Manchas escrita por Juliiet


Capítulo 15
Capítulo 14


Notas iniciais do capítulo

Oi, fantasmas do além. Duvido muito que alguém ainda esteja aqui lendo essa história depois de eu ter passado mais de 3 meses sem atualizar. Caso ainda tenha, eu só posso pedir desculpas e culpar o diabo do bloqueio criativo que me inativou pra essa história. Eu finalmente consegui me livrar (eu acho) depois de reescrever esse cap umas mil vezes. Ficou meio chato, mas eu precisava dele. Se alguém comentar dizendo que ainda quer ler essa história, eu tento escrever o próximo. É só.



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– Devolve! Devolve! – ela gritou, a voz dilacerada, as mãos percorrendo os cabelos negros com tanta agressividade que era como se estivesse tentando arrancar os fios da cabeça.

Eu a ignorei e liguei o triturador de lixo. O som alto e ruidoso da máquina preencheu o lugar e abafou o grito estrangulado dela:

– Por quê?! Por que você fez isso?!

A raiva pura, o ódio quente fluíam em meu sangue, fervendo e ardendo, transformando-se em dor. Dor fina, aguda, que crescia em espiral e se grudava em minha pele como uma camada de suor. A dor e o ódio eram tão intensos que nublavam meus olhos e mente, escureciam meu coração, apertavam-no como um punho de aço escaldante. Prejudicavam meu discernimento até o ponto em que eu só enxergava o que queria ver. E era ela que estava ali, atormentando-me, puxando-me para fora da linha fina da civilidade.

– Cala essa boca, sua vadia inútil! – as palavras rasgaram minha garganta, impregnadas do ódio profundo e fluido que corria por minhas veias e envenenava meu coração. – Por que você não desaparece?! Você não é ninguém para mim, para nós, sua parasita maldita! Por que você não morre?

As palavras ecoaram, vermelhas e densas, maculando o branco das paredes como se tivessem sido escritas com sangue. Olhos azuis me encaravam, tão familiares para mim quanto os meus. Eram os meus. Tornando-se mais cinzentos à medida em que meu ódio se espalhava por eles, moldando-os, virando parte deles.

Ódio escuro e irracional. Úmido e quente como um beijo. Doloroso como sal em uma ferida.

Um último lampejo de claridade iluminou minha mente, permitiu-a respirar e fugir da escuridão por um segundo. Percebi que não era ela que eu vira momentos antes, minhas palavras cruéis haviam atingido a pessoa errada.

Por que você não morre?

E meu próprio rosto se virou para mim, os olhos escurecidos, quase...sem alma. Senti como se um dedo gelado deslizasse por minha espinha quando vi o brilho trêmulo em suas mãos.

A lâmina era comprida e fina, fria ao toque como um mau presságio. Tão inofensiva quando guardada na gaveta do balcão. Tão mortal e assustadora naquelas mãos brancas e frágeis, porém determinadas.

– Por que você não morre, Julieta?

Eu expirei pelo nariz e boca com força. Em seguida puxei tanto ar para dentro dos pulmões que fiquei tonta. A grande camisa de flanela que eu estava usando agarrava-se às minhas costas, empapando-as de suor. O calor era sufocante, mas quando eu afastei as cobertas, o frio do quarto me atingiu. Senti um alívio imediato e meus pés oscilaram para fora da cama até tocar lentamente o chão gelado. Minhas pernas tremiam.

Foi só um pesadelo, Julieta.

Um maldito pesadelo.

Estava escuro, escuro mesmo. Nem um fiapo de luz se esgueirava através das cortinas. Ainda deviam faltar umas três horas para o amanhecer. Precisei ficar vários minutos sentada na cama, de olhos arregalados, até finalmente conseguir vencer a escuridão sufocante e conseguir enxergar o contorno dos móveis e dos corpos das duas garotas que ressonavam tranquilamente em suas camas.

Não sei quanto tempo fiquei ali sentada, ajustando meus olhos ao breu e reaprendendo a respirar, mas quando finalmente me ergui, o pior da tremedeira em minhas pernas havia passado e o suor havia secado frio em minha pele, como um gel desconfortável que coçava e pinicava.

Fui me arrastando com passadas inconscientemente pesadas, meus pés insensíveis no chão frio. Passei pelas camas de Luma e Willa, imperturbáveis em seu sono, e alcancei a porta, abrindo-a sem ruído. O piso acarpetado do corredor era morno e áspero sob meus pés descalços, devolvendo a eles parte da sensibilidade e abafando meus passos na escuridão. O silêncio só era quebrado por ruídos de pele raspando em lençóis, respirações cadenciadas e alguns roncos vindos de dentro das portas fechadas. Além disso, no meio da noite, o prédio antigo do dormitório feminino da Werburgh ganhava vida, estalando, rangendo e gemendo. As paredes pareciam respirar, suspirar.

