O palácio de Nereu era grande e imponente, feito de corais que mesclavam-se em diversas cores, das paredes ao teto. Era uma construção que lembravam o formato de um enorme castelo, com duas torres altas e enormes jardins de flores desconhecidas pelos mortais, um para cada filha de Nereu. Havia todos os tipos de flores e algas crescendo ali, enormes cardumes de peixes brincando dentro e fora do palácio.

No centro estava o salão de festas, era o maior aposento. Tinha um formato arredondando e ficava na parte baixa da construção, com doze entradas feitas de corais e flores. O salão era iluminado por mais de sem tochas, o fogo celestial, que dançava com o movimento das águas, incapaz de se apagar. O chão era de areia tão branca quando a neve, e enormes estátuas com formas de musas e ninfas decoravam o aposento. Havia uma mesa enorme no centro, feita de corais também, aperitivos, néctar e ambrosia alimentavam as divindades aquáticas, que dançavam ao som de liras e outros instrumentos, nereidas e ninfas dançavam alegres junto as sereias, era quase impossível não se alegrar com tamanha beleza e alegria.

O sábio do mar estava sentado em seu trono, e ao seu lado estava Dóris. Nereu lembrava um velho rabugento, com a barba amarelada e suja. A esposa por outro lado era linda e encantadora, com cabelos castanhos muito longos, que formavam cachos grossos. Os olhos eram verdes, como uma esmeralda, e a pele era pálida. Ela usava uma túnica roxa, com um colar de pérolas e uma coroa delicada feita de corais azuis. Ambos olhavam para as filhas, que dançavam e cantavam felizes.

Nereu então se levantou, e bem alto anunciou o visitante.

– Temos aqui, em nossa presença, Poseidon, o imperador dos mares!!!!

E então todos começaram a bater palmas, a atenção voltada a figura alta que entrava por uma das 12 aberturas principais do palácio. Era um homem alto, com a pele bronzeada e olhos azul-esverdeados que demonstravam poder e elegância. Os cabelos eram negros e curtos e ele usava uma túnica branca, com uma armadura prateada reluzente. O rosto era de um homem jovem, aparentava ter 30 anos, mas seu olhar, tão profundo quanto o mar, denunciavam os séculos vividos.

Todos pareciam surpresos ao contemplar a verdadeira forma do deus dos mares, mas nenhum deles estava tão surpreso quanto Anfitrite. Que não sabia qual reação demonstrar naquele instante. Seu coração parecia querer sair pela boca, batendo tão aceleradamente que ela se sentia tonta. Suas mãos suavam e tremiam, e ela sabia que estava vermelha. Ele sorriu, observando a todos em volta e parando ao encontrar o olhar surpreso da deusa.

– Convido a todos a fazermos um brinde ao nosso ilustre convidado.

Uma das ninfas entregou uma taça dourada a Poseidon, que sorriu em agradecimento. Nereu ergueu sua taça cheia de vinho, que por mais que estivessem embaixo d’água, não saia da taça. Convidando a todos a fazerem o mesmo ele disse:

– Um brinde a Poseidon

Todos erguerem a voz, e repetiram aquelas palavras

– Um brinde a Poseidon!!!

Anfitrite tomou um bom gole de vinho, e suspirou confusa. Indo em direção as irmãs que dançavam despreocupadas.

– Então meu caro Nereu, queria falar comigo? – Poseidon toma mais um gole de vinho

– Ah sim meu senhor, eu gostaria de lhe fazer uma proposta

– Estou ouvindo...

– Soube que vossa majestade está à procura de uma esposa

O senhor dos mares solta uma gargalhada

– Do contrário meu amigo, do contrário...

– Como assim? Acho que não compreendi.

Nereu convida Poseidon a se sentar, ambos se acomodam, e Poseidon toma mais um gole de vinho.

– Meu caro, eu não pretendo me casar

O sábio do mar olha espantado para Poseidon

– Não quer se casar?

– Não

– Por quê? Gosta de se sentir livre?

– Mais do que qualquer coisa meu amigo.

– Você nunca amou não é?

– A.. Amar? Claro que já amei!

– Ora vamos meu senhor, então você nunca quis a companhia de uma mulher ao ponto de querer tê-la ao seu lado todos os dias?

– Eu... Eu... Não, acho, acho que não.

– Então sinto em dizer-te que você nunca amou alguém de verdade.

Poseidon se cala, pensativo. Ele se lembra da sensação que teve ao ver e falar com Anfitrite, a vontade de estar com ela, de senti-la, de conhecê-la.

– Minha proposta é a seguinte – continuou Nereu – proponho que se case com uma de minhas filhas como um sinal de aliança entre nós.

O deus dos mares olha surpreso

– Quero que escolha uma das minhas jóias, e eu lhe darei a minha benção.

– Eu realmente agradeço a proposta...

– Escute-me senhor, beba um pouco, aproveite a musica e a comida, e converse com minhas filhas, sei que vai se interessar, caso contrário, eu prometo não falar mais a você sobre este assunto.

Anfitrite estava sentada em uma pedra, estava longe da festa porque tinha decidido que iria subir a superfície e sentir o vento, que de algum modo sempre a acalmava. Mas era difícil parar de pensar nele. Por alguma razão estúpida aquele rosto e aquela voz não saiam da cabeça dela. Ela havia aprendido a temê-lo, e até odiá-lo, mas a figura das historias de sua avó não pareciam nada com aquele homem com quem ela tinha conhecido.

