Trabalho Escolar: Diário de Lidia Brazzi escrita por Juliiet


Capítulo 22
Dia 11, sexta-feira, 12 de agosto. (parte 1)


Notas iniciais do capítulo

Ameei a recomendação de duas leitoras lindas, obrigaada! Esse cap é pra vocês *-* (eu amei esse cap, ok? espero que vocês também gostem). Boa leitura :)



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   Tive a impressão de que havia acabado de fechar os olhos quando Renata começou a me sacudir.

   - Acorda Lidy! Vamos nos atrasar para a escola!

   Abri os olhos e me espreguicei. Parecia que eu tinha acabado de correr a maratona de tão cansada que estava. Nem parecia que tinha dormido por...quanto tempo eu dormi mesmo?

   - Que horas são, Rê? – perguntei.

   - Quase sete horas da manhã e você ainda está toda enrolada nessa cama. – respondeu ela, levantando-se.

   Putz! Sete horas da manhã? Eu havia dormido por mais de 15 horas! Então por que sentia que tinha acabado de ser atropelada por um trem?

   - Você dormiu tanto que de noite mamãe disse para eu ver se você não tinha morrido – informou Renata enquanto jogava livros na mochila. Percebi que ela já estava arrumada e vestida. – Você estava viva, mas tão chumbada que eu não quis te acordar para jantar.

   - Hm, ok – eu disse, levantando-me de um salto. – Não tem problema. Duvido que eu acordasse mesmo. Além do mais, não estou com fome.

   - Mas Lidia, você mal tocou na sua comida no almoço e passou o resto do dia dormindo, precisa comer alguma coisa!

   Só assenti com a cabeça e entrei no banheiro. Tomei um banho rápido, mas novamente não sequei os cabelos. Não dava tempo. Mas cobri com corretivo minhas olheiras que pareciam estar criando vida, e passei um brilho labial de cereja que encontrei na bancada do banheiro.

   Tinha trazido uma muda de roupas íntimas na mochila, mais nada. Então vesti o mesmo uniforme que havia usado ontem, já que, com ajuda de alguma força divina desconhecida, ainda estava inteiro e limpo.

   Depois de apresentável, fui até a cozinha, onde a Sra. Dixon tinha feito um café da manhã maravilhoso.

   Mas só o cheiro já me fazia enjoar.

   Só que o senhor sabe, Sr. Albert, que eu não podia fazer uma desfeita deixando de comer o que ela fez com tanto carinho para mim, não é?

   Então fingi comer dois pães de queijo e uma caneca de chocolate quente, mas quando ninguém estava olhando, joguei tudo no lixo.

   Enquanto estava ali sentada, invejei a sorte de Renata. O Sr. Dixon, um homem forte, grande e engraçado havia morrido há cinco anos. Eu gostava muito dele e senti sua morte. Ataque cardíaco fulminante.

   Sei que isso pode parecer ingratidão e até coisa pior, mas eu realmente preferiria que meu pai estivesse morto. Ele já quase não faz parte da minha vida mesmo. E, se ele estivesse morto, mamãe não ficaria o tempo todo preocupada com a vida dele e da sua “mulherzinha”, como ela a chama. Ela faria o mesmo que a Sra. Dixon fez. Sofreu a perda do marido amado, mas seguiu em frente. E não se esqueceu de que tinha uma filha que a amava e precisava muito dela naquele e em todos os momentos.

   Algumas pessoas simplesmente não nasceram para ter filhos.

   Mamãe é a primeira delas.

   Eu sou a segunda.

   Estávamos ajudando a limpar a mesa quando o ônibus da escola chegou. Nos despedimos da Sra. Dixon e saímos. Lá fora estava muito frio MESMO. E eu não tinha nenhum casaco para usar. Renata ainda me perguntou se eu queria que ela voltasse e pegasse um para me emprestar, mas eu disse que não precisava.

   Me arrependi quando chegamos na escola.

   Juro que sentia o frio nos meus ossos, Sr. Albert. E ele só se intensificou quando eu vi quem estava parado, fitando-me na frente da escola.