Cheguei ao banheiro, que foi imediatamente iluminado pela luz insensível e clínica da lâmpada branca, e o azulejo frio do chão trouxe arrepios até a parte de trás do meu pescoço. Fui até a pia e abri uma das torneiras, enfiando meus pulsos sob o jato de água gelada. Fiquei assim por quase um minuto e joguei um pouco de água na nuca antes de fechar a torneira.

Levantei os olhos e fitei meu temido reflexo no espelho. Aquele rosto que podia me causar tanto medo e aversão estava agora inexpressivo. Gotas de suor haviam se formado em minha testa e as marcas das lágrimas que eu não percebera ter derramado ainda eram visíveis em minhas bochechas. Minha boca era uma linha fina de lábios descorados e minhas olheiras eram manchas fundas e arroxeadas embaixo dos meus olhos nublados. Minha pele parecia macilenta e esverdeada, doente. Meu rosto magro demais, os ossos se destacando, como se esticassem minha pele, e fios emaranhados de cabelo negro emolduravam tudo, dando-me um aspecto quase macabro. A camisa cinza que eu vestia era grande demais, chegando até meus joelhos, e a gola larga escorregara para o lado esquerdo, expondo meu ombro nu.

Lentamente, levei a mão direita à pele exposta do meu ombro, afastando mais a camisa até que meu braço ficasse descoberto até o cotovelo.

Estava lá. A cicatriz ainda meio rosada que interrompia a palidez constante da minha pele. Ela se destacava, fina e longa, e eu podia senti-la ao passar os dedos sobre ela, como se tivesse saltado para fora da minha pele. Apertei-a e raspei minhas unhas sobre a cicatriz até pequenos pontos de sangue surgirem sob a camada mais fina e superficial da minha pele. A dor, porém, não me atingiu, como se eu fosse imune a ela, como se estivesse entorpecida.

O frio, no entanto, era um manto denso em meu corpo, e o barulho dos meus dentes batendo preencheu o ambiente. Desviei o olhar da cicatriz em meu braço e voltei a encarar meus próprios olhos no espelho. Sentia-me tonta. Aqueles olhos eram tão cinzentos, frios, inexpressivos...

Sem alma.

Corri até uma cabine individual, empurrei a porta, caí de joelhos na frente do vaso sanitário e vomitei. Os impulsos involuntários só se acalmaram depois que expeli até a bile. Levantei-me trêmula, e puxei a descarga. Havia voltado a suar, embora sentisse ainda mais frio que antes. Reparei que as pontas dos meus cabelos estavam um pouco sujas e me senti enjoada de novo. Peguei uma toalha branca na pilha que havia no armário embutido na parede e pendurei-a ao lado do chuveiro. Despi-me, largando minhas roupas no chão, e liguei o chuveiro.

– Merda! – praguejei. O primeiro jato d’água que me atingiu foi gelado, mas eu me obriguei a ficar parada, congelando embaixo dele, a água glacial arrancando-me do meu torpor. Gradativamente, a temperatura foi crescendo até eu estar envolta por uma capa de água deliciosamente quente. Os arranhões que eu mesma fiz na pele da minha cicatriz finalmente começaram a arder, fazendo-me sentir como se estivesse sendo picada por minúsculas agulhas. A dor era...certa e eu dei as boas vindas a ela. Sentir era bom. Significava que eu estava viva. Mas...

Por que você não morre, Julieta?

De fato, por quê?




A pequena e bucólica St. Werburgh já estava me abrigando há quase um mês. Era estranho como as coisas por aqui se ajeitaram. Não haviam ficado certas, nada disso. Só pareciam mais naturais, como se eu tivesse sido acordada pelos sinos da igreja às seis da manhã durante toda a minha vida, por exemplo. Eu continuava sendo a fofoca da cidade mesmo depois de todo esse tempo e era hostilizada pela maioria da população estudantil, principalmente por Luma Britto, minha estimada colega de quarto, que me tratava como se eu fosse a ameaça número um da escola, especialmente depois que pegou o monitorzinho fascista e eu voltando juntos para a Werburh no carro dele, depois de mais uma rodada daquela discussão sem sentido em que ele mandava eu me afastar do Gabe e eu mandava ele cuidar da sua vida.

Naquele dia em que voltei para a escola com o Chermont – depois da primeira noite que passei no apartamento do Gabe – Luma apareceu e começou a ter um ataque por eu estar ali, aparentemente. Ao que parecia, Paulo Chermont era propriedade dela, e eu decidi que não valia à pena me meter entre os dois. Eu simplesmente estava cansada de todo aquele draminha adolescente. Chame-me do que quiser, mas eu detesto todo esse joguinho. E é por isso que eu não gostava de pessoas. Tudo o que eu queria era ficar sozinha por um tempo, longe de toda aquela chatice. Não sabia onde Gabe estava e, para ser sincera, não o queria por perto naquele momento. Não sabia como me expressar corretamente, mas eu já me sentia deslocada e desconfortável em minha própria presença, não precisava de outra pessoa para intensificar esse sentimento.

