Olho através das janelas. O que eu vejo? Chuva. Caindo, molhando tudo. Atrás de mim ouço o som de um filme. Não sei exatamente qual é, mas tenho certeza do que se trata. Continuo ali, parada, olhando para o nada. A espera do quê? Eu sei que ele não vai mais voltar, eu sei que ele não está no mesmo mundo que eu. Mas algo em mim ainda espera o ver voltando para mim, naquela chuva, com os cabelos loiros caídos em seu rosto e os olhos azuis virados em minha direção, seu rosto sem cicatriz e um sorriso sincero nos lábios.

Balanço minha cabeça tentando jogar fora essa ilusão. Ele não vai mais voltar, ele não vai mais voltar, diz a minha mente a uma eu iludida. Viro-me de costas para aquela janela e vejo a cena que eu queria passar na televisão que meus irmãos mortais viam com a minha madrasta: a garota olhando através da janela enquanto o cara voltava para ela totalmente molhado, mas claramente olhando para ela. Volto-me novamente pra janela não agüentando ver aquela mentirosa cena.

E se isso fosse um filme? Você voltaria para mim? Ficaria esperando lá fora até que eu saísse?

Eu estava enlouquecendo. Com certeza. Fazia seis meses, eu tinha o visto morrer. Mas eu ainda o desejava. Eu ainda queria que ele estivesse vivo. Eu ainda o queria para mim, mesmo já estando com outro. Eu ainda era a mesma egoísta de antes, a diferença era que ele estava morto.

Desci correndo as escadas, sem me virar para trás quando a minha madrasta perguntou aonde eu ia. Aonde eu ia? A lugar algum. Peguei minha bolsa com todas as minhas coisas básicas e saí para a chuva. Se ele não vinha a mim, eu iria até ele. Deixei as gotas caírem sobre mim, molhando os meus cabelos, fazendo-os ficarem pesado e sem forma. Andei rápido para atrás da casa, onde havia o jardim em que eu e Percy havíamos criado uma lapide cerimonial para ele. Não sei o que estávamos com a cabeça quando fizemos aquilo.

Pego uma das pás de jardinagem dos meus irmãos que estava jogada ali e vou cavando a terra até achar a caixa cheio de coisas dele que enterramos. Abro-a e sem ver de verdade o que havia ali para não me machucar mais do que eu já estava machucada. Procuro dentro da minha bolsa a adaga, a que a matou, a adaga maldita, a única coisa que dele que não havia deixado que tirassem de mim naquele dia. Coloco-a junto com aqueles objetos e a ponho de volta ao seu buraco.

Mas eu não ia tampar tudo de novo com terra. Isso não era um filme, eu não vou dizer eu sinto muito para objetos mortos e tudo não ficará bem. Eu preciso queimar o meu passado, eu preciso queimá-lo, mesmo que eu não possa queimar ele, eu posso queimar as coisas que simbolizavam sua alma. Pego o pequeno frasco de fogo grego e jogo na caixa.

Me afasto quando esse explode, e juro que poderia ter visto um the end nas fumaças. Nosso filme acaba aqui.