os lençóis estavam amarrotados. A porta do armário estava aberta e eu podia ver que suas gavetas também estavam bagunçadas. Tinham alguns livros da escola até no chão.

   – Um furacão passou por aqui? – perguntei, divertida ao ver Chermont corar.

   – Err...foi provavelmente a Mari – ele disse, tentando culpar a irmã.

   – Sei.

   Comecei a andar pelo quarto e olhar para as coisas dele. Paulo tinha uma grande coleção de quadrinhos da Marvel e da DC Comics, coisa que me pegou de surpresa. Ele não era parecia do tipo nerd que lia quadrinhos, mas eu meio que gostei de conhecer esse lado dele. Vi uma raquete de tênis encostada na parede e, em cima da mesa de cabeceira ao lado da cama, ele tinha um pequeno cacto.

   – Que bonitinho – eu zombei. – Ele tem uma plantinha.

   – Não enche – Paulo disse, ainda parado perto da porta, vendo-me explorar o quarto dele.

   Sentei-me na beira da cama, numa parte que estava livre de roupas e livros da escola.

   – Então é aqui que toda a ação acontece? – não consegui me impedir de perguntar com um ar malicioso.

   Ele soltou uma gargalhada.

   – Ah, claro – disse.

   Eu lancei um olhar malvado para ele.

   – Você tem cara de quem guarda camisinhas na gaveta do criado mudo, só no caso de alguma eventualidade. Devo conferir? – e dizendo isso, abri a primeira gaveta do mesinha onde estava o cacto.

   – NÃO!

   Paulo correu até mim no momento em que abri a gaveta, mas era tarde demais. Eu já a havia aberto e estava olhando seu conteúdo.

   Não achei camisinha nenhuma.

   No lugar disso, em cima de uma agenda, uma câmera e alguns papéis, tinha uma foto.

   Uma dessas que você bate para colocar na carteira de motorista, só que ampliada.

   Era uma garota.

   Uma garota que eu conhecia.

   – Ah droga – Paulo soltou quando viu que eu me inclinava para pegar a foto. – Eu posso explicar.

   Ele não tentou tirá-la de mim, acho que pensou que era tarde demais.

   Eu continuava olhando a foto, hipnotizada, e apenas com metade da minha mente, eu pude ouvir minha própria voz dizer, numa voz estranhamente calma:

   – Então explique.

   Paulo passou a mão pelos cabelos diversas vezes, parecendo nervoso e frustrado, até que resolveu sentar numa poltrona que havia perto da cama, ficando de frente para mim, que continuava sentada.

   – Roger, meu padrasto que você acabou de conhecer, é investigador de polícia – ele começou. – E, há alguns anos, um amigo dele de outro distrito pediu para ele examinar um caso, como ele faz de vez em quando. Um dia, ele esqueceu no carro a pasta com os detalhes do caso, as informações, as fotos da cena do crime e essas coisas, e me pediu para pegar. Eu entreguei e, quando saí do escritório, vi que tinha deixado uma foto cair. Era essa.

   Ele agora tinha minha atenção. Eu ainda segurava a foto com dedos trêmulos, mas meus olhos se voltaram para ele.

   – Eu era jovem, Julieta – ele continuou. – Mais jovem, quer dizer. E estava meio decepcionado com o relacionamento que tinha na época. Esses olhos me atraíram. O rosto me atraiu. Eu guardei a foto e, às vezes, ficava horas deitado nessa cama, olhando-a. Memorizando cada detalhe. Acho que foi assim que me apaixonei por você.

   Ah, agora fazia sentido. Não, na verdade não fazia. Mas pelo menos agora eu entendia.

   – Meu padrasto descobriu que eu havia ficado com a foto e me disse para não perder meu tempo – a voz dele agora era meio triste. – Disse que a garota estava morta. Por isso foi um choque quando te vi pela primeira vez no colégio. Acho que ele deve ter se enganado ou coisa assim. Você está bem viva. Está muito diferente, mas era muito mais nova quando tirou essa foto, certo? Os olhos são exatamente os mesmos.

   Eu me levantei e andei para longe dele, para a janela. Fiquei de costas para ele enquanto via a árvore do jardim de sua casa com o balanço se movendo suavemente com o vento.

   – Não sou eu nesta foto – eu disse, ainda com aquela voz quase sinistra de tão composta. – É minha irmã.

   Eu o ouvi se levantar também.

   – Bianca? – sua voz era mais que surpresa.

   Virei-me para ele e olhei fixamente em seus olhos.

   – Não – respondi. – A garota nesta foto está mesmo morta. É minha outra irmã. Sofia.

   Eu podia ver seu rosto passar de surpreso para confuso. É claro que ele não sabia que eu tinha outra irmã, eu nunca contei. Eu tentava ao máximo não falar dela, ainda que não houvesse um dia em que eu não pensasse nela.

   Ela estava sempre nos meus pensamentos, lembrando-me do que eu fizera, lembrando-me de que eu era a pior pessoa do mundo.

   Lembrando-me que eu nunca poderia me perdoar.

   – Eu não sabia que você tinha outra irmã... – Paulo disse, se aproximando. – Ela está mesmo morta? E-eu sinto muito...eu não sabia. Como aconteceu?

   – Eu a matei.


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Notas finais do capítulo

Então, não me matem por causa desse final, ok?
Certo, o que eu quero falar é que o próximo capítulo vai demorar um pouquinho pra sair, porque eu vou me focar em finalizar minha outra história, O Amor É Clichê, que já está nos últimos capítulos. Espero que entendam. Mas não vou ficar taaaanto tempo longe, não vou colocar a história em hiatus.
Espero mesmo que entendam e que tenham gostado do capítulo.
Deixem reviews! Beijos :*