Por isso que naquele dia eu me afastei do Chermont e da Britto e deixei-os sozinhos e livres para arrancarem os cabelos um do outro. Juro que não entendia o relacionamento deles...mas também não era da minha conta. Fui andando sem rumo pelo campus, ignorando da melhor maneira que podia o buraco que o olhar daquele monitorzinho abria em minhas costas. É, eu era capaz de sentir o olhar dele, como se, de alguma forma, estivéssemos conectados.

Respirei fundo e o ar puro e úmido preencheu meus pulmões. Fiquei contando minhas respirações enquanto andava. Concentrava-me no movimento que me dava vida para expulsar Paulo da minha cabeça. Eu estava cheia dele.

Pensei em ir para o dormitório e me enrolar na minha cama até o dia seguinte, mas seria impossível ficar sozinha lá. Amaldiçoei pela milésima vez a falta de privacidade daquele lugar e continuei caminhando sem nenhum lugar fixo em mente. Percebi que minhas pernas me guiavam – inconscientemente – pelo mesmo percurso que eu fizera logo depois de ter meu primeiro pesadelo em St. Werburgh. Esses pesadelos haviam me assombrado por mais de um ano, porém pensei tê-los superado muito antes de vir para esse fim de mundo.

Estava errada.

Depois do primeiro, eu tive pesadelos todas as noites, exceto as que passava no apartamento do Gabe. Sorri sem humor com esse pensamento. Apesar de odiar reviver tudo aquilo – mesmo em sonhos – era meio que algo familiar, com o qual convivi por muito tempo. Era uma coisa à qual se agarrar quando as coisas ao meu redor pareciam muito diferentes, muito mudadas.

Parei ao alcançar as primeiras árvores. Não havia ninguém ali por perto e eu pensei que talvez pudesse encontrar a paz solitária que procurava. Ultrapassei o limite invisível e entrei no bosque com passadas curtas e irregulares devido às raízes grossas que formavam armadilhas no chão. Tentei andar em linha reta para não me perder – não era como se houvesse uma trilha – e à cada passo que eu dava, tudo ao meu redor ficava mais escuro e mais úmido. O chão parecia molhado sob meus tênis e minhas roupas não eram capazes de me proteger do frio. Vaguei por vários minutos, adorando o silêncio e a solidão, mas odiando o frio e a umidade. Já pensava em voltar, meus dentes estavam batendo de frio, quando o encontrei.

Meu refúgio.

Não sabia que o estivera procurando nem que o queria, que precisava dele. E ali estava. Eu quase não acreditava em meus olhos.

A alguns metros de mim havia uma pequena inclinação e logo abaixo, quase escondido pelas árvores, havia um pequeno chalé. Parecia algo saído do filme A Branca De Neve. Devia estar ali há muito tempo, muito tempo mesmo. Talvez há mais tempo que a escola. Era todo de madeira, tábuas grossas e horizontais colocadas uma em cima da outra. O telhado era negro, algumas telhas faltavam, o resto estava coberto de musgo e do meio despontava o que parecia ser uma chaminé de pedra. Havia uma minúscula varanda em um dos lados, onde havia a porta, que estava claramente apodrecendo. As janelas eram quadriculadas e pareciam abrir em guilhotina. As duas sobressaíam, uma de cada lado da porta, como dois olhos fechados, já que o vidro estava tão sujo que era impossível ver algo lá dentro. Plantas trepadeiras cresciam em volta da casa, grudando-se às paredes, tornando-as meio verdes. A casinha parecia tão abandonada, sem vida, esquecida. Como se estivesse vazia há décadas. Juro, a coisa estava caindo aos pedaços.

Eu amei.

Era o lugar perfeito para mim. Parecia muito com aquelas casinhas de clubes secretos que eu via as outras crianças frequentarem quando era pequena. Exceto que elas normalmente ficavam em cima de árvores. E depois de lutar um pouco com a porta emperrada, vi que estava mesmo certa, o lugar era perfeito. Era mais ou menos do tamanho do meu quarto no dormitório feminino. Havia um sofá marrom, meio caído em um dos lados, de frente à lareira de pedra, que parecia tão molhada que eu duvidava que um dia veria fogo crepitando nela. De um lado do sofá, virada para o centro, havia uma poltrona verde desbotada, com o estofamento rasgado em algumas partes e algumas molas para fora e, no chão, um tapete, que algum dia podia ter sido bonito e colorido, mas que agora era cinza e puído.

