O começo do ano em Hogwarts estava sendo realmente maravilhoso. Minha amizade com Severus não existia dentro de sala. Aproveitava pra conciliar a bagunça e os deveres, e parei de discutir com os garotos pra prestar atenção. Uma aula eu prestava atenção, e a outra eu passava brincando com meus amigos. Snape quase não me dava broncas, e quando dava, vinham num tom tão sarcástico que tinha vontade de rir. Eu nunca achei que fosse dizer ou até mesmo pensar isso... Mas mesmo com aquela imagem toda, Severus é uma das pessoas mais doces que já conheci.

Agora que passei à “disfarçar” que tenho favoritismo por Snape, os gêmeos voltaram a grudar em mim. Ginny continua com seus planos maléficos de me fazer a garota mais bonita da escola – e eu continuo ignorando-os.

Acordei na quinta-feira e Ginny já pulou em cima de mim. “Hoje dá certo, ou eu não me chamo Ginnevra Molly Weasley.” Agarrou meus cabelos e começou seu trabalho árduo. Fez minha maquiagem e usou alguns feitiços no meu uniforme.

- Eu não quero usar um uniforme mais curto, Ginny. – Disse irritada.

- Olha só essas pernas! – Ela disse apontando minhas coxas que agora estavam totalmente nuas. – Pensa em quanto sucesso você vai fazer com elas.

- Eu vou fazer isso hoje, Ginnevra! – Eu disse, ainda irritada, mas já vencida. – E se eu me sentir incomodada, você o faz voltar ao normal.

- Feito. – Ela apertou minha mão com um sorriso.

Abri a porta do dormitório e desci as escadas, já não encontrando ninguém. É óbvio que todos já estão tomando café, já que Ginny fez questão de me agarrar por vários minutos e fazer seu ritual macabro de roupa, cabelo e maquiagem. Esperei a ruiva descer – deslumbrante como sempre – e seguimos pro salão. Por incrível que pareça, os corredores estavam vazios. “Parece que dessa vez, estamos muito atrasadas.” Fomos andando apressadas, e quando passamos à entrada do salão, o falatório parou e todos ficaram em silêncio.

Pouco a pouco, todas as cabeças estavam viradas pra nós. Todos os alunos cochichando. Garotos e garotas. Corvinal, Lufa-Lufa, Sonserina e – principalmente – Grifinória.

Senti minhas pernas tremerem um pouco, mas caminhei confiante até meu lugar. Mirei o nada várias vezes, pra tentar ignorar, e me sentei entre Fred e George.

Como de costume, esperei que me cumprimentassem, mas pra minha surpresa, os dois ficaram calados.

- O que deu em vocês hoje, garotos? – Disse olhando pra Fred e depois pra George.

Peguei uma torrada com geléia e comecei a comer. Os dois continuaram fazendo silêncio.

- Hey! – Gritei, irritada.

- Desculpa. – Disseram os dois em uníssono.

- Tudo bem. – Eu sorri. – Bom dia pra vocês.

- Hermione... – Disse Fred sério. – Pode me acompanhar?

Levantou-se e foi saindo do salão. Segurei seu braço e o segui, ainda com um pedaço de torrada na mão. Chegamos a um corredor vazio no terceiro andar, ele me olhou dos pés à cabeça.

- O que aconteceu? – Perguntou impaciente.

- Como assim? – Perguntei confusa, terminando de comer a torrada.

- Desde o começo do ano, você está passando maquiagem demais, e se arrumando demais... – Ele disse parecendo irritado. – Mas andar nua pela escola é apelação. Você está querendo chamar a atenção de quem?

- Você está entendendo tudo errado. – Comecei a rir. – Isso é coisa da sua irmã. Eu nem queria...

- Ah, claro. – Ele balançou a cabeça, rindo. – Ginny te amarrou e te obrigou a andar assim pelos corredores.

- Fred. – Eu disse incrédula. – Qual é o problema? Enquanto Harry fica aí babando por Ginny e Ron aos agarros com a Lilá... Porque eu não posso simplesmente parecer mais bonita? Tenho que ficar pra sempre parecendo uma rata de biblioteca?

- Você nunca pareceu uma rata de biblioteca. – Ele disse olhando pro chão. – Pare de agir assim. Essa não é a Hermione que eu conheço.