   Ele mesmo, Sr. Albert. Acertou em cheio. Com um olhar tão gelado que eu achei que nunca mais fosse me sentir aquecida de novo.

   Segurei Renata pelo cotovelo, fazendo-a parar antes que entrássemos na escola.

   - Rê, valeu por ter me deixado ficar na sua casa, - comecei, com os olhos fixos nos botões do seu agasalho. – Mas hoje eu vou voltar com o Felipe.

   - O quê? – ela exclamou, e então viu Felipe encostado no portão e baixou a voz. – Por quê?

   - Eu preciso Renata – respondi, finalmente olhando em seus olhos. – Eu devo muito a ele. Ele salvou minha vida. Se ele está me pedindo para ser namorada dele e viver na casa dele, por uns tempos, eu acho que é uma troca justa.

   Ela pôs as costas da mão na minha testa e perguntou:

   - Você está bem?

   - Estou sim, Rê. Espero que você entenda.

   - Eu não entendo, mas aceito. Além do mais, se eu estivesse no seu lugar, também não resistiria àquele pedaço do paraíso. – dizendo isso, Renata soltou uma risadinha e entrou na escola.

   Ela sabia que eu ia ter um particular prá lá de sério com aquele “pedaço do paraíso”.

   Aproximei-me dele.

   - Oi – disse.

   Ele não disse nada.

   Apenas ficou me olhando daquele jeito profundo e intenso por um ou dois segundos, antes de me segurar pelos ombros, me empurrar no portão da escola e beijar meus lábios com uma força que chegou a machucar.

   Eu gostei.

   Ah Senhor, me ajude, agora além de tarada, eu sou masoquista. Bela combinação. O diabo vai fazer uma festa de arromba com minha alma quando eu morrer.

   Espalmei minhas mãos em seu peito e consegui empurrá-lo um pouco, apesar de realmente querer enrolar minhas mãos naqueles cabelos e puxá-lo para mim.

   - O que você pensa que está fazendo? – forcei-me a dizer entre arquejos. Meu coração dançava samba e daria para passar minhas pernas no pão, já que elas tinham acabado de virar geléia.

   - Olá namorada – foi só o que ele disse.

   Sua voz fez a minha temperatura corporal subir descontroladamente. Sangue de Jesus! O que esse garoto estava fazendo comigo? Frio num momento, calor no outro...vamos regular esse termostato, por favor.

   - Solte-me Felipe – disse, minha voz soava fraca e enrolada. – Vamos conversar.

   - Não quero conversar – ele disse, aproximando-se do meu rosto de novo.

   Sua voz parecia distante. Tentei falar algo, mas não consegui.

   - Lidia! Lidia! – Ouvi Felipe dizer, mas era como se sua voz estivesse baixinha.

   Sentia-me fraca e de repente não consegui me sustentar nas minhas próprias pernas. Felipe segurou-me pelos ombros e disse:

   - O que está acontecendo com você, Lidia?! Vou levá-la para o hospital!

   Não apaguei, mas foi por pouco. Minha visão ficou meio embaçada e senti Felipe me pegar nos braços e me colocar deitada no banco de trás de um carro. Ele mesmo entrou no banco da frente e começou a dirigir.

   - Felipe – consegui dizer com voz fraca. Estava me sentindo um pouco melhor agora que estava deitada, mas ainda me sentia tonta. – Pare.

   - O quê? – disse Felipe, olhando-me pelo retrovisor enquanto eu tentava me levantar. Ele estava com uma expressão tão preocupada! – Deite-se Lidia, você quase desmaiou.

   Respirei fundo e tentei não enjoar.

   - Felipe, não quero ir para um hospital – disse, finalmente sentando e colocando os dedos nas têmporas. Sabia exatamente o que havia de errado comigo. - Eu só preciso comer alguma coisa. Não comi nada ontem nem hoje. Só estou um pouco fraca.

   Hm, agora ele estava, não apenas preocupado, mas furioso.

   - O que você está tentando fazer, Lidia? – perguntou ele, gritando – Quer me matar de preocupação se matando no processo?

   - Não diga frases com mais de dez palavras, por favor.