Do outro lado, embaixo de uma das janelas embaçadas, havia uma pia enferrujada num balcão de pedra, uma mesa redonda de madeira com três cadeiras – também de madeira – diferentes entre si. Uma delas estava torta, um dos pés quebrados. A única porta dentro do aposento dava para um banheiro minúsculo e muito sujo, sem pia e sem espelho.

O lugar inteiro estava coberto por uma grossa camada de poeira. Mas pelo menos não era tão úmido quanto o lado de fora.

O meu refúgio era perfeito para mim. Perfeitamente acabado e imperfeito.

Cada coisa que podemos achar numa escola anciã...

Quando eu voltei para o dormitório naquela noite, sentia-me melhor do que estive em meses. Eu tinha uma missão, um objetivo. Ajeitar e limpar meu pequeno chalé. E nas semanas seguintes, empenhei-me em uma faxina impressionante, principalmente para mim, já que eu nunca fui do tipo que limpa ou arruma. Minhas colegas de quarto sempre torciam o nariz para a minha cama bagunçada e cheia de roupas amassadas. Mas eu me esforcei para me livrar de todo aquele pó, desentupir a pia e lavar os vidros das janelas. Numa madrugada, esperei Luma e Willa dormirem e me esgueirei para fora do quarto, peguei alguns travesseiros e cobertores na lavanderia, coloquei-os em dois grandes sacos e levei para o chalé. Certo, eu meio que roubei, e daí? Quem ia chamar a polícia por causa de alguns travesseiros?

Ainda pensei em levar algumas roupas minhas para lá, mas eu estava tão escassa nesse departamento que era impossível. Eu nem tinha uma muda de roupa limpa no vestiário de educação física nem usava minha parte no armário do quarto! Minhas roupas ainda estavam enfiadas na mochila ou espalhadas pela cama. Com as aulas, as atividades vespertinas, a detenção e os finais de semana com Gabe, regados a muito dever de casa, eu não tivera tempo para fazer compras.

Quando meu refúgio ficou pronto – exceto pelo banheiro, eu ainda não tinha coragem de entrar ali – eu me senti...orgulhosa do meu trabalho. Eu não estava feliz – achava difícil que, algum dia, eu pudesse voltar a sentir verdadeira e pura felicidade – mas estava satisfeita.

E, para uma pessoa como eu, isso era o bastante.




– Então, sua tortura acaba essa semana, não é? – Gabe perguntou.

Eu estava na aula coordenada por ele, Desenho e Pintura. Era uma das classes de atividades vespertinas mais vazias, com menos de vinte alunos. Gabe, como coordenador da atividade, precisava dar uma de “professor”, ainda que ninguém usasse esse título para se dirigir a ele ou a qualquer outro coordenador de atividade. Ele era taciturno e tímido demais para esse papel, mas entendia do assunto, era talentoso e tinha uma paciência infinita – eu era a prova viva disso, ninguém ali conseguia ser pior que eu quando o assunto era desenhar – o que meio que compensava. Como era uma atividade com poucos alunos e, mesmo os que estavam ali pareciam querer distância do “professor”, Gabe apenas dava as instruções do dia e passava o resto do horário conversando comigo. Ele não parecia incomodado com a distância dos outros alunos nem com o fato de eu monopolizá-lo. Ainda tentava me ensinar alguma coisa – técnicas de desenho ou mesmo a história de um pintor ou movimento – mas eu era uma verdadeira negação e nós passávamos a maior parte do tempo falando sobre qualquer outra coisa.

– Não é tão ruim – respondi. Estávamos sentados lado a lado, dividindo uma mesa, misturando tintas para fazer novas cores. A turma não estava em silêncio, mas também não era uma turba em polvorosa, portanto não precisávamos sussurrar nem gritar. – Mas, em resposta à sua pergunta, sim, acaba na sexta-feira.

A “tortura” da qual estávamos falando era a minha detenção. Eu sabia que a madre superiora não iria deixar barato o que eu fiz com seu querido monitorzinho, Por isso, na segunda-feira seguinte ao incidente, ela me chamou à sala dela e me deixou de detenção por um mês.

Isso mesmo. Uma hora por dia. Cinco dias por semana. Durante um mês.

Mas, como eu havia dito, não era tão ruim. Mas fora por causa disso – e dos deveres de casa, das atividades complementares e do tempo que eu passava com o Gabe – que eu demorara tanto tempo para limpar o meu pequeno recanto bucólico, que, podia até ser egoísmo, era só meu. Isso mesmo, não contei para Gabe o meu pequeno segredo. Quase não tinha tempo de ir para lá mesmo, mas isso acabaria no final de semana. Eu esperava, finalmente, poder estrear o meu cantinho.

– Não importa o que você diga, vou ficar feliz quando você estiver livre do castigo – Gabe retrucou. Ele achava tudo aquilo uma injustiça, porque, é claro, eu não contei o motivo da detenção. Não contei para ninguém.