- A Hermione que você conhece é uma nerd sem graça que tem cabelo de vassoura e vive no fundo da biblioteca. – Eu respondi irritada. – Eu não vi problema nenhum com as roupas. Pelo menos as pessoas pararam de me chamar de nerd e começaram a olhar pra mim de outro jeito.

Fred parecia muito irritado. Muito mesmo. E o que eu falei só piorou a situação. Ele ficou vermelho de raiva. Da mesma cor dos seus cabelos.

- Você é linda sem esforço nenhum, Hermione. – Ele disse se aproximando e me puxando pela cintura.

Minha respiração começou a falhar. Fiquei confusa e não sabia o que fazer. “O que é que ele está fazendo, Merlin?” Me perguntei e depois de segundos – que mais pareceram uma eternidade – senti os lábios de Fred tocando minha testa. Logo depois ele me abraçou e me tirou do ar, rodando. Deixei um sorriso escapar.

- Me desculpe. Eu me alterei. – Ele disse com as bochechas coradas. – Não há nenhum problema com as suas roupas. Mas se a doninha oxigenada te lançar mais um olhar eu castro ele!

Saímos do corredor de braços dados e às gargalhadas. Fred me disse sobre os olhares de vários garotos sobre mim. Entre eles estavam quase todos os garotos da escola. Só tirando ele, George e Harry – segundo ele, claro.

O dia se passou magnificamente. Eu e Ginny recebemos vários – e quando eu digo vários, são mais de cinqüenta – pergaminhos enfeitiçados. Anônimos, assinados, com palavras bonitas e até alguns com coisas engraçadas. Divertimos-nos o dia inteiro. Gargalhávamos pelos corredores e recebíamos olhares raivosos de Ron, Harry, Fred e George.

Hoje, nenhum deles ficou perto de nós. Peguei Harry olhando as pernas da ruiva umas vinte vezes, sem conseguir ao menos disfarçar. Não vi ninguém me olhando do mesmo jeito. Não que ninguém tivesse olhado, mas Harry não olha pra ela só com “desejo”, ele é apaixonado por ela e isso não é novidade pra ninguém.

- Fred está estranho. – Escutei a voz da ruiva, me tirando dos meus pensamentos.

- Por quê? – Perguntei confusa.

- Ele não para de olhar pra você. – Ela disse parecendo intrigada. – Mione... Não ‘tá achando estranho esse tratamento não?

- N-não. – Gaguejei e ela me olhou cerrando os olhos.

- Sei. – Disse com um sorriso que diz “você vai ter que me contar tudo depois.”

Fomos pra sala comunal depois do jantar e pedimos aos grifinórios terceiranistas pra virarem o sofá de frente pra lareira. Sem pensar duas vezes, eles nos fizeram esse grande favor. Agradecemos com um beijo na bochecha e nos jogamos no sofá, vendo o fogo crepitar.

- Obrigada. – Disse abraçando a ruiva. – Não achei que fosse tão divertido ser bonita.

- Deixe de ser idiota, Hermione Granger. – Ela me deu um tapa na cabeça, que doeu. – Você sempre foi bonita. Mas sempre teve “medo” de se mostrar.

- Obrigada por ter me obrigado a me mostrar. – Disse e gargalhamos.

Ficamos ali, deitadas. Enquanto alisava o cabelo de Ginny e via o fogo crepitar, a única coisa que passava pela minha cabeça, eram aqueles olhos castanho-esverdeados. O hálito quente, o cheiro doce e envolvente, os cabelos ruivos desgrenhados, a voz que quase me matava de tanto rir... Os abraços de urso... Os beijos na testa...

- Hermione? – Escutei a voz de Harry sussurrando ao meu lado.

Quebrou todos os meus pensamentos sobre Fred.

- Oi? – Perguntei acordando.

- Posso levá-la pro dormitório? – Ele perguntou apontando pra ruiva que estava dormindo com os cabelos espalhados no meu colo.

- Como vai subir as escadas? – Perguntei com um sorriso de canto.

- Os gêmeos prometeram ajudar. – Ele sorriu.

- É claro que pode. – Eu sorri. – Afinal, ela é praticamente sua prometida e você não faz questão de esconder o quanto a quer.

- Hermi-

O interrompi com um “shh” e ele ficou vermelho. Pegou a garota no colo, com um sorriso, e desapareceu com ela. Escutei George murmurar um feitiço, e depois de minutos Harry se sentou ao meu lado.