   Hm, eu ainda estava um pouco tonta, Sr. Albert, qual o problema? Me mata logo.

   Parecia ser exatamente isso que Felipe queria fazer, se o olhar que ele me lançou servisse de indicação.

   - Vou te levar para casa, então – ele disse, claramente frustrado por não poder explodir quando eu estava tão fraca. Tava na cara que ele queria mesmo era me jogar no meio da rua. E ainda passar por cima.

   - Não quero ir para a sua casa – disse baixinho. Não aquela casa que me fazia sentir tão sozinha e errada, como uma erva daninha em meio a um jardim de rosas.

   Felipe deu uma freada no meio da rua. Meu corpo foi jogado para frente, dei de cara com o banco do passageiro. Sorte que o trânsito estava calmo naquela rua e nenhum carro vinha atrás de nós.

   - O que diabo você quer?!

   - O que diabo você está fazendo?!

   Felipe e eu gritamos ao mesmo tempo.

   Ele estava querendo matar nós dois? Que merda ele tinha na cabeça? Eu agora tinha enjoado mesmo.

   - Odeio a sua droga de casa! – disse, piscando para espantar as lágrimas. As palavras saíram abafadas porque eu estava com a mão na boca. – Eu fico lá naquele castelo de gelo sozinha enquanto você vai sei lá pra onde fazer sabe-se lá o quê com alguma fulaninha aí.

   Espera aí...o que eu disse? Eu estava com...

   Felipe virou o rosto para mim. Ele sorria.

   O desgraçado estava rindo de mim!

   - Você está com ciúmes – ele disse alargando ainda mais aquele maldito sorriso hipnotizador.

   - Ciúme o caramba – eu não usei a palavra ‘caramba’, se é que o senhor me entende, Sr. Albert. – O inferno vai congelar antes que eu sinta ciúme de um maníaco desajustado como você.

   Ok, essa era a mentira do ano. Não o fato de Felipe ser um maníaco desajustado, nããão, isso ele é mesmo.

   Mas eu estava mortinha de ciúme dele.

   Ok, eu sei e digo pela enésima vez.

   Eu sou uma idiota.

   Não é nenhuma novidade.

   - Você está com ciúmes sim, Lidia – ele disse, rindo agora. – Você está se roendo de ciúmes!

   Maldito!

   Eu não podia mais aguentar aquela humilhação, não podia mesmo. A qualquer momento eu não conseguiria mais controlar as lágrimas.

   Por isso que eu tive a brilhante ideia de descer do carro e sair correndo.

   Brilhaaaante.

   O que, é claro, eu não pensei na hora é que Felipe não ia simplesmente me deixar ir.

   Também não pensei que, no estado em que eu estava, depois de dois passos, minha visão ficou turva e eu caí.

   É, brilhante.

   Bom, eu não me machuquei nem nada, mas Felipe teve que me carregar de novo e me colocar no carro. Pelo que eu pude perceber naquele estado de semi-consciência, ele estava soltando fogo pelas ventas.

   Não fazia a mínima ideia de para onde ele estava me levando. Eu mal conseguia abrir os olhos! Que, por sinal, estavam molhados. Merda!

   Paramos. Ele desceu do carro e me deixou lá. Será que a ideia era me deixar sufocando lá dentro? Hm, que seja. Eu não estava em condições de fazer nada a respeito.

   Depois de alguns minutos, Felipe entrou de novo com algumas sacolas e continuou dirigindo. Por um bom tempo. Ele pegou o celular e ligou para alguém. Eu estava acabada demais para prestar atenção. Bom, pelo menos ele não ia me deixar morrer sufocada ali.

   Paramos pela segunda vez. Ele desceu de novo, com as sacolas, e depois voltou e me pegou no colo. Eu estava mais pra lá do que pra cá, então nem protestei. Além do mais, era bom ficar nos braços dele.

  Sou um caso perdido.

  Ouvi alguns sons desconexos. Não estava prestando muita atenção ao meu redor. Só sabia que era bom ficar ali agarradinha no Felipe. E ele nem estava reclamando do meu peso, o que era um bom sinal.

   Ou talvez não.

   Sei que entramos num elevador. Depois entramos num corredor e Felipe abriu uma porta ao lado do elevador. Entramos, mas eu não notei o ambiente.

   Ele me colocou em cima de uma cama macia, com lençóis brancos e cheirosos. Saiu e voltou depois de alguns minutos. Tirou meus sapatos e sentou na cama ao meu lado.

   - Lidia, acorde – disse, num tom de voz que não consegui definir se era carinhoso ou com raiva. Talvez um pouco dos dois, se é que isso é possível.

   - Eu estou acordada – disse numa voz enrolada.

   - Você precisa comer alguma coisa – ele começou a passar a mão nos meus cabelos. Era tão bom!

   - Não estou com fome – eu disse.

   - Mas vai comer mesmo assim.

   - Estou enjoada.

   - Não quero saber.

   Hm, Sr. Irredutível, você vai me enfiar comida goela abaixo?

   - Se você não cooperar, vou.

   Merda. Eu disse aquilo em voz alta.

   Felipe se levantou. Eu comecei a abrir os olhos e notar o ambiente onde estava. Era um quarto espaçoso, com paredes azul gelo e bonitos móveis de madeira. Que lugar era aquele?

   Felipe estava num canto do quarto, tirando alguma coisa das sacolas.

   - Onde estamos? – perguntei, sentando na cama. Tudo começou a girar e eu deitei de novo.

   Acho que Felipe tinha razão. Eu devia comer alguma coisa. Não só por causa da tontura, mas porque minha audição já estava ficando prejudicada. Eu escutei ele dizer “num hotel”?

   - Onde? – perguntei de novo.

   - Num hotel, Lidia.

   Estava chocada.

   O cretino tinha me levado para um hotel?!

   - Agora coma – Felipe disse, sentando-se novamente ao meu lado na cama e me fazendo sentar devagarzinho. Estava embasbacada demais para fazer ou dizer alguma coisa.

   Senti que ele colocava uma colher na minha boca. Era alguma coisa doce, mas eu não senti o gosto direito. Mastiguei contra a minha vontade. Queria mesmo era cuspir tudo em cima dele.

   Engoli e então disse:

   - Seu safado tarado sem-vergonha! Se você pensa que eu vou cair no seu jogo, pode tirar o cavalinho da chuva!

   Felipe suspirou ruidosamente. Pegou outra colherada do que, eu podia ver agora, era uma salada de frutas e enfiou na minha boca quando eu a abri para falar.

   Muito fula da vida, mastiguei.

   - Do que você está falando agora, Lidia? – ele perguntou.

   Engoli e respondi:

   - Se você pensa que eu vou cair nos seus braços nesse quarto de hotel, você está enganado.

   - Você cai nos meus braços em qualquer lugar. Não preciso te levar para um quarto de hotel para isso.

   Arfei. Que filho da mãe arrogante! Minha vontade era quebrá-lo de pancada, mas ainda estava muito fraca para isso.

   - Então quais são suas intenções obscuras ao me trazer para cá? – perguntei depois de engolir outra colherada da salada de fruta. Minha vontade era gritar “mentira!”, mas ele tinha razão. Eu sempre caía nos braços dele.

   - Não tem nada de obscuro – ele respondeu simplesmente. – Você não quis ir para um hospital nem para minha casa. Eu precisava te levar para algum lugar. E eu fiz questão de pedir um quarto com paredes coloridas, já que você detesta branco.

   - Eu não detesto branco – disse. De onde ele tirou isso?

   - Já vi o jeito que você olha para a minha casa. Te incomoda ela ser quase toda branca, não é?

   O que me incomodava era que, no meio tanta brancura, eu me sentia suja. Mas nem morta eu ia falar isso para ele.

   - Não, não incomoda – disse. – É só diferente.

   O que não é exatamente uma mentira.

   - Que seja. Pedi um quarto azul. Todo mundo gosta de azul, não é?

   Nesse momento eu tive certeza de que amava ele mais do que jamais amaria alguém.


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Notas finais do capítulo

Vou me arrumar pra aula e antes de sair, posto a parte 2. Beijooos!