Gabe e eu ficamos mais próximos, quase inseparáveis, no último mês. Eu estava quase sempre na companhia confortável dele e passava os finais de semana em seu apartamento. Nós saíamos da escola na sexta-feira depois das aulas e ficávamos lá até domingo. Gabe acordava cedo e ia para a missa e eu ficava dormindo pelo resto da manhã, depois nos encontrávamos para almoçar e voltávamos para a escola. Ele meio que se tornou uma rotina, principalmente depois que um certo monitor parou de me encher o saco por eu andar com o proscrito da Werburgh.

Estava mais do que claro que Gabe e eu éramos tratados como leprosos pelo resto dos alunos. Ninguém se aproximava ou falava com a gente mais do que o necessário. Até porque todo mundo ficou sabendo da minha detenção – a mais longa da história do Instituto – mas ninguém sabia por que exatamente eu fora punida, além do envolvido. E ele também não abriu a boca.

Mas os boatos sobre minha detenção rolavam por toda a escola. As teorias mais frequentes eram de que eu tentara vender drogas na escola; fora pega transando com alguém no gabinete da madre superiora; e que eu tentara colocar fogo na capela da escola. Essa última era a que mais me fazia rir, já que as pessoas acreditavam que eu era membro de uma gangue satânica com a missão de colocar fogo em lugares sagrados. Claro que o fato de eu nunca ter posto os pés na capela para a missa de domingo só fazia tudo parecer mais verdadeiro na mente maluca desses caipiras.

Legal como as pessoas me viam por aqui. Uma vadia, traficante de drogas, incendiária e adoradora do satã. E meu último terapeuta ainda dizia que eu não passava uma boa primeira impressão.

– Vou gostar de ter minha liberdade de volta – eu disse, misturando amarelo e azul para fazer verde pistache. E falhando miseravelmente. – Talvez eu possa finalmente ir às compras.

– Você precisa colocar um pouco mais de amarelo aí – Gabe disse, indicando minha mistura. – E, se você quiser, nós podemos pegar o trem para a próxima cidade. Leva só uns 40 minutos e você vai ter mais opções de compras por lá.

– Você não se importa? Sempre achei que garotos odiassem acompanhar garotas em viagens de compras.

– Não tenho nada melhor para fazer – respondeu, dando de ombros.

– Ok. Vamos no sábado?

Gabe me lançou um olhar estranho.

– Esse sábado é dia da família, Julieta.

Essa informação me pegou de surpresa. Eu tinha esquecido completamente que, um sábado por mês, os pais podiam vir até a escola visitar os filhos, principalmente aqueles que não podiam ir para casa nos finais de semana. Imediatamente, uma imagem distorcida de mamãe, papai e Bianca aparecendo na Werburgh meio que me deixou em pânico por um segundo.

Na minha visão, mamãe me olhava com ódio, papai com indiferença e Bianca estava pendurada no braço do canalha do Andy.

Estremeci e balancei a cabeça para afastar a imagem assustadora. Até porque isso nunca aconteceria. Mamãe não podia sair do hospital e Bianca e Andy já haviam terminado aquele namoro maldito há muito tempo. Além disso, papai trabalhava demais para ter tempo para mim. E ele tinha que ter noção de que eu preferiria me jogar na frente de um caminhão a passar um dia inteiro na companhia dele e da minha querida irmã. Nem sei por que pensei nisso.

– Não acho que alguém venha me visitar – eu disse, dando de ombros com toda aquela pose de “não podia me importar menos”. – E você?

Ele gemeu como se sentisse dor.

– Minha mãe não perde um dia de família.

Arqueei uma sobrancelha para ele. O garoto não parecia muito animado com a visita iminente da mãe.

– É só que... – começou, em resposta à minha pergunta muda. – Regin não é a mais agradável das criaturas. Não gostaria que você precisasse conhecê-la.

Eu sorri sem humor.

– E você está dizendo isso para a garota da Família Monstro. Sério, se você conhecesse os meus parentes, sua mãe provavelmente pareceria algo saído de Os Ursinhos Carinhosos.

Foi a vez de Gabe arquear a sobrancelha. Aquela era a primeira vez que eu dava alguma informação concreta sobre a minha família. Ele continuou me encarando interrogativamente por vários minutos e eu baixei os olhos para a minha mistura, que há muito brilhava numa intensa cor verde. Larguei-a em um canto e peguei mais dois tubos de cores, sem vê-las realmente.

– Sua família é assustadora assim? – Gabe perguntou quando ficou claro que eu não falaria mais nada.

– Você nem imagina – suspirei, ganhando tempo para pensar em algo inócuo sobre meus parentes, mas ao mesmo tempo estranho. Algo que explicasse meu comentário, mas que não fosse o pesadelo que me acompanhava há anos.

Gabe ainda me encarava, esperando uma resposta, então eu disse numa voz leve:

– Eu tenho até uma prima que é bruxa.

Ele me olhou assombrado. Eu não aguentei e comecei a rir.

– Você está brincando comigo – ele reclamou.

– Não, é sério! – insisti, ainda rindo. – Ela é toda metida com bruxaria e coisas do além, mas jura que não pratica Magia Negra. E bom, eu nunca a vi matando galinhas em encruzilhadas à meia noite nem nada do tipo.

Foi a vez de Gabe rir. E sua risada era tão linda, tão pura e contagiante, que eu acabei acompanhando-o. E ri tanto que minha barriga começou a doer. Inclinei-me para a frente, apoiando-me na mesa e acabei, acidentalmente, batendo em um tubo de tinta, derrubando-o nas calças de Gabe.

Nosso riso morreu imediatamente enquanto fitávamos aquela mancha de tinta laranja e viscosa que começava a ser absorvida pelo tecido. Aquela visão foi, para mim, como um soco no estômago. Roubou-me o ar por um segundo. Vi, no lugar do laranja, um vermelho escuro e quente, derramando-se como se nunca fosse parar, entrando em cada poro do tecido branco, maculando-o...

A luz parecia tornar tudo pior. Grotesco. Mordi as bochechas para não gritar, o gosto embaixo da minha língua era insuportavelmente salgado, uma mistura de sangue e saliva. Eu parecia incapaz de piscar, meus olhos estavam vidrados no sangue que escorria até o chão, lento e viscoso. Quase como se fosse de mentira.

Só que não era.

Pisquei ao sentir um toque gelado em minha bochecha, interrompendo o fluxo de lembranças. Virei o rosto e vi Gabe olhando para mim, um resquício de sorriso brincando em seus lábios.

– Tire essa tristeza dos olhos, garota, foi só um acidente – ele disse, mas ambos sabíamos que minha tristeza tinha origens mais profundas. – E além disso, eu já me vinguei – e apontou para a minha bochecha.

Na mesma hora passei a mão sobre ela e tinta azul manchou meus dedos. Olhei para Gabe e, apesar da dor que queimava em meu coração, um sorriso lento se formou em meus lábios.

– Não, você não faria – Gabe disse ao perceber minhas intenções, se afastando lentamente de mim. Um segundo depois, sua franja preta estava coberta de tinta verde.

Ei, eu sei, tinta no cabelo é golpe baixo.

Eu deveria ter ficado envergonhada pelo que aconteceu a seguir, afinal minha mente ainda estava, de certo modo, quente das lembranças desencadeadas pela tinta laranja. O pesadelo da última madrugada ainda vívido atrás dos meus olhos. Mas a vergonha não era o sentimento que me preenchia enquanto Gabe eu nos enfrentávamos em uma mini guerra de tinta. Não, eu tinha certeza que meus olhos refletiam o mesmo que os de Gabe. Calor. No meu caso era calor por saber que, apesar do meu passado e da escuridão dentro de mim, eu tinha um...

Amigo.

Meu primeiro amigo.

Sem que eu percebesse, em um mês, Gabe baixou algumas das minhas defesas e me fez gostar dele tanto quanto eu podia gostar de alguém. Eu até me preocupava com ele e todas essas merdas que pessoas normais sentem pelos amigos. Eu não era normal, mas Gabe também não era e eu sentia que nós dois tínhamos levado uma surra da vida. Talvez por isso eu fosse capaz de me sentir bem com ele. De ser sua amiga.

Estávamos rindo e jogando tintas um no outro. Aquilo não era felicidade, não para mim, mas era o mais próximo dela que eu era capaz de chegar. Era uma sensação boa que me fazia, não esquecer meus infortúnios, mas coloca-los em segundo plano. Eu nunca seria normal, sabia disso, mas naquele momento com Gabe, eu me sentia capaz de fingir que era.

E isso me deixava satisfeita.

O sinal tocou e arrancou Gabe e eu do nosso pequeno mundinho. O riso foi morrendo em nossos lábios enquanto percebíamos quase vinte pares de olhos colados em nós. Toda a sala nos fitava como se estivessem assistindo dois elefantes brincando de pular corda. Ao que parecia, estávamos sendo observados já há algum tempo, talvez desde nosso primeiro ataque de riso. Era quase como se nossa amizade, nossos sorrisos os ofendessem.

Como se não tivéssemos o direito de nos divertir.

As caretas de desaprovação me surpreenderam. Eu estava acostumada a isso sim, mas só quando estava fazendo algo errado ou apenas sendo um pé no saco. Nunca ninguém me recriminou por sorrir. Por não sorrir, talvez.

– Sua prima bem que podia lançar um feitiço nesses idiotas – Gabe sussurrou na minha orelha. – Quem sabe uma maldição?

Olhei-o e vi o riso contido em seus olhos. Não resisti e soltei uma gargalhada, sendo seguida por ele. Os alunos olharam feio para nós por mais alguns segundos antes de começaram a pegar suas coisas e sair da sala.

– Não esqueçam os aventais na próxima aula – Gabe disse entre risos para a turma que se encaminhava para a saída. – Vamos continuar a mexer com tinta e vocês não vão querer...se sujar.

Lágrimas escapuliam dos meus olhos de tanto que eu ria. Gabe havia se levantado para se dirigir à turma e eu podia ver o nível do estrago. Seu uniforme estava destruído, completamente desfigurado por manchas aleatórias verdes, azuis, amarelas, pretas, roxas e eu ainda podia ver a grande mancha laranja em suas calças. O cabelo dele pingava multicolorido, um arco-íris bagunçado e molhado.

– Você não está muito melhor – observou ele ao notar a direção do meu olhar. O último aluno já havia saído e só restávamos nós dois na sala.

– Eu sei, estou uma bagunça – respondi, olhando para a minha própria roupa. Estavam quase tão ruins quanto às dele. – Não quero nem ver meu cabelo – eu ri. Gabe havia tacado pelo menos dois tubos de tinta no meu rabo de cavalo.

– Você está linda, Julieta – ele disse apenas.

Senti minha pele corar por trás da tinta em meu rosto. Levantei-me e limpei minhas mãos na pequena toalha que ele estendeu para mim. Peguei minha mochila e tentei sujá-la o mínimo possível.

– Eu tenho que ir para a detenção – disse e fui embora.

Era o que eu sempre fazia quando as coisas ficavam esquisitas entre nós. Não que acontecesse com muita frequência, mas ele já devia estar até acostumado. E a culpa nem era dele, eu é que não me sentia confortável com elogios.

Saí da sala e fui descendo as escadas para o térreo. Precisava me limpar e tinha menos de quinze minutos para a minha detenção. Fui até o vestiário de educação física e alcancei meu armário, jogando minha mochila lá e amaldiçoando pela enésima vez o fato de eu não ter nem uma camisa extra para trocar. Fui até a pia e tentei me limpar da melhor forma possível. Consegui tirar toda a sujeira do meu rosto, pescoço e mãos, embora ainda houvesse tinta verde embaixo das minhas unhas. Meu uniforme era – quase – um caso perdido. Minha blusa fora milagrosamente poupada, salva pelo blazer, que tinha ficado na linha de fogo. Minha saia, no entanto, estava arruinada, tinta seca grudava-se em cada prega. Tirei o blazer sujo e o guardei no meu armário. Molhei meus cabelos, mas não os soltei do rabo de cavalo – ia dar mais trabalho para coloca-lo de volta depois. Consegui tirar a maior parte da tinta, mas pequenos pontos coloridos ainda eram visíveis entre meus fios. Minha meia calça e meus sapatos tinham sido pouco atingidos, exceto por uma grande mancha amarela no meu joelho e pequenas gotas de tinta azul nos cadarços do meu tênis – sim, eu estava usando meus tênis all star pretos, nem pensar que eu voltaria a usar aqueles sapatinhos de boneca. A meia calça já era mais do que eu podia aguentar.

Bom, exceto pela saia – que parecia uma obra de arte produzida por uma criança de 6 anos – eu não estava tão ruim assim. Certo, não é bem verdade. Eu parecia mais que tinha acabado de sair de um jogo de paintball do que de uma aula de desenho.

Quinze minutos depois, eu estava entrando na mesma sala onde havia quebrado a janela no meu primeiro dia de aula. Depois de quase um mês sendo obrigada a passar uma hora por dia lá, o lugar deveria estar me irritando até as entranhas e despertando a vadia louca dentro de mim. Mas, surpreendentemente, eu não me incomodava tanto assim.

Pietro Vicentini já estava me esperando, jogado numa cadeira e com os pés apoiados na mesa. Ele também havia tirado o blazer do uniforme, pendurando-o nas costas da cadeira, e as mangas da sua camisa estavam enroladas nos braços musculosos, acima dos cotovelos. Seus longos cabelos loiros caíam em seus olhos quando ele se virou para mim. Afastou os fios dos orbes azuis brilhantes com um toque descuidado da mão, antes de dizer num sotaque forçado:

– Onde foi a festa da tinta, bela mia?

Rolei os olhos e me afundei na cadeira ao lado dele.

– Na aula de pintura – respondi. – E você já pode abandonar o sotaque italiano fajuto.

Ele riu. Eu sempre falava a mesma coisa quando ele começava com aquele sotaque de sedutor de esquina.

– Ficou se divertindo com seu artista durante a aula, é? – perguntou ele em sua voz normal. – Que coisa feia, Julie.

– Quer dizer que a fofoca já chegou até você? – suspirei.