Ela olhou a lua, o céu estava lindo aquela noite. Com estrelas brilhando e cintilando como se tivessem sido bordadas a mão pelo próprio Zeus. Ela fechou os olhos e em silencio agradeceu a Selene por aquela lua tão linda

Tomou mais um gole de vinho, e então ela sentiu uma mão quente tocando seu ombro. Ela se virou e viu aquele rosto novamente. Seu coração acelerou, e suas mãos começaram a suar.

– Boa noite meu senhor – disse ela timidamente

– Boa noite jovem deusa. – Poseidon se senta ao lado dela

–Meu senhor...?

– Fale...

– Porque não me disse quem era quando nos falamos na festa?

– Porque eu sei que se falasse você fugiria de mim.

– E o que te faz pensar isso?

– Porque é exatamente o que você está fazendo agora princesa.

Anfitrite corou, sentiu-se triste pelas palavras dele. Sabia que a confusão em sua cabeça a estava afetando. Ela sorriu calorosamente, e se aproximou mais dele.

– Sinto muito- disse ela

– Não sinta, sei que cometi muitos erros, estou apenas pagando por eles.

Era incrível como a presença dela acalmava o deus dos mares. Com o tempo ele nem se lembrava mais da raiva que sentiu antes. Era assustador e ao mesmo tempo empolgante estar ao lado dela. Então era isso que Nereu queria dizer com desejar estar ao lado de uma mulher todos os dias? Porque pela primeira vez ele desejou uma mulher, não como desejou no passado, não como desejou Medusa, Deméter, ou qualquer outra, ele desejou-a como amiga, como amante, como sua rainha, como sua imperatriz, sua mulher.

– Anfitrite...

– Sim meu senhor?

– Você já amou?

A ninfa se assusta um pouco com a pergunta, e fica envergonhada ao olhar para o rosto tranqüilo de Poseidon, ela estava se sentindo estranhamente nervosa e ansiosa ao pensar de que forma responderia a pergunta, que acabou sendo um pouco simples e frustrante.

– Não... – ela solta um suspiro- E você meu senhor?

– Eu? Bom, se fizessem-me esta pergunta a meia hora atrás, minha resposta provavelmente seria diferente, mas agora, nesse instante não haveria outra resposta, ou sequer outro diagnostico para aquilo que sinto no meu coração e em minha alma.

– É por isso que veio a festa do meu pai?

– Sim, foi por isso.

– E quem é ela?

– É você minha deusa...

O coração de Anfitrite acelera desesperado, as palavras repediam em sua mente a cada milésimo de segundo, e ela ficou congelada, sem conseguir falar nada.

– Eu falei com seu pai Anfitrite, quero que se case comigo, quero que se torne minha rainha.

– Eu...eu...eu não sei se isso é uma boa idéia e...

– Como assim isso não é uma boa idéia? Eu a amo!

– Mas como você pode me amar se nem me conhece?

– Eu a conheço, porque conheço seu olhar, conheço o que guarda no fundo do seu coração, eu conheço a solidão que sente!

– Mais isso não basta!!!

– Então deixe-me conhecê-la!

– Não...

A sensação de desespero tomou-lhe por completo. E ele sentiu uma dor horrível em seu peito, como se tivesse sido ferido em batalha. Ela não o queria, não entendia seu amor. Ódio, não dela, mas de si mesmo, medo de não vê-la nunca mais. NÃO! Pensou ele Não vou permitir isso!

E sem pensar no que estava fazendo ele segura Anfitrite pelos pulsos com firmeza. Ela se desespera e se debate tentando soltar-se, mas não consegue vencer a força do deus.

– Me solte! - grita ela

– Não! Não vou perdê-la!

Ela continua a se debater, tomada pelo pânico e pelo medo

– Me solte Poseidon!

– Não!

Lágrimas frias começam a escorrer pelo rosto pálido da ninfa, que cai de joelhos no chão.

– Por favor...- sussurra

Poseidon sentiu seu corpo perder toda a força que tinha, as lágrimas dela fizeram foram um choque para ele, e por alguns segundos ele só pode olhar diretamente nos olhos dela. Anfitrite estava tão assustada, estava com tanto medo...Medo dele, medo do que ele tinha se tornado, medo do monstro que ele era. Seus dedos soltaram os pulsos dela, e por um segundo ambos ficaram sem ação, parados sem saber o que dizer, ou fazer. Poseidon teve medo de dizer qualquer coisa, medo de assustá-la mais ainda, mas ele sentia tanto...

–Eu...Eu...Sinto muito

Mas aquelas palavras não tiveram qualquer efeito sobre o que tinha acontecido, a única coisa que fizeram foi despertar Anfitrite, que sem saber o que fazer se jogou no mar e nadou o mais rápido que pôde. Não sabia para onde ir, nem sequer sabia se voltaria. Tudo o quê ela queria era fugir de todo aquele medo e toda aquela maldita duvida que ainda atormentava sua mente. Ela mergulhou o mais fundo que conseguiu, nadou e nadou até seus braços latejarem de dor, e suas pernas não terem mais forças, porque tudo o que ela queria naquele instante, era fugir da dor que a consumia como um enorme buraco negro.