- Vai ficar aqui? – Ele perguntou, olhando pro fogo.

- Vou. – Disse sorrindo. – É muito confortável.

- Não se esqueça que tem aula amanhã. – Ele disse com ar severo. – E que o primeiro horário é o seu “ex-favorito” Severus Snape.

- “Ex-favorito.” – Disse com ar de desprezo. – Seboso nunca foi meu favorito.

- Sei. – Ele disse com aquele ar de “você não me engana.” – Boa noite.

- Boa noite, Harry. – Ele se levantou e beijou o topo da minha cabeça.

- Não durma no sofá. – Ele disse antes de subir as escadas do dormitório masculino.

Continuei ali, sem tirar os olhos do fogo e desatenta a qualquer barulho. O crepitar do fogo me lembrava Fred. Ou talvez tudo ultimamente me lembre Fred. “O que está acontecendo com você?” Minha consciência perguntou, e eu não soube responder.

- Não seja boba, garota. – Eu me respondi, alto. – Você está apaixonada.

Fiquei horas ali, perdida nos meus próprios pensamentos. “Como você pôde ser tão idiota?” me perguntei mentalmente. “Ele nem liga pra você, vassoura de biblioteca!” minha consciência gritou e eu senti lágrimas rolando minhas bochechas.

- Porque a garota mais linda de Hogwarts está chorando? – Escutei a voz inconfundível que mexia com todos os meus sentidos.

Senti arrepios com o jeito que Fred sussurrou aquela frase no meu ouvido. Depois disso, ele deu a volta no sofá e se sentou ao meu lado.

Senti seu olhar analisando meu rosto, sem ter coragem de olhar pra ele. Ele segurou meu rosto e me virou contragosto. Secou minhas lágrimas e sorriu.

- Você fica melhor assim. – Ele disse ainda com um sorriso. – Vai dizer o motivo de estar chorando?

- Tive alguns pesadelos ultimamente. – Menti. – Pesadelos reais.

Menti em partes, até porque, tive pesadelos reais e terríveis nos últimos dias.

- Não liga pra isso. – Ele disse passando as pontas dos dedos na minha bochecha. – São só pesadelos.

Fiquei em silêncio, ainda absorvendo as informações que eu mesma resolvi admitir. “Eu estou apaixonada pelo irmão do meu melhor amigo!” Pensei assustada comigo mesma.

- Você tá bem, Mione? – Ele perguntou com uma careta de preocupação.

- E-eu... – Gaguejei e depois fiquei calada. – Eu não tenho o que temer, você está por perto.

“Nota mental: matar-me se eu repetir uma coisa dessas.”

Achei que tinha visto os olhos de Fred brilharem, mas concluí que é coisa da minha cabeça. Ele me puxou pra perto e me abraçou. Aceitei seu abraço e respirei fundo, sentindo seu cheiro e escutando os batimentos do meu próprio coração. Sinto-me tão frágil. Tão insegura. Não sei nem o que pensar. “E se eu não for boa o bastante pra ele?” Me perguntei. “Você é só uma rata de biblioteca.” Minha consciência gritou. Abracei Fred mais apertado e ele retribuiu. Fiquei calada, só escutando sua respiração, seus batimentos – e os meus, de tanto que meu coração tamborilava acelerado perto dele – sentindo seus braços me envolverem. Sentindo-o perto de mim. Deixei-me levar pelo momento e fiquei ali, desejando que durasse pra sempre. Adormeci.

- Ela precisa ir pro dormitório. – Escutei uma voz conhecida.

- Eu não vou acordá-la. – Sussurrou Fred, ainda abraçado a mim. – Faz o feitiço e eu vou levá-la no colo mesmo.

- Não. – Sussurrei. – Eu quero...

“Shh...” Ele sussurrou, achando que eu estava sonhando.

- Eu quero ficar com você.

Senti seu corpo relaxar e ele deu um suspiro.

- Mudança de planos George. – Ele sussurrou. – Traga meu lençol. Nós vamos dormir aqui.

Meus olhos estavam pesados demais pra que eu comemorasse ou achasse bom. Agarrei-me à seu peito e dormi ao som da canção de ninar mais magnífica do mundo: Fred Weasley.