– Não há segredos na Werburgh.

– Você que pensa – eu ri. Sou a pessoa com segredos que valem por todos os alunos nessa escola, afinal. Não que eu fosse dizer isso para meu monitor preferido.

Ele estreitou seus olhos azuis para mim, mas seus lábios estavam curvados para cima.

– Quer dizer, quase não há segredos na Werburgh – ele corrigiu, colocando as duas mãos na nuca. – Quando é que você vai me contar o que aconteceu entre Paulo e você naquela noite?

Rolei os olhos. Não era a primeira vez que ele perguntava isso. Mas eu nunca contei para ele, nem contaria. Caramba, eu nem contei para o Gabe!

– Quando for da sua conta – respondi.

– E quando vai ser isso?

– Nunca.

Eu não gostava de pensar naquela noite. Sentia como se algo tivesse me escapado, como se tivesse deixado de perceber algo de muito importante. Era como se...desde aquele beijo, algo em mim tivesse deixado de fazer sentido.

– Ah, qual é, Julie – Vicentini reclamou, baixando as mãos e olhando para mim. – Você não confia em mim?

Eu tive que rir depois dessa. Uma cascavel seria mais confiável que Pietro, porém claro que não seria tão agradável.

– Não. E não me chame de Julie.

Ele suspirou teatralmente, mas eu sabia que não estava chateado de verdade. E esse era o lado bom da detenção e da hora diária que eu passava com aquele monitor metido a Don Juan. Eu podia ser a vadia mal educada e sem consideração que eu sabia que era sem me preocupar em deixa-lo magoado ou zangado, coisa que eu não podia fazer com Gabe, que já me parecia emocionalmente frágil. Vicentini só ria, não estava nem aí. Ao conhecê-lo, pensei que fosse mais um Sr. Certinho , por ser monitor e amigo do Chermont. Mas eu estava muito enganada. Pietro Vicentini era tudo o que sua aparência de surfista tarado indicava. Mulherengo, sarcástico, boa vida, irritantemente bem humorado e malicioso.

E, eu suspeitava, o destruidor do coração de Luma Britto.

Confesso que essa suspeita o fez parecer melhor aos meus olhos.

Claro, o garoto era um rato. Mas pelo menos com ratos eu sabia lidar. Estava meio acostumada com eles.

– Você não me fala nada, Paulo faz cara de quem está tomando uma injeção na bunda toda vez que seu nome é mencionado – ele foi dizendo, balançando a cabeça em frustração, o que fez as pontas do seu cabelo liso roçarem em seus ombros. – Juro que vou morrer de curiosidade e a culpa vai ser sua.

– Por mim tudo bem. Mas antes da sua morte iminente e precoce – falei. – O que vamos fazer hoje?

Quando eu dizia que a detenção não era tão ruim, não era só por causa do canalha do Pietro. Sério. Eu fiz todo tipo de coisa durante as detenções nas últimas semanas. Ajudei a catalogar livros novos para a biblioteca, organizei arquivos, fiz um inventário do material para as aulas de arte (a de Gabe incluída) e muitos outros trabalhos tediosos, porém necessários, que ocupavam minha mente e me impediam de pensar em certas coisas, pelo menos por uma hora.

E havia um monte de coisas nas quais eu preferia nem pensar.

E é claro que essas eram as coisas que não saíam da minha cabeça.

– Nada – Pietro respondeu, piscando para mim. – Fiquei sem criatividade e resolvi que você merecia uma folga, então pensei que poderíamos só ficar por aqui e dar uns amassos.

Soltei uma risada e me levantei.

– Você é sempre tão engraçado? – perguntei, indo em direção à porta.

– Eu faço o que posso.

– Bom, não esqueça de tomar um remedinho para essas suas alucinações e de pensar em algo mais criativo para fazermos amanhã.

– Vai fugir da detenção assim fácil? Eu posso te denunciar para a madre superiora, você sabe.

– Você não vai me denunciar e sabe disso. Mas se fizer, eu te denuncio por assédio sexual.

Ele colocou uma mão sobre o coração, como se eu tivesse acabado de enfiar uma faca ali.

– Essa é minha Julie, sempre tão doce e submissa.

Riu da própria ironia e eu o acompanhei. Ainda estava com um sorrisinho nos lábios quando abri a porta.

Mas meu sorriso morreu quando fitei aqueles olhos verdes e furiosos do outro lado da porta.

Olhos que eu conseguira evitar por um mês.

Olhos que, mesmo agora, enviavam arrepios por minha espinha até a nuca.

Olhos dos quais eu percebia que não podia mais fugir.

Deus, eu estava tão ferrada.



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Notas finais do capítulo

Ficou grandinho e meio confuso, né? Mas se alguém ainda estiver lendo e não tiver entendido, só me perguntar. Vou ver se escrevo o próximo